Semana de Biologia da Unesp reúne acadêmicos e comunidade de São Vicente

Debates incluíram temas como pesca, poluição, turismo, acidentes com tubarões, preservação de espécies, praias, mangues e ecossistema marinho

A 3ª edição da Semana de Biologia Marinha e Gerenciamento Costeiro, congresso anual promovido pelos alunos do Campus de São Vicente da Unesp (CSV) entre os dias 29 de agosto e 2 de setembro, teve público recorde, com 500 participantes e superou o número de visitantes dos encontros anteriores.

A programação foi ampliada com a apresentação de resumos de trabalhos científicos e atividades com a criação de oficinas para a comunidade local. Os temas surgiram a partir de debates realizados no CSV e incluíram 15 minicursos, 30 palestras direcionadas para o público acadêmico, duas mesas-redondas com especialistas brasileiros e estrangeiros, cinco oficinas artístico-culturais, festas de abertura e encerramento, com shows de rock, reggae e maracatu.

Além da comunidade acadêmica, participaram do encontro a comunidade litorânea e representantes de empresas, ONGs e de prefeituras da Baixada Santista. Na pauta, a pesca, o turismo, os transportes marítimos, a poluição oceânica, os ataques de tubarões, a contaminação da areia das praias, o tratamento de resíduos domésticos e industriais, a ocupação irregular do solo, a preservação de mananciais, manguezais e de espécies ameaçadas de extinção: aves, caranguejos, tartarugas e tubarões.

A população local teve a oportunidade de participar de oficinas culturais e de capacitação nas áreas de saúde pública, preservação ambiental na zona costeira, balneabilidade (uso recreativo das praias), reciclagem de materiais, reaproveitamento de garrafas PET, artesanato, desenhos e produção de brinquedos.

Cursos para a população

Fruto da paixão da aluna Cristal Coelho Gomes pela arte, foi criada uma oficina para as crianças de São Vicente. No evento, a universitária ensinou que qualquer pessoa consegue desenhar, desde que tenha incentivo e persistência. “O traço e o estilo surgem aos poucos. Na Unesp, a partir de fotos, comecei a reproduzir espécies marinhas – o resultado tem sido bastante satisfatório. No treinamento, mostrei alguns trabalhos bonitos e fáceis de fazer”, conta.

A professora Ana Júlia Fernandes de Oliveira supervisionou o encontro e conta que foi realizado simultaneamente em dois locais: no campus e no centro de convenções municipal, cedido pela prefeitura. “Todos os anos, o congresso é uma excelente oportunidade para professores e alunos reciclarem conhecimentos, trocarem informações com colegas de outros Estados e países e ampliar a rede de contato, fundamental para o desenvolvimento de qualquer pesquisa”, observa.

Allan Lima Ferreira, aluno do quarto ano e integrante da comissão organizadora, diz que o evento mobilizou quase a totalidade do campus. Obteve o apoio da prefeitura e patrocínio da Petrobras, SOS Computadores e Agência Costeira. O universitário explica que, a partir da década de 80, o País começou a estudar e valorizar mais o seu litoral, de 8,5 mil quilômetros de extensão e densidade demográfica de 87 habitantes por quilômetro quadrado, índice cinco vezes superior à média de ocupação do território nacional.

Também foram debatidas questões estratégicas na área de gestão costeira com propostas de soluções harmônicas entre os agentes sociais comprometidos na porção oceânica, como a Marinha, empresas de transportes, de pesca e turismo e gestores públicos. No dia 30, o pesquisador Daniel Suman, da Universidade de Miami, especialista em gerenciamento costeiro, relatou para a plateia como está sendo conduzida sua experiência no litoral de Santa Catarina. Destacou temas relevantes como responsabilidade social para os agentes sociais presentes na costa brasileira.

Mangue ameaçado

O professor Marcelo Pinheiro, coordenador-executivo do CSV, informa que são oferecidas 40 vagas no curso de Biologia, com duas habilitações: Gerenciamento Costeiro e Biologia Marinha. No último vestibular, a procura chegou a 25 candidatos por vaga. O CSV tem 19 docentes contratados em regime de dedicação exclusiva. A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) investiu R$ 1,5 milhão e a primeira turma se formará em 2006.

