Centrinho da USP Bauru inova no tratamento de lábio leporino

​Aparelho expansor maxilar desenvolvido na unidade reduz pela metade uma das etapas do tratamento; fissura labiopalatina bilateral acomete um a cada 650 recém-nascidos no Brasil

Projetar e desenvolver um novo ferramental ortodôntico capaz de reduzir de um ano para seis meses uma das etapas do tratamento da fissura labiopalatina. Batizado de expansor maxilar diferencial, o aparelho é uma inovação produzida em Bauru, no Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais (HRAC/Centrinho), da Universidade de São Paulo (USP).

Conhecida popularmente como lábio leporino, a fissura labiopalatina bilateral (fenda dos dois lados dos lábios e do céu da boca) afeta um a cada 650 recém-nascidos no Brasil. A anomalia provoca estreitamento na região anterior do céu da boca da criança e, por esse motivo, o tratamento requer uso de um aparelho expansor da maxila.

Criado pela professora ortodontista Daniela Garib, o projeto teve apoio do Centrinho-USP desde o início de seu desenvolvimento, com financiamento de R$ 100 mil da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado (Fapesp), na modalidade Auxílio de Pesquisa. Os testes com o protótipo em 20 pacientes foram realizados durante dois anos e quatro meses, pela também ortodontista Rita Lauris, aluna de doutorado de Daniela.

A pesquisa com o novo ferramental odontológico começou em 2010, depois de Daniela acompanhar diversos tratamentos de fissura labiopalatina no Centrinho-USP. Docente da disciplina de Ortodontia da Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB-USP), ela explica que, na técnica convencional, o ortodontista usa um expansor na boca do paciente para corrigir o estreitamento da maxila – mas muitas vezes surgem efeitos colaterais indesejados.

Patente

“Propus, então, criar um aparelho com expansão diferencial nas regiões anterior e posterior do céu da boca. E, assim, controlar a abertura milimétrica do expansor nas partes frontal e posterior”, destacou a ortodontista. Seis meses depois, sob supervisão de Daniela, os técnicos de laboratório Lourival Garcia e Vagner Pereira moldaram os primeiros protótipos.

Para evitar contaminações por micro-organismos, o protótipo é construído em aço inoxidável, assim como o modelo tradicional. A peça apresentou resultados satisfatórios logo nas primeiras avaliações da dentição e do osso maxilar dos pacientes.

Em 2010, o trabalho do Centrinho-USP obteve depósito nacional de pedido de patente. No ano seguinte, o protótipo conquistou o primeiro lugar na Olimpíada USP de Inovação na área da saúde. Atualmente, uma empresa norte-americana testa o novo aparelho, baseado na tecnologia desenvolvida em Bauru.

A anomalia

A formação da fissura labiopalatina ocorre na criança ainda no útero materno, a partir do primeiro mês de gravidez. A deformidade no rosto do bebê, algumas vezes, pode ser detectada por ultrassom, nos exames pré-natais. Quando o diagnóstico é confirmado, a criança seguirá em tratamento por equipe multidisciplinar desde o nascimento até o final da adolescência, por volta dos 18 anos de idade.

Na maioria dos casos, com três meses de vida o recém-nascido passa por cirurgia plástica para fechar o lábio. O céu da boca somente é fechado por volta de um ano de idade, antes de a criança começar a falar. A terapia prossegue, então, com cuidados de equipe multidisciplinar (odontologia, fonoaudiologia, psicologia, nutrição, entre outras áreas de saúde).

Vantagens

Aos 8 anos de idade é instalado o aparelho expansor na boca do paciente. Na terapia tradicional, essa etapa demanda um ano: seis meses para a expansão e mais seis meses para o alargamento da parte frontal. Com o protótipo criado em Bauru, o tempo de tratamento é reduzido pela metade.

O novo expansor tem o conceito de ser “2 em 1”, ou seja, é uma peça única com dois parafusos. A primeira vantagem da técnica é atenuar o sofrimento da criança, que passa por menos intervenções; além disso, o custo do aparelho cai pela metade, por ser peça única.

