Sabesp pesquisa utilização da água de reúso para irrigação no campo

Novidade auxilia adubação do solo, diminui a emissão de efluentes nos rios e abre novas perspectivas de preservação ambiental no País

Desde fevereiro de 2001, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) mantém, em Lins, um centro experimental multidisciplinar e especializado em pesquisas com a utilização da água de reúso para a irrigação na agricultura. A iniciativa, pioneira no País, tem a Universidade de São Paulo como parceira e visa a encontrar alternativas racionais, do ponto de vista ambiental, sanitário e agronômico, para o recurso hídrico, desde a sua captação no aquífero e rios até a devolução à natureza.

Proveniente do tratamento de esgotos, a chamada água de reúso é utilizada sem riscos à população na agricultura de países como Israel, Egito, Austrália, Arábia Saudita, Tunísia, Chile e Estados Unidos. No Brasil, ainda não é aproveitada porque não há legislação específica sobre o assunto. Somente na região de Lins, a vazão disponível para a irrigação na agricultura é de 1,5 mil litros por segundo.

Entretanto, a Sabesp antecipou-se à chegada da regulamentação definitiva sobre a utilização da água de reúso. O estudo realizado pela USP com novas tecnologias no centro experimental resultou em mais de doze teses de pós-graduação sobre temas ligados à agronomia e à qualidade de solo (quatro ainda estão em andamento).

Alternativa para a agricultura

A área total da estação de tratamento de esgoto tem 13 alqueires (1 alqueire paulista = 24 mil metros quadrados). No local, 30 pesquisadores das áreas de engenharia, agronomia, biologia e geologia desenvolvem estudos sobre os efeitos da irrigação com a água de reúso no solo de três culturas da região: a cana, o café e o capim tifton – variedade híbrida muito utilizada em pastagens por ter alta produtividade e ser rica em proteínas para o gado.

Nos testes com a cana no centro experimental, são utilizados equipamentos especiais, como o lisímetro. Esse dispositivo tem sensores instalados em três profundidades e coleta informações sobre a necessidade hídrica do solo. Os pés de cana são plantados em cinco faixas vizinhas, demarcadas por placas: área sem irrigação, com irrigação de 100%, 125%, 150% e 200%.

Uso seguro

Célia Regina Montes, do Núcleo de Pesquisa em Geoquímica e Geofísica da Litosfera (Nupegel) e do Centro de Energia Nuclear na Agricultura da USP (Cena), explica que os resultados obtidos com a água de reúso são promissores e que essa prática não oferece riscos para a saúde humana.

“A presença de organismos patogênicos é o maior inconveniente dos efluentes dos esgotos domésticos. Assim, a recomendação é irrigar preferencialmente a cultura cuja matéria-prima tenha uso industrial, como a cana. Porém, a eliminação dos organismos patogênicos por técnicas de desinfecção pode permitir até o consumo de alimentos crus”, observa.

A pesquisadora comenta que a falta de regulamentação tem impedido a execução de vários projetos.

“Há um grupo de trabalho ligado à Câmara Técnica de Ciência e Tecnologia do Ministério do Meio Ambiente elaborando resolução específica para a utilização agrícola. No âmbito estadual, a Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb), igualmente, elaborou orientação para a apresentação de projeto visando à aplicação da água de reúso para a irrigação. Pelo andamento atual, é provável que em 2008 a lei federal esteja finalizada”, prevê Célia.

Um dos pesquisadores, o professor Roque Passos Piveli, da Escola Politécnica, conta que os estudos realizados pelo grupo foram publicados em diversas revistas científicas e também orientaram a edição de um livro, sob a coordenação de Maria de Lourdes Florêncio.

A obra descreve as possibilidades da utilização agrícola do esgoto sanitário e propõe diretrizes para a regulamentação da prática, que Roque acredita terem sido úteis para a elaboração da minuta de normas do Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH).

