Laptop de US$ 100 promete causar uma revolução na educação no Brasil

Pesquisadores da USP mantêm projeto piloto usando o computador portátil em escola pública da capital, com 1,2 mil alunos

Promover a inclusão digital e revolucionar a educação nos países pobres. Essa é a proposta da organização não-governamental One Laptop Per Child (OLPC), que pretende repassar computadores portáteis para um bilhão de estudantes e professores no mundo todo. No Brasil, os responsáveis pelo projeto mantêm experiências com os protótipos do notebook em São Paulo, Porto Alegre, Brasília, Piraí (RJ) e Palmas, no Tocantins.

Em São Paulo, o estudo é realizado pelos pesquisadores do Laboratório de Sistemas Integráveis (LSI) da Escola Politécnica da USP. Desde o início do ano o grupo mantém projeto piloto com os alunos e professores da Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Ernani Silva Bruno, do bairro de Parada de Taipas, zona norte da capital.

Roseli de Deus Lopes, professora de Sistemas Eletrônicos da Escola Politécnica e pesquisadora do LSI, observa que baixo custo e uso simplificado não significam que o laptop em experiência seja um produto de qualidade inferior. Ela destaca o grande esforço da comunidade científica internacional para criar soluções capazes de reduzir o custo do computador até o patamar dos US$ 100.

Tecnologia e menos custo

Em São Paulo e Porto Alegre estão sendo usados 275 laptops do modelo XO doados pela OLPC. Em breve, cada escola das duas capitais receberá mais cem computadores. Em Palmas e Piraí, cada estabelecimento de ensino recebeu 400 protótipos doados pela Intel; e em Brasília serão testados 40 notebooks do modelo Móbilis, doados pela empresa indiana Encore.

“O avanço tecnológico e a produção em grande escala permitem hoje a fabricação de protótipos por US$ 175. O preço acessível é a estratégia adotada pela OLPC para permitir aos governos dos países pobres comprar os laptops”, explica.

Inovação e segurança

A professora Roseli observa que o uso do notebook amplia o repertório do aluno e potencializa seu processo educacional e de integração com os colegas, professores, família e comunidade. A ferramenta permite redigir textos, acessar a internet em redes sem fio, filmar, desenhar, brincar e fotografar, entre as possibilidades já conhecidas.

“Mesmo sem ter computador em casa, a criança sabe o que é o endereço de um site e um e-mail. Muitas vezes, troca o dinheiro da condução para frequentar lan houses. Porém, nesse ambiente não há supervisão de pais e professores e o estudante fica vulnerável a conteúdos impróprios. É papel da escola fornecer orientação e prevenir o mau uso do recurso”, salienta Roseli.

“O sucesso no emprego de novas tecnologias depende da capacitação do professor. Ele precisa entender o que atrai o aluno nos sites de relacionamento, no jogo em rede e no comunicador on-line e filtrar os conteúdos relevantes. Então, se houver necessidade, adaptar a ferramenta eletrônica para a prática pedagógica tradicional”, completa.

Proposta inovadora

Um exemplo a ser seguido é o que vem do Uruguai, aponta Roseli. Lá, os testes com o laptop começaram este ano, em Montevidéu. O Uruguai tem 600 mil estudantes do nível fundamental nas redes pública e privada e pretende, nos próximos cinco anos, distribuir um computador portátil para cada aluno. Sobre o Brasil, Roseli afirma que o desafio da inclusão digital é muito maior, por causa do tamanho, da dimensão e das desigualdades sociais. Lembra, porém, que pode ser concretizado em menos de dez anos.

“Temos 55 milhões de estudantes e professores para atender e vários fatores favoráveis: a universalização do ensino básico, a cultura e o engajamento no software livre, o comprometimento do poder público e a capacidade de montar e em breve fabricar equipamentos como esses laptops no País. Mesmo que a doação não seja possível, um financiamento com valores compatíveis nas lojas levará o equipamento básico para todos os alunos brasileiros”, acredita.

Tecnologia nacional

Uma das missões da cientista de computação Irene Ficheman é supervisionar o uso do laptop na escola. Ela recebe sugestões dos alunos e professores e propõe, a partir das informações recebidas, novas opções de uso pedagógico do recurso. Participa também do desenvolvimento de programas de computador, como o de desenho e o de educação musical.

