Alunos de Etec criam sistema de tratamento de água

De baixo custo, tecnologia criada em Campinas utiliza energia solar e possibilita a produção de água potável em residências de regiões secas e semiáridas

Um trio de alunos do curso técnico de Eletrônica integrado ao Ensino Médio da Escola Técnica Estadual (Etec) Bento Quirino, de Campinas, criou um equipamento inédito, de baixo custo, para tratar microbiologicamente a água. A partir de um processo químico chamado eletrólise, que utiliza eletricidade e uma mistura de sal de cozinha (cloreto de sódio) e água, é obtido o gás cloro que será empregado na esterilização da água contida em um recipiente fechado.

O sistema é alimentado por energia solar, gerada por um painel fotovoltaico de baixa potência (15 watts) e custo de R$ 120. No interior de suas tubulações são separadas as moléculas de hidrogênio, oxigênio e sódio presentes na mistura de água e sal. O resultado da reação química são dois gases: o hidrogênio, liberado por um duto para a atmosfera, e o cloro, que é canalizado para o recipiente com água, onde o gás se dissolve e elimina micro-organismos.

Beatriz da Silva, Matheus da Silva e Gabriel Trindade, estudantes do sexto e último semestre do curso, são os criadores do equipamento que torna a água potável, segura para beber e cozinhar, tomar banho e escovar os dentes. Denominado Solução para o Tratamento de Água nas Cisternas Instaladas no Brasil (STAC-IBR), o sistema vem sendo desenvolvido desde o início do ano, sob orientação do professor João Alexandre Bortoloti e coorientação do professor Edson Duarte.

Láurea

A STAC-IBR será apresentada como trabalho de conclusão do curso (TCC) dos estudantes, em dezembro. Antes, o protótipo do equipamento será exposto entre os destaques da 10ª Feira Tecnológica do Centro Paula Souza (Feteps), encontro anual de inovação das Etecs e Faculdades de Tecnologia do Estado (Fatecs) que, neste ano, será realizado na capital, no período de 19 a 21 de outubro, em local ainda a ser definido.

Com proposta sustentável e inovadora, a STAC-IBR é resultado de iniciativa conjunta da Etec Bento Quirino com o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), câmpus de Campinas, e o Projeto WASH!, do Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), ambos vinculados ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).

Seus autores pretendem agora patenteá-la, sob orientação da agência de inovação do Centro Paula Souza (Inova) e do IFSP. Na sequência, eles querem repassar a tecnologia às empresas interessadas em produzi-la em escala industrial. O primeiro protótipo desenvolvido já rendeu aos estudantes o quinto lugar na edição 2016 do V Benchmarking Junior – Inovações & Sustentabilidade, concurso anual promovido pela organização não governamental Mais Atitude Instituto Socioambiental (Mais).

Inspiração

Os estudantes, inicialmente, tinham em mente produzir um clorador elétrico, com o fim de esterilizar água de piscina. Entretanto, após uma aula de geografia, o conceito do projeto ampliou-se e eles desenvolveram um equipamento portátil para tratar água acumulada em cisternas, mas que pode ser acoplado definitivamente na caixa-d’água.

Segundo os estudantes, o sistema foi concebido para abastecer residências do semiárido brasileiro onde há pouca oferta de água e, também, para tratar a água da chuva acumulada em cisternas. Outro conceito incorporado é o de impedir a proliferação nos reservatórios de larvas do Aedes aegypti, mosquito causador da dengue, chikungunya e zika.

De acordo com delimitação realizada em 2005 pelo Ministério da Integração Nacional, o semiárido brasileiro é uma região de um milhão de metros quadrados onde predominam altas temperaturas e clima seco. Ocupa 11% do território nacional, compreendendo porções dos Estados de Alagoas, Bahia, Ceará, Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe.

Composição

O primeiro protótipo da STAC-IBR custou mil reais e o sistema foi montado pelos estudantes em poucas horas, depois que ele foi projetado no papel. Os componentes usados foram tubulações de esgoto e válvulas. O montante gasto no protótipo foi financiado pelo Centro de Tecnologia da Informação (CTI) Renato Archer, cuja sede fica em Campinas e onde também está localizado o IFSP.

Depois de alguns testes laboratoriais, os alunos da Etec Bento Quirino chegaram à formulação adequada para a STAC-IBR esterilizar a água na cisterna. Um volume de 18 litros de água com 5,5 quilos de sal de cozinha permite tratar 16 mil litros de água – esse é também o volume mínimo recomendado em uma residência para atender as necessidades de uma família de seis pessoas durante os oito meses mais secos do ano no semiárido brasileiro.

