IPT indica novos caminhos para os resíduos sólidos urbanos

Projeto-piloto em Bertioga avalia opções para a prefeitura tratar e reciclar o lixo doméstico e prover sua destinação ambiental correta

Convênio firmado em dezembro entre o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), vinculado à Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado, e a prefeitura de Bertioga, cria alternativas para se desenvolver, em âmbito municipal, uma plataforma tecnológica inédita no tratamento de resíduos sólidos urbanos (RSU).

Chamados genericamente de lixo, os resíduos sólidos representam um conjunto de materiais orgânicos e embalagens provenientes de residências, como, por exemplo, papel higiênico, restos de comida e dejetos. A lista inclui também galhos e folhas de árvores recolhidos após a varrição e limpeza das ruas; sobras dos chamados grandes geradores (supermercados, feiras e sacolões), cujo descarte principal são alimentos fora do prazo de validade; e, por fim, rejeitos, como fraldas e absorventes, que têm como destino o aterro sanitário.

Multidisciplinar e pioneira no País, a iniciativa da secretaria, por meio do IPT em Bertioga, segue as diretrizes da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) – Lei federal nº 12.305/2010, cujo objetivo é regulamentar e padronizar procedimentos de descartes de resíduo industrial, doméstico, da área de saúde, eletroeletrônico, etc. O objetivo é melhorar a saúde e a qualidade de vida da população, fortalecendo ações de saneamento básico e de educação ambiental e, ainda, diminuir custos com a disposição final dos resíduos.

Tecnologias

A PNRS é um dos alicerces do Plano Nacional de Saneamento Básico (Lei nº 11.445/2007) e suas proposições incluem, entre outras ações governamentais, a adoção e execução nos Estados e municípios brasileiros de serviços, como abastecimento de água, tratamento de esgoto, limpeza urbana e drenagem de águas das chuvas.

Em Bertioga, o projeto do IPT irá identificar e indicar as tecnologias mais baratas e eficazes para tratar os resíduos. O trabalho considera questões locais, técnicas, econômicas e ambientais e, quando for concluído, apresentará relatório para a prefeitura com as opções de metodologias integradas para reciclagem, pré-tratamento, biodigestão (com micro-organismos) e tratamento térmico dos resíduos sólidos urbanos.

Coordenado pela pesquisadora doutora Cláudia Echevenguá Teixeira, do Laboratório de Resíduos e Áreas Contaminadas do IPT (ver serviço), o trabalho integra 50 profissionais em atividades de campo, ensaios e análises técnicas. A equipe é formada por pesquisadores, técnicos, bolsistas, colaboradores e pessoal de apoio e administrativo de seis laboratórios do instituto: Análises Químicas; Biotecnologia Industrial; Combustíveis e Lubrificantes; Engenharia Térmica; Processos Metalúrgicos e Recursos Hídricos; e Avaliação Geoambiental.

Composição

O estudo irá pesquisar meios para ampliar a coleta seletiva e a reciclagem (de vidro, papelão, ferro, papel, alumínio e plásticos), avaliar estratégias para diminuir a massa e o volume do material coletado e identificar opções de destinação ambiental correta para diferentes tipos de resíduos.

“Em média, cada cidadão gera diariamente cerca de um quilo de lixo – matéria-prima complexa e heterogênea, cuja composição varia muito em função dos hábitos de consumo da população e das estações do ano”, explica Cláudia.

Na Baixada Santista, cerca de 50% do lixo coletado é orgânico. Essa característica, informa a pesquisadora, abre a possibilidade de geração de biogás a partir da decomposição anaeróbia do material. Rico em metano, esse biocombustível gasoso pode ser queimado para obtenção de calor ou de eletricidade no ambiente doméstico, automotivo ou industrial.

Bertioga, cidade de 55 mil habitantes, foi a selecionada para abrigar o projeto por ter sistema de coleta seletiva e infraestrutura favoráveis à pesquisa, como o Centro de Gerenciamento e Beneficiamento de Resíduos da prefeitura, inaugurado em maio do ano passado. Atualmente, o município gera 2,1 mil toneladas de resíduos sólidos mensais. No entanto, na alta temporada (de dezembro a fevereiro), este volume aumenta até oito vezes por causa da população flutuante.

Processamento

Como a maioria das cidades da Baixada, Bertioga é impactada pelo lixo urbano e tem no turismo uma atividade econômica fundamental. Assim como os municípios vizinhos, Bertioga também abriga trechos de mata atlântica em diversos parques estaduais – todos gerenciados pela Fundação Florestal, ligada à Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo.