“Em uma atividade na sala de aula, cada aluno redigia no caderno uma poesia e depois a digitava no computador. Sugeri mudar o exercício: cada um faria um trecho do texto e todos participariam. Reforcei, assim, o caráter colaborativo do projeto, uma estratégia de produção de saber universal e de qualidade, nos moldes da Wikipedia, a enciclopédia livre da internet”, exemplifica.

Irene explica que os programas instalados no laptop são diferentes dos vendidos para uso em escritório, embora ofereçam funções parecidas com as dos softwares comerciais, como redigir textos, fazer desenhos e usar gráficos e planilhas. “Esta iniciativa melhora o conhecimento de informática do estudante e o aproxima dos programas exigidos por empresas para contratar profissionais”, finaliza.


Como é o laptop

O equipamento é seguro, flexível e leve (1,5 quilo). Não usa materiais tóxicos e o pacote básico de aplicativos instalado tem somente programas de computador de código livre (open source) desenvolvidos especialmente para ele. Essa é uma das diretrizes adotadas pela OLPC na formatação do projeto.

Os componentes internos (hardware) e os programas (software) são atualizados periodicamente pela comunidade científica internacional. A configuração padrão de aplicativos inclui navegador, editor de texto, de desenho, reprodutor multimídia, leitor de livros eletrônicos e jogos educativos de português, matemática e arte musical.

O portátil de US$ 100 supera modelos convencionais em questões como mobilidade, design, ergonomia e usabilidade, tamanho, segurança, peso e resistência contra quedas. A tela é um destaque: tem mais linhas de resolução e é projetada para economizar a energia da bateria quando usada em locais abertos.

O sistema operacional é o Fedora, com uma versão enxuta do Linux. Sobre ele foi desenvolvido um ambiente denominado Sugar, que reproduz a integração da criança na sociedade e organiza o conteúdo a partir de quatro aspectos hierárquicos. A primeira noção é individual, a segunda consiste em compartilhar experiências em sala de aula com os colegas e o professor. A terceira congrega familiares e vizinhos e a última orienta a relação do estudante com o mundo.


Escola do futuro

Desde a chegada dos laptops, a comunidade da Emef Ernani Silva Bruno nunca mais foi a mesma. Tudo começou quando o professor Jorge Ferreira Franco notou desinteresse dos alunos pelo estudo do inglês. Segundo ele, os alunos achavam desnecessário aprender uma língua estrangeira, mas se interessavam pela internet, MSN, Orkut e jogos eletrônicos.

Para motivá-los, Franco estruturou o laboratório de informática e criou atividades com o computador e tecnologias da Internet para diversas disciplinas. Há três anos, liderou um grupo da escola que participou de uma oficina na Feira Brasileira de Ciências e Engenharia (Febrace).

Na oportunidade, conheceu e aproximou-se da equipe do LSI. Na escolha da escola para o projeto piloto do uso do laptop no Estado, pesou o envolvimento da comunidade com as atividades ali realizadas, a baixa rotatividade de professores e a disposição coletiva em oferecer ensino de qualidade.

Fazendo a diferença

Franco contribui com o treinamento dos 60 professores e 35 alunos monitores para trabalhar com os 275 notebooks cedidos à escola. Seu esforço individual soma-se a um processo de mudança coletiva de rumos e mentalidades na escola, que vem sendo ampliado há quatro anos com a vinda de um novo diretor.

No LSI, Franco cursa doutorado e pesquisa o emprego de novas tecnologias na educação e explica por que: “Na era da informação, o conhecimento só tem sentido se puder ser compartilhado e promover a inclusão social”.

O sucesso da experiência piloto despertou o interesse de muitas famílias em matricular seus filhos na escola. A escola fica na periferia, próxima a mais duas escolas públicas. Outro fator foi o surgimento do aluno monitor, um serviço voluntário realizado em esquema de revezamento antes e depois do horário de aula.

Esse monitor oferece suporte técnico para os professores nas atividades com os laptops. O primeiro deles foi Wilson Roberto, de 14 anos. Bem-sucedido na tarefa, hoje orienta os demais monitores. Com a informática, diminuiu a timidez, fez novos amigos e obteve reconhecimento. “Fico agora mais tempo na escola e estou com novos projetos. Entre eles, a criação de um site para o proprietário de uma loja de vidros da Cohab Brasilândia”, explica.