Marcelo é responsável por uma das quatro linhas de pesquisa patrocinadas pela Fundação no CSV: a preservação e o manejo do caranguejo-uçá, espécie de grande importância econômica em várias regiões brasileiras, em especial Norte e Nordeste. O animal é o mais comum no mangue e a principal fonte de alimento para outras espécies e comunidades ribeirinhas.

O manguezal é fundamental para a reprodução de muitas espécies marinhas. A presença do caranguejo-uçá é um indicador de nutrientes e de vida no ecossistema. O bicho come folhas que caíram das árvores e, nas tocas, acelera a decomposição da matéria orgânica presente no mangue. Seus resíduos sustentam outras espécies. “A redução das populações do crustáceo é reflexo da destruição dos manguezais e da pesca predatória”, justifica o aluno de doutorado Ronaldo Christofoletti, um dos pesquisadores.

O caranguejo-uçá também é objeto de estudo do doutorando Gustavo Hattori, que, com Ronaldo, ministrou um minicurso. O estudo da equipe da Unesp começou em 1998 e o pesquisador detalha que, na natureza, o crustáceo demora nove anos para atingir a idade adulta.

O grupo do CSV desenvolve trabalho de conscientização dos pescadores, de modo a preservar animais em fase de crescimento e fêmeas prenhes, principalmente na época de reprodução, nos meses de dezembro a março. Os dados foram obtidos num estudo realizado durante seis meses em mangues da ilha Coroa do Saco, próxima à Barra de Icapara, município de Iguape, litoral sul do Estado.

A ilha foi dividida em oito regiões e mapeadas por satélite. Na pesquisa, foram considerados o número de indivíduos das populações de caranguejo-uçá e comparados com 35 parâmetros ambientais. O resultado desse trabalho foi apresentado ao Centro de Pesquisa e Extensão Pesqueiras do Sul (Cepsul), de Itajaí (SC), órgão do Ibama. Suas diretrizes nortearam a promulgação de portaria nacional, pioneira no tema, que definiu as regras para a exploração sustentada do animal nos manguezais.

O sistema é conhecido por gestão participativa e abrange pesquisadores, gestores públicos, donos de restaurantes, representantes de cooperativas de pescadores e as equipes do Ibama e da Polícia Florestal. “É possível conciliar diferentes interesses, seja o da indústria da pesca e do turismo e até a sobrevivência das populações ribeirinhas. O trabalho está em fase de conclusão e os participantes estão bem mais conscientes sobre a necessidade da preservação”, analisa o professor Marcelo.


Ataques de tubarões versus destruição do seu habitat

Otto Fazzano Gadig é professor de zoologia de vertebrados do campus de São Vicente da Unesp e especialista em tubarões. Desde 1996 coordena o Projeto Cação, estudo de taxonomia (identificação) das espécies que habitam a costa brasileira. O levantamento identificou hábitos alimentares, reprodutivos e o tamanho das populações, apresentados no evento numa palestra e um minicurso.

O professor Otto afirma que as causas dos ataques contra surfistas são consequência da diminuição da oferta de alimento e da destruição do habitat oceânico. Ocorrem na maioria das vezes em locais poluídos e pouco iluminados. “Apesar de ser malvisto pelas pessoas, o tubarão tem função primordial no ecossistema marinho e sua presença é primordial para o equilíbrio da cadeia alimentar“, observa.

Estão catalogadas 450 espécies diferentes no planeta, contudo, as mais agressivas são o cabeça-chata e o tigre, nas áreas tropicais, e o branco, em águas frias. Além dessas, outras seis são responsáveis por ocorrências e acidentes, porém, de menor gravidade. “O número de imprevistos é pequeno, mas os ataques são amplamente divulgados na mídia”, assegura.

Segundo o pesquisador, a construção do Porto de Suape, em Recife (PE), é exemplo de como a destruição de sistemas marinhos traz problemas à sociedade, como as investidas contra surfistas e mergulhadores. O risco maior é a queda da quantidade de tubarões, pois muitas espécies estão sob ameaça de extinção.