Roque destaca o trabalho do seu grupo de pesquisa na USP, que estuda a desinfecção de esgotos e o pós-tratamento de efluentes em lagoas de estabilização. As alternativas pesquisadas incluem técnicas como a aplicação de radiação ultravioleta, a ozonização e a cloração, opção que tem se mostrado mais simples e menos onerosa.

Menos adubação

O responsável pelo centro experimental em Lins é o engenheiro civil e sanitarista Luiz Paulo de Almeida Neto, superintendente da Unidade de Negócio Baixo Tietê e Grande da Sabesp.

Luiz conta que a ideia do centro experimental surgiu em 1995, quando a empresa comparou, no município de Riolândia, a irrigação em dois campos de milho: o primeiro recebeu água captada no Rio Grande, e o outro, água de reúso. Após a colheita, foi verificada produtividade 30% maior na lavoura irrigada com a água processada.

O total obtido não surpreendeu Luiz Paulo. Ele revela que a água de reúso é rica em nutrientes: fósforo e nitrogênio. E permite ao agricultor diminuir em até 50% a adubação, em algumas culturas. O resultado inicial foi apresentado em congressos e seminários pelo Brasil. Motivou pesquisas com outras lavouras, como palmito pupunha e girassol. Por fim, resultou na criação do centro multidisciplinar em Lins.

A unidade experimental de Lins é a maior do Estado. Aprofunda pesquisas em monitoramento da concentração de metais junto ao lençol freático, a qualidade do solo e sua necessidade de adubação e outros impactos na natureza ligados à irrigação com água de reúso.


Ciclo da água

São Paulo é o Estado brasileiro mais populoso, com 40 milhões de habitantes, volume comparado à população da Espanha. Mesmo assim consegue tratar 60% do total de esgoto produzido em seu território.

Entre as regiões paulistas, a de Lins possui o melhor índice de tratamento: 91%. O município é um dos 83 atendidos pela Unidade de Negócio Baixo Tietê e Grande da Sabesp, e pretende até 2009 atingir 100% de tratamento nas seis cidades restantes: Catiguá, Cardoso, Fernando Prestes, Monte Alto, Palmares Paulista e Santa Ernestina.

Os 70 mil habitantes de Lins consomem água potável proveniente de dois poços perfurados no Aquífero Guarani – reserva subterrânea que se formou com o acúmulo da água de chuva de milhares de anos. A cada dia, o município gera 12 milhões de litros de esgoto, que tem 100% de tratamento e é composto por dejetos líquidos (urina), sólidos (fezes), sabão e detergente.

A legislação atual exige retenção de até 80% dos poluentes do esgoto antes do seu encaminhamento aos rios e lagos. Na estação de Lins é realizado o chamado processo secundário de tratamento e são retirados 85% de toda a matéria orgânica. O tratamento é feito em duas fases e demora 21 dias.

Inicialmente, o efluente fica exposto à ação solar, do vento e de bactérias anaeróbicas (que vivem sem a presença de oxigênio) durante cinco dias em três tanques com quatro metros de profundidade.

A etapa seguinte é denominada facultativa, tem duração de 16 dias e possui tratamento aeróbico e anaeróbico. No fundo dos três tanques de 1,6 metro de profundidade, o efluente é acumulado e a desinfecção é feita por bactérias anaeróbicas; na superfície, algas fazem o trabalho aeróbico.

Ganho ambiental

O engenheiro Luiz Paulo lembra que a utilização da água de reúso para irrigação não gera lucro para a Sabesp, porém traz ganhos ambientais. Trata-se de importante ação no sentido de conscientizar a população sobre combater desperdícios e usar o recurso hídrico com racionalidade.

“Mesmo tendo recebido tratamento, a presença do efluente no rio contribui para a eutrofização. Este fenômeno prejudica o equilíbrio natural e é provocado pela proliferação de algas, que ao entrar em decomposição aumentam o número de toxinas que deterioram a qualidade da água”, explica.

