Parceria IPT e CDHU reduz 30% da conta de luz em moradia popular

Tecnologia de aquecimento solar desenvolvida para moradias também é capaz de diminuir consumo de água pela metade

Um projeto-piloto realizado em 2003 pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) para a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) se tornou padrão para a construção de moradias populares no Estado de São Paulo. Durante um ano, no município de Cafelândia, na região centro-oeste paulista, o IPT orientou a instalação de uma tecnologia que combina aquecedores de água baseados em energia solar com o chuveiro elétrico convencional. E monitorou, em 50 residências de um conjunto habitacional, o consumo de água e luz durante o banho dos moradores.

A pesquisa teve apoio da prefeitura local e parcerias da Transsen (fabricante de aquecedor solar) com a CDHU, e mais duas empresas produtoras de chuveiros elétricos. Para pré-avaliar o consumo foi feita simulação no Laboratório de Instalações Prediais e Saneamento do IPT.

Depois, o teste foi aplicado na prática, noite e dia, nas quatro estações do ano. Os resultados, incluindo monitoramento em tempo real pelos pesquisadores, indicaram queda, pela metade, da água utilizada nas moradias e economia de no mínimo 30% nos relógios de luz.

No sistema híbrido (solar e elétrico) aprimorado pelo IPT, cada moradia de baixa renda tem seu sistema exclusivo para pré-aquecer a água por irradiação solar. O coletor solar do sistema garante produção mínima mensal de 142,6 kWh. Aproveita um fenômeno físico conhecido como termossifão e funciona de modo automático e ininterrupto.

O conjunto de coletor e reservatório revestido de aço inox, de 200 litros, é instalado sobre o telhado da casa ou do prédio do conjunto habitacional. Por meio dele, a água do reservatório circula por canaletas internas do coletor e retorna aquecida para o reservatório, em tubulações de cobre. Quando está cheio, em média, proporciona de cinco a seis banhos diários com água em volume suficiente.

Mistura sustentável

Para tomar banho, o funcionamento é semelhante ao usado em muitos hotéis, com duas torneiras: uma de água quente, vinda do telhado, e outra de fria, com a ligação da rua. A mistura de ambas atinge, em poucos segundos, a temperatura máxima recomendada sem causar queimaduras, de 39ºC. E em períodos com pouca oferta de sol, a água é aquecida pelo chuveiro de modo convencional, com eletricidade.

O sistema consegue aquecer água a até 70ºC. Tem uso combinado com chuveiro de potência reduzida e dispensa apoio elétrico no reservatório. O eletrodoméstico foi a opção escolhida por ter baixo custo de fabricação e por ficar ligado durante pouco tempo. O equipamento oferece altíssima eficiência energética, capaz de transformar quase a totalidade de eletricidade em calor – chegando próximo dos 100% de eficiência.

O conhecimento adquirido em Cafelândia foi transformado em documento técnico do IPT para a CDHU sobre o assunto. Desde 2008, o modelo híbrido de aquecimento vem sendo adotado no Programa Minha Casa Minha Vida, iniciativa de habitação popular da Caixa Econômica Federal. Também é usado por concessionárias paulistas de fornecimento de eletricidade, como EDP Bandeirante e CPFL.

O técnico Douglas Messina, responsável pelo projeto no IPT, comenta que a tecnologia pesquisada reúne o máximo de eficiência do sistema solar e do elétrico. Ele afirma ser possível estender a economia proporcionada pelo mesmo para áreas com oferta solar abundante na maior parte do ano. A lista de localidades inclui Estados brasileiros, como os da região Nordeste; e mais o México e muitos países africanos.

Construtores e usuários

No território nacional, Douglas comenta que são dois os principais desafios para a expansão do sistema híbrido. O primeiro é disseminar entre os construtores o conceito de incluir o aquecimento solar ainda na fase da “prancheta”. E, deste modo, abordar aspectos técnicos obrigatórios, como questões estruturais, hidráulicas, de segurança, pressão da água, entre outras.

Uma possibilidade seria a instituição, pelo MEC, de uma disciplina obrigatória sobre aquecimento solar em residências na grade horária de cursos técnicos, como o de Edificações, e superiores, como o de Engenharia Civil.