Tartaruga marinha: longevidade e sabedoria

A bióloga Paulin Antar, do Instituto de Oceanografia da USP, lotou o auditório na apresentação de sua palestra. Especialista em tartarugas marinhas e integrante do Projeto Tamar, argumentou que esses répteis exercem grande atração nas pessoas e têm sua imagem associada à longevidade e à sabedoria. Trata-se de um fascínio diferente do que se costuma sentir em relação aos golfinhos e às baleias que habitam somente o oceano.

As tartarugas desovam na praia e fazem parte da alimentação, cultura e folclore da população caiçara. São cinco as espécies que habitam a costa brasileira – todas ameaçadas de extinção.

Na Baixada Santista, a maior incidência é das variedades cabeçuda e verde e em menor proporção, a pente. “Na escala evolutiva, esse réptil transformou-se pouco e é muito bem adaptado ao seu meio. Começa a se reproduzir aos 40 anos e pode viver até 200. De cada mil filhotes, somente um ou dois chegam à idade adulta”, calcula Paulin.


Preservação da Amazônia Azul

Simultaneamente ao evento do CSV, o público teve a oportunidade de conhecer, no Centro de Exposição de São Vicente, a mostra itinerante da Marinha, coordenada pelo capitão-de-mar-e-guerra Jorge Camillo.

No local, o visitante observou pesquisas da Comissão Interministerial para Recursos do Mar, nas bases militares instaladas no arquipélago de São Pedro e São Paulo (a 1,1 mil quilômetros do litoral do Rio Grande do Norte) e na Antártida. A exposição revela o trabalho de monitoramento oceanográfico e o estudo de aspectos climáticos, de temperatura e pressão atmosférica.

O destaque é a manutenção da soberania nacional na região conhecida como Amazônia Azul, porção oceânica de território com 4,5 milhões de quilômetros quadrados: começa na costa brasileira e se estende por 200 milhas náuticas (400 quilômetros) depois do continente. Com ela, o País amplia em mais de 50% sua extensão territorial.

“A Marinha estima existirem nove vezes mais riquezas para serem exploradas na Amazônia Azul do que na continental. É uma zona econômica de uso exclusivo do Brasil, que detém o direito de exploração dos recursos vivos (pesca, flora, fauna, turismo, mergulho), minerais (ferro) e do subsolo (petróleo e gás)”, analisa.

O capitão Camillo informa que o Brasil pleiteia na ONU a posse definitiva e a extensão dos limites da Amazônia Azul para além das Ilhas São Pedro e São Paulo, localizadas na metade da distância entre a América e a África. Dessa forma, o País ganharia mais 900 mil quilômetros quadrados e teria presença hegemônica no Oceano Atlântico.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas II e III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 13/09/2005. (PDF)

Em 7 anos, Banco do Povo destinou R$ 269 milhões a microempreendedores

Créditos de R$ 200 a R$ 5 mil auxiliam na expansão de pequenos negócios de clientes com dificuldades de comprovar renda e preencher requisitos exigidos pelo sistema financeiro tradicional

Há pouco mais de quatro anos, Paulo Sérgio do Nascimento montou informalmente uma quitandinha numa garagem de 40 metros quadrados, em Botujuru, bairro da periferia de São Bernardo do Campo. Junto com o irmão vendia legumes. Nascimento queria ampliar o negócio, mas não tinha dinheiro. Ao participar de cursos de empreendedorismo do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) foi informado de que, mesmo não tendo firma aberta, poderia obter empréstimo do Banco do Povo Paulista (BPP).

Nascimento não hesitou. Em setembro de 2001, fez seu primeiro microcrédito, de R$ 2 mil. “O Banco cobra só 1% de juros ao mês. Diversifiquei as mercadorias com bebidas e gêneros alimentícios, que antes não comercializava. Comecei a adquirir os produtos nos atacadistas à vista, com lucros de 30% a 40%. Desse jeito, fica fácil pagar a dívida”, explica.