Serviço

Etec Bento Quirino (Campinas)
E-mail atendimento@etecbentoquirino.com.br
Telefone (19) 3252-3596

V Benchmarking Junior
IFSP (câmpus Campinas)
Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI)
Mais Atitude Instituto Socioambiental (MAIS)

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente na página IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 16/07/2016. (PDF)

Menos desperdício (USP debate opções para estimular o reúso da água)

Meta é aproveitar o insumo com as tecnologias já existentes, em especial na RMSP, a de maior escassez hídrica do País

Pesquisar e executar projetos com água de reúso – este é o objetivo do Projeto Coroado, criado em novembro do ano passado por iniciativa da União Europeia. Tem investimento previsto de 4,5 milhões de euros e congrega nove centros de pesquisas europeus e quatro universidades latino-americanas. Como representante brasileira no projeto, a USP patrocinou o último encontro do grupo, que se reuniu no Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária da Escola Politécnica.

A chamada água de reúso é um dos insumos provenientes de estação de tratamento de esgoto. Embora não seja potável, oferece inúmeras possibilidades de aproveitamento. Sua utilização ajuda a diminuir o consumo hídrico e a reduzir desperdícios, além de permitir extrair volumes menores de água doce de reservas subterrâneas e superficiais.

Os clientes potenciais da água de reúso são condomínios, prefeituras, comércio, transportadoras e empresas com processos industriais, como construção civil. As destinações mais comuns são limpar ruas, irrigar jardins, refrigerar equipamentos, processos industriais e gerar energia elétrica.

Lavagem de pistas

O encontro do Projeto Coroado na Cidade Universitária permitiu à delegação europeia conhecer as instalações do Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária da Escola Politécnica e entrar em contato com as experiências brasileiras na área. E também visitar os laboratórios do Centro Internacional de Referência em Reúso de Água (Cirra), coordenado pelo professor José Carlos Mierzwa, com a colaboração do professor Ivanildo Hespanhol.

O Cirra é referência nacional no conhecimento sobre membranas usadas para filtrar a água a ser reutilizada. Desenvolve projetos em parceria para indústria e órgãos públicos. Entre seus trabalhos, um deles é em parceria com a Prefeitura do Município de São Paulo e aproveita a água de reúso da Sabesp para lavar ruas da capital. Outra iniciativa reutiliza a água da torneira das pias dos banheiros do Aeroporto Internacional de Guarulhos para limpar as pistas de pouso e decolagem.

“Em muitas situações, a água de reúso pode e deve substituir a potável com vantagens ambientais e financeiras”, explica José Carlos Mierzwa, pesquisador do Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária. “Em novembro de 2015, data prevista para o encerramento da iniciativa, será lançado um manual de referência com as melhores práticas de reúso adaptadas aos diferentes contextos sociais e climáticos da América Latina”, informa o professor.

Legislação inexistente

A professora Mônica Porto, vice-chefe do Departamento de Engenharia Hidráulica e Ambiental da Escola Politécnica, coordena o Projeto Coroado na América Latina. Especialista em pesquisas envolvendo qualidade da água e gestão de recursos hídricos, afirma que um dos desafios é combater o preconceito existente contra o insumo.

Na avaliação de Mônica, falta no Brasil uma legislação de âmbito nacional para orientar a sua utilização. Por este motivo, muitos projetos são brecados pelo temor de haver consumo humano ou contaminação.

“De acordo com a finalidade projetada para a água de reúso, já existem tecnologias suficientes para garantir a segurança da iniciativa. O emprego ideal pressupõe conhecimento sobre a fonte ou a origem do efluente que foi separado da água na estação de tratamento de esgoto”, ensina a professora.


Quatro casos na América Latina

No estágio atual do Projeto Coroado, os pesquisadores estudam o emprego da água de reúso em quatro casos na América Latina. O primeiro deles é na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), local de maior escassez de água do Brasil. A ideia é destinar o insumo para limpar ruas, praças, pisos e instalações industriais. O aglomerado urbano paulista reúne 39 cidades e abriga 10% da população do País. E hoje precisa importar água potável até de outros Estados para suprir sua demanda.

O segundo caso é na Argentina, na Bacia do Rio Suquía. A proposta no país vizinho é mista, prevê reaproveitar a maior parte na agricultura e o resto nos meios urbano e industrial. No Chile, na Bacia do Rio Copiapó, o reúso da água é para irrigação; no México, na Bacia dos rios Bravo e Grande, o emprego será majoritariamente agrícola e, em menor escala, urbano e industrial.

As universidades e centros de pesquisa participantes do projeto são: Agricultural University of Athens (Grécia), Stichting Dienst Landbouwkundig Onderzoek (Holanda), Agencia Estatal Consejo Superior de Investigaciones Científicas (Espanha), Universidade do Porto (Portugal), National Technical University of Athens (Grécia), Pontificia Universidad Católica de Chile, T. C. Geomatic Ltd (Chipre), Norwegian Institute for Agricultural and Environmental Research (Noruega), Fachhochschule Nordwestschweiz (Suíça), Tecnología de Calidad (México), National University of Córdoba (Argentina), Sistemas Especializados para Água (México).

Serviço

Interessados no processamento de água de reúso devem entrar em contato com a Sabesp pelo e-mail solucoesambientais@sabesp.com.br ou pelo telefone 0800 771 2482. Mais informações sobre o Projeto Coroado, acessar o site.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente na página I do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 19/05/2012. (PDF)