Pandemia aumenta dores de pacientes

Ansiedade e depressão podem ampliar o problema; recomendação médica é combater o sedentarismo

A pandemia provocou um aumento nas lombalgias e dores dos pacientes e, portanto, levou muita gente ao consultório médico. A conclusão é do Dr. Fabio Roberto Porto, ortopedista e traumatologista filiado à Associação Paulista de Medicina (APM).

Segundo o médico, a maioria dos relatos são de dores na coluna, articulações, quadris e joelhos e as causas do problema são múltiplas. A falta de atividade física piora quadros de ansiedade e de estresse emocional, contribuindo, assim, para desestabilizar o quadro geral. “Na faixa etária dos 60 anos o problema se agrava ainda mais. Nessa idade, a propensão a perder a massa muscular ocorre mais rapidamente, levando a um aumento das dores”, avisa o Dr. Fabio.

Inatividade

Dr. Aryovaldo Tarallo, ortopedista e traumatologista – Crédito foto: Casa do Médico Araraquara

Dr. Aryovaldo Tarallo, ortopedista e traumatologista – Crédito foto: Casa do Médico Araraquara

Opinião análoga tem o Dr. Aryovaldo Tarallo, ortopedista e traumatologista, também afiliado da Associação Paulista de Medicina. Para ele, a principal causa de dores é a inatividade, isto é, a falta de movimento. No início da pandemia, por orientação das autoridades e cientistas, a maioria das pessoas ficou mais reclusa e amedrontada com a letalidade do coronavírus – e deixou de se exercitar e de frequentar parques, piscinas e academias de ginástica e de fazer tratamentos posturais, assim como teve ganhos de peso corporal e aumento de ansiedade, ampliando o problema das dores.

Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 80% da população mundial terá dor nas costas pelo menos uma vez na vida. Contudo, as causas desse problema podem ser multifatoriais. Os motivos serão questões posturais de coluna, problemas genéticos, esforços repetitivos, ansiedade, tensões emocionais, idade avançada e atrofias de musculatura.

Riscos

“Conforme o conhecimento e a divulgação de informações sobre a pandemia foi crescendo, o grau de percepção da sociedade foi sendo ampliado”, destaca o Dr. Aryovaldo. Nesse lento e progressivo retorno às atividades normais, houve aumento dos relatos de dores dos pacientes, principalmente na coluna cervical e dorsal.

O Dr. Aryovaldo alerta, entretanto, que as dores devem desaparecer após 10 dias de medicação com analgésicos. Se isto não ocorrer neste prazo, pode ser sinal de algo mais grave, como por exemplo, doença dos discos vertebrais. “Nesse caso, a recomendação é o paciente retornar ao consultório tão logo seja possível, para não agravar o quadro”, informa o Dr. Aryovaldo.

Corpo X mente

Dr. Fábio Roberto Porto – Ortopedista – Crédito foto: Casa do Médico Araraquara

Dr. Fábio Roberto Porto – Ortopedista – Crédito foto: Casa do Médico Araraquara

O fator emocional também tem relação com as dores crônicas, explica o Dr. Fabio, por dois motivos. A princípio, pelo fato de a mente interferir na rotina do sono, prejudicando a recuperação diária do organismo. E sobretudo, pelo fato do paciente com dor crônica ter piora da ansiedade e da depressão, e consequentemente, aumento das dores.

A lista de pacientes com problemas de fundo emocional na pandemia é extensa, pontua o Dr. Fabio. Inclui, por exemplo, a população de modo geral, temerosa de sair de casa e se contaminar com o coronavírus; o funcionário angustiado com o risco de demissão por causa da crise econômica causada pela pandemia; o pequeno ou micro empresário, sem saber sobre qual decisão tomar para manter o seu negócio; e pessoas enlutadas, abaladas severamente pela perda de um ente querido, entre tantos outros impactados.

Trabalho em casa

Outra causa primordial para o aumento nas dores na pandemia foi a adoção em massa do home office. Ambos os médicos, Fabio e Aryovaldo, sublinham o fato do trabalho no ambiente doméstico ter surgido como opção segura para prevenir contra o coronavírus e as aglomerações do mundo corporativo. Neste sentido, não houve, contudo, a adoção de móveis e de instalações sob medida. Muita gente se acostumou a digitar deitado no sofá, com o notebook no colo, isto é, com posturas inadequadas.

Junto desse grupo, comenta a dupla de ortopedistas, entra também outra turma. É o grupo formado por quem aproveitou a reclusão causada pela pandemia para fazer pequenas reformas em casa. “Muitos estavam sem preparo físico e acabaram se contundindo nesses trabalhos braçais”, conclui o Dr. Fabio.

