Elas sabem fazer a diferença

Mesmo trabalhando em setores mais complicados, como segurança pública, elas esbanjam entusiasmo e vitalidade; e garantem que não se arrependem das escolhas

Esqueça a imagem de mulher durona, que usa a cara amarrada para impor respeito. A delegada Elisabete Ferreira Sato, 56 anos, surpreende e impressiona pela marca feminina que imprime ao Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), em São Paulo, desde que assumiu a diretoria em janeiro.

É a primeira mulher à frente do DHPP, nomeação aplaudida pelos colegas que a recepcionaram muito bem, segundo ela própria conta. À frente de uma equipe de 700 policiais, ela tem nas mãos casos de tirar o sono – assassinatos, sequestros, intolerância, pedofilia.

Apaixonada pelo trabalho, está há 36 anos na polícia, onde começou como escriturária. Nessa época cursava Ciências Biológicas e sonhava em ser médica. Mudou de ideia ao conhecer a rotina da polícia. O curso de Direito ganhou prioridade, prestou concurso para delegada e tornou-se a primeira mulher no comando da Divisão de Homicídios ao assumir a chefia da primeira Delegacia da Criança.

Também exerceu a vice-presidência do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, além de ter liderado, em 1998, o grupo de apoio e proteção à escola no Departamento de Investigações sobre Narcóticos (Denarc) junto às escolas no combate ao microtráfico.

Nascida no bairro de Cangaíba, zona leste, é casada, e faz questão de viajar pelo menos uma vez por ano ao exterior. Após o expediente no DHPP, seu passatempo preferido é cozinhar e inventar pratos diferentes.

“Não abro mão de preparar o jantar para meu marido todos os dias. Ele acha que minha feijoada ganha do Copacabana Palace”, diz, aos risos. Filha de japonês com mineira, ama a comida de Minas, se arrisca a preparar pamonha, curau e não resiste a um doce em calda de casca da laranja-da-terra, à moda mineira.

Gosto por aprender

Uma apaixonada pelos livros e pela carreira, Norma Sueli Bonaccorso, a nova diretora do Instituto de Criminalística (IC), 54 anos, impressiona pelo currículo acadêmico. Graduada em Ciências Biológicas e em Direito pela USP, ela não parou por aí.

Obteve mestrado e doutorado em Direito Penal pela San Fran (como carinhosamente chama a Faculdade de Direito da USP). No ano passado, voltou aos bancos escolares, não como professora, mas como aluna. Agora, no curso de Filosofia, na Faculdade de Filosofia, Ciências Humanas e Letras da USP.

Ao ingressar na USP, em Biologia, passava pela porta da Acadepol (Academia de Polícia) e pensava: “Um dia eu vou estar aí”. E conseguiu. “Comecei a trabalhar como perita criminal e, nas minhas férias, aproveitei para visitar o IML de Roma e a West Palm Beach, para conhecer todas as técnicas de perícia”.

Em 1997, veio o grande desafio: a criação do Laboratório de DNA do IC, onde realizou mais de 1,3 mil exames que contribuíram para a elucidação de vários crimes e identificação de pessoas. O trabalho, não esconde, tem de ser feito com paixão. Nas horas vagas, além de ler muito, restaura livros e móveis, pratica jardinagem e ainda cuida de três gatinhas.

Durante muito tempo, Maria Aparecida Pires de Ávila, do Instituto de Pesos e Medidas (Ipem), cansou de ouvir a frase, repetida com ironia: “Só podia ser mulher”. Isso ocorria quando ela puxava a caneta para autuar um motorista de táxi, cujo taxímetro apresentava irregularidades. Era uma atividade de rotina realizada por homens, mas encarada de forma diferente quando partia de uma mulher: “Eu era a chata”.

Mas o trabalho de Cidinha (como é conhecida) vai além: o setor gerenciado por ela fiscaliza cerca de 35 mil táxis, que circulam diariamente na capital. A convocacão é feita, obrigatoriamente, uma vez por ano. Por dia, o Ipem da Regional Leste (Vila Alpina) faz a verificação de 200 carros.