Uso pedagógico

Um ponto positivo notado pela professora Edna de Aquino foi o aumento da frequência e das médias escolares. “De acordo com o conteúdo da aula, posso usar sites como Turma da Mônica, Menino Maluquinho e Racha a Cuca, uma homepage indicada pelos monitores que possui ótimos enigmas matemáticos”, explica. “Porém muitas atividades são feitas sem o computador. O uso é racional”, ressalva.

Edna Telles, coordenadora pedagógica, afirma que há sempre aprimoramento do uso do computador na escola. Uma das técnicas empregadas é dividir a classe em grupos de alunos e usar um correio eletrônico gratuito e compartilhado para a troca de mensagens entre colegas e com a professora.

“É possível sempre inovar no uso do computador. O LSI nos dá sugestões e há espaço para alunos e professores proporem atividades. Em uma visita à Estação Ciência da USP, um grupo de estudantes produziu vídeos e fotos com a webcam do laptop. O conteúdo foi depois compartilhado com quem não pôde ir”, lembra a coordenadora.

Uso aprovado

Os alunos Ágata Santos, Igor Silva, Gabriel Passarelli e Mariane Duarte aprovaram a novidade. Para eles, a aula com o computador é a mais esperada do dia. “Pena que dura só uma hora. O mais legal é ter a companhia dos colegas para fazer as atividades”, contam.

Edna explica que muitos tinham dificuldade de leitura e escrita e com o uso do e-mail. Perceberam, na prática, que a mensagem enviada só chega ao destinatário se o endereço for digitado corretamente.

Nessa fase do projeto ainda não há um laptop disponível para cada um dos 1,2 mil alunos. A solução, explica Edna, foi fazer um planejamento de uso e oferecer o computador para todos.

“Foi interessante. Cada estudante criou o hábito de colocar uma etiqueta com seu nome e sempre recarregar o aparelho para o colega da próxima turma. Quando chegarem unidades adicionais, o aluno ficará em definitivo com o computador e poderá levá-lo para casa e interagir com familiares e vizinhos, em vez de deixá-lo guardado na escola”, prevê.

O laptop provocou mudanças também na configuração dos móveis. Cada carteira teve instalada uma tomada para recarga de energia. E um carrinho especial foi desenvolvido pelo LSI para transportar e guardar os computadores com segurança.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas II e III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 12/09/2007. (PDF)

TV Cultura se prepara para ingressar na era da transmissão digital

Primeiros equipamentos já chegaram e em breve serão feitas as primeiras gravações no novo sistema, com programas culturais

O dia 2 de dezembro de 2007 promete entrar para a história. Nesse domingo será realizada a primeira transmissão aberta em rede nacional da TV digital. A migração de um sistema para o outro será lenta, só estará completa em 2017, quando todas as transmissões televisivas serão digitais. No Estado de São Paulo poderá haver até 45 canais com recepção gratuita.

No início de 2006 a TV Cultura destinou US$ 5,5 milhões para a aquisição de equipamentos de vídeo digitais. Parte desse recurso foi usada na compra de 13 câmeras digitais, quatro das quais estão em operação na produção televisiva. O próximo passo será investir mais US$ 8 milhões para adquirir um transmissor digital, uma antena e adaptar a torre de transmissão.

A imagem digital tem mais definição e nitidez que a analógica, explica o engenheiro José Chaves Oliveira, diretor técnico operacional da emissora. Na nova produção, mudam a iluminação, o cenário, o figurino e a maquiagem. Contudo, a captação de áudio e a operação de câmera continuam as mesmas. “Na verdade, a migração para o digital já começou. O programa Cocoricó já é filmado com câmera de alta definição, porém a exibição continua analógica”, afirma.

O diretor explica que a prioridade atual da emissora é finalizar a montagem da primeira unidade móvel (carro) de produção digital. Ela permitirá a gravação de concertos da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp) e de musicais como o Ensaio e o Bem Brasil. “Esses programas têm prioridade na programação. A produção é rápida e podem ser convertidos em DVD”, informa.

Apelo educacional

Desde o início a emissora mantém convênio com instituições de ensino superior, visando a desenvolver programas interativos para aproveitar esse recurso digital na formação artística, cultural e educacional do telespectador. “Ainda não foi criada nenhuma ferramenta com essa finalidade específica. Porém, depois de finalizado o primeiro aplicativo, a ideia é adaptá-lo para uso na grade da programação”, explica.