Outro ponto positivo é possibilitar a expansão da maxila, isto é, o osso maxilar passa a acompanhar o desenvolvimento do rosto da criança. Esse detalhe, contam Daniela e Rita, foi confirmado por meio de tomografias computadorizadas e de análises de modelos dentários digitais da arcada dentária dos pacientes.

Bullying

A diminuição dos deslocamentos dos pais e familiares também é um benefício. Muitos residem em outros Estados ou em localidades distantes de Bauru e acabam perdendo dias de trabalho para levar o filho ao Centrinho-USP. Na unidade vinculada à universidade pública estadual paulista, todos os tratamentos são custeados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e recursos próprios da autarquia.

Além da questão estética e dos danos causados à autoestima pelo bullying nos meios escolares e social, as pesquisadoras comentam que a fissura labiopalatina pode prejudicar também a amamentação, dentição, fala e audição. Na maioria dos casos, tem origem genética. Entretanto, as duas especialistas do Centrinho-USP comentam que outros fatores favorecem seu surgimento. A lista de risco à gestante inclui deficiência vitamínica, alguns medicamentos anticonvulsivos e o consumo de álcool e tabaco.

Serviço

Mais informações e endereços do Centrinho-USP, consulte o site.

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente na página I do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 24/09/2015. (PDF)

Bibliotecas da USP recebem kits de acessibilidade social

Equipamentos com ampliador digital e leitor autônomo facilitam a leitura e o aprendizado de pessoa com deficiência visual, parcial ou total

A Universidade de São Paulo (USP) disponibilizou três conjuntos de equipamentos (kits) de leitura para pessoa com deficiência visual, parcial ou total. À disposição da comunidade acadêmica e demais usuários das bibliotecas universitárias, o primeiro deles foi instalado na Biblioteca do Câmpus de Ribeirão Preto (BCRP).

O segundo kit foi montado na sala de acessibilidade da biblioteca da Faculdade de Educação (FE), da Cidade Universitária, na zona oeste de São Paulo. O último conjunto tem entrega e operação previstas para outubro, tendo como destino a biblioteca da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH), da USP Leste, na capital.

Assistivo

Cada kit custa em média R$ 16 mil e inclui duas máquinas com sistemas de informática com vida útil prevista para vários anos. Ambas têm software (programas) e hardware (placas e demais componentes) projetados especificamente para facilitar a leitura de impressos para pessoa com deficiência visual.

O leitor autônomo é o primeiro dispositivo inclusivo do kit. Seu sistema “fotografa” páginas de livros e reconhece o conteúdo. Na operação, lê de modo linear o texto impresso e o transmite para os fones de ouvido do cego, que, com um teclado, controla a velocidade da leitura, podendo avançar ou retroceder rapidamente para outras linhas e parágrafos. Se o usuário tiver visão parcial, pode ampliar trechos da página com o teclado e conferir o resultado do zoom na tela do equipamento.

A linha em braile é o segundo dispositivo assistivo do kit. Parecido com um teclado de computador, funciona em conjunto com o leitor autônomo. Seu sistema decodifica o texto escaneado da página e o converte para os 64 sinais da linguagem braile. Estes são representados em alto-relevo em uma superfície perfurada do teclado. Nela, pequenos pinos se alternam, subindo e descendo, formando os símbolos e permitindo ao cego fazer a leitura tátil do conteúdo.

A biblioteca da FE dispõe também de terceiro equipamento para auxiliar pessoas com visão diminuída, chamado ampliador digital. Com operação similar à de uma lupa, sua lente dá zoom em trechos das páginas e reproduz, com nitidez e de modo instantâneo, o conteúdo impresso em um monitor de computador.

Ler e estudar

“O objetivo dos kits é fortalecer ainda mais a inclusão social na universidade”, destaca Anderson de Santana, chefe da Divisão de Desenvolvimento e Inovação do Sistema Integrado de Bibliotecas (SIBi) da USP. “Além da leitura, equipamentos possibilitam ao aluno, professor ou funcionário cego ou com visão parcial estudar. Funcionam também com arquivos armazenados por eles em e-mails e pendrives pessoais”, informa.