No Ipem há 33 anos, Maria Aparecida atua como especialista em metrologia e qualidade. O início foi tímido, como escriturária concursada. Depois, tornou-se a primeira mulher encarregada a trabalhar com aferição de taxímetro. Aprendeu a gerenciar uma área dominada pelos homens, a lidar com os conflitos entre os próprios colegas e a desviar dos comentários nem sempre elogiosos sobre a situação de mulher.

“É uma conquista diária, uma questão cultural, a mulher tem de mostrar mais capacidade às vezes por uma coisa tão simples”. Na sua seção, é responsável por 13 funcionários: dez dos quais do sexo masculino. “Hoje, temos uma convivência de muito respeito, camaradagem e de troca de ideias”. Solteira, aprecia cinema e documentários sobre ciências. Gosta de viajar nas férias, de preferência em cruzeiro.

O prazer de ensinar

“Faço o que gosto, apesar dos percalços da profissão”, diz Ana Lúcia Negrão Fernandes, professora de Matemática há 40 anos, na EE Horácio Soares, em Ourinhos, interior de São Paulo. Só nessa escola, de mil alunos, está há 25 anos. O começo foi em Salto Grande, a 20 km de Ourinhos, depois passou por Xavantes, sempre em escolas estaduais.

Ana costuma dizer que o magistério corre em suas veias e que não se imagina noutra profissão. Casada, tem dois filhos: um professor (que ela queria que se formasse em Matemática, mas ele seguiu o caminho da Geografia) e uma bióloga. Para ela, formada também em Pedagogia, o segredo de 40 anos de magistério é muito amor e dedicação.

“Já participei de muitas lutas pela melhoria das condições de trabalho e elevação de salário”. Chegou a fazer piquete em porta de escola e acredita que essa luta é a mesma que move as mulheres em outros campos de trabalho.

“A mulher já conquistou muita coisa, mas a estrada é longa. Ela ainda tem de provar sua capacidade, seguir normas, cumprir horários e se desdobrar numa tarefa paralela, que é a de dona de casa, esposa e mãe”.

Seu dia é tomado pelas aulas de manhã e à tarde, para 160 alunos. Mora a um quarteirão da Escola Horácio Soares, onde cursou o ensino médio. “É como estar em casa”. Das alegrias da profissão, a que mais a toca é quando o aluno diz: “Nunca gostei de Matemática, mudei de opinião depois das suas aulas”.

Ou quando recebe e-mails saudosos de ex-alunos, muitos já formados. Fica mais feliz ainda quando um deles diz que está formado em Matemática ou Física. “Sinto que fui recompensada”.


Amor, zelo e competência

Vencendo obstáculos e servindo de exemplo, as mulheres têm muito que comemorar neste dia, o que muitas não farão, pois estarão trabalhando

Em janeiro, Marilza Vieira Cunha Rudge assumiu a vice-reitoria da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), sendo a primeira mulher a ocupar o cargo, nos 37 anos da universidade. Médica formada pela Unicamp é pró-reitora de pós-graduação da Unesp desde 2005.

Sob sua responsabilidade estão 109 programas de pós-graduação em diferentes áreas. Tem vasta experiência de pesquisa na área de Medicina, com ênfase em Saúde da Mulher, atuando em temas como diabete e gravidez, hipertensão e gravidez e substâncias tóxicas persistentes no binômio mãe-feto.

Para Marilza, a nova atividade é prazerosa, mas de uma enorme responsabilidade. “Pesa com suavidade”, diz, ao referir-se à enorme estrutura que dirige: 35 mil alunos de graduação, 12 mil de pós strictu-sensu e mais de 6 mil de lato sensu. “Em nosso corpo docente, 42% são mulheres, 80% estão no corpo administrativo”.

Marilza comenta que as mulheres vêm ocupando espaço pelo próprio esforço, pela garra, competência e pelos estudos. “Quando fiz Medicina, na minha classe de 90 alunos só oito eram mulheres. Hoje, elas são mais de 50%”.

