Proteger o conhecimento

Simpósio celebra cinco anos da Agência Unesp de Inovação; no período, foram 277 invenções registradas e 104 pedidos de patentes

O simpósio Desafios Nacionais e Globais para Inovação no Brasil comemorou, neste mês, o quinto aniversário da Agência Unesp de Inovação (Auin). A programação do evento incluiu homenagens a lideranças acadêmicas, apresentações de diretores da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado (Fapesp) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Além da comunidade acadêmica, a plateia reuniu representantes governamentais, de centros de pesquisas e de empresas.

Comandada desde sua criação, em 2009, pela professora Vanderlan da Silva Bolzani, a Auin é um desdobramento do antigo Núcleo de Inovação Tecnológica (NIT), instituído em 2007. Durante apresentação no evento, a docente destacou que o objetivo continua o mesmo: proteger o conhecimento surgido nos laboratórios e salas de aula da Universidade Estadual Paulista (Unesp).

A agência também atua como órgão permanente de assessoria em inovação para toda a Unesp. Promove, de modo estruturado, o repasse das tecnologias, unindo a comunidade acadêmica com os setores público e privado atendidos, com estímulo ao empreendedorismo entre alunos e pesquisadores, o que permite à universidade obter recursos a partir do saber gerado.

Expansão e atendimento

Diretora-executiva da Auin, Vanderlan reportou no simpósio crescimento de 200% na proteção da propriedade intelectual da universidade depois da criação da agência. No período, foram registradas 277 comunicações e invenções, 104 pedidos de patentes e 24 licenciamentos. “Conseguimos, pela primeira vez na Unesp, um depósito internacional de patente”, comemorou.

Sediada no campus da Unesp, na capital, no bairro da Barra Funda, a agência emprega, além da professora Vanderlan, dez profissionais. Eles dividem-se na tarefa de assegurar, juridicamente, a proteção intelectual do conhecimento gerado e também atuam em todas as atividades ligadas ao assunto.

O serviço da Auin é gratuito para todos os pesquisadores das 34 unidades da Unesp localizadas em 24 cidades paulistas. Além do atendimento presencial na capital, promove palestras e cursos anuais de incentivo ao empreendedorismo para pós-graduandos nos campus.

O site da agência informa os passos a serem seguidos pelos interessados em proteger suas criações e um sistema que permite o registro do trabalho científico. Na maioria das vezes, o pesquisador encaminha a descrição da inovação para análise prévia pela Auin, para checagem de viabilidade. Em caso afirmativo, o interessado reenvia a descrição com os detalhes.


Peptídeo modificado está protegido

Em 2013, o pesquisador Eduardo Maffud Cilli, do Instituto de Química (IQ-Unesp), campus de Araraquara, entrou em contato com a Auin para proteger sua descoberta científica: um peptídeo modificado em laboratório, com atividades antimicrobianas (elimina bactérias e fungos) e anticâncer (mata células tumorais).

Seis meses depois, o peptídeo (biomolécula natural formada pela ligação de dois ou mais aminoácidos), que possui diversos usos potenciais, como medicamento de uso tópico humano e veterinário, estava devidamente registrado pela Auin. Agora, segue à espera de aprovação do pedido de depósito de patente da tecnologia de produção no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi).

Serviço

Agência Unesp de Inovação (Auin)
Rua Dr. Bento Teobaldo Ferraz, 271
Bloco II – Barra Funda – CEP 01140-070
São Paulo (SP). Tel. (11) 3393-7902
E-mail – auin@unesp.br

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente na página III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 26/11/2014. (PDF)

Pesquisadores da Unesp de Araraquara têm novas perspectivas para Mal de Alzheimer

Extrato de árvore da Mata Atlântica fornece matéria-prima para substância com a propriedade de impedir queda na produção de acetilcolina

Um composto produzido por estudiosos da Universidade Estadual Paulista (Unesp) poderá atenuar os efeitos do Mal de Alzheimer, doença que acomete 1,5 milhão de brasileiros. O estudo foi realizado pelos pesquisadores do Núcleo de Bioensaios, Biossíntese e Ecofisiologia de Produtos Naturais (NuBBe), do Instituto de Química da Unesp de Araraquara, sob a coordenação da professora Vanderlan da Silva Bolzani.

A novidade é resultado do trabalho de bioprospecção, iniciado em 2001, que analisou 1,3 mil extratos (raízes, sementes, folhas, frutos) de espécies vegetais nativas da Mata Atlântica e isolou 200 substâncias ativas. Foram selecionadas 30 variedades consideradas promissoras, por conterem propriedades analgésica, anti-inflamatória, antitumoral, bactericida, antifúngica e antioxidante.