Antes do retorno dos kits para a universidade, Anderson conta que os três integraram a exposição Conhecimento: Custódia e Acesso. Realizada de 2012 a 2014, essa mostra celebrou 30 anos de criação do SIBi e foi atração em diversos eventos em instituições culturais, como o Museu da Língua Portuguesa, vinculado à Secretaria Estadual da Cultura. Esteve também na Bienal do Livro de São Paulo e nas Feiras do Livro de Ribeirão Preto e Educar, na capital.

Segurança

“A maioria das pessoas com deficiência que ingressa na universidade costuma conhecer o ampliador digital e o leitor autônomo. Ambos são de uso simples e aprendizado rápido”, diz Lina Flexa, diretora da biblioteca da FE.

Segundo ela, o kit representa mais um passo da USP para ampliar o acesso aos acervos acadêmicos. Lina diz se orgulhar de comandar uma das bibliotecas campeãs de acessibilidade da universidade pública paulista. Como exemplo, cita a entrada do prédio que não tem capachos, pois podem prejudicar o acesso de pessoas com muletas e andadores.

Os cuidados seguem com o piso tátil para orientar deslocamentos. O mobiliário adaptado inclui balcão rebaixado, mesas com altura regulável (para cadeirantes), elevador, banheiros e bebedouros exclusivos para pessoas com deficiência. Além disso, as estantes e a escada são sinalizadas com painéis em braile.

Faz tudo

Thiago Freires, um dos bibliotecários responsáveis pelo atendimento ao público, confirma a facilidade de uso dos aparelhos do kit. Na USP desde 2009, ele assina e apresenta o vídeo institucional do site da biblioteca, que tem sete minutos de duração e traz todas as informações sobre o acervo, consultas e demais serviços da biblioteca da FE (ver link em serviço).

Ele conta que, diariamente, cerca de 400 pessoas circulam pelos três pisos (térreo e dois andares) do edifício próprio. Com 25 funcionários, a biblioteca da FE abre de segunda a sexta-feira, das 8h30 às 22 horas, e aos sábados, das 9 às 13 horas.

Serviço

Bibliotecas da USP com kits de acessibilidade:

Central USP Ribeirão Preto
Faculdade de Educação da USP
Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente na página III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 22/09/2015. (PDF)

Unesp inova em cirurgia de crânio

Peça de acrílico desenvolvida em impressora 3D foi utilizada com sucesso em procedimento cirúrgico; pesquisadores solucionam caso complexo de menino de 6 anos com fratura na cabeça

Pesquisa inédita da Universidade Estadual Paulista (Unesp) possibilitou a realização com sucesso, na segunda-feira, 1º, de cirurgia de implante de crânio (cranioplastia) em um menino de 6 anos de idade. Executada em duas horas, a operação foi realizada no Hospital das Clínicas (HC) da Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB-Unesp).

O procedimento cirúrgico de alta complexidade teve a coordenação dos cirurgiões Aristides Palhares (cirurgia plástica) e Pedro Hamamoto (neurocirurgia), ambos professores da instituição. Custeada pelo Sistema Único de Saúde (SUS), a cranioplastia foi realizada no HC de Botucatu, hospital universitário vinculado à Secretaria de Estado da Saúde, que oferece atendimento gratuito à população.

Tridimensional

A cirurgia consistiu em implantar uma peça de acrílico tridimensional no crânio do paciente. Desenvolvido sob medida, o biomaterial teve como origem imagens contidas em duas tomografias remetidas pelo professor Palhares para o Centro Avançado de Desenvolvimento de Produtos (Cadep). Especializada em impressão tridimensional (3D) e prototipagem rápida, a unidade especial da Unesp é vinculada à Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação de Bauru (Faac-Unesp).