Constata o avanço da mulher no espaço acadêmico e elogia: “Ela faz isso sem deixar de lado o papel de mãe, de esposa e de dona de casa. E continua preocupada com o lar e a educação dos filhos. Por outro lado, teve ganhos importantes, como as creches, auxílio natalidade, e, mais recentemente, a licença gestante ampliada. Na Unesp, por exemplo, temos creche nas quatro unidades”. Mãe de três filhos e avó de duas meninas, gosta de exercer atividade física e o voluntariado numa instituição em Botucatu que abriga cem crianças. “É uma alegria”.

O Instituto de Economia Agrícola (IEA), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado, tem, desde junho do ano passado uma mulher à frente da diretoria técnica. Trata-se da engenheira-agrônoma e pesquisadora Marli Dias Mascarenhas, cujo início da carreira foi em 1978, como auxiliar de laboratório, concursada, do Instituto Geológico. Foi transferida para o IEA e nomeada pesquisadora, em 1992. Em 70 anos do IEA, é a segunda mulher a ocupar o posto, depois de Valquíria da Silva, que exerceu as funções de março de 2007 até o ano passado.

Mestre em Agronomia pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq-USP), a nova diretora tem os olhos voltados para a área de administração rural, que envolve sistemas de produção, análise de custo de produção, gerenciamento de sistemas mecanizados, estudos de viabilidade econômica e alternativas tecnológicas, entre outros. É a responsável pela qualidade total do IEA.

Segundo Marli, dirigir um instituto desse porte é um desafio e tanto e, ao mesmo tempo, estimulante. “A direção feminina só vem somar, mesmo porque temos várias mulheres em postos de destaque aqui no instituto: elas estão na diretoria-geral, na assessoria, na diretoria administrativa, na comunicação, nos estudos econômicos e na área de estatísticas”. No IEA dos 129 funcionários, 85 são mulheres. “A convivência é bem pacífica, os homens são muito colaborativos e temos uma parceria complementar”, diz Marli.

Na Torre de Babel

A psicóloga Ivete Barão de Azevedo Halasc gerencia uma verdadeira Torre de Babel. Há sete anos, é diretora da Penitenciária Feminina da Capital, com 620 presas. “Setenta por cento da população carcerária daqui é formada por estrangeiras: africanas, asiáticas, latino-americanas. A maioria presa por tráfico de entorpecentes”.

A atração pelo sistema carcerário começou ainda na universidade. “Meu estágio foi na Casa de Detenção. E o meu orientador dizia que eu estava equivocada e que não iria conseguir a vaga. Consegui e o período de estágio, que era de seis meses, durou quatro anos”.

Os anos passaram e, em 1986, Ivete soube por um amigo que haveria um concurso para psicólogo na Secretaria de Administração Penitenciária. “Prestei o concurso. Fui procurar meu nome na lista e não achei. Quando estava saindo, uma funcionária perguntou qual era o meu nome. Falei e ela disse: Parabéns, você conseguiu o primeiro lugar”.

Ivete foi diretora de vários presídios masculinos, onde incentivou os reeducandos a participarem de oficinas de teatro. “Utilizamos o método do Teatro do Oprimido para ajudá-los na reinserção social. As apresentações fizeram tanto sucesso que o diretor Zé Celso Martinez queria transformar uma simples apresentação numa temporada”. Resultado: a maioria dos reeducandos não voltou ao crime.

Quando começou a trabalhar com reeducandas, viu que tinha outro desafio. “Tenho de gerenciar TPM, choros e outros problemas da psiquê feminina. Mantemos as meninas estudando e trabalhando. O tempo passa rápido e elas realizam diversos cursos: inglês, português (para as estrangeiras), dança, cantoterapia, informática, além de trabalhar em oficinas de hotelaria, padaria, marketing e reciclagem”.