Comenta, ainda, que na história da humanidade a disponibilidade de água sempre foi fundamental para o desenvolvimento dos povos e civilizações. “Todas surgidas nas margens de grandes rios. A escassez do recurso já foi motivo de inúmeras guerras e conflitos e promete ser, no futuro, um dos principais desafios a serem vencidos”, finaliza.

Uso industrial e municipal

Segundo o engenheiro Luiz Paulo de Almeida Neto, desde junho de 2003, todas as 15 unidades de negócio da Sabesp no Estado têm certificação ISO. A região metropolitana da capital é atendida por cinco unidades e as outras dez ficam localizadas no interior do Estado e na Baixada Santista.

A companhia vende em média 95 mil metros cúbicos de água de reúso por mês, volume correspondente a 0,5% de todo o esgoto tratado no Estado. A maior parte do efluente vem da estação de tratamento do Ipiranga, localizada na zona sul de São Paulo, e é utilizada por indústrias e prefeituras da região metropolitana da capital (RMSP).

A fabricante de Linhas Coats paga aproximadamente R$ 0,81 por 70 metros cúbicos de água mensais utilizados em seus processos de tingimento. As prefeituras utilizam o produto principalmente para lavagem de ruas após as feiras e pagam R$ 0,44 por metro cúbico, enquanto construtoras usam para lavar canteiros de obra e desembolsam R$ 0,74 por metro cúbico.

Além disso, está em andamento a instalação de tubulações para o fornecimento de 60 mil metros cúbicos de água de reúso por mês da estação de tratamento do ABC para a Companhia Santa Therezinha (Santher). Os investimentos são de aproximadamente R$ 1,5 milhão para a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) e a rede.


Parceiros interessados: públicos e privados

Os parceiros da Sabesp no centro experimental são a USP, por meio da Escola Politécnica, Faculdade de Saúde Pública (FSP) e o Nupegel. E também o Programa Nacional de Pesquisa em Saneamento Básico (Prosab), a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), a Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo (Fapesp) e a prefeitura de Lins.

A possibilidade de irrigação na agricultura com a água de reúso atraiu também interesse empresarial. A Equipav, usina sucroalcooleira de Promissão, fez parceria com a Sabesp na pesquisa com a cana. Ofereceu mão-de-obra, mudas, insumos e orientação técnica para o plantio de 1,5 hectares no centro experimental.

Pretende, após a chegada da legislação, fazer estudo de viabilidade para avaliar a possibilidade de irrigar seus canaviais, distantes um quilômetro da estação de tratamento de esgoto.

Mauro José Penna, diretor agrícola da Equipav, explica que a empresa exporta açúcar, álcool e levedura certificados. Apóia o projeto porque confia no trabalho da Sabesp e dos pesquisadores. “Se os órgãos certificadores aprovarem e se a iniciativa se mostrar viável, do ponto de vista do investimento e retorno, poderemos construir a tubulação e o sistema de bombeamento da água para o canavial”, observa.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas II e III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 21/07/2007. (PDF)

Oficiais bombeiros estudam Engenharia Civil para ampliar sua especialização

Iniciativa visa a aprimorar serviços prestados à população; curso é bancado pelos oficiais que frequentam as aulas depois do expediente

Desde o início de 2006, um grupo de 97 oficiais do Corpo de Bombeiros está cursando Engenharia Civil na Universidade de Guarulhos. A decisão de retornar ao banco escolar para reforçar a formação superior foi espontânea, bancada pelos próprios alunos e não trará reajustes de vencimentos.

Reúne profissionais da capital, ABC e de regiões próximas – Baixada Santista, São José dos Campos e Campinas. Em janeiro de 2008, os 83 oficiais da ativa e os 14 da reserva terão em mãos seus novos diplomas acadêmicos.

A iniciativa tem o apoio dos comandos do Corpo de Bombeiros e da Polícia Militar (PM) e considera o fato de os oficiais já terem formação universitária. Todos passaram pela Academia do Barro Branco da PM: um curso superior de quatro anos em período integral com jornada de 2,5 mil horas-aula.

