Um dia histórico no IPT

Instituto empossa nova diretoria, inaugura Laboratório de Bionanomanufatura e mostra equipamentos e serviços de alta tecnologia

Um dia histórico no Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT): na segunda-feira, 27 de agosto, o órgão fundado em 1899 e ligado à Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia (SDECT) empossou sua nova diretoria, apresentou o primeiro Laboratório de Bionanomanufatura da América Latina e mais dois serviços pioneiros na pesquisa e suporte à tecnologia renováveis – o simulador solar e o forno de solidificação direcional de silício.

Instalado na Cidade Universitária, o Laboratório de Bionanomanufatura recebeu investimento de R$ 46 milhões. O prédio ocupa 8 mil metros quadrados de área e concentrará processos de biotecnologia, micromanufatura de equipamentos e metrologia. A meta do IPT com os novos serviços é auxiliar empresas de todos os portes com soluções tecnológicas capazes de reduzir o uso da energia, desenvolver novas matérias-primas e preservar o meio ambiente, sem abdicar da competitividade.

As aplicações do Laboratório contemplam tanto as áreas médicas quanto as de segmentos industriais distintos – petróleo e gás, medicamentos, têxtil, cosméticos, química, cerâmicas, siderurgia, papel e celulose, combustíveis e construção civil. Suas pesquisas serão bancadas por três fontes de recursos igualmente divididos: a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), a empresa privada interessada e subvenção governamental.

Simulador solar

Já funcionando no Laboratório de Instalações Prediais e Saneamento, o simulador reproduz a incidência dos raios solares na superfície terrestre. Seu primeiro uso será o de medir a captação de luz e a eficiência energética de coletores solares em sistemas de aquecimento de água. Permitirá, em linhas gerais, obter, em duas horas, respostas que demandariam até dois meses no telhado de uma residência.

A nova instalação teve investimento de R$ 3,5 milhões, sendo 90% do Governo paulista e 10% provenientes do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). O conjunto de luzes e refletores especiais foi importado da Alemanha. O restante, incluindo o projeto e adaptação das instalações, foi desenvolvido internamente pela equipe do pesquisador Douglas Messina, responsável pelo projeto desde a sua concepção, em 2008.

Segundo o pesquisador, o aumento na eficiência da captação solar diminui o consumo de energia elétrica nos sistemas de apoio aos aquecedores. Irá favorecer o desenvolvimento de produtos mais sustentáveis do ponto de vista ambiental.

O simulador contribuirá também em testes com sistemas fotovoltaicos para gerar energia e analisar equipamentos submetidos à influência da luz solar. A construção civil é o primeiro setor da economia nacional atendido, considerando aplicações residenciais, comerciais e industriais. Segundo Douglas, há tendência mundial de crescimento de dispositivos coletores, inclusive no setor industrial, não só para aquecer água, mas também para gerar vapor.

O sistema tem potência de 50 kVA e pode ser colocado em qualquer plano entre zero e 90 graus para reproduzir quaisquer situações de estudo. Opera por meio de software e hardware exclusivos e dispõe de instrumentação específica para gerenciar a vida útil das lâmpadas.

Forno para silício

O forno de cristalização de Silício Grau Solar (SiGS) do IPT é o primeiro a entrar em operação na América Latina. Foi montado para contribuir com o processo de purificação do elemento químico. Sua instalação deu início no Brasil a um modelo alternativo para produzir a matéria-prima, a qual é utilizada na fabricação de coletores solares fotovoltaicos destinados à gerar eletricidade.

O projeto é coordenado pelo pesquisador João Batista Ferreira Neto, do Laboratório de Metalurgia e Materiais Cerâmicos. O equipamento foi adquirido da Alemanha por R$ 1,43 milhão. O recurso integra projeto de R$ 12,5 milhões, sendo R$ 11,6 milhões bancados pelo Fundo Tecnológico (Funtec), do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Os R$ 900 mil restantes foram financiados pela Companhia Ferroligas Minas Gerais (Minasligas) empresa parceira.