Conversas com colegas

No comparativo entre os anos de 2020 e 2021, o Google, mecanismo de busca com mais acessos na internet, registrou em seu serviço de Tendências (Trends) o aumento na procura no Brasil por termos como lombalgia e dores na coluna.

“Em breve, novos artigos acadêmicos também deverão confirmar a tese de que a pandemia ampliou as dores dos pacientes. Um dado complementar são os relatos de colegas médicos de outras especialidades sobre a questão do aumento de procura por consultas causadas, por exemplo, por queixas de dores”, aponta o Dr. Fabio.

Causas

“A dor é um aviso do corpo sobre problemas e pode estar relacionada com ansiedade e depressão”, sublinha o Dr. Fabio. É possível dividir suas causas em intrínsecas e externas. As primeiras são as advindas do próprio paciente, como deformidades congênitas, a genética familiar, hérnias de disco, entre outras.

Já as origens externas, incluem o tabagismo e o sedentarismo e impactam quem não se exercita e fortalece músculos e parte postural. E mais, causas ligadas diretamente à questões laborais, como por exemplo, motoristas e profissionais com muitas horas de trabalho na mesma posição.

Mini currículos

O Dr. Aryovaldo é especialista da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (SBOT). Ele tem 63 anos, há 37 anos atua como médico e se formou em 1984 na Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) – depois fez residência médica no Hospital Humberto Primo, em São Paulo (SP).

Já o Dr. Fabio tem 44 anos e atua como médico há 20 anos. Ele também integra a SBOT e se formou em 2001 na Faculdade de Medicina de Catanduva (Fameca), tendo concluído em 2004 residência médica em Ortopedia e Traumatologia no Hospital de Base da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto. Tem especialização pela Faculdade de Medicina da Santa Casa de São Paulo em patologias e cirurgias da coluna vertebral e nessa mesma área fez estágio no Twin Cities Spine Center, em Minneapolis (Estados Unidos). Entre 2017 e 2019 concluiu pós-graduação em Tratamento da Dor no Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio Libanês, de São Paulo.

Reportagem publicada originalmente no site da APM Araraquara.

Variante Ômicron põe em cheque as vacinas?

Médicos da APM de Araraquara avaliam o momento atual da Covid-19

O surgimento da variante Ômicron, a nova cepa do SARS-CoV-2, vírus causador da Covid-19, tem gerado diversas discussões na sociedade médica. Nesta quarta-feira (8), a Organização Mundial da Saúde (OMS) informou que pessoas que já tiveram a doença poderiam ser mais facilmente reinfectadas pela nova cepa. Isso porque, de acordo com estudos preliminares, a variante Ômicron pode reduzir a atividade neutralizante de anticorpos produzidos por imunidade natural. Diante do atual cenário, o impacto na eficácia das vacinas é uma das primeiras questões levantadas pelos cientistas.

Dra. Estela Cattelani, infectologista

Dra. Estela Cattelani, infectologista

Ainda sem uma resposta conclusiva, a orientação geral dos médicos, entretanto, é de que a vacina é primordial para a proteção da população contra a Covid-19. Segundo a infectologista Estela Maura Cirino Cattelani, a produção de anticorpos no organismo não é atingida plenamente se não forem tomadas pelos menos as duas doses iniciais da vacina. “Por enquanto, muita gente só tomou a primeira dose”, comenta.

Formada em Medicina pela Puccamp (Pontifícia Universidade Católica de Campinas) em 1987, Dra. Estela fez residência em São Paulo no Instituto Emílio Ribas. Em 1990, mudou-se para Araraquara, onde atende em seu consultório e no Serviço Especial de Saúde, da Faculdade de Saúde Pública da USP (Universidade de São Paulo). Ela também é docente na Uniara (Universidade de Araraquara) e leciona a disciplina de Moléstias Infecciosas.

Risco de Mutação

Opinião parecida com a da Dra. Estela tem o pneumologista Eduardo Ferraz Hage. “Tudo que se fala sobre coronavírus envolve muitas novidades como, por exemplo, a variante Ômicron, cuja principal característica é ter perfil genético com capacidade de mutação preocupante, embora os doentes com a variante têm tido sintomas leves, sem dizer quando não são assintomáticos”, destaca Dr. Eduardo.