Localizado fora do perímetro urbano, no quilômetro 227 da Rodovia Manoel Hipólito do Rego (SP-55 – Rodovia Rio-Santos), o Centro de Gerenciamento e Beneficiamento de Resíduos tem por função o transbordo (recepção, separação e compactação) dos resíduos, que não permanecem mais que 24 horas no local.

Para avaliar todos os processos relacionados ao projeto, o IPT montou duas bases de operações em Bertioga: uma na Secretaria Municipal do Meio Ambiente, na região central da cidade, e outra no posto municipal de Gerenciamento e Beneficiamento de Resíduos. Na primeira, o instituto atua em conjunto com os representantes da prefeitura; e, na segunda, os pesquisadores acompanham e monitoram todas as atividades e etapas do processamento do lixo.

A operação no Centro de Gerenciamento começa com a pesagem dos caminhões vindos de todos os bairros da cidade. Na sequência, o lixo é descarregado e compactado para reduzir seu volume. No local, 21 trabalhadores da Cooperativa de Triagem de Sucata União de Bertioga, conveniada com a prefeitura, separam itens da coleta seletiva de recicláveis para revender.

Por ser considerado insalubre pela Norma Regulamentadora nº 15 do Ministério do Trabalho e Previdência Social, o lixo convencional, sem separação de materiais, não pode ser manipulado e segue para o aterro sanitário Sítio das Neves, em Santos. Esse local tem capacidade de armazenamento prevista para se esgotar nos próximos anos – e assim amplia a relevância do projeto-piloto em Bertioga.


As três fases do projeto multidisciplinar e pioneiro

O projeto-piloto do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), para tratamento de resíduos sólidos urbanos (RSU) no município de Bertioga, está dividido em três etapas e teve como um dos pontos de partida uma chamada pública realizada pelo IPT em novembro.

Direcionada a empresas especializadas em tratamento de resíduos sólidos, a convocação atraiu representantes de 30 organizações – a maioria brasileiras. Permitiu aos pesquisadores do instituto conhecer as soluções mais atuais para tratar o lixo doméstico em diferentes escalas e proporções, incluindo maquinários e processos.

A fase inicial, de três meses, foi finalizada em março. Compreendeu a criação de um projeto de planta para avaliar e mapear opções de rotas tecnológicas disponíveis, saber mais sobre a população local e, ainda, definir escala de instalação, layout das unidades e determinar prazos e custos das plantas industriais para destinação dos resíduos.

Plataforma

Iniciada em abril, a segunda fase tem duração prevista de 15 meses. Abrange a montagem e o desenvolvimento da planta, elaboração de memorial descritivo e contratação de fornecedores de máquinas e equipamentos. Além das instalações, será criado protocolo de coleta de amostras de resíduos, tendo a população como fonte de informação em diversas atividades e, ainda, dará início às operações das unidades de tratamento de resíduos e aos testes de monitoramento.

A etapa final terá seis meses de duração e vai pôr em prática a plataforma tecnológica desenvolvida pelo IPT, com operação, monitoramento e avaliação das atividades da planta industrial instalada em Bertioga.

A pesquisadora doutora Cláudia Echevenguá Teixeira, do IPT, ressalta que, além do apelo ambiental, tratar os resíduos ajuda a prevenir doenças na população e diminui a proliferação de diversos insetos e animais atraídos pelo lixo. Segundo ela, no encerramento do projeto, de 24 meses de duração, no final de 2017, a prefeitura da cidade de Bertioga poderá decidir, amparada em critérios técnicos e laboratoriais, quais decisões quer tomar em relação aos resíduos urbanos.

“Na maioria dos municípios brasileiros, o tema lixo é complexo, exige custos variados e abrange questões regionais, além de diversos aspectos inter-relacionados. Assim, a estratégia adotada pelo IPT foi propor uma abordagem integrada e multidisciplinar para este desafio”, explica a pesquisadora.

Passo a passo

O projeto tem investimento de R$ 9,5 milhões da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado e prevê a capacitação de técnicos municipais em tratamento de resíduos, além de apoiar a instalação e o monitoramento dos sistemas. Em contrapartida, a prefeitura de Bertioga oferece apoio logístico e operacional e faz a intermediação entre a população e os pesquisadores do IPT.