A Minasligas pretende produzir silício em escala industrial. Atualmente, no Brasil, o material é exportado e a demanda nacional pelo insumo ainda é incipiente. Segundo João Batista, o projeto tem grande potencial para gerar novos negócios, por dois motivos. O primeiro é o fato de o Brasil ser um dos maiores produtores mundiais de Silício Grau Metalúrgico (SiGM) – e há disponibilidade de matéria-prima para a produção do grau solar. O segundo fator é o crescimento anual de 30% desse mercado mundial.

O silício é usado para produzir ligas metálicas, preparar silicones e na indústria cerâmica. É material semicondutor abundante no planeta, com aplicações nas indústrias eletrônica e microeletrônica. É material básico para produzir transistores para chips, células solares e em diversas variedades de circuitos eletrônicos.

Com o forno, será possível produzir no IPT lingotes de silício que, em seguida, são cortados, proporcionando as lâminas que compõem as placas fotovoltaicas. “Isso permite avaliar o desempenho do material produzido”, afirma João Batista, explicando que essa avaliação é complementar à análise química do silício.

Com o forno em operação, a próxima fase do projeto será avaliar a qualidade do silício produzido para ajustar o processo de purificação. No mercado internacional, o preço do insumo varia de acordo com seu grau de pureza. O quilo do SiGS tem preço de US$ 50, enquanto o grau metalúrgico vale hoje US$ 1,5 por quilo. Isso significa que a nova atividade em gestação no IPT permitirá agregar valor à indústria desse material, que poderá crescer em importância econômica.


Novo diretor

Fernando Landgraf é o novo diretor-presidente do IPT. Livre-docente pela Escola Politécnica da USP, é pesquisador especializado na área de Engenharia de Materiais e Metalúrgica. Desde julho de 2009 respondia pela diretoria de inovação do Instituto.

Após ser empossado, Landgraf disse que o principal objetivo de sua gestão será apresentar resultados dos investimentos de R$ 150 milhões na modernização do IPT, realizados na gestão de seu antecessor, João Fernando Gomes de Oliveira.

“A meta é aumentar a relevância e o impacto do Instituto para a indústria e a sociedade paulista e brasileira. Pretendemos criar uma metodologia para o IPT medir seu impacto, seguindo o modelo de instituições internacionais de alta credibilidade tal qual o Massachusetts Institute of Technology (MIT), dos Estados Unidos”, destacou.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente na página IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 29/08/2012. (PDF)

Novas tecnologias a seu dispor

IPT celebra 112 anos inaugurando, até o fim do ano, na capital, o Laboratório de Bionanotecnologia; em 2012 será entregue o de Estruturas Leves em São José dos Campos

O Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) celebrou 112 anos de fundação no dia 24 de junho. Criado em 1899, o instituto surgiu com o objetivo de avaliar a qualidade de materiais empregados nas áreas de construção civil e produção mecânica. Hoje, é referência internacional em metrologia e parceiro de órgãos públicos e empresas privadas em projetos de inovação, pesquisa, desenvolvimento e educação.

Vinculado à Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia (SDECT), o IPT atua como elo multidisciplinar entre universidades e centros de pesquisas com diversos setores produtivos brasileiros. O serviço inclui desenvolver soluções tecnológicas e melhorar processos para pequenos e médios empresários, de modo a fortalecer o empreendedorismo no Estado e no País.

O IPT também é parceiro de setores industriais de grande porte, como petróleo, mineração, naval, aeronáutica, siderurgia, medicamentos, cosméticos, engenharias, construção civil, têxtil, florestal, química, geração de energia, biocombustíveis e livros didáticos.

O trabalho do órgão é realizado por 12 centros de pesquisa, 30 laboratórios, dez seções técnicas e núcleo de atendimento tecnológico à micro e pequena empresas. O quadro funcional integra mil pesquisadores, 275 profissionais administrativos e 160 estagiários e bolsistas. A sede fica na Cidade Universitária, zona oeste da capital, e o instituto possui filiais em Franca e São José dos Campos, interior paulista.