Daí em diante, investiu o lucro na ampliação de seu negócio. Obteve equipamentos de caixa, duas balanças eletrônicas e quatro freezers. Nos anos seguintes, solicitou outros empréstimos, num total de mais de R$ 30 mil. Nascimento frisa que sempre pagou as parcelas em dia e até quitava antes do prazo.

As conquistas não pararam por aí. A área da quitanda foi aumentada e se transformou em mercadinho, conhecido como Sacolão e Minimercado Thaynara. Oferece aos clientes um pouco de tudo: desde artigos de papelaria, utilidades domésticas até uma pequena variedade de calçados (chinelos). No andar superior, instalou bar com mesa de sinuca e bebidas. Como também é pedreiro, assumiu o trabalho de construção e economizou um bom dinheiro.

O dono do mercadinho conta que a experiência de empreendedorismo, aliada ao constante aprimoramento, só lhe rende bons resultados. “Duas vezes por semana vou ao Poupatempo São Bernardo do Campo orientar-me com os consultores do Sebrae. Se não buscar informações, como vou desenvolver meu negócio? Sem o Banco do Povo, não teria saído do lugar”, avalia.

Até o carnaval de 2006, pretende pedir outros empréstimos e criar um mini-açougue e uma mini-padaria. Quando concretizar esse objetivo, diz que sairá da informalidade. O pequeno comércio inicial de 40 metros quadrados ganhou mais 80 metros quadrados de área construída.

Geração de empregos

O Banco do Povo Paulista, considerado o maior programa de microcrédito do País, é uma iniciativa do governo do Estado, por meio da Secretaria Estadual do Emprego e Relações do Trabalho (Sert). Criado em setembro de 1998, mantém parceria com 347 municípios paulistas. Até o mês passado, o total de contratos assinados pela instituição ultrapassou 100 mil, com a destinação de R$ 269 milhões para pequenos empreendedores, na informalidade ou não.

Nos dias 12 e 13, foram instaladas agências do Banco do Povo nas cidades de Canitar, na região de Ourinhos, e Ituverava, cidade próxima a São Joaquim da Barra. Amanhã, será inaugurada nova unidade em Barretos.

A finalidade da instituição financeira é gerar ocupação e renda aos beneficiários. As parcelas são pequenas e calculadas para não sobrecarregar o tomador de empréstimo. Com juros de 1% ao mês, a inadimplência é de apenas 2%. Em quase sete anos de atividade, a iniciativa gerou 61,9 mil empregos diretos, 12,8 mil indiretos e 44,5 mil colocações profissionais de efeito renda (emprego obtido a partir da transformação da renda dos trabalhadores em consumo).

Menos burocracia

O agente financeiro da operação é o Banco Nossa Caixa e o empréstimo é concedido em qualquer uma das 347 agências no Estado. O banco empresta, em média, R$ 8 milhões mensais. O dinheiro está disponível para pequenos negócios, em especial para clientes como catadores de papelão, que têm dificuldades de comprovar renda e preencher os requisitos exigidos pelo sistema financeiro tradicional. Pode fazer o empréstimo qualquer tipo de empreendedor com atividade lícita: açougue, bicicletaria, carrinho de pipoca, artesanato, oficina de costura, mecânica, bar, chaveiro e produção rural.

O agente de crédito é o grande motor do Banco do Povo. Esse profissional atende ao empreendedor, estuda a viabilidade do negócio, orienta e acompanha o cliente. É ele quem identifica riscos de inadimplência e define o valor do empréstimo. Para isso, desloca-se da agência bancária até a propriedade ou negócio do interessado e faz estudo de viabilidade. Um dos objetivos da ida ao local de trabalho do empreendedor é evitar a possibilidade de calote.

Comitê de crédito

O Estado tem 485 agentes de crédito. Cada um recebe treinamento constante como noções de matemática financeira, comunicação e assistência As lições aprendidas são sempre repassadas aos empreendedores. Além das prefeituras, o Banco do Povo mantém parcerias com o Sebrae e Pró-lar (programa do governo estadual que oferece moradia e melhores condições de habitação a famílias de baixa renda).