Responsável pelo Cadep, o professor Osmar Rodrigues, do Departamento de Design da Faac, explica que a peça de acrílico é segura, resistente e compatível com os tecidos do organismo, sem risco de rejeição. Sua confecção exigiu oito dias de trabalho e foi projetada com uma folga proposital de dois milímetros – espaço considerado suficiente para a instalação do implante e possibilitar o crescimento da caixa craniana da criança.

Monitoramento

Responsável geral pelo projeto, o pesquisador Palhares explica que o garoto já recebeu alta hospitalar. Observa, contudo, que ele seguirá sob acompanhamento médico permanente até a adolescência, quando terá seu quadro clínico reavaliado por completo.

Especialista em cirurgia plástica, Palhares informa que a cranioplastia não é técnica médica inédita no País. Destaca, entretanto, o pioneirismo e o protagonismo da Unesp ao solucionar, internamente, uma demanda específica de alta complexidade. Sobre o paciente, explica o motivo do trauma: a queda de uma laje de três metros de altura, cujo impacto da batida provocou grave traumatismo e levou à perda de tecido ósseo, abrindo fenda de 10 cm por 13 cm de área na cabeça do menino.

Fila do implante

Há quatro anos aguardando a cirurgia, a criança encabeçava lista com mais de 50 pacientes com diferentes traumas à espera de um implante ósseo sob medida. A cirurgia possibilitou reconstituir o tecido ósseo perdido, recuperar a forma e aspecto originais do crânio e assegurar proteção mecânica e física ao cérebro e demais órgãos interligados.

“Esse caso abre nova ‘janela’ científica para a pesquisa nacional”, comenta o pesquisador da FMB-Unesp. “Exigiu abordagem multidisciplinar e inovadora, integrando áreas distintas da universidade, como neurologia, cirurgia plástica e o design tridimensional da peça. Demonstrou, na prática, a importância do investimento em recursos humanos, científico e tecnológico no Estado de São Paulo e no País”, destaca Palhares.


Inovação em design

Os profissionais do Centro Avançado de Desenvolvimento de Produtos (Cadep) mantêm diversos projetos nas mais variadas áreas do design. O centro foi inaugurado em 2012 e sua sede e maquinários especializados funcionam em instalações próprias da Faac, em Bauru, cujos laboratórios atendem a pesquisas conjuntas de graduação e pós-graduação da Unesp e de outras instituições científicas.

O Cadep atende também a empresas, preservando os segredos industriais. Os setores já contemplados são o automotivo, metalúrgico, moveleiro, eletroeletrônico, brinquedos, miniaturas e plásticos, entre outros. O professor Osmar Rodrigues, coordenador do Cadep, conta que a primeira incursão do centro na área da biologia foi em 2013.

Na época, o desafio proposto à sua equipe de cinco pesquisadores bolsistas foi projetar e construir, em resina biocompatível, a parte superior do bico de um tucano (foto). Bem-sucedida, a peça implantada repôs o pedaço original do bico da ave, que fora dilacerado por uma mordida de cachorro e prejudicava na alimentação e deglutição.

Novas frentes

A experiência na área veterinária abriu espaço para o desenvolvimento da peça para a cranioplastia realizada em Botucatu. Na avaliação de Rodrigues, a operação é promissora. Especialista em design, ele visualiza, agora, como desdobramento natural do trabalho, atender os demais pacientes que seguem na fila de espera de implantes do HC-FMB.

“Há também diversas possibilidades, como fornecer materiais odontológicos, pinos e implantes. Hoje, a modelagem 3D é mais precisa e mais barata do que a manual”, observa. “As tecnologias de prototipagem, modelagem e impressão tridimensional (3D) seguem disponíveis em diversos centros de pesquisa pelo mundo. Mas o grande diferencial do Cadep é mesclar a experiência adquirida na manipulação de diversos materiais e equipamentos com as técnicas mais recentes”, revela.

Serviço

Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB)
Hospital das Clínicas de Botucatu (HC-FMB)
Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação (Faac)
Centro Avançado de Desenvolvimento de Produtos (Cadep-Faac)

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente na página IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 05/09/2015. (PDF)