Aplicações

Muitos brasileiros não sabem, mas o resultado do trabalho do IPT está presente em muitas situações cotidianas. A lista de tarefas é extensa. Inclui analisar consumo de energia e ruído de eletrodomésticos, participar de etapas do desenvolvimento de remédios, conferir a qualidade de roupas e tecidos. E, também, as características de materiais empregados na construção civil, avaliar o impacto ambiental de obras do Metrô e do Rodoanel, o risco de quedas de árvores nas cidades e testar radares de trânsito usados para controle de velocidade em ruas e rodovias.

A proposta do IPT é atender a sociedade brasileira em oportunidades para o País, como a descoberta das reservas de petróleo e pré-sal e o pioneirismo na produção de etanol. Para suprir a essas demandas, desde 2008 o Governo estadual investiu R$ 150 milhões no IPT.

O recurso está sendo usado para modernizar o instituto, com a contratação nos últimos três anos de novos profissionais concursados e requalificação dos atuais. O dinheiro também foi empregado para reformar e ampliar as instalações existentes. Desse total, R$ 46 milhões foram direcionados para a construção, na sede do órgão, do Laboratório de Bionanotecnologia, previsto para ser entregue até o final do ano.

Soluções sustentáveis

A bionanotecnologia é área de pesquisa promissora, capaz de manipular materiais milhares de vezes menores que a espessura de um fio de cabelo. Tradicionalmente, uma partícula recebe o prefixo “nano” caso tenha entre um e 100 nanômetros, aproximadamente 0,01% do diâmetro de um fio de cabelo. Hoje, estima-se em 600 o número de produtos que contêm nanomateriais disponíveis no mercado mundial.

O Laboratório de Bionanotecnologia do IPT estudará o desenvolvimento de organismos vivos, tecnologia de partículas (microencapsulação de componentes químicos e terapia medicinal, como em cosméticos), micromanufatura de equipamentos e metrologia.

Uma das propostas do instituto é privilegiar a busca de soluções sustentáveis. Para isso, uma de suas inovações recentes foi o bioplástico degradável. Diferente do produto à base de petróleo, que demora séculos para se decompor no meio ambiente, o bioplástico vira “comida” de bactéria em seis meses, sem poluir. E pode ser produzido a partir de restos de frutas das fábricas de suco ou bagaço de cana das usinas de álcool.

Corrida tecnológica

Outra novidade é o Laboratório de Estruturas Leves (LEL), previsto para ser concluído em 2012. Orçado em R$ 90,5 milhões, o LEL será instalado em São José dos Campos. A meta é ajudar empresas brasileiras a desenvolver novas tecnologias no setor aeroespacial, como, por exemplo, criar materiais capazes de reduzir o peso de componentes das aeronaves para, assim, torná-las mais competitivas no cenário internacional.

No projeto do LEL, o Governo paulista tem como parceiros a prefeitura local, BNDES, Embraer, Fapesp, Finep, Faculdade de Engenharia Industrial (FEI), Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), USP, Unicamp, Unesp, Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) e Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE).

Outro projeto em andamento é de uma planta de gaseificação de biomassa, em Piracicaba. A meta é conseguir produzir etanol de segunda geração a partir do bagaço de cana, atualmente aplicado na queima para a geração de energia.

Com a gaseificação, a expectativa é dobrar a produtividade das usinas canavieiras sem aumentar a atual área plantada. Esse projeto também marca a posição do IPT e do País em uma corrida tecnológica mundial, já que a gaseificação, com bagaço, carvão ou outra biomassa ainda está por ser dominada.

Novos desafios

Segundo João Fernando Gomes de Oliveira, diretor-presidente do IPT, os próximos passos do instituto são conseguir equilíbrio harmônico entre produzir conhecimento, aplicá-lo e vender serviços. Para Oliveira, são três os desafios para o desenvolvimento científico e tecnológico brasileiro – e todos representam novas oportunidades e necessidades.

O primeiro é uma imposição socioambiental, baseada na necessidade de se desenvolver tecnologias em prol da sustentabilidade. Assim, as pesquisas do IPT continuarão tentando despoluir rios e áreas degradadas, criar matérias biodegradáveis e energias renováveis (solar e da biomassa) e estruturar veículos e peças com materiais mais leves.