Outros projetos da Sert também utilizam o microcrédito estadual: Programa de Auto Emprego (PAE) e a Superintendência do Trabalho Artesanal nas Comunidades (Sutaco), que investe na capacitação e formação de cooperativas de artesãos. Recentemente, a instituição governamental firmou convênio com o Fundo Social de Solidariedade do Estado de São Paulo (Fussesp) para oferecer empréstimo a empreendedores artesanais.

O Banco do Povo responde por 90% dos recursos direcionados aos clientes, e as prefeituras paulistas desembolsam os outros 10%. Cerca de 73% dos financiamentos concedidos retornaram aos fundos para novo empréstimo. O cliente solicita o crédito e o seu negócio tende a progredir. Quitando a dívida, a tendência é que regularize a situação (antes informal) para conseguir créditos maiores. O dinheiro é liberado somente após aprovação do comitê de crédito, formado por representantes de quatro entidades: Sert, comissão municipal de emprego, Banco Nossa Caixa e prefeitura.

Como obter o crédito

Para conseguir empréstimo, o interessado deve ter endereço fixo e produzir no município há mais de seis meses, com firma aberta ou não. Ter nome limpo na Serasa, no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) e faturar menos de R$ 150 mil por ano. É necessário apresentar um avalista. Esse fiador pode ser parente de primeiro grau, desde que não more na mesma casa.

O dinheiro é cedido tanto para investimento fixo (compra de máquinas, equipamentos e ferramentas) como para capital de giro (mercadoria, matéria-prima, consertos e ferramentas). Não é permitido usar os recursos para aquisição de insumos do setor agropecuário (sementes, fertilizantes, animais) e pagamento de dívidas. É proibido fazer uso do crédito para compra de veículos de passeio e para qualquer atividade ilegal. A verba deve ser empregada na produção e em atividades de empreendedorismo.

Outras instituições oferecem linhas de financiamentos especiais na área de agropecuária. O valor mínimo do empréstimo é de R$ 200 e o máximo, R$ 5 mil. O prazo de pagamento é de até seis meses para capital de giro e no máximo 18 para investimento fixo. Se o solicitante for uma cooperativa legalizada, o valor pode alcançar até R$ 25 mil.


Segredo do sucesso: capacitação e responsabilidade

Izabel de Souza Sampaio tinha um pequeno salão de cabeleireiro em sociedade com outra pessoa, em São Bernardo do Campo. Quando a parceira resolver desfazer o negócio, a cabeleireira passou por dificuldades financeiras. No início de 2001, ao participar de curso de empreendedorismo do Sebrae, foi indicada a conhecer o Programa de Microcrédito do governo paulista.

De início, fez um empréstimo de R$ 2,7 mil, que lhe possibilitaram comprar novo lavatório, cadeira e maca. Resultado: aumento de 30% da clientela. Meses depois, Izabel percebeu a necessidade de mais espaço. Em novembro do mesmo ano, alugou uma casa numa rua bem localizada, em Rudge Ramos, bairro comercial da cidade. Nesse local, mora com a família e mantém o salão de beleza, agora, mais amplo.

A profissional contratou uma esteticista e mais uma cabeleireira. Em abril, pediu mais R$ 3 mil ao Banco do Povo. Ampliou o salão ainda mais e deu novo visual ao ambiente. Adquiriu novas bancadas, duas cadeiras e admitiu outra funcionária.

“Quanto ao acerto da dívida, não tenho problemas. Pago 18 parcelas de R$ 182. Se fosse num banco comum, os juros seriam bem maiores”, ressalta a moça, completando: “Compro os equipamentos à vista e obtenho entre 4% e 5% de desconto. Com isso, os juros de 12% ao ano (do Banco do Povo) caem para 7% ou 8%”, celebra.

“Se parcelasse os produtos nas lojas, as prestações seriam bem mais altas”, calcula. Izabel relata que sempre pagou os débitos com o banco em dia, por isso tem credibilidade para novos recursos. A dona do Lis Cabeleireiras dá uma dica a quem quer progredir no empreendedorismo: “Seja um profissional responsável. Estude bastante e capacite-se para a função”.


