De Santos a Guarujá pelo fundo do mar

Prevista para 2016, ligação subterrânea suportará tráfego de pedestre, ciclista, carro, moto, caminhão e veículo leve sobre trilhos

A Dersa S.A., empresa mista ligada à Secretaria Estadual de Logística e Transportes do Estado de São Paulo, apresentou em seminário realizado no Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), na capital, os desdobramentos do Projeto Prestes Maia. A novidade é a ligação por túnel das cidades de Santos e Guarujá. No encontro foram apresentados o local e o cronograma de construção da obra.

Com previsão de término para 2016, a ligação custará R$ 1,3 bilhão aos cofres do Estado. O túnel ficará 21 metros abaixo da superfície da água do canal e terá 900 metros de extensão. Interligará os bairros do Macuco, em Santos, pela Avenida Conselheiro Rodrigues Alves, até Vicente de Carvalho, próximo ao Terminal de Contêineres, no Guarujá. Suportará tráfego simultâneo de pedestre, ciclista, carro, moto, caminhão e Veículo Leve sobre Trilhos (VLT).

Origem e destino

Entre fevereiro e agosto de 2011, a Dersa realizou diversos estudos de viabilidade técnica e de trânsito nas duas cidades. O levantamento ouviu 7,5 mil moradores que diariamente transitam entre Santos e Guarujá. A pesquisa também analisou o perfil econômico da população da Região Metropolitana da Baixada Santista , que responde por 4% do PIB paulista e é formada por nove municípios: Bertioga, Cubatão, Guarujá, Itanhaém, Mongaguá, Peruíbe, Praia Grande, Santos e São Vicente.

A pesquisa da Dersa também considerou questões atuais, como os estrangulamentos do trânsito na região. E também temas futuros, como o aumento no tráfego local a partir do incremento do turismo e das operações da Petrobras na região, com a exploração do pré-sal e do petróleo nas jazidas marinhas da Baixada