Casada, mãe de três filhos e avó de duas netas, Ivete confessa que é uma apaixonada pela profissão e pelo cargo que exerce. “Não me vejo em outra função ou em outro lugar”.

Conquistar é preciso

A mais reconhecida relações-públicas do País, Margarida Maria Krohling Kunsch assumiu a diretoria da Escola de Comunicações e Artes (ECA), da USP, em fevereiro, para o quatriênio 2013-2016. É a primeira mulher a ocupar o cargo de direção da Escola em 47 anos. “Realmente foi uma quebra de paradigmas e os desafios são muitos. Mas estou otimista e animada, mesmo porque na minha vida nunca optei pelas coisas mais fáceis. Não será diferente agora”.

Margarida lembra que a ECA é complexa e abrangente e congrega muitas áreas, oito departamentos e uma escola de artes dramáticas, celeiro de potencialidades e de grande capital intelectual, integrado por professores, estudantes e funcionários.

Autora de diversos livros na área de Comunicação Organizacional, foi recentemente homenageada na 7ª edição do Prêmio Relações Públicas do Brasil, com a comenda Waldyr Gutierrez Fortes, honraria concedida apenas uma vez, em cada 10 anos de premiação, a personalidades que atingiram status de referencial pleno na profissão. Para a professora, a mulher tem avançado na conquista de postos mais altos, mas precisa conquistar mais.

“Apesar de termos pela primeira vez na história uma mulher presidente do País, a sua participação na política no Brasil ainda é muito pequena. No Brasil, diferente de países como a Finlândia, quando uma mulher assume cargo de destaque sempre constitui notícia. A explicação, acredito, se deve ao fato de que isso ainda é visto como exceção e não como algo normal. Portanto, as mulheres precisam ocupar mais postos de destaque na política, na ciência e na gestão de todos os setores”.


O vozeirão do Brasil

“Nossa, já até perdi as contas. Mas são cerca de 100 discos, entre compactos, 78 rotações, LPs e CDs”, diz sorrindo, Inezita Barroso. Há 33 anos, ela comanda o Viola, minha Viola, programa que vai ao ar pela TV Cultura.

A cantora e apresentadora, de 88 anos, mantém o vozeirão, segundo ela, sem ‘muito esforço’. “O que faço com afinco é evitar ar-condicionado e qualquer tipo de bebida gelada. Se eu tomo gelado, fico rouca rapidinho. Sempre foi assim”. Mesmo com o ritmo da televisão, ela continua com o trabalho de encontrar grandes talentos na música.

O programa tem plateia cativa, como o seu Santinho, e várias histórias interessantes como a de um bolo de fubá que ficava em um balcãozinho no cenário. “Nos primeiros programas, ele era de verdade. Depois, passou a ser feito de espuma. Mas era tão perfeito que não passava um programa sem que algum artista fosse lá tentar comer um pedaço”.

Maria Lúcia Zanelli e Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas I e IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 08/03/2013. (PDF)

As supermulheres do Estado

Foi-se o tempo em que o serviço público era território dos homens. Aos poucos, as mulheres foram chegando e tomando conta do espaço – com competência

O Estado de São Paulo tem 372 mil servidoras públicas na ativa. Elas estão em todas as áreas e ocupam todos os cargos. No universo público, não há mais espaço exclusivo para homens.

Na Polícia Militar de São Paulo, por exemplo, elas ocupam altos cargos hierárquicos – coronéis e tenentes-coronéis. Neste ano, três mulheres passaram a comandar, pela primeira vez, três instituições consideradas território masculino: o DHPP, o Instituto de Criminalística e o Metrô de São Paulo. Na área acadêmica, a professora Marilza Vieira Cunha Rudge assumiu a vice-diretoria da Unesp, fato que ocorre pela primeira vez.

O tempo de permanência nos postos de trabalho, também, é outra característica do universo feminino. Algumas servidoras estão no cargo há 40 anos, como Ana Lúcia Negrão Fernandes, professora de Matemática, na Escola Estadual Horácio Soares, em Ourinhos.