O segundo desafio é conscientizar os usuários para prevenir desperdícios. Medidas simples são capazes de potencializar a economia de água e de luz em quaisquer moradias. As recomendações são reduzir o tempo de banho, ajustar o termostato do chuveiro à temperatura ambiente, e regular a vazão do eletrodoméstico de modo a obter uma quantidade suficiente de água.

“Do ponto de vista da sustentabilidade, o maior desafio hoje para o Brasil não é gerar eletricidade. Há opções hidrelétrica, termoelétrica e até nuclear, se houver necessidade. A necessidade mais urgente é a de economizar água, recurso natural finito e não renovável”, observa Douglas. “Um dos próximos passos do Laboratório de Instalações Prediais e Saneamento do IPT será aprimorar a tecnologia para o uso do gás combustível, que também oferece grande potencial para gerar economia”, conclui.


Sem sustos na hora da fatura

“Nunca mexo no termostato do chuveiro. O banho aqui é tão gostoso que nem dá vontade de sair”, conta a dona de casa Aparecida Donizete da Silva. Ela mora com marido, dois filhos e dois netos em uma das 1.680 unidades do conjunto habitacional de prédios inaugurado em outubro de 2003, no distrito César de Sousa, em Mogi das Cruzes.

De acordo com o IBGE, o condomínio construído pela CDHU abriga 5 mil famílias com média de 3,4 habitantes cada. Sem elevadores, é dividido em cinco áreas com 17 blocos de 20 apartamentos cada. Exclusivo para cada moradia, o kit com o SAS foi instalado no telhado dos prédios por meio de convênio com a EDP Bandeirante.

No conjunto habitacional, a concessionária de energia regula aquecedores e chuveiros para oferecer banhos com temperatura máxima de 39ºC. Aparecida é síndica da área J1. Antes de realizar o sonho da casa própria, morava de aluguel e não conhecia o sistema de aquecimento solar.

Com seis moradores e oito banhos diários, a conta de água da família de Aparecida nunca ultrapassou R$ 30; e a de luz se mantém estável em R$ 65. A economia permitiu a compra, em prestações, de eletrodomésticos, como TVs com telas planas para a sala e o quarto do casal.

A dona de casa se diz satisfeita com o sistema. Comenta que, nos meses de inverno, os banhos tendem a ser mais longos, mesmo com os familiares já adaptados ao sistema. “A única situação diferente é quando recebo visita. Preciso orientar o convidado para abrir a torneira de água quente antes da fria. Mas é rapidinho e nunca ninguém reclamou”, diz sorrindo.


Os caminhos da água quente

Sistema de Aquecimento Solar da Água (SAS) é o nome técnico da solução híbrida que equipa novos projetos de conjuntos habitacionais da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU). O dispositivo segue as normas do Decreto nº 53.336, de 20 de agosto de 2008, que instituiu o Programa Estadual de Contratações Públicas Sustentáveis (PECPS).

Com viés social, a CDHU hoje tem o maior programa em eficiência energética para banho da América Latina. Além de estabelecer economia de água e de energia, também sugere adoção de tecnologias menos agressivas ao meio ambiente, como reduzir poluentes e usar produtos de baixa toxicidade. Desde a sua efetivação, em 2009, foram instalados 30 mil kits de SAS no Estado, divididos em quatro áreas.

A primeira reúne municípios das regiões de Taubaté, Baixada Santista, Campinas e Sorocaba; a segunda, de Ribeirão Preto, São José do Rio Preto e Araraquara; a terceira, de Bauru e Marília, e a quarta, de Presidente Prudente e Araçatuba. Para o futuro, a meta da CDHU é também adotar o SAS em empreendimentos na capital e em municípios da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) ainda não contemplados.

O sistema de aquecimento solar da água adotado pela CDHU segue requisitos de diversos órgãos de referência e iniciativas sustentáveis. A lista deles inclui Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e o Programa Nacional de Conservação e Energia Elétrica, responsável pelo Selo Procel.

Eduardo Baldacci, gestor de eficiência elétrica da CDHU, explica que a proposta principal é melhorar a qualidade de vida da população de baixa renda e ampliar suas possibilidades financeiras com a economia proporcionada. “Já para a administração pública, a tecnologia permite poupar recursos em infraestrutura, em especial no processo do sistema elétrico nacional conhecido como Geração, Transmissão e Distribuição (GTD)”, analisa.