Soluções encontradas na agência Araraquara

A agência Araraquara do Banco do Povo é uma das mais movimentadas do interior. Criada em dezembro de 2001, dispõe de três agentes de crédito e emprestou mais de R$ 1,1 milhão.

O agente Paulo Alexandre da Silva conta que 80% dos pedidos atendidos são de trabalhadores informais e os 20% restantes para os formais. “A maior motivação é saber que, depois do levantamento econômico para conceder o primeiro crédito, passamos para o cliente nova visão gerencial de seu próprio negócio, que ele não era capaz de enxergar”, diz.

Seu colega Celso Paiva afirma que os vínculos de amizade formados são frequentes: “Muitos empreendedores voltam para trocar ideias, informações e pedir novos empréstimos”.

Juliana Porto, também agente de crédito, lembra da história de um migrante que veio para a região colher laranja e ficou desempregado na entressafra. Decidido, começou a percorrer a cidade recolhendo sucata com sacolas. Logo, transformou uma geladeira velha em carrinho para carregar mais itens. Para expandir a atividade e coletar o material proveniente de indústrias, solicitou ao Banco do Povo o financiamento de uma kombi.

O comitê de crédito estudou a viabilidade e constatou que o homem não teria como arcar com as despesas do veículo e da carteira de habilitação. Foi sugerido, então, que financiasse uma charrete com mula, por R$ 1 mil. “Foi a solução encontrada, viável e que atendeu à necessidade do cliente sem sobrecarregá-lo”, diz Juliana.


Depoimentos de empreendedores da região de Araraquara

“Ajudou-me na produção, tornando-a mais rápida e com melhor qualidade”. Ana Maria Mauri – dona de confecção

“Com o financiamento ampliei os itens vendidos, oferecendo comodidade aos clientes e aumentando o movimento”. Andréia Rodrigues – setor de alimentação

“Auxiliou-me na compra de equipamentos para expandir a produção e aperfeiçoar a qualidade”. Antônio Ciniato – afiador de ferramentas

“Tive oportunidade de ampliar minha floricultura. E o número de consumidores aumentou”. Inara de Freitas – dona de floricultura

“O Banco do Povo Paulista me deu condições de maior produção e variedades na parte de tecelagem”. Josefa da Silva – proprietária de confecção

“Com o financiamento, comprei uma máquina de café expresso. E aumentei a minha clientela”. Manoel Gomes – setor de alimentação

“Promoveu impulso mais rápido para viabilizar negócios maiores”. Maria Cristina Ruivo – artesã

“Consegui melhorar diagnósticos com mais rapidez, depois que comprei equipamentos com o financiamento”. Roberto Zacarias – oficina mecânica


Números do Banco do Povo desde 1998

– Total de contratos formalizados: 100.699;
– Valor emprestado: R$ 269.045.895;
– Geração de 61,9 mil empregos diretos e 12,85 mil indiretos, com efeito renda de 44,5 mil.

Viviane Gomes e Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas II e III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 19/08/2005. (PDF)

Vida rural de Boa Esperança do Sul encanta crianças de escola pública de Peruíbe

Grupo de 40 alunos da cidade litorânea tem contato com a cultura e o lazer de moradores de pequenos municípios do interior paulista

Encanto, novidades e um complemento de conhecimentos adquiridos na sala de aula. Este foi o resultado da viagem de férias que 40 crianças da Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Parque Guaraú, de Peruíbe, fizeram, este mês, ao município de Boa Esperança do Sul, região central do Estado, distante 300 quilômetros da capital.

O passeio faz parte de uma iniciativa do Programa Caravanas do Conhecimento e integra as atividades da Fundação Prefeito Faria Lima (Cepam), órgão da Secretaria Estadual de Economia e Planejamento. O programa levou 6 mil crianças da rede pública de ensino, de 9 a 11 anos, para conhecer 131 cidades do interior do Estado.