No campo do entretenimento, Inezita Barroso esbanja vitalidade aos 88 anos e comanda há 33, o Viola, minha Viola, que vai ao ar pela TV Cultura.

“A parte mais difícil é conciliar todos os papéis femininos. Trabalhar fora e cuidar de todos os “cês” da nossa vida (casa, crianças, cônjuge, comentários) é tarefa para leoa. Mas existe o cê de consciência, que é maior”. O depoimento de Laura Molina Meletti, pesquisadora científica do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), revela ainda a preocupação das mulheres em conciliar carreira com família. Elas têm dado conta do recado.

Justiça

Quando se trata de Direitos Humanos, três mulheres (Elaine Cavalcante, Juliana Armede e Cristiane Pereira) arregaçam as mangas e não medem esforços para ajudar os mais necessitados. Principalmente quando o assunto é violência doméstica. Apesar da Lei Maria da Penha, a violência doméstica ainda é um dos graves problemas que atingem a mulher.

O Mapa da Violência 2012, do Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos, informa que entre 1980 e 2010 foram assassinadas no país cerca de 92 mil mulheres, mais de 43 mil só na última década.

Elaine Cavalcante é juíza de Direito e atua no combate à onda cíclica da violência. Ela está na Vara do Foro Central de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, na capital paulista. Muito atuante, ela coordena o projeto Dialogando para a Paz e integra a Coordenadoria da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário do Estado de São Paulo (Comesp) ao lado das desembargadoras Angélica Almeida e Maria Tereza do Amaral e da juíza Maria Domitila Prado Manssur Domingos.

Quando se transformou em primeira juíza titular na 2ª Vara Criminal de Jundiaí, Elaine foi manchete de jornais. “Naquela época, uma mulher assumir um cargo de juíza titular era um fato novo e daí a curiosidade dos leitores”. Ela garante que nunca sofreu discriminação. “Hoje as mulheres conquistaram seu espaço na magistratura paulista, e pela primeira vez têm uma desembargadora na Comissão de Concurso de Ingresso à Carreira da Magistratura. Então, temos que comemorar essas vitórias”.

Cristiane Pereira é coordenadora do Centro de Referência de Apoio às Vítimas (Cravi), programa da Secretaria de Justiça e da Defesa da Cidadania. O Cravi completa 15 anos de existência em julho e trabalha com vítimas diretas e indiretas da violência.

A advogada atua no Cravi desde 2011. Com mestrado em Filosofia do Direito pela PUC-SP, sempre atuou em projetos de inclusão social. “Atuar dentro de uma instituição como o Cravi é uma missão. Ajudamos as vítimas diretas e indiretas da violência. Infelizmente, 70% das pessoas que procuram o nosso atendimento são mulheres, no papel de mães ou esposas. Elas chegam aqui aos pedaços, clamando por Justiça.”

Juliana Felicidade Armede é coordenadora dos programas estaduais de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e Combate ao Trabalho Escravo. “O Estado de São Paulo tem uma legislação pioneira no combate ao trabalho escravo e no enfrentamento ao tráfico de pessoas, mas existe um Brasil desconhecido, onde falta infraestrutura social e de Direitos Humanos. É nesse contexto que a sociedade deve atuar”. Juliana questiona também o papel da mulher na perpetuação da opressão.

Quebrando paradigmas

Cláudia Virgília conquistou uma vaga sonhada por muitos homens. Aos 41 anos, ela é subcomandante do 50º Batalhão de Polícia do Interior, sediado em Itu. Nascida em uma família de militares, a major Cláudia pertence à primeira turma de mulheres que ingressaram na Academia do Barro Branco. “Entramos em 1989. Éramos 12 garotas num universo de 160 homens”. A jornada árdua de estudos e treinamento não intimidou a oficial e as colegas. “Hoje, temos o orgulho de sermos chamadas de pioneiras”, recorda.