Atualmente, a pesquisa em Bertioga é focada em área da região central do município, onde vivem 2,5 mil pessoas (5% da população). O passo seguinte será adaptar e replicar a tecnologia desenvolvida nos outros bairros da cidade para, futuramente, estendê-la a outros municípios da Baixada Santista e demais regiões do Estado e do País.

Responsável pelos trabalhos de campo no Centro de Gerenciamento e Beneficiamento de Resíduos, a pesquisadora do Laboratório de Resíduos e Áreas Contaminadas, Fernanda Manéo, atua com três colegas do IPT no local: o gestor ambiental autônomo Daniel Leite e os técnicos Reginaldo Cruz e Jozias da Cruz.

Fernanda explica que a coleta de amostras de resíduos sólidos em Bertioga é baseada na Norma Brasileira ABNT NBR 10007:2004, de referência sobre o tema. O trabalho começa com a separação de uma parte do material despejado pelos caminhões de lixo para as pesquisas, sendo averiguadas apenas as amostras de material proveniente da região central, objeto inicial do estudo.

Balizas

A coleta considera aspectos como o horário do descarte feito pela população, a data e a estação do ano, entre outras variáveis. O objetivo, informam Fernanda e Daniel, é obter amostras representativas da composição média dos materiais jogados no lixo, para se definir as tendências e padrões gerais do descarte.

Uma das estratégias adotadas é misturar, novamente, em um tambor plástico de 200 litros o material coletado, para, depois, na etapa seguinte, abrir os sacos de lixo selecionados em uma lona, estendida no chão e separar, analisar, classificar e pesar o material. As informações apuradas balizarão as próximas fases do projeto.

O engenheiro Fernando Poyatos e o tecnólogo ambiental Adriano Baião, ambos da Secretaria do Meio Ambiente de Bertioga, destacam a possibilidade de elaborar, a partir do trabalho do IPT, um plano tangível e racional para os resíduos sólidos. “Além de prover destinação ambiental correta para o lixo doméstico, há também a possibilidade de geração de energia a partir dele”, analisam.

Os dois observam que a experiência está sendo um grande aprendizado para todos: munícipes, poder público e trabalhadores que atuam na reciclagem. Para o futuro, a meta é instalar uma incubadora de empresas especializadas em prestar serviços na área ambiental. “Já temos um espaço reservado para essa finalidade no Centro de Gerenciamento e Beneficiamento de Resíduos”, revelam.

Reciclagem

Clóvis dos Santos, presidente da Cooperativa de Triagem de Sucata União de Bertioga, fundada em 2010, é um dos mais entusiasmados com a parceria IPT/prefeitura. Segundo ele, em três meses o projeto ajudou a orientar o grupo em diversas questões e aumentou a conscientização dos munícipes sobre a necessidade de separar resíduos orgânicos dos recicláveis antes do descarte.

“Em março, mesmo com o fim da alta temporada no litoral, dobramos o volume diário de itens recicláveis vendidos em comparação com janeiro”, revelou. Outra notícia favorável foi a renovação, em fevereiro, do convênio da cooperativa com o município até 2021. Esse acordo paga aos trabalhadores pelo serviço de reciclagem dos materiais e os premia com valores adicionais quando atingem metas – estratégia para ampliar a reciclagem, a renda e o emprego deles, que têm como base a revenda do material reciclável.

O aumento na renda permitiu ao grupo deslocar Renilza da Silva da esteira de separação de materiais para a cozinha dos trabalhadores no Centro de Gerenciamento. “Gostaram do meu tempero, não me deixaram voltar mais”, conta a recicladora, orgulhosa com a nova função.

Serviço

Laboratório de Resíduos e Áreas Contaminadas do IPT
E-mail rsuenergia@ipt.br
Telefone (11) 3767-4251

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente nas páginas II e III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 12/04/2016. (PDF)

Unesp cria película para uso em telas planas

Produzido com bactérias e óleo de mamona, biomaterial de baixo custo desenvolvido pelo Instituto de Química de Araraquara é flexível, resistente e sustentável e pode ser alternativa ao vidro

Uma pesquisa do Laboratório de Materiais Fotônicos do Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista (IQ-Unesp), câmpus de Araraquara, pode representar no futuro uma alternativa às atuais telas planas de vidro usadas em celulares, tablets e televisores. O biomaterial desenvolvido é uma película produzida a partir de óleo de mamona, fonte de biomassa abundante no Brasil, e da celulose proveniente de culturas da bactéria Gluconacetobacter xylinus.