Um exemplo é o projeto da Embraer de criar em conjunto com o IPT um avião revestido 100% por compósito (mistura de fibra de carbono com polímero). “Por ser mais leve, a aceleração é mais rápida com menor gasto de energia. Além disso, o material é renovável e mais resistente do que o alumínio”, explica João.

Outra meta inclui explorar o recurso da luz solar, com projetos de células de silício, e obter mais eficiência com a biomassa abundante no campo. “Com as tecnologias futuras, será possível reaproveitar o bagaço de cana disponível no Estado de São Paulo e gerar eletricidade anual equivalente à produzida pela Usina de Itaipu (12 gigawats anuais)”, observou.

O segundo desafio consiste em aproveitar as oportunidades disponíveis, como o pré-sal. “Esta riqueza mineral dependerá de muita pesquisa para ser obtida – e também tornar viável e rentável a exploração. O IPT apoiará a Petrobras e sua cadeia de fornecedores no projeto, que requer perfurações em grandes profundidades marinhas, até 7 quilômetros abaixo do nível da superfície”, analisa.

O último desafio do IPT será aproveitar a oportunidade induzida pelo desenvolvimento da ciência, como a bionanotecnologia. O objetivo do novo ramo é incorporar novas funcionalidades nos materiais, a partir de mudanças em suas propriedades e composição.

As possibilidades da bionanotecnologia são infinitas e é possível agregar novas características do ponto de vista químico, mecânico, térmica, biológico, elétrico, etc. Uma das promessas é a de produzir um medicamento sob medida para cada organismo e, também, controlar seu princípio ativo de modo de só agir em condições especiais, evitando efeitos colaterais conhecidos das drogas atuais.


Serviços especializados do IPT

Tanque naval – O tanque naval do IPT é o maior da América Latina. Tem cerca de três quarteirões de extensão e é usado para simular em laboratório o comportamento de embarcações em água fluvial e alto-mar, para ajustes na fabricação de navios e equipamentos.

Fraturamento hidráulico – O fraturador hidráulico do IPT é usado para aprimorar equipamentos e definir metodologias para medição de tensões em rochas. Atende às engenharias civil, de minas e de petróleo e tem usos na construção de obras subterrâneas em rochas de qualquer natureza. O dispositivo foi usado na construção dos trechos subterrâneos da Rodovia dos Imigrantes, Rodoanel e Metrô. Também tem utilidade em túneis de pressão para geração de energia e em barragens (fundações e ombreiras) e cavernas.

Recursos hídricos – O instituto dispõe de um grupo multidisciplinar de 20 pesquisadores que acompanham 160 projetos relacionados às diversas bacias hidrográficas paulistas. Uma das ações é elaborar os planos delas, ou seja, identificar quem são os consumidores da água (setores municipal, agrícola e industrial) e verificar suas demandas. A tarefa inclui analisar demografia, qualidade das águas, monitoramento de chuvas, situação da vegetação, destinação do lixo urbano e poluição agrícola, entre outras demandas.

Segurança contra fogo – O serviço do IPT oferece diagnósticos das condições do setor de combate a incêndios no País e avalia as condições do combate ao fogo nas áreas urbana, rural e indústria petroquímica.

Livros didáticos – O instituto mantém três projetos ligados à qualidade dos livros do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). O serviço federal distribui esses materiais para alunos da rede pública nos 27 Estados brasileiros. Atende ao ensino fundamental, médio e de jovens e adultos e consiste em averiguar se a qualidade das publicações está de acordo com as especificadas em lei.

Siderurgia e etanol – Há 20 anos pesquisa a área de materiais metálicos fundidos resistentes a desgaste. O trabalho é realizado em parceria com o Laboratório de Fenômenos de Superfície, da Escola Politécnica (Poli-USP). Com relação ao etanol, o IPT pesquisa tecnologias para favorecer a exportação do etanol. A atividade verifica o grau de corrosão do biocombustível e rendeu metodologias de ensaio, aproximando as condições do laboratório com as verificadas na prática. O objetivo no futuro é estender o serviço.