Caravanas do Conhecimento é sempre realizado nas férias escolares. A programação de julho recebe o nome Redescobrindo o Interior. Nas férias de verão, a garotada do interior visita o litoral, por isso o nome de Interior na Praia. No início do ano, 8 mil crianças de 164 municípios conheceram o mar. Muitas delas, pela primeira vez.

O Cepam fez os contatos entre as prefeituras e organizou a viagem. Providenciou exame médico e seguro de vida para cada um dos alunos. Houve treinamento para monitores e para o soldado da Polícia Militar (PM) Anderson Luís Santos Morato, que veio com as crianças, de Peruíbe, e as acompanhou durante todo o período em que estiveram fora de seu domicílio. “Elas se comportaram bem no alojamento e nos passeios. Aprenderam valores como o respeito mútuo, a boa convivência e a solidariedade”, contou o soldado Morato.

Troca de experiências

Os jovens se hospedaram na Emef Ana da Cunha Vianna, a maior escola do município, com 1,2 mil alunos matriculados. Três salas de aulas foram adaptadas e receberam colchonetes para abrigar o grupo de 20 meninas, 20 meninos e três monitores. Durante os passeios, foram servidas cinco refeições diárias, com cardápio elaborado por nutricionistas.

A professora da quarta série do ensino fundamental, Rosana de Freitas Tabata, uma das quatro monitoras do grupo, conduziu os estudantes. Diz que o Programa Caravanas do Conhecimento contemplou jovens da capital, região metropolitana e litoral. “A maioria é de famílias carentes, e esta foi a primeira viagem que fizeram na vida. Para eles, foi um grande desafio passar quatro noites longe dos pais e manter os alojamentos arrumados”, observa Rosana.

As instalações eram confortáveis e espaçosas. Os anfitriões ofereceram jogos de dama, xadrez, dominó, pingue-pongue em mesa oficial e filmes em DVD, em tevês de 29 polegadas instaladas em todos os alojamentos.

Berenice Terezinha Mastri, do Cepam e responsável local, ficou incumbida de verificar as condições das acomodações, a qualidade da comida, da distribuição de camisetas aos monitores e de apoiar as iniciativas. “As atividades oferecidas foram interessantes, permitiram aos jovens conhecer mais sobre a vida no interior e trocar experiências com pessoas de outras regiões do Estado”, afirma.


Conhecendo o primeiro seringal do Estado

No dia seguinte à chegada, o primeiro destino dos estudantes foi visitar a praça da capela municipal de Boa Esperança do Sul, no centro da cidade. Conheceram e tentaram abraçar, sem sucesso, a copa de um timburi (árvore da família das leguminosas, cujo fruto pode ser utilizado como sabão). Foi plantada há 60 anos e virou símbolo da cidade, com mais de dez metros de altura. Depois, a viagem prosseguiu por mais 20 quilômetros. O motorista cruzou canaviais até a entrada da Fazenda Seringal Paulista, localizada na divisa da área rural de Boa Esperança do Sul com Gavião Peixoto.

Ao chegar, foram recepcionados pelo proprietário da fazenda, Carlos Procópio de Araújo Ferraz. O anfitrião contou a história de seu avô, cujas reminiscências misturam-se à história da exploração da borracha no Estado. Em 1917, o marechal Rondon enviou para o avô de Ferraz 24 sementes de seringueira (Hevea brasiliensis), árvore da flora nacional originária da Amazônia, que foram plantadas na fazenda.

Metade da borracha nacional

A ideia de introduzir a heveicultura (cultura da seringueira) no Estado foi uma alternativa proposta frente à falência dos seringais da Amazônia – no início do século passado –, que foram devastados pelo fungo Microcyclus ulei, causador do mal-das-folhas-da-seringueira. Na natureza, as sementes caem das árvores, se dispersam e flutuam no leito dos rios, durante o período das cheias. Doze dias após o rebaixamento do nível das águas, elas fixam-se no solo e germinam. Deste modo, as árvores surgem sempre distantes umas das outras.

As plantações da Amazônia acabariam sofrendo a concorrência de produtores da Malásia e da Costa do Marfim, países que receberam as sementes contrabandeadas do Brasil pelos ingleses e franceses. Além da biopirataria, as grandes plantações de seringueiras apresentavam condições ideais para o fungo, que tem ciclo de reprodução rápida (dez dias) e necessitavam de 98% de umidade do ar.