Do histórico escolar do grupo constam disciplinas específicas de bombeiros e também da área de engenharia, estas ministradas pela Fatec, como Cálculo I, Física Aplicada I (Mecânica) e II (Termodinâmica), Química, Instalações Elétricas Prediais e Urbanas, Desenho, Resistência dos Materiais, Construção Civil, Microinformática e Mecânica dos Fluidos.

Um dos líderes do grupo é o tenente-coronel Ivan Mano Neves, do 5º Grupamento de Bombeiros, que atua nas regiões de Guarulhos e do Alto Tietê. É um dos alunos mais aplicados e também um dos responsáveis por incentivar colegas a se matricularem juntos na mesma universidade.

“Muitas situações enfrentadas pelos bombeiros no cotidiano englobam questões práticas e ligadas a atividades de engenharia, nas áreas civil, mecânica e de segurança. Assim, este retorno à universidade está ampliando a formação superior da tropa e melhorando o serviço prestado à população”, afirma.

O tenente-coronel Neves lembra, ainda, que o estudo realizado fora do horário de trabalho resgata uma antiga tradição dos bombeiros paulistas. “É um costume dos oficiais da reserva repassar experiências e conhecimentos adquiridos ao longo da carreira para os demais. Essa transmissão é realizada com a participação em diversas comissões de estudo mantidas pela corporação. E visam à constante atualização e aperfeiçoamento de normas e táticas utilizadas”, destaca.

Segundo o coronel Manoel Antonio da Silva Araújo, comandante do Corpo de Bombeiros e também aluno, “a realização tem dimensão que por certo marcará a história da evolução técnica da corporação no Estado. E a formação superior garantirá mais qualidade nas áreas de prevenção, emergenciais e de combate a incêndios”, finaliza.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente na página IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 29/06/2007. (PDF)

IAC: 120 anos como referência em pesquisa agronômica

Produtividade no País saltou de 60 para 120 milhões de toneladas de grãos por ano e área plantada aumentou somente 15%

O Instituto Agronômico de Campinas (IAC), o mais antigo centro de pesquisa em agricultura do Brasil e da América Latina completou 120 anos de fundação ontem.

Fundado por Dom Pedro II em 1887 e vinculado ao Governo Estadual desde 1892, o IAC foi criado para aprimorar o conhecimento do País na cultura cafeeira. Hoje é referência internacional em pesquisa e melhoramento genético em todas as atividades ligadas ao agronegócio no País.

Presente em todas as regiões paulistas, o IAC teve em 2006 orçamento de R$ 41 milhões, sendo R$ 25 milhões da Secretaria Estadual da Agricultura (SEA) e R$ 16 milhões da iniciativa privada e de agências de fomento: Fapesp, FinepCNPq. Abriga 350 funcionários, 204 pesquisadores e mantém 600 projetos em pesquisa.

Em seu mês de aniversário, o IAC celebra também a publicação de mais de 200 teses em seu projeto de pós-graduação stricto sensu, instituído em 1999. A formação acadêmica trouxe à sociedade novo serviço. Além de gerar conhecimento, o instituto passou a formar recursos humanos especializados em encontrar soluções para os problemas existentes nas lavouras brasileiras.

A pós-graduação é referendada pela Capes e dividida em três áreas de concentração: Gestão de Recursos Agroambientais, Melhoramento Genético Vegetal e Tecnologia da Produção Agrícola. O curso reúne profissionais interessados em trabalhar na iniciativa privada. Destaca-se por oferecer formação direcionada à pesquisa aplicada e geração de tecnologia específica para cada cultura.

Genoma de citros

Orlando de Melo Castro, diretor do IAC, comemora o sucesso de variedades produzidas, mais especificamente a cana forrageira (IAC86-2480), lançada em 2002 e bastante disseminada em São Paulo e Minas Gerais. A planta tem baixo teor de fibra, é adequada à alimentação do gado e aumenta o peso e a produtividade dos animais do rebanho leiteiro em comparação às outras fontes de alimentação.