Parceiro de empresas públicas e privadas

Em 1894, um grupo de engenheiros, liderados por Antonio Francisco de Paula Souza, fundou a Escola Politécnica de São Paulo. Para atender às crescentes demandas de ensaios de materiais de construção e às necessidades do curso, alguns professores criaram, em 1899, o Gabinete de Resistência de Materiais, que se tornaria o núcleo básico do que viria a ser o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT).

No início do século 20 o instituto pesquisou materiais para a construção civil e ajudou o empresariado paulista a instalar estradas de ferro e hidrelétricas. Até hoje, o órgão preserva amostras de concreto da época – e seria possível contar parte da história das construções civis brasileiras por meio delas.

Durante a Revolução Constitucionalista de 1932, o IPT orientou os paulistas sobre como fabricar morteiros, granadas, capacetes, carros de combate e trem blindado. Entre 1934 e 1946, desenvolveu produtos de madeira que tiveram larga utilização industrial, aplicando-os também na construção de aviões de treinamento e planadores. Em 1940 foi encarregado dos estudos para as fundações do complexo da Companhia Siderúrgica Nacional, em Volta Redonda (RJ).

O mesmo aconteceu com a produção de armas durante a Segunda Guerra Mundial. Nesse caso, o IPT forneceu assistência direta às oficinas bélicas nacionais. Devido à escassez de gasolina, os técnicos do instituto adaptaram os motores dos carros para o gasogênio.

Na década de 1940, cresceu e ampliou suas tarefas e colaborou com grandes obras de engenharia do País. Entre elas, destacam-se a construção das rodovias Anchieta, Anhanguera, Rio-Petrópolis e Dutra, e a ampliação dos portos de Santos, Rio de Janeiro e São Sebastião.

No mesmo ritmo, em meados de 1950, o IPT participou da construção das hidrelétricas paulistas de Paranapanema, Jurumirim, Chavantes, Limoeiro, Euclides da Cunha, Jupiá, Ilha Solteira e da usina de Paulo Afonso (BA).

Nos anos 1970 ajudou a construir a Linha Norte-Sul do Metrô paulistano e nos anos 1980 prestou assistência técnica na Rodovia dos Imigrantes e nas hidrelétricas de Sobradinho (BA) e Itaipu (PR).

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas II e III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 28/06/2011. (PDF)

 

Simpósio debate em Araraquara os avanços da nanotecnologia no Estado

Área multidisciplinar da ciência inspira-se na natureza para criar medicamentos, cosméticos, vidros, cerâmica e até memórias

No mês passado, Araraquara foi palco do 1º Simpósio Paulista de Nanotecnologia, evento que atraiu pesquisadores brasileiros e internacionais ao Centro Multidisciplinar para o Desenvolvimento de Materiais Cerâmicos (CMDMC). Mais de 200 participantes, entre palestrantes e inscritos, debateram o cenário atual e as novas perspectivas para a nanotecnologia. A programação contemplou as três áreas com mais avanços e investimentos no Brasil: materiais, médica e fotônica.

O Centro Multidisciplinar é um grupo mantido pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) que reúne 120 cientistas de instituições públicas. É coordenado pelos professores Élson Longo e José Arana Varela, do Instituto de Química da Unesp. Tem equipes em São Carlos, da USP e da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

Segundo o professor Élson Longo da Silva, além de integrar os pesquisadores paulistas, o evento mostrou as tecnologias de alto nível criadas e usadas no Estado. “São estudos pioneiros que podem indicar novos rumos à indústria nacional, como a fabricação de para-raios com materiais nano e de vidros especiais para serem usados como memória de computador, com capacidade de armazenamento muito superior às atuais”, destacou Élson.

Na mesma linha de raciocínio, o físico José Arana Varela, pesquisador do Instituto de Química (IQ) do CMDMC e pró-reitor de pesquisa da Unesp, afirmou que simpósios desse tipo são fundamentais para ampliar a sinergia entre os centros de pesquisa brasileiros e internacionais.

Mundo nano

A nanotecnologia é uma ciência relativamente nova, multidisciplinar e ainda desconhecida de grande parte da população. Sua proposta é alterar, com fins específicos, as propriedades de átomos e moléculas para obter novas funcionalidades e materiais.