Segundo o químico Hernane Barud, um dos participantes da pesquisa, a tecnologia traz diversas vantagens na comparação com o vidro, cuja origem é a sílica, composto inorgânico encontrado na areia, que impacta o meio ambiente em seus processos de produção e de descarte. Patenteada em âmbito nacional, a película criada em Araraquara é obtida por meio de um processo “verde” e sustentável – usa celulose produzida em laboratório proveniente de fontes naturais.

A nova tecnologia dispensa o corte de árvores e a necessidade de separar a celulose de outras substâncias como a lignina e a hemicelulose, impurezas que precisam ser removidas. Barud explica que o único tratamento exigido para originar uma matéria-prima flexível, resistente e parecida com um plástico é a eliminação das bactérias depois da produção da película.

Descarte correto

Uma das vantagens é o fato de a celulose se decompor na natureza em menos de um ano e ainda colaborar para a adubação do solo, ao passo que o vidro exige descarte ambiental específico e centenas de anos para se decompor.

A película também pode ser produzida por outras fontes de carbono capazes de fornecer a glicose necessária para alimentar os micro-organismos. Já foram testados com sucesso o melaço de cana e a goma de caju, dois resíduos agroindustriais baratos, abundantes e ricos em açúcares.

O pesquisador conta que o estudo começou em 2004. Na época, uma empresa nacional solicitou ao IQ-Unesp a caracterização de um biofilme produzido a partir de mantas de celulose bacteriana. O cliente, atuante na área médica e de biotecnologia, desejava produzir curativos com a espessura de um folha de papel de seda e com propriedades terapêuticas especiais.

Concluído o pedido, o passo seguinte foi produzir, no próprio Laboratório de Materiais Fotônicos, as mantas de celulose. Na visão do grupo de pesquisadores, havia outros usos para esse biomaterial, nas áreas odontológica, de preparação de biossensores e de desenvolvimento de novos curativos, entre outras possibilidades.

Transparência

Em 2009, os cientistas de Araraquara começaram a pesquisar o uso da manta como substrato flexível para displays. A qualidade do material foi considerada satisfatória; no entanto, o composto era opaco e não representava alternativa viável ao vidro.

Entre 2010 e 2015, o desafio foi tornar transparente a celulose obtida. Com isso, o IQ-Unesp passou a fazer parte da corrida tecnológica mundial em busca de telas “orgânicas” para celulares e televisores, eletroeletrônicos com vida útil cada vez menor e a preocupação com os impactos ambientais incluídos em seus processos de produção e de descarte.

Depois de vários experimentos, a solução encontrada pelos cientistas da Unesp foi usar óleo de mamona transformado em poliuretano – processo que conferiu a transparência necessária ao material para substituir o vidro.

Além de colaborador do IQ-Unesp, Barud é docente do programa de Biotecnologia do Centro Universitário de Araraquara (Uniara). Ele conta que o trabalho teve financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado (Fapesp) na modalidade Auxílio à Pesquisa, no valor de R$ 45,7 mil. Atualmente, ele busca parceiros para produzir o biomaterial em escala industrial e estruturar um novo negócio.

No IQ-Unesp, a linha de estudos com a película tem a coordenação dos professores Sidney Ribeiro e Younes Messaddeq e apoio do doutorando Robson Silva e dos doutores Maurício Palmieri e Elaine Rusgus. Participam também do trabalho o cientista Wagner Polito, da Universidade de São Paulo de São Carlos e os doutores Marco Cremona e Vanessa Calil, ambos cientistas da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) do Rio de Janeiro.

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente na página IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 07/01/2016. (PDF)

Unesp de Araraquara orienta alunos para criarem empresas de base tecnológica

Laboratório da universidade é especializado em pesquisas de nanotecnologia e cerâmicas especiais

A criação de novas empresas de base tecnológica no Estado está entre as iniciativas do Laboratório Interdisciplinar de Eletroquímica e Cerâmica (Liec) – parceria entre o Instituto de Química (IQ) da Unesp, campus de Araraquara, e a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). O modelo de negócio é supervisionado pelos professores da universidade e tem como empreendedores alunos de mestrado e doutorado.

O Instituto trabalha com o chamado sistema spin off, tipo de parceria comum nos países europeus, por meio da qual o aluno não perde seu vínculo com a universidade e, ao mesmo tempo, presta serviços nos laboratórios da faculdade. De acordo com seus idealizadores, o sistema traz benefícios para toda a sociedade, como o desenvolvimento regional e a geração de empregos e renda.