Entre as novidades, Orlando destaca o atual estudo do IAC que visa a identificar e produzir laranjas ricas em vitaminas A e E por meio de melhoramento genético. Segundo ele, a meta é obter um fruto saboroso, de alto valor nutricional, resistente às pragas, de manejo simples e rentável para o produtor paulista e brasileiro.

Uma conquista recente, de 2002, foi o uso do manjericão como substituto ao pau-rosa, árvore da Amazônia ameaçada de extinção utilizada para a extração do linalol – óleo utilizado pela indústria de cosméticos para produzir aromas como o perfume Chanel nº 5.

Para o futuro, Orlando aponta como desafio para o IAC e para o Estado brasileiro conseguir transferir a inovação desenvolvida em seus laboratórios para o assentado ou pequeno produtor rural. Prover também meios de garantir a sustentabilidade de cada negócio.

“Com o adequado manejo é possível plantar frutas de regiões frias como a uva, o morango e a maçã em regiões do Nordeste brasileiro. Contudo, o desafio maior é fazer chegar até o produtor a informação de qualidade. Com a TV e a internet, os boletins e eventos regionais promovidos pelo IAC têm sido ferramentas importantes de divulgação, mas estes canais não são suficientes para integrar em definitivo o produtor de uma região distante à cadeia nacional do agronegócio”, observa.

Ação integrada

Na área agronômica, o IAC é um parceiro natural da iniciativa privada e seu trabalho contempla agricultores de pequeno, médio e grande porte. Muitas vezes a pesquisa é realizada dentro da propriedade do produtor rural, para ter mais abrangência e permitir análises aprofundadas de condições climáticas, qualidade do solo e oferta de água e luz.

São Paulo lidera a pesquisa e produção de açúcar e álcool no País. E a estratégia do instituto para a cana foi dividir em 1999 o Estado em sete áreas, de modo a produzir variedade específica para cada região do território paulista.

“Os estudos realizados pelo Centro de Cana do IAC orientarão a instalação de novas usinas em Tocantins, oeste baiano e sul de Minas Gerais. A tecnologia desenvolvida nos laboratórios do instituto também orienta o cultivo do algodão no Paraná, Goiás e Mato Grosso. A cultura da mamona em São Paulo é pequena, com apenas mil hectares. Em contrapartida, a variedade Guarani criada no instituto é a mais cultivada no País, no Nordeste brasileiro e em Minas Gerais, os principais produtores”, observa Orlando.

“Embora São Paulo domine toda a cadeia produtiva do etanol, faz-se necessário disseminar em outros Estados e continentes sua tecnologia de produção. Assim será possível criar mercado internacional para o produto e evitar o risco futuro do desabastecimento. Além disso, a cultura sucroalcooleira (açúcar e álcool) tem potencial para impulsionar a economia de países com clima e características parecidas com as nacionais”, analisa.

“O risco de concorrência com os novos produtores será pequeno. O Brasil tem produção em maior volume, condições climáticas excepcionais e áreas disponíveis para ampliar o plantio, insuficiente ainda para atender toda a frota nacional de veículos flex”, ressalta.

Celeiro do mundo

Na opinião de Orlando, o Brasil ainda é chamado celeiro do mundo por ser uma das principais potências agrícolas internacionais. Sua tendência é crescer o suficiente sem depender, à semelhança da Europa e dos EUA, de subsídios governamentais.

De qualquer forma, tem como desafio incorporar gradativamente mais tecnologia e qualidade para passar a produzir e exportar itens de maior valor agregado. “Além de criar produtos diferenciados, com marca e identidade próprias, para conseguir ultrapassar as barreiras sanitárias estrangeiras, que serão ainda mais restritivas”, observa.

Nos últimos 15 anos, o País registrou aumento de 60 para 120 milhões de toneladas de grãos por ano, tendo ampliado a área plantada em apenas 15%. “A vocação brasileira continua sendo agrícola. O aumento na produtividade do algodão, milho, soja, feijão e arroz é resultado da incorporação de tecnologias, uso correto de defensivos, melhor adubação e manejo de solo, práticas de plantio direto. O IAC, ao completar 120 anos, tem participação direta nesses números”, comemora.