Para o cidadão comum, o conhecimento nano já é usado para fabricar medicamentos, dentes humanos artificiais e materiais odontológicos, memórias e discos rígidos para computador, cosméticos, espelhos telescópicos, pilhas, tintas, panelas e plásticos.

Para a sociedade, a pesquisa em nanotecnologia estimula a formação de pesquisadores de alto nível e favorece a criação de empresas de perfil tecnológico no País – novas fontes de emprego, renda e impostos.

Na história da ciência, compreender os fenômenos naturais sempre foi uma busca recorrente. Na área nano não é diferente. E alguns processos complexos despertam interesse especial dos pesquisadores, como a fotossíntese nos vegetais e a produção da madrepérola em algumas espécies de molusco, um biomaterial sofisticado.

O progresso da ciência nas últimas décadas ampliou a compreensão sobre os fenômenos naturais, químicos, físicos e biológicos. E a manipulação de materiais no nível atômico abre infinitas possibilidades de pesquisa básica e aplicada.

Energia alternativa

No primeiro dia de atividades do simpósio, o professor Édson Leite, do Departamento de Química da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), apresentou trabalhos nas áreas de polímeros, cerâmicas eletrônicas e filmes finos. E sublinhou o fato de serem todos compostos desenvolvidos no Laboratório Interdisciplinar de Eletroquímica e Cerâmica (Liec), um dos principais centros de pesquisa do CMDMC.

O professor expôs nanomateriais destinados à geração de energia a partir de tecnologias limpas e sustentáveis, como a célula combustível alimentada por hidrogênio. Este processo tem grande potencial para gerar eletricidade, é renovável e sem emissão de ruído e de gás carbônico. No entanto, assim como a energia solar, outra pesquisa em andamento no Centro Multidisciplinar, ainda tem baixa eficiência.

Do ponto de vista energético e ecológico, pesquisar e investir em tecnologia limpa é uma tendência mundial. A expectativa é obter mais segurança, autonomia e desempenho em motores elétricos. E substituir, com vantagem, as atuais pilhas e baterias usadas no controle remoto, celular e notebook.

As pilhas atuais contêm metais pesados na composição, suportam número limitado de recargas e têm grande potencial poluidor, caso não recebam tratamento ambiental adequado. De acordo com as leis vigentes, é tarefa dos fabricantes recolher as baterias após o descarte e fazer a destinação correta, do ponto de vista ambiental, das pilhas e baterias usadas.

Petróleo e aquecimento

Desde o início do século passado, o petróleo continua sendo a principal matriz energética do planeta. É matéria-prima fundamental para a produção de combustíveis, plásticos e fertilizantes. E na relação custo/benefício, permanece imbatível em comparação a outras fontes de energia.

Caso confirmem-se as previsões mais otimistas, o petróleo durará mais cem anos antes do seu esgotamento definitivo. E os outros hidrocarbonetos também de origem mineral (carvão e gás) utilizados como matriz energética estarão disponíveis por mais 300 anos.

Entre 2006 e 2007, o consumo mundial de petróleo cresceu 60%. Além disso, outros fatores como o aumento constante da economia chinesa, a incessante instabilidade no Oriente Médio e a estagnação do volume de óleo extraído levaram o preço do barril do petróleo a ultrapassar a casa dos US$ 130 no mês de maio.

“A mudança climática na Terra provocada pelo aquecimento global é um problema maior que a escassez de petróleo”, afirma Édson Leite. Ele concorda com especialistas que associam a elevação da temperatura mundial com as emissões de gás carbônico causadas em grande parte pelo desmatamento e queima de combustíveis minerais.

Uma saída, indica o professor, é aumentar o investimento governamental e privado na geração alternativa. Este caminho já é seguido pelo Bloco Europeu, que investe na captação de energia eólica e solar e tem legislação ambiental severa, que prevê reduções progressivas no volume de emissões de gás carbônico para os próximos anos.