O gestor também destaca a evolução nos editais de contratação e termos de referência de serviços e produtos e o aumento das exigências da CDHU, sobretudo em aspectos como qualidade e durabilidade dos equipamentos. “Acabamos por favorecer a pesquisa e o desenvolvimento dos chuveiros e aquecedores solares nacionais. A meta é ter o SAS mais barato, porém capaz de maximizar a economia e a eficiência energética”, explica.

Dois caminhos

Para ser incorporado na moradia popular, o sistema híbrido de aquecimento pode vir de dois caminhos. O primeiro é a ata de preços. Por meio dela, a CDHU licita a compra e instalação dos conjuntos de aquecedores solares, de acordo com a Lei nº 8.666, de 1993. E repassa ao fabricante, por meio de cláusula no contrato do edital, a tarefa de instalar, orientar o morador sobre o uso adequado e oferecer assistência técnica durante cinco anos, período de garantia do equipamento, cuja vida útil é de 20 anos.

Eduardo informa que, desde 2009, início do projeto, menos de 0,5% do total de aquecedores instalados teve relato de algum problema. E se for necessário, pelo contrato, o fornecedor vencedor da concorrência também arca com custos referentes à retirada, transporte, ensaios e reposição do equipamento. Nesta modalidade, já foram instalados 19,5 mil SAS em 131 cidades paulistas.

O outro tipo de instalação dos aquecedores é por meio de convênio firmado entre a CDHU e as concessionárias de fornecimento elétrico do Estado. Pelo contrato, as empresas doam e instalam os equipamentos para os mutuários, como contrapartida à Lei Federal nº 9.991, de 2000, que as obriga a investir 1% de seu faturamento anual em programas de pesquisa e desenvolvimento em eficiência energética.

O convênio com as empresas é um tipo de contrato imposto pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). As concessionárias podem colocá-lo em prática de acordo com os seus próprios critérios.

Por meio dele foram instalados 10,5 mil sistemas híbridos em 17 municípios paulistas. No total, a CPFL responde por 6,5 mil, o grupo EDP Bandeirantes por 4,8 mil e a Eletropaulo tem mais 5 mil, sendo que estes últimos serão colocados em funcionamento até o final de 2013.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas II e III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 03/10/2012. (PDF)

Um dia histórico no IPT

Instituto empossa nova diretoria, inaugura Laboratório de Bionanomanufatura e mostra equipamentos e serviços de alta tecnologia

Um dia histórico no Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT): na segunda-feira, 27 de agosto, o órgão fundado em 1899 e ligado à Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia (SDECT) empossou sua nova diretoria, apresentou o primeiro Laboratório de Bionanomanufatura da América Latina e mais dois serviços pioneiros na pesquisa e suporte à tecnologia renováveis – o simulador solar e o forno de solidificação direcional de silício.

Instalado na Cidade Universitária, o Laboratório de Bionanomanufatura recebeu investimento de R$ 46 milhões. O prédio ocupa 8 mil metros quadrados de área e concentrará processos de biotecnologia, micromanufatura de equipamentos e metrologia. A meta do IPT com os novos serviços é auxiliar empresas de todos os portes com soluções tecnológicas capazes de reduzir o uso da energia, desenvolver novas matérias-primas e preservar o meio ambiente, sem abdicar da competitividade.

As aplicações do Laboratório contemplam tanto as áreas médicas quanto as de segmentos industriais distintos – petróleo e gás, medicamentos, têxtil, cosméticos, química, cerâmicas, siderurgia, papel e celulose, combustíveis e construção civil. Suas pesquisas serão bancadas por três fontes de recursos igualmente divididos: a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), a empresa privada interessada e subvenção governamental.

Simulador solar

Já funcionando no Laboratório de Instalações Prediais e Saneamento, o simulador reproduz a incidência dos raios solares na superfície terrestre. Seu primeiro uso será o de medir a captação de luz e a eficiência energética de coletores solares em sistemas de aquecimento de água. Permitirá, em linhas gerais, obter, em duas horas, respostas que demandariam até dois meses no telhado de uma residência.

A nova instalação teve investimento de R$ 3,5 milhões, sendo 90% do Governo paulista e 10% provenientes do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). O conjunto de luzes e refletores especiais foi importado da Alemanha. O restante, incluindo o projeto e adaptação das instalações, foi desenvolvido internamente pela equipe do pesquisador Douglas Messina, responsável pelo projeto desde a sua concepção, em 2008.