O Liec trabalha atualmente com três clientes nesse sistema: Science, Kosmo Science e uma empresa em formação, que apoiará as indústrias do município de Pedreira, com o suporte da prefeitura local.

Um dos focos de estudo do laboratório são as cerâmicas e os compostos produzidos com nanotecnologia, ramo da ciência aplicado ao estudo e manuseio de partículas muito pequenas, da ordem de milionésimos de milímetro.

A proposta é miniaturizar peças, necessidade tecnológica das indústrias de componentes elétricos, eletrônicos e de informática. Quanto menor e mais pura for a partícula da matéria-prima pesquisada, maior será a sua chance de aplicação na ciência e nos negócios.

Cerâmica especial

O Liec surgiu em 1988 e recebeu investimento inicial de R$ 80 mil da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Conta com 12 pesquisadores, 25 funcionários e 50 alunos, e mantém convênios com instituições de pesquisa de todas as regiões do Brasil.

Atualmente, o laboratório tem 70 contratos assinados de prestação de serviço, 12 dos quais estão em operação. A carteira de clientes inclui a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), White Martins, Indústria Brasileira de Artigos Refratários (Ibar), Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM) e o Sindicato de Cerâmica Artística de Porto Ferreira. No total, conseguiu US$ 97 milhões em rendimento e obteve o registro de 13 novas patentes com a CSN.

Uma cerâmica especial projetada no Liec/Science tem propriedades solicitadas pela indústria – é bactericida, possui grande abrasão, dureza, durabilidade e não enferruja. O segredo está na preparação do aço, que recebe tratamento especial e é oxidado artificialmente com titânio, o que antecipa em laboratório a oxidação que ocorreria naturalmente com o uso. Assim, torna-se ideal para revestir pinças e bisturis, recobrir eletrodomésticos de linha branca (fogões e geladeiras que não amarelam com o tempo) e ser a base de louças baratas e consistentes utilizadas pela cerâmica artística.

Outra destinação estratégica para as cerâmicas é a utilização como combustível alternativo para produzir energia elétrica, a partir do uso do hidrogênio. Este será utilizado em células cerâmicas de alto desempenho. A tecnologia permite a geração de energia para alimentar condomínios, hospitais, veículos, celulares, notebooks e máquinas fotográficas.

Limpeza de altos-fornos

A Science Solution é uma empresa sediada em São Carlos que pertence ao ex-aluno do IQ-Unesp Luiz Gustavo Simões e seus dois sócios. Funciona no sistema spin off e concebeu filme especial à base de aço, para revestir as paredes de tubos utilizados na indústria petroquímica, que facilita a limpeza interna das tubulações. A aplicação pode prolongar de 40 para 100 dias o tempo entre as interrupções do serviço para manutenção, sendo que cada dia de paralisação do sistema custa aproximadamente US$ 1 milhão. O sistema desenvolvido pela Science já proporcionou economia de US$ 2 milhões anuais.

Sob medida

Simões conta que, em um ano de existência, conseguiu o retorno do investimento feito na abertura da empresa. Além disso, está providenciando orçamentos para clientes interessados em suas resinas cerâmicas, para recobrir brocas odontológicas. Outro pedido é de um fabricante suíço de relógios de pulso, que deseja um vidro à prova de riscos e também componentes internos que não oxidem.

Pedreira, cidade localizada na região central do Estado, é um dos principais polos de produção de cerâmica artística do País. Um contrato spin off entre a Unesp e a prefeitura local possibilitou a instalação de um núcleo local do Liec para prestar consultoria e trazer inovação em processos e produtos dos 24 fabricantes locais. A medida procura responder aos concorrentes chineses, presentes no mercado nacional com preços competitivos e itens de qualidade.

O professor Élson Longo, do Liec, explica que há rica troca de experiências entre os alunos empreendedores e seus professores. “Esse modelo abre grandes perspectivas para a universidade pública, que passa a ser parceira do desenvolvimento nacional e consegue também formar e atrair profissionais qualificados para trabalhar nos laboratórios acadêmicos e em suas empresas de tecnologia”, destaca.

Outro aspecto positivo é o aporte de recursos proveniente da prestação de serviços à indústria. A receita é reinvestida no Liec para comprar novos equipamentos, manter os atuais e pagar o salário dos técnicos especializados. Para as grandes empresas, surge a possibilidade de encomendar com os professores o desenvolvimento de materiais sob medida, do ponto de vista físico, químico e mecânico.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente na página II do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 24/08/2005. (PDF)