A oficial foi a primeira mulher a trabalhar na 2ª Companhia de Choque, na zona norte, e na Companhia de Força Tática. Formada em psicologia, é casada, tem um filho e ainda encontra tempo para atuar numa ONG que luta em defesa dos animais.

A voz tranquila e a figura aparentemente frágil escondem o verdadeiro perfil de Débora Santos de Oliveira. Quem a vê dificilmente imagina que ali está uma oficial do Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Estado de São Paulo.

Aos 31 anos, a primeiro-tenente PM comanda o 3º Grupamento de Bombeiros – Posto de Itaquera. Com histórico semelhante ao da major Cláudia (é filha do sargento PM Delcídio, bombeiro aposentado), Débora tem 60 profissionais sob suas ordens. “A sensibilidade da mulher é um dos fatores de sucesso em todas as profissões. Não é diferente no Corpo de Bombeiros”.


Histórias de mulheres de valor

Dividindo seu tempo entre as atividades profissionais e as responsabilidades de casa, elas buscam a realização (que muitos homens não conseguem)

A trajetória profissional da psicóloga Cândida Rocha Schwenck confunde-se com a evolução dos serviços prestados pelo Poupatempo. Em abril de abril de 1998, ingressou no serviço público estadual e passou por treinamento no posto Sé, o posto pioneiro do programa, inaugurado em outubro de 1997. E foi trabalhar, como assistente de atendimento, na agência Luz, desde a sua abertura.

Em 15 anos dedicados ao Poupatempo, a hoje executiva passou por várias funções: coordenadora geral (Agência Luz) e coordenadora de atendimento (Sé). Depois, gerenciou os postos de São Bernardo do Campo e de Itaquera. Atualmente comanda as unidades Sé (750 funcionários) e Luz (200 servidores), curiosamente, onde iniciou a carreira.

Cândida diz gostar de treinar e de comandar equipes, em especial, de trabalhar com pessoas de perfis diversificados – característica presente no trabalho do Poupatempo. Hoje, com 42 anos, casada, mãe de gêmeas, com duas especializações no currículo, ela tem uma vida dedicada à família, à formação acadêmica e, em especial, a aperfeiçoar o atendimento ao cidadão. Uma tarefa desafiadora e bem-sucedida, visto que, em 2012, pesquisas revelaram 95% de satisfação com o serviço do Poupatempo.


Quando Luciana Quintanilha entrou para os quadros da Polícia Civil, há 28 anos, o universo da instituição também era dominado por homens. “Eu cursava biologia na PUC Campinas e prestei concurso para a Polícia Civil para ajudar meu pai nas despesas com a universidade”. Há quase três décadas atua na área, hoje como perita criminal e especialista em documentoscopia. “É um universo fascinante no qual não existe rotina”. Entre macroscópios, ela é especialista em detectar documentos e dinheiro falsos. Fluente em inglês, já visitou diversos países e participou de inúmeros congressos (inclusive conheceu o Federal Reserve nos Estados Unidos). E trata de dividir suas conquistas: ensina documentoscopia e inglês na Acadepol.


Tudo nos trilhos

Em maio de 2012, Alexandra Leonello Granado assumiu a diretoria de assuntos corporativos do Metrô paulistano. Em 45 anos de existência da companhia, a administradora, antes advogada da empresa, foi a primeira mulher a assumir um cargo de diretoria no Metrô.

A executiva comenta que as áreas de transportes e de engenharia, trabalhos típicos do Metrô, tradicionalmente despertam maior interesse do maior público masculino – 70% do corpo funcional do Metrô ainda é formado por homens. Entretanto, o perfil do quadro vem se modificando. Ela própria é um exemplo: comanda 604 funcionários, divididos entre os setores jurídico, compras e contratações, infraestrutura, serviço interno e recursos humanos.

Com 41 anos, casada e mãe de dois meninos, Alexandra diz que sempre foi bem recebida pelos colegas homens e que essa junção – homens e mulheres –traz muitos benefícios para as empresas.