Segundo o pesquisador, o aumento na eficiência da captação solar diminui o consumo de energia elétrica nos sistemas de apoio aos aquecedores. Irá favorecer o desenvolvimento de produtos mais sustentáveis do ponto de vista ambiental.

O simulador contribuirá também em testes com sistemas fotovoltaicos para gerar energia e analisar equipamentos submetidos à influência da luz solar. A construção civil é o primeiro setor da economia nacional atendido, considerando aplicações residenciais, comerciais e industriais. Segundo Douglas, há tendência mundial de crescimento de dispositivos coletores, inclusive no setor industrial, não só para aquecer água, mas também para gerar vapor.

O sistema tem potência de 50 kVA e pode ser colocado em qualquer plano entre zero e 90 graus para reproduzir quaisquer situações de estudo. Opera por meio de software e hardware exclusivos e dispõe de instrumentação específica para gerenciar a vida útil das lâmpadas.

Forno para silício

O forno de cristalização de Silício Grau Solar (SiGS) do IPT é o primeiro a entrar em operação na América Latina. Foi montado para contribuir com o processo de purificação do elemento químico. Sua instalação deu início no Brasil a um modelo alternativo para produzir a matéria-prima, a qual é utilizada na fabricação de coletores solares fotovoltaicos destinados à gerar eletricidade.

O projeto é coordenado pelo pesquisador João Batista Ferreira Neto, do Laboratório de Metalurgia e Materiais Cerâmicos. O equipamento foi adquirido da Alemanha por R$ 1,43 milhão. O recurso integra projeto de R$ 12,5 milhões, sendo R$ 11,6 milhões bancados pelo Fundo Tecnológico (Funtec), do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Os R$ 900 mil restantes foram financiados pela Companhia Ferroligas Minas Gerais (Minasligas) empresa parceira.

A Minasligas pretende produzir silício em escala industrial. Atualmente, no Brasil, o material é exportado e a demanda nacional pelo insumo ainda é incipiente. Segundo João Batista, o projeto tem grande potencial para gerar novos negócios, por dois motivos. O primeiro é o fato de o Brasil ser um dos maiores produtores mundiais de Silício Grau Metalúrgico (SiGM) – e há disponibilidade de matéria-prima para a produção do grau solar. O segundo fator é o crescimento anual de 30% desse mercado mundial.

O silício é usado para produzir ligas metálicas, preparar silicones e na indústria cerâmica. É material semicondutor abundante no planeta, com aplicações nas indústrias eletrônica e microeletrônica. É material básico para produzir transistores para chips, células solares e em diversas variedades de circuitos eletrônicos.

Com o forno, será possível produzir no IPT lingotes de silício que, em seguida, são cortados, proporcionando as lâminas que compõem as placas fotovoltaicas. “Isso permite avaliar o desempenho do material produzido”, afirma João Batista, explicando que essa avaliação é complementar à análise química do silício.

Com o forno em operação, a próxima fase do projeto será avaliar a qualidade do silício produzido para ajustar o processo de purificação. No mercado internacional, o preço do insumo varia de acordo com seu grau de pureza. O quilo do SiGS tem preço de US$ 50, enquanto o grau metalúrgico vale hoje US$ 1,5 por quilo. Isso significa que a nova atividade em gestação no IPT permitirá agregar valor à indústria desse material, que poderá crescer em importância econômica.


Novo diretor

Fernando Landgraf é o novo diretor-presidente do IPT. Livre-docente pela Escola Politécnica da USP, é pesquisador especializado na área de Engenharia de Materiais e Metalúrgica. Desde julho de 2009 respondia pela diretoria de inovação do Instituto.

Após ser empossado, Landgraf disse que o principal objetivo de sua gestão será apresentar resultados dos investimentos de R$ 150 milhões na modernização do IPT, realizados na gestão de seu antecessor, João Fernando Gomes de Oliveira.

“A meta é aumentar a relevância e o impacto do Instituto para a indústria e a sociedade paulista e brasileira. Pretendemos criar uma metodologia para o IPT medir seu impacto, seguindo o modelo de instituições internacionais de alta credibilidade tal qual o Massachusetts Institute of Technology (MIT), dos Estados Unidos”, destacou.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente na página IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 29/08/2012. (PDF)