A partir de substância extraída de folhas, flores e frutos da Cássia-do-nordeste (Senna spectabilis) – árvore presente nos estados de São Paulo e do Rio Grande do Sul –, os especialistas descobriram um derivado da espectalina – substância que tem similaridade estrutural com a acetilcolina, neurotransmissor humano, cuja função é propagar o impulso nervoso. A acetilcolina, produzida pelo organismo, atua nos mecanismos cerebrais de memória recente e tem sua produção diminuída progressivamente entre os doentes de Alzheimer.

Registro internacional

O químico Cláudio Viegas Júnior, integrante do grupo de sete pesquisadores comprometidos com o trabalho, explica que o passo seguinte foi modificar a estrutura da espectalina em laboratório. O objetivo era potencializar as propriedades terapêuticas do extrato vegetal, abrindo novas perspectivas para o controle de doenças degenerativas da memória e do aprendizado.

Os resultados obtidos foram animadores e os derivados da espectalina mostraram ser menos tóxicos que as outras quatro substâncias existentes no mercado, todas importadas, utilizadas para combater a doença.

Assim, o processo de transformação da substância foi patenteado no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), em 2003. No ano passado, o registro foi estendido internacionalmente, para todos os países signatários do Patent Cooperation Treaty (PCT). Depois da descoberta, a empresa Apsen Farmacêutica tornou-se parceira da pesquisa.

“A patente foi requerida para evitar o risco da biopirataria e para assegurar a cessão de uso pela indústria farmacêutica, que não investiria recursos para fabricar uma fórmula de domínio público. Além disso, a planta e seus produtos isolados sozinhos não são ativos. O segredo, que foi protegido, é o processo de fabricação desse derivado, e a promessa é ter no mercado brasileiro e internacional, em poucos anos, um medicamento de origem nacional com grande apelo comercial”, explica Viegas.

Etapas de desenvolvimento

O estudo teve investimento de R$ 1,1 milhão da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), do governo federal, e contou com o auxílio de quatro pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ): Carlos Alberto Manssour Fraga e Eliézer Barreiro, do Laboratório de Avaliação e Síntese de Substâncias Bioativas; e Newton Castro e Mônica Rocha, do Departamento de Farmacologia.

O médico e farmacologista Newton Castro informa que, para um novo medicamento chegar às prateleiras das farmácias, precisa antes passar por vários testes pré-clínicos. O primeiro inclui o isolamento da nova droga e testes com roedores; em seguida, com outros animais, como macaco e cachorro; depois de assegurada a eficácia e a segurança nestes exames, finalmente são realizados ensaios com seres humanos. Na fase final, são analisadas a toxicidade e o estudo de efeitos colaterais e adversos.

Também são observadas as formas mais eficazes de utilização (creme, injeção, comprimido) e considerados mecanismos para garantir que o medicamento atue no local desejado no organismo. Com relação ao derivado da espectalina, o ideal é que aja no sistema nervoso central.

Biota-Fapesp

A pesquisa com extratos vegetais é parte do Programa Biota-Fapesp, atividade de caráter interdisciplinar que congrega diversas instituições de pesquisa com o objetivo de mapear e catalogar as espécies nativas da fauna e flora dos biomas paulistas, como o cerrado e a Mata Atlântica. Para produzir a espectalina, explica Viegas, a extração não prejudica a árvore. Os oito exemplares utilizados forneceram 50 quilos da matéria-prima necessária para os ensaios, que resultaram em 250 gramas de espectalina, quantidade suficiente para a pesquisa.


Doença tem causa desconhecida

Descrita pela primeira vez em 1906 pelo médico alemão Alois Alzheimer (1864-1915), a doença homônima se caracteriza pelo acúmulo de placas e fibras no tecido do cérebro. Embora não se conheça sua causa, sabe-se que a idade é um fator importante – o número de pessoas afetadas dobra a cada cinco anos depois dos 65.

Estima-se que 1,5 milhão de brasileiros sofram do mal, que ainda não tem cura, embora haja tratamento. “Com o aumento da longevidade e a diminuição da taxa de mortalidade, o Alzheimer está se tornando mais frequente, a ponto de ser considerado a doença do século 21”, diz a farmacêutica Vanderlan da Silva Bolzani, coordenadora do estudo e professora do Instituto de Química da Unesp.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente na página IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 17/09/2005. (PDF)