É grata ao marido, “que divide a educação das crianças comigo”, e como dica para quem ingressa no mercado de trabalho, sugere desprendimento.“Independente mente do sexo, concluir uma faculdade já não é suficiente. A preparação tem de ser constante, pois os espaços se abrem para quem se dedica com afinco”.


Café e simpatia

Ivanete da Silva Melo esbanja alegria pelas salas da Secretaria Estadual do Trabalho e Relações do Emprego (Sert). Copeira há dez anos, a sergipana de Estância cuida dos colegas com o mesmo carinho que dedica à família, principalmente aos dois netos. Bem falante, conta com orgulho sua nova conquista: “Vou utilizar a linha de crédito do Banco do Povo Paulista para reformar minha casa no Itaim Paulista”.

Para Ivanete não há mau tempo. “As mulheres não devem temer nada, a não ser a falta de vontade. Com fé em Deus, consegui criar meus quatro filhos, construí uma casa, trabalho onde gosto. Até dou entrevistas para TVs e jornais, pareço uma celebridade,” brinca.


Aposentadoria é uma palavra que não existe no dicionário de Maria Rosa Baraldi nem de Etelvina Moreira de Souza, ambas de 65 anos. Maria Rosa, há 18 anos, é analista sociocultural da Secretaria Estadual de Esportes e coordena o Espaço Salutaris, uma academia para os funcionários da pasta. “Viajamos pelo interior para dar cursos e conhecemos pessoas maravilhosas que mudaram suas vidas, a partir daí.”


Já a história de Etelvina Moreira de Souza confunde-se com a história da Universidade de São Paulo. “Meus pais eram portugueses e tinham uma pequena chácara, onde está localizado hoje o Hospital Universitário no campus da USP”.

Aos 16 anos, ela deixou o lugar e foi morar na zona leste. Depois, o destino se encarregou de levá-la de volta à USP. E, há 27 anos, é conhecida como a Dona Etelvinha, a zelosa funcionária da Faculdade de Saúde Pública, onde cuida do laboratório, serviço de zeladoria e ainda tem tempo para estudar. “Meu conselho para as mais jovens? Estudem. A vida é um aprendizado e cada segundo deve ser aproveitado”.


Mudando rumos

Elaine de Carvalho é testemunha da história. Funcionária do TJSP, ela atua como agente de fiscalização judiciária há 27 anos. “Além de prestarmos serviços de atendimento ao cidadão que procura o TJ, nós damos assistência no controle das salas durante os julgamentos”. Ela assistiu aos principais casos que tiveram grande clamor público como os julgamentos de Suzanne Von Richtofen, o de Lindenberg e dos Nardoni.

Tecnóloga em contabilidade, Elaine mudou radicalmente de profissão ao ver a oportunidade da estabilidade de um emprego numa carreira pública. “Para as mulheres, a área de segurança ainda representa alguns obstáculos, principalmente das pessoas que não pertencem ao setor. Geralmente, eles associam segurança com homens sarados em ternos escuros”. Elaine chefiou durante cinco anos o departamento de fiscalização judiciária do Fórum Criminal da Barra Funda. “Era como matar um leão por dia, mas valeu cada segundo”.


Aos 33 anos, Marinalva Cruz, supervisora do Programa de Apoio à Pessoa com Deficiência (Padef), acredita na capacidade do ser humano em mudar sua própria história. “Independentemente das limitações, todos têm direito à educação e ao trabalho. Não é diferente aqui, quando lidamos com pessoas com deficiência”. Os resultados comprovam. De 1995 a 2012, 65 mil pessoas com deficiência procuraram o Padef. Mais de 12,7 mil conseguiram a tão almejada vaga de trabalho.

A supervisora do Padef, formada em Recursos Humanos, acredita que a real inserção das pessoas com deficiência, só ocorrerá com a mudança cultural e empresarial. “Temos pessoas deficientes com excelente qualificação acadêmica e profissional. Eles só precisam de oportunidade”.

Maria Lúcia Zanelli e Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas I e IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 07/03/2013. (PDF)