Café: a cultura inicial

O cafeeiro arábica foi trazido para o Brasil em 1727. Chegou em Campinas em 1810, tendo como origem o Vale do Paraíba. Até então era cultivado no Estado como cultura nômade. Em 1887, a partir de solicitação dos cafeicultores paulistas, foi criada a Estação Agronômica de Campinas, origem do atual IAC.

Na época, o desafio era encontrar respostas para as questões de adubação, de reposição de nutrientes e métodos de conservação do solo. Evitar, assim, o esgotamento da terra após os primeiros anos da cultura e interromper a constante procura e necessidade por novos terrenos, com solos produtivos e ricos em matéria orgânica.

Entretanto, o aumento da área cultivada e a adaptação da planta às condições de solo e ao clima paulista transformaram São Paulo no epicentro da economia brasileira.

No ano do seu 120º aniversário, o IAC continua sendo a principal referência brasileira sobre café. Seus estudos abrangem todos os aspectos ligados ao plantio e conservação dos grãos, incluindo agroclimatologia, fisiologia, fitopatologia, melhoramento genético e biotecnologia (Projeto Genoma), fertilização do solo, mecanização, qualidade, enxertia e tolerância à seca e ao calor e resistência às pragas do bicho mineiro, das famílias de vermes nematóides e à ferrugem.

O café é a bebida mais consumida no planeta – a cada ano são servidos 400 bilhões de xícaras. O Brasil é o maior produtor mundial e cultiva duas espécies: o arábica (Coffea arabica), com menor teor de cafeína e de melhor qualidade (65% do total de pés plantados) e o conilon (Coffea canephora), mais conhecido por robusta, mais rústico e com mais cafeína (35% da produção).

Em 2006, o País obteve 32 milhões de sacas. A produção foi liderada pelo Estado de Minas Gerais (50%), seguida pelo Espírito Santo (30%), São Paulo (10%), Paraná (5%) e os 5% restantes foram colhidos em outras unidades da Federação.

O agrônomo Luiz Carlos Fazuoli comanda o Centro de Café Alcides Carvalho. O nome da unidade do IAC homenageia o pesquisador do instituto falecido em 1992 e maior especialista do País em café.

Fazuoli lamenta nos últimos 15 anos a progressiva perda de espaço da cultura para outras mais rentáveis para o produtor, como a soja, os citros e a cana. Destaca, porém, que 90% de todo o café arábica plantado no Brasil tem origem no instituto e aponta como saída para estimular novamente a cafeicultura a criação de modalidades especiais e de uma marca de café especial com o selo do IAC.


Descafeinado naturalmente

A pesquisadora Maria Bernadete Silvarolla é a descobridora de um pé de café contendo o menor teor de cafeína já encontrado: somente 0,07% na sua composição. A inovação teve o apoio do biólogo e professor da Unicamp Paulo Mazzafera, responsável pelas análises laboratoriais das amostras. Com isso, abriu novas perspectivas para o aperfeiçoamento de uma linha de produtos com baixos teores da substância, capaz de agradar ao consumidor com esta necessidade.

Durante cinco anos, a agrônoma estudou individualmente as amostras dos grãos retiradas de cada uma das duas mil plantas presentes no jardim do Centro de Café Alcides Carvalho até encontrar, em 2003, o pé com baixo teor de cafeína. Esta plantação especial reúne todas as espécies de café existentes no mundo. E o café é uma planta perene – se tiver manejo adequado pode viver até cem anos, mas a operação comercial de cada planta é de até 20 anos.

Em média, cada xícara de café feito com coador tem 1% a 1,2% de cafeína na sua composição. O café descafeinado transformou-se em segredo industrial em 2005, após a assinatura de um convênio com a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) para o desenvolvimento do produto.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas II e III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 28/06/2007. (PDF)