José Chaves prevê grandes oportunidades de educação com a TV digital, como cursos on-line de reciclagem para professores e alfabetização de adultos por meio de videoconferência. “Estudamos parcerias com outras entidades do Estado e secretarias para divulgar conteúdos ligados à cidadania, à informação e à cultura. Outro viés é oferecer serviços públicos eletrônicos: certificação digital, vendida pela Imprensa Oficial, e talvez uma versão do Poupatempo com acesso via terminal, dispensando o uso do computador”, prevê.

Desde o anúncio da chegada do sistema digital a TV Cultura tem investido na capacitação dos seus recursos humanos. “As equipes técnicas operam os novos métodos sem dificuldade. A emissora também desenvolveu projeto de arquitetura exclusivo para acomodar o sistema de edição digital. É um conjunto de salas especiais, iluminadas, com vidro transparente e móveis feitos sob medida, na nossa oficina de marcenaria”, orgulha-se.

Nova imagem

A TV digital é móvel, funciona dentro de veículos e ao ar livre. Tem como característica a convergência de mídias distinta: internet, o cinema e o rádio digital. O sinal aberto será recebido em televisores e em dispositivos portáteis (celulares e notebooks) de última geração. Por ocupar menos espaço de banda que o sistema analógico, permite às emissoras oferecer programação diferenciada em vários canais.

A nova tecnologia elimina chuviscos e fantasmas na recepção e amplia a interatividade do espectador com a emissora. No início, para sintonizar a TV digital aberta, o telespectador (doméstico) usará um equipamento denominado terminal de acesso a serviços públicos, ou set-top-box – nome comercial utilizado pelos fabricantes.

Para receber o sinal digital será preciso conectar o televisor a esse terminal. Prolonga-se, assim, o uso dos atuais televisores, que têm vida útil média de 15 anos. Outra opção para o usuário será comprar uma TV de plasma ou LCD com o receptor do sinal digital embutido.

O terminal de acesso receberá o sinal digital em até 12 bandas de frequência. Se houver obstáculos físicos à transmissão – prédio ou de paredes –, o aparelho usa como alternativa uma das outras bandas disponíveis. Automática, rapidamente sincronizará o som e a imagem, permitindo ao espectador assistir à programação sem interrupção.

Conteúdo exclusivo

O sinal digital já é usado no País em serviços pagos – TV por assinatura, e em pacotes oferecidos por operadoras de celular. Atualmente, a principal dificuldade encontrada pelas emissoras de conteúdo restrito tem sido estabelecer um canal de retorno para receber as respostas e escolhas do espectador enviadas para o programa. Essa conexão ainda é feita pela linha telefônica.

Uma tendência da TV digital é adaptar o controle remoto para ter funções parecidas com as do mouse dos computadores. Por meio dele, o espectador fará escolhas em menus na tela, de acordo com as opções disponíveis pelo programa. Também poderá, no futuro, acessar a internet e usar correio eletrônico.


Relevância pública

Em 1995, o Laboratório de Sistemas Integráveis (LSI) da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) iniciou o estudo da TV digital. O grupo de cientistas coordenou três dos 22 consórcios formados no Brasil para tratar do assunto, nas áreas de codificação de áudio, vídeo e tecnologias com terminais de acesso. Hoje, pesquisa a adaptação do modelo japonês, padrão definido pelo Ministério de Ciência e Tecnologia para ser utilizado no Brasil.

O engenheiro Marcelo Zuffo, do LSI, é um dos participantes no estudo do sistema digital. Segundo ele, há no País 100 milhões de televisores. “O principal desafio para a TV digital no Brasil será assegurar o envio do sinal em um país de dimensões continentais e baratear o custo do terminal de acesso a serviços públicos, hoje calculado em R$ 300, preço elevado para a maioria da população. Acredito que a estréia do sinal aberto derrubará o custo do aparelho”, prevê Marcelo.

Ele vê, também, grandes chances de inclusão social com a nova tecnologia nas áreas de educação e saúde, desde que melhore a distribuição de renda no País e as emissoras ofereçam programação de qualidade. “Uma possibilidade é usar o laptop de US$ 100 para receber conteúdos educativos. Essa iniciativa internacional é coordenada no Brasil pelo LSI e entregará, em breve, um notebook para cada criança dos países pobres do planeta”.