Os líderes brasileiros acreditavam que a seringueira poderia ladear a produção dos cafezais paulistas, já que o clima no Estado é mais seco e impede a proliferação do micro-organismo. Atualmente, São Paulo produz 52% da borracha nacional, e o Brasil detém 1% da produção mundial da matéria-prima cada vez mais consumida pela indústria.

Recordações: semente e látex

Ferraz deu uma aula para as crianças sobre o Ciclo da Borracha e exibiu vídeo produzido na década de 50. Narrou como a matéria-prima brasileira auxiliou os países aliados a vencerem a 2ª Guerra Mundial. Mostrou, também, livros e recortes do século passado, amostras da borracha produzida do modo manual, que consistia em agrupar o látex e produzir a “péla”, bola de borracha que adquire coloração marrom depois de vulcanizada (queimada) para ser enviada à indústria.

As crianças da Emef Parque Guaraú ficaram encantadas. Alan Almeida Mendes, 11 anos, quinta série, foi o primeiro a segurar a péla. Depois repassou para seus colegas. Espantado com o peso, imaginou como os índios se divertiam com um brinquedo tão pesado. Seu colega Higor Cavalheiro Gonzáles, também da quinta série, ouviu que havia muitas sementes de seringueira na fazenda. E não sossegou enquanto não encontrou uma na mata para levar de recordação.

Jéssica Mascarello, 11 anos, preferiu outro tipo de lembrança: uma bolinha de látex, feita com a mão, logo depois que Ferraz fez uma incisão no tronco de uma seringueira. “É um brinquedo legal, embora o cheiro não seja bom. Só fiquei com dó das árvores, que são cortadas durantes oito meses do ano”, afirmou. O grupo de crianças seguiu à risca o conselho dos monitores antes de passear na mata: ficou alerta sobre o perigo de cobras e insetos.

O garoto Lucas Ramalho, 10 anos, espantou-se ao saber que a seringueira cresce 2 metros a cada 2 anos. Seu xará, Lucas Florido, também de 10 anos, decidiu que pedirá autorização à diretora para plantar uma seringueira na escola: “A viagem foi inesquecível e, logo, a sombra da árvore nos fará lembrar destes momentos”.

A Fazenda Seringal Paulista, certificada como estação experimental pelo Instituto Agronômico de Campinas (IAC), é uma das principais produtoras de sementes naturais de seringueiras do País.

Ferraz explica que a heveicultura é uma opção rentável para o agricultor e tem a vantagem de retirar da atmosfera gás carbônico que ajuda a reduzir os gases do efeito estufa. Segundo ele, uma boa variedade de seringueira demora, em média, cinco anos para começar a produzir. Nesse período, o produtor deve plantar outras culturas junto ao seringal, como banana e palmito.


Moradores de Boa Esperança dependem da agricultura

Boa Esperança do Sul foi fundada em 1898 e a principal fonte de renda do município de 12 mil habitantes é a agricultura, com destaques para as culturas de cana-de-açúcar e laranja. A estada da criançada foi toda acompanhada por Maria Cândida Beraldo, supervisora de ensino municipal que também atendeu às emergências e necessidades imediatas dos alunos. Os anfitriões de Boa Esperança do Sul organizaram programação especial com churrasco, visitas a fazendas, clubes, pesqueiro, apiário e shows.

As atividades culturais e de lazer permitiram às crianças conhecer um pouco da identidade cultural do interior e o modo de vida das pessoas que vivem nos pequenos municípios paulistas. Os passeios noturnos também foram animados. A garotada assistiu a apresentações de grupos de dança (country e hip-hop) e demonstrações de artes marciais. No terceiro dia, foram ao show do cantor Juliano César no estádio municipal, em celebração ao aniversário da cidade. Na véspera do retorno para Peruíbe, participaram de festa de despedida no Clube Municipal e assistiram ao show de DJs.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas II e III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 28/07/2005. (PDF)