Édson Leite aprova o programa brasileiro de biocombustível (etanol e biodiesel), por ser sustentável e dispensar o subsídio governamental. No Brasil, os carros flex-fuel dominam o mercado e no exterior são vendidos veículos híbridos movidos a gasolina e a eletricidade: o Toyota Prius e o Honda Civic.

Ambos os modelos têm descontos e incentivos governamentais. Mas preço superior ao dos concorrentes e autonomia restrita quando impulsionados somente pelas baterias.

“A energia nuclear é viável se for bem executada e não emite gás carbônico”, analisa. Em contrapartida, o urânio, uma de suas principais matérias-primas, é um metal raro na natureza e de difícil extração. Além disso, o uso da matriz atômica pode provocar corrida armamentista e a proliferação de armas de destruição em massa.

Nova matriz energética

A luz solar é a maior fonte de energia disponível no planeta. O Brasil é o país com maior oferta deste recurso no mundo, porém, não existe nenhum programa governamental para aproveitá-lo. Na opinião de Édson Leite, a melhor saída seria, no futuro, o Brasil combinar o uso desta energia com o de célula combustível.

O princípio de funcionamento da célula combustível é similar, do ponto de vista teórico, ao usado pelos vegetais durante a fotossíntese para acumular energia. A planta capta e armazena a luz gerando elétrons (eletricidade) para queimar o hidrogênio que alimentará a célula combustível. O desafio para a ciência é obter a mesma eficiência.

Na sua exposição o professor Osvaldo Oliveira Júnior, do Instituto de Física da USP São Carlos (IFSC), apresentou estudos recentes no nível molecular para controlar propriedades de materiais para quaisquer tipos de aplicações. Uma das possibilidades é produzir filmes orgânicos ultrafinos para integrar biossensores e polímeros luminescentes.

Uma aplicação interessante do filme orgânico fino é simular em laboratório o efeito de um fármaco sobre um tecido humano. A técnica permite determinar se a substância penetra ou não na célula – e em qual concentração este processo ocorre.

Língua eletrônica

Osvaldo Oliveira Júnior alerta que o modelo usado no estudo é bastante limitado. No entanto, o conceito permite à indústria farmacêutica e de cosméticos pesquisar novos produtos e drogas com dosagem e tempo de atuação mais precisos no organismo.

Para o grupo de pesquisadores coordenado pelo professor, o principal desafio será explorar com eficiência a alta sensibilidade dos biossensores. Para a indústria, a meta será oferecer um medicamento de acordo com as características orgânicas e genéticas de cada paciente.

O destaque final da apresentação do docente foi a língua eletrônica. O dispositivo consiste em um arranjo de sensores usado para identificar os quatros sabores básicos do paladar: amargo, azedo, doce e salgado. (Os asiáticos acrescentaram um quinto sabor – o do peixe cru – à lista).

A inovação tem mil vezes mais sensibilidade que a língua humana. Emprega conceitos nano e de redes neurais para identificar com precisão, e em poucos minutos, uma substância num universo de até 800 amostras.

Já é usada por produtores de vinho para indicar variações entre as safras de uva e pela Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), para identificar os melhores grãos para produzir variedades finas. De baixo custo, o equipamento serve também para analisar a qualidade da água e verificar a presença de pesticidas, micro-organismos e metais pesados.

O projeto da língua eletrônica foi desenvolvido pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) em parceria com a USP São Carlos, Unesp de Presidente Prudente, UFSCar de Sorocaba e Escola Politécnica de São Paulo.

Mais empresas

No segundo dia de debates a mesa-redonda foi constituída pelos pesquisadores Élson Longo (IQ-Unesp), Antônio Carlos Hernandes (USP-São Carlos), Luiz Henrique Matoso (Embrapa) e Edgar Dutra Zanotto (UFSCar). Eles discutiram sobre os caminhos para melhor aproveitar a produção científica paulista e incentivar a formação de empresas de perfil tecnológico no Estado.

O professor Edgar é um dos pioneiros em estudos com vidros nano no Brasil. Ele destacou o fato de atualmente ter crescido a oferta de recursos governamentais para estímulo à pesquisa. Também citou como exemplo de iniciativa estadual o Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (Pipe) da Fapesp. E, no âmbito federal, a Subvenção Econômica da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep-MCT).