Pioneirismo e parceria

As diretrizes para implementação do sistema digital brasileiro foram definidas pelo governo federal em novembro de 2006. “A regulamentação é resultado do esforço de mais de 500 pesquisadores brasileiros comprometidos em processos de inovação nos consórcios da TV digital. A lei privilegia o interesse nacional em um mercado potencial com números superlativos”, destaca o engenheiro Marcelo Zuffo.

O mercado brasileiro é o quarto maior do mundo para a TV digital. Atualmente o País pesquisa processos de transmissão, produção de equipamentos e formação de pessoal especializado. Sobre a escolha do padrão japonês, Marcelo aprova a robustez, a flexibilidade e a portabilidade, embora, na comparação com os sistemas europeu e norte-americano, ofereça menos interatividade.

Zuffo comenta que o processo de tropicalização da tecnologia surpreendeu seus criadores. “Em algumas questões técnicas, não nos cobraram direitos autorais e propuseram parceria. Um dos exemplos foi a criação de um padrão mundial de radiodifusão, o International Standards on Digital Broadcasting (ISDB)”, explica.

Informa também que o Brasil será pioneiro na utilização do Linux, sistema operacional de uso livre em um terminal de acesso. Adotará o formato de vídeo Mpeg-4 High Definition, inovação capaz de aumentar a compressão de dados e oferecer maior número de canais de uma mesma emissora para o telespectador.

Nas próximas duas décadas, 1,5 bilhão de televisores no mundo migrarão para o digital. “O avanço tecnológico derruba preços, mas é preciso considerar a diferença entre o custo, o valor de produção de um componente e o preço, relativo a quanto um cliente está disposto a desembolsar. Em 2006, um chip utilizado no terminal de acesso saía por US$ 120 – hoje vale US$ 20”, constata Zuffo.


Pessoal especializado

Em abril, o professor João Fernando Gomes de Oliveira, do Departamento de Engenharia de Produção da USP de São Carlos, foi incumbido pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) para estruturar a formação de recursos humanos especializados em TV digital no País.

O objetivo é aprimorar a tecnologia e estimular a inovação no Brasil. Motivar fabricantes de equipamentos, geradores de sinal, emissoras a interagir com os centros nacionais de pesquisa. “Hoje, poucas universidades brasileiras pesquisam o assunto. Temos recurso estatal disponível e um edital pronto para atrair cientistas interessados em projetos de pós-graduação”, afirma Oliveira.

A intenção inicial é atrair cientistas das áreas de engenharia e computação. No segundo momento, congregar também especialistas de tecnologia da informação, mídia e profissionais dispostos a aprender sobre como produzir conteúdo para a TV digital.

“Essa iniciativa da Capes segue as diretrizes do Ministério de Ciência e Tecnologia. Estamos numa corrida contra o tempo e ainda não foi definido o limite de bolsas e projetos que podem vir a ser aprovados. Inclusive há a possibilidade de o pesquisador fazer parcerias com empresas e universidades de outros países e continentes. Por exemplo, no Japão predomina o investimento privado em inovação e tecnologia. Quem quiser, poderá propor associações com fabricantes locais”, destaca Oliveira.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas II e III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 22/08/2007. (PDF)

Caverna Digital da USP comanda estudo da realidade virtual no País

Aplicações incluem telemedicina, prospecção de petróleo em águas profundas e construção de um planetário interativo em 2005

A Caverna Digital da USP é o principal centro de pesquisa e desenvolvimento em realidade virtual (RV) da América Latina. É uma iniciativa do Laboratório de Sistemas Integráveis (LSI) da Escola Politécnica da USP, iniciada em março de 2001 que investe na criação de sistemas interativos e de imersão. Um dos objetivos é transferir o conhecimento adquirido para governos e empresas. As atividades são centralizadas na Cidade Universitária, na capital.

A RV é um conceito vasto e compreende três áreas principais – visualização, computação de alto desempenho e transmissão de dados em alta velocidade. Hoje, ela tem aplicações em telemedicina, TV digital e também em áreas como engenharia (naval, oceânica, mecânica, civil, automobilística e eletrônica), medicina (simulações cirúrgicas, estudos em anatomia), ciências básicas (astronomia, astrofísica, biologia e química), pedagogia (jogos interativos educativos), arquitetura (maquetes virtuais), entretenimento, (roteiros imersivos e interativos e estudos em imagens de alta resolução).