Mas ele ressalta que ainda falta verificar como as vacinas agirão contra a variedade Ômicron. Na avaliação dele, contudo, apesar do número significativo de vacinados, é preciso aguardar a evolução das variantes do vírus. “O risco de contaminação persiste”, alerta o médico, que esteve à frente no combate da epidemia em Araraquara, atuando na enfermaria do Hospital São Paulo e no Ambulatório de Covid da Unimed.

Cepa de Manaus

Há 32 anos o Dr. Eduardo Ferraz Hage atua como pneumologista no consultório e em hospitais. Ele tem 59 anos, se formou na Faculdade de Medicina de Marília (Famema) e fez residência médica no Hospital do Mandaqui, em São Paulo. Da experiência na luta contra a Covid-19, ele destaca o fato de Araraquara ter sido a primeira cidade brasileira a ser atingida pela cepa que apareceu em Manaus (AM), um motivo de muitas mortes e internações na capital amazônica.

Dr. Eduardo Hage, pneumologista

Dr. Eduardo Hage, pneumologista

“Em janeiro de 2021 foi um verdadeiro tsunami. Nós, das equipes médicas, e os agentes da saúde trabalhamos em média 18 horas por dia. No início, a maioria dos pacientes era idosa com comorbidades. Nos dois meses seguintes, com a extensão da vacinação, o aumento de casos passou a ser de pacientes com idades entre 30 e 55 anos, ainda não imunizados”, recorda.

“Hoje, avalio como razoável vacinar toda a população a partir dos 10 anos de idade”, conclui o Dr. Eduardo.

O plasma do Butantan

Um dos principais aprendizados deixados pela Covid-19 para os médicos foi a importância de se fazer anamnese, isto é, de ouvir mais os pacientes. “É preciso saber como é o início da doença, os sintomas, a história e a evolução clínica do paciente para, então, iniciar o tratamento”, ressalta. Para ilustrar o fato, o Dr. Eduardo cita o exemplo pioneiro da transfusão de plasma, tratamento desenvolvido pelo Instituto Butantan e usado com muito sucesso em Araraquara.

Com foco na diminuição da ação do vírus no organismo, o plasma consiste em injetar anticorpos no paciente, nos cinco primeiros dias da doença. O objetivo é tentar brecar a infestação, em especial em órgãos vitais como pulmões e rins. “Quanto antes o plasma era aplicado, melhores eram os resultados obtidos”, comenta o pneumologista, destacando outro aprendizado obtido na linha de frente ao combate à pandemia.

Variante Ômicron e as vacinas

Ainda que não esteja clara a eficácia das vacinas diante da variante Ômicron, os médicos alertam para a necessidade de tomar a terceira dose contra a Covid-19. podendo este reforço na imunização ser semestral. Esta questão, no entanto, segue em aberto, já que nenhuma vacina protege 100% contra a doença e muitas pesquisas sobre o assunto ainda estão sendo realizadas.

“O vírus da Covid-19 segue circulando, não vai embora, assim como o da gripe e de outras enfermidades causadoras de óbitos”, alerta a Dra. Estela. “Até que haja um controle total sobre a pandemia, medida preventiva como o uso de máscara continua obrigatória, assim como quando estiver em um restaurante, evitar gritar e só tirar a máscara para comer”, completa.

“A Covid-19 veio para ficar, portanto, a higienização das mãos é fundamental para a proteção contra o coronavírus e outros vírus letais”, acrescenta o Dr. Eduardo. “A retomada das atividades por parte da sociedade deve seguir seu rumo, entretanto, sem abrir mão do bom senso e da segurança, isto é, sempre usando máscara em locais abertos e fechados. Nesse sentido, festas com grandes aglomerações como réveillon e carnaval podem ser adiadas por mais um ano. Para participar de eventos deveria ser obrigatório, então, apresentar a carteira de vacinação com o registro das duas primeiras doses. Isso certamente aumentaria a segurança”, finaliza.

Reportagem publicada originalmente no site da APM Araraquara.

Paciente “informado” pelo Google, um desafio para os médicos

Profissionais da Associação Paulista de Medicina alertam: diagnóstico só pode ser fechado após consulta presencial

Na era digital, em que a informação é difundida na velocidade da luz, muitos pacientes chegam aos consultórios “informados” pelo Google. Esse até não seria um problema, exatamente, se a fonte oficial de consulta fosse um ensaio clínico randomizado com uma amostra significativa, por exemplo. Mas não é o que ocorre geralmente.