“O desafio é criar uma mentalidade empreendedora no pesquisador e transformar suas descobertas em novos produtos. Inovar e registrar a descoberta é apenas o primeiro passo”, observou Edgar. A etapa seguinte é analisar o potencial do mercado, criar a empresa e desenvolver o produto. Em paralelo, aprender conceitos de marketing, distribuição, venda e pós-venda.

Outra necessidade é firmar parcerias com fornecedores e traçar estratégias para concorrer com empresas asiáticas. Nestes países, as empresas locais levam vantagem sobre as brasileiras em muitos pontos, como logística, infraestrutura de transportes e mão-de-obra mais qualificada.

“Quem quer empreender e não tem todo o dinheiro necessário pode recorrer a um fundo de capital de risco. Assim, une-se a investidores experientes, que profissionalizam a gestão do negócio que, fortalecido, ajuda a evitar a mortalidade precoce. Nos últimos 25 anos em São Carlos foram criadas cem empresas e mais da metade desapareceu – em muitos casos pela falta de preparo administrativo e não científico”, observou Edgar.


Nanoarte: beleza e tecnologia

O Centro de Divulgação Científica e Cultural da USP São-Carlos (CDCC) promove até o dia 28 de junho a exposição Nanoarte: uma viagem pelo mundo da tecnologia. A mostra apresenta 30 imagens ampliadas e em alta resolução de materiais nano obtidas nos equipamentos do Centro Multidisciplinar para o Desenvolvimento de Materiais Cerâmicos.

A mostra Nanoarte é uma criação do professor Élson Longo e do jornalista Kleber Chicrala, que tem como objetivo demonstrar em imagens de 40 centímetros x 50 centímetros a beleza existente nas cores, formas e composições de muitos trabalhos científicos. A entrada é gratuita e a visita pode ser feita de segunda-feira a sábado, das 8 às 12 horas e das 14 às 18 horas.


Híbrido e molecular – pioneirismo

O professor Henrique Toma, do Instituto de Química da USP (IQ-USP), apresentou materiais de perfil híbrido e molecular. Ele é um dos pioneiros no País na área, e em sua exposição traçou um perfil da evolução da pesquisa nano no mundo.

A primeira fase começou há duas décadas e visou ao controle dimensional e estrutura molecular dos compostos. Resultou nos atuais sensores e catalisadores. A próxima etapa dará ênfase à nanoarquitetura e permitirá o controle e visão tridimensional dos átomos; a quarta geração se ocupará do controle molecular.

Henrique Toma citou exemplos recentes de aplicações industriais baseadas em princípios nano. “Inspirado nas células da pele do tubarão, o maiô especial criado pela Speedo e usado pelos nadadores para quebrar sucessivos recordes desliza melhor na água”, garante.

Outro exemplo é a cola sem cheiro e sem compostos químicos, usada em consertos caseiros e na construção civil. O produto comercializado pela empresa Adespec não traz riscos à saúde humana e ao meio ambiente e ganhou os nomes comerciais de Prego Líquido e FixTudo.

Durante o desenvolvimento, a pesquisa recebeu recursos do Projeto Pipe da Fapesp. Os produtos imitam as propriedades das células existentes nas patas da lagartixa que lhe permitem grudar no teto e nas paredes. No futuro, o mesmo princípio poderá ser utilizado numa roupa autolimpante.

“Muitos produtos já incorporam a tecnologia nano. Na área de cosméticos, é uma prática comum. Porém, por ser novidade, muitos fabricantes ocultam esta informação temendo a rejeição dos consumidores – um receio semelhante ao sofrido pelos alimentos transgênicos”, finaliza.


Glossário

Fotônica – Área científica voltada ao controle, manipulação, transferência e armazenamento de informações por meio do fóton – partícula elementar mediadora da força eletromagnética.

Polímero – Composto de elevada massa molecular relativa, resultante de reações químicas. São divididos em plásticos, borrachas e termofixos.

Biossensor – Analisa funções metabólicas de micro-organismos para medir poluentes.


Serviço

CDCC
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Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas II e III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 03/06/2008. (PDF)