Diferentes segmentos empresariais brasileiros já utilizam e fazem economia com o uso da RV. Indústrias como a aeronáutica, montadoras e de óleo e gás reduzem custos com a produção digital de maquetes virtuais, cujo preço é muito inferior à construção de protótipos reais. Outra vantagem é poder modificar o projeto em qualquer fase de desenvolvimento sem precisar reiniciar todo o processo.

Na área médica, treinamentos cirúrgicos já são realizados com a ajuda de uma interface que simula um bisturi. Além disso, os serviços prestados pela Caverna Digital incluem o auxílio na prospecção e exploração de petróleo em águas profundas pela Petrobras. O centro investe também em educação e, em 2005, colocará em funcionamento um planetário interativo para crianças, que será construído ao lado do Zoológico, na zona sul da capital. A previsão é receber 150 mil visitantes por ano.

Equipe multidisciplinar

O engenheiro eletrônico Marcelo Knörich Zuffo é o cientista responsável pela criação e comando da equipe multidisciplinar de 30 profissionais (pós-graduandos, professores e estagiários) da Caverna Digital. Ele conta que seu gosto pelo estudo de imagens começou no natal de 1982, quando ganhou uma calculadora científica que imprimia gráficos coloridos.

Desde então, Marcelo se especializou no tema e explica que a Caverna Digital teve grande impulso com o desenvolvimento interno de clusters – agrupamentos de computadores de baixo custo e alta capacidade computacional. No arranjo, cada máquina é responsável por projetar simultaneamente as imagens em cada uma das cinco paredes da Caverna Digital. E assim, criar, de modo artificial a sensação de tridimensionalidade. No Brasil, a Caverna Digital é pioneira no desenvolvimento desses sistemas e dispõe de três conjuntos.

O cluster é composto por algumas unidades de computadores, que podem chegar a algumas dezenas. As máquinas funcionam sincronizadas e as projeções simultâneas, associadas aos efeitos sonoros, tornam mais atraentes e interativas as aplicações em RV. Marcelo informa que daqui a dez anos, a meta será disponibilizar um computador para cada pixel, a menor unidade de imagem projetadas na telas do computador.

“Com milhares de máquinas trabalhando juntas, as experiências, serão ainda mais realísticas. Um dos desafios em RV é estimular a interoperabilidade e o uso comum entre os diferentes sistemas de computadores. E também criar filmes que dispensem um sistema operacional para ser executados”, explica.

Transmissor estereoscópico

Marcio Cabral é formado em ciências da computação e gerente de projetos da Caverna Digital. Atualmente está envolvido na construção de um transmissor de vídeo estereoscópico sem fio.

Trata-se de um equipamento que contém um capacete com duas câmeras acopladas – de visão frontal e traseira e mais uma mochila com um computador portátil (laptop) no seu interior. Ao se deslocar, o usuário transmite as imagens capturadas para um outro computador ou ambiente.

“As possibilidades de uso do transmissor são ilimitadas. Abrangem treinamento para portadores de deficiências, conserto à distância de motores e máquinas, uso militar e exploração de áreas perigosas, como campo minados”, conta.

O engenheiro de computação Luciano Pereira Soares é um dos pioneiros da equipe da Caverna Digital. “Trabalhei na Silicon Graphics, empresa multinacional de computação gráfica e vim fazer mestrado na Caverna Digital. Utilizei aqui meus conhecimentos prévios e colaborei na concepção das paredes, salas de máquinas e clusters. Aproveitei ainda as soluções encontradas pela Escola Politécnica da USP para clusters numéricos e adaptei-as para a área de computação gráfica”, conta.

Luciano explica que desenvolver ferramentas educacionais é uma das principais propostas do centro. “O ensino tradicional, restrito à lousa e giz, não tem o mesmo apelo do passado. Para estudar a estrutura do átomo, é mais fácil e instigante assistir a um filme com uma aplicação em RV mostrando para o aluno o seu funcionamento, com cores, animações e interatividade”, comenta.

Um dos desafios para a expansão da RV é desenvolver ferramentas para construir aplicações. “Comprar software é caro e nem sempre o programa corresponde totalmente às expectativas”, explica. O custo dos computadores, baseado em dólar, é outro fator de limitação. “E finalmente, é preciso criar conteúdo brasileiro para os filmes”, salienta.