Guido Tsuha

O ortopedista e médico do esporte Guido Felloni Tsuha, de 47 anos, atua desde 2001, e comenta ser comum pacientes chegarem ao consultório com muitas informações obtidas na internet, em sites aleatórios. Na avaliação dele, essa é uma questão bastante atual, recorrente e natural em uma sociedade cada vez mais tecnológica e hiperconectada.

Porém também se trata de um desafio adicional para os profissionais da área da saúde. Muitos pacientes chegam, inclusive, a sugerir exames específicos para tratar o seu problema. “Acreditar no diagnóstico dado pelo Google é um erro, assim como se automedicar é outro costume equivocado”, ressalta.

Natural de Araraquara, Dr. Guido é integrante de uma família com mais dois irmãos médicos também nascidos na Morada do Sol e atuantes na cidade: os anestesiologistas Gustavo Felloni Tsuha e Luiz Tsuha Junior.

Opinião semelhante tem o ginecologista Antônio Fernando Longo Vidal, de 63 anos, formado há 39 anos na Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Botucatu. Para ele, o paciente deve sempre considerar o diagnóstico dado pelo médico especialista no consultório.

“O Google traz muitos resultados e, muitas vezes, os dados encontrados são contraditórios. Além disso, os pacientes são, em sua maioria, leigos e não têm como interpretar corretamente as informações”, observa o Dr. Vidal.

Desinformação

Antônio Fernando Longo Vidal – crédito foto Rogério Mascia Silveira

O uso da telemedicina se expandiu rapidamente com a pandemia de Covid-19, mas segundo o Dr. Vidal, na área de ginecologia, esse recurso é limitado. “Serve apenas para debater resultados de exames e jamais pode ser utilizado em um contato inicial”, explica.

Como exemplo dos desencontros atuais, ele cita o caso de uma paciente com suspeita de endometriose, cujo exame de sangue apontou valores alterados.

“Ela leu os resultados, pesquisou na internet e me perguntou como deveria tratar o câncer de ovário”, destaca. “No consultório, esclareci se tratar de endometriose, explicando que, de fato, ambas as doenças apresentam alterações no exame, porém em escalas de valores distintas”, relata.

Para ele, depois do diagnóstico do médico, o paciente até pode complementar sua consulta e pesquisar a respeito do seu quadro na internet.

Sites de referência

Na visão de Dr. Guido, o fato de o paciente se informar pode até ser positivo, desde que consulte sites de referência na área de medicina, como por exemplo, as bases de dados da Pubmed e da Cochrane Library, também utilizadas por ele para se reciclar e adquirir novos conhecimentos.

“Quem quer saber mais sobre seu o problema pode pesquisar, entretanto, deve recorrer sempre a fontes confiáveis”, esclarece.

Contudo, para fechar um diagnóstico, nada substitui o contato do médico com o paciente, mesmo tendo à disposição exames sofisticados e valiosos, como, a ressonância magnética, entre outros. “Em algumas situações, uma radiografia é suficiente para identificar o problema e avançar no tratamento”, observa.

Contato humano

No mesmo diapasão do Dr. Guido, o Dr. Vidal destaca o fato de que a tecnologia é benéfica e amplia as possibilidades da medicina, assim como ele entende que é natural o paciente ficar ansioso e querer saber mais sobre o seu problema.

Ele concorda com o colega de profissão: “é fundamental o médico especialista examinar o paciente, identificar seu histórico, conversar e realizar exames clínicos, para somente assim concluir o diagnóstico”, aponta.

“Essa interação presencial com o paciente segue fundamental. Foi ela que me possibilitou, inclusive, ter identificado diversos casos fora da minha área de especialidade, como apendicite, verminoses, tuberculose e diverticulite, entre outras doenças”, ilustra o Dr. Vidal.

Novos conhecimentos

Para reciclar o conhecimento, o Dr. Vidal participa todo ano de três a quatro congressos médicos a fim de conhecer e discutir novos casos. Ele também lê o jornal da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e a revista médica mensal da entidade, a Femina.

Na avaliação do Dr. Guido e do Dr. Vidal, ambos associados à Associação Paulista de Medicina (APM), assim como em muitas profissões, os médicos precisam seguir sempre estudando ao longo de sua carreira.

O caminho é fazer cursos de aprimoramento e participar de congressos, onde há compartilhamento de experiências e apresentação das mais recentes inovações.

Para a dupla de doutores, é um grande desafio se manter atualizado em um mundo cujas transformações são cada vez mais rápidas, até mesmo para conseguir oferecer respostas conclusivas aos questionamentos cada vez mais direcionados dos pacientes nos consultórios.

Reportagem publicada originalmente no site da APM Araraquara.