A mestranda Júlia Benini é estagiária da Caverna Digital e formada em Propaganda pela USP. Trocou empregos anteriores em produtoras de sites, pela possibilidade de se aprofundar na pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias. “Aqui encontro respostas para as pesquisas de viabilidade prática que faço com bolsistas de iniciação cientifica e graduandos. É diferente de locais que colocam o estagiário para somente tirar xerox“, conta.

Rede Kyatera

A Rede Kyatera é um projeto da Fapesp que vai interligar a Caverna Digital com sistemas similares no Brasil e no mundo. Permite a realização de exercícios de imersão e teleimersão à distância – ou seja, gerar e transferir as imagens e sons digitais por meio da internet de alta velocidade e, no outro ponto da rede, repassar a sensação de ilusão para usuários distantes, até mesmo em outros continentes.

O estudo da telepresença é apoiado pela Rede Nacional de Pesquisas (RNP) e é diferente do teletransporte de matéria, brincadeira recorrente no antigo desenho animado dos Jetsons. Marcelo Zuffo conta que esta aplicação já é uma realidade, sendo utilizada por médicos para ensinar outros colegas a realizar procedimentos cirúrgicos delicados.

Vôos panorâmicos

Na Caverna Digital, o visitante pode fazer um vôo panorâmico, como se estivesse em uma asa-delta sobrevoando o Corcovado na cidade do Rio de Janeiro. Se quiser, pode também conhecer todo o campus da USP na capital e, para aprender astronomia, “viajar” pelo Sistema Solar e estudar as estrelas da Via Láctea na Caverna Digital. A experiência é controlada por um joystick, dispositivo de controle igual ao utilizado nos jogos eletrônicos. O computador cria artificialmente as sensações de profundidade, movimento e de imersão”, explica Marcelo.

Para participar da experiência, o visitante coloca óculos especiais e, de meia ou de chinelo, anda e interage com o ambiente, que é revestido por telas especiais que recebem as projeções – são brancas com três metros de altura e três de largura. A luminosidade do local também é calculada e o projeto das salas foi acompanhado por professores de arquitetura da USP. O objetivo é oferecer conforto máximo para os usuários na sala, que tem isolamento acústico também especial.

Fotomontagens

O engenheiro Osvaldo Ramos é especialista em processamento de imagens e conta que o filme tridimensional exibido na Caverna Digital é o resultado de um minucioso trabalho de fotomontagem. As imagens que compõem as cenas são produzidas com uma câmera especial, que fica sob um tripé. Ela captura imagens simultaneamente em 360 graus com doze lentes que, dispostas em círculo, filmam todas as direções e permitem produzir imagens panorâmicas de toda uma área. O passo seguinte é fazer a junção de toda as fotos e transformá-las em um filme único, em um programa de computador que foi desenvolvido pelos cientistas da Caverna Digital.

Osvaldo conta que esta iniciativa teve grande importância para a Petrobras. “Esta aplicação é muito útil na exploração de águas profundas. Permite a um robô afundar e mapear, de modo panorâmico, toda a paisagem submarina. Estas informações são fundamentais para a construção de oleodutos, marinas e plataformas de exploração de petróleo”, explica.

Aplicações infinitas

A RV tem aplicações na construção de robôs e dispositivos capazes de desarmar bombas, evacuar prédios e prestar socorro em situações de emergência. “Uma novidade, é o uso da RV no tratamento de fobias, já realizado em países europeus, como Portugal e França. Um paciente que tenha medo de altura pode ser submetido a um tratamento que utilize a RV no auxílio na superação de seus medos”, conta Marcelo.

Marcelo informa que o esforço dos cientistas em pesquisar a RV colabora com projetos em bens de consumo ergonômicos – eletrodomésticos e dispositivos capazes de se integrar melhor aos movimentos e formas do corpo humano. Um dos maiores desafios é conseguir sincronizar o funcionamento de todos as máquinas envolvidas para criar a sensação de profundidade, que se completa com a projeção simultânea dos computadores nas paredes e com o uso dos óculos especiais.

Parcerias

A lista de parceiros da Caverna Digital inclui empresas como a Itautec, Intel e o Finep, programa de financiamento de estudos e projetos do Ministério da Ciência e Tecnologia.

Informações

Caverna Digital da USP

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas II e III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 20/11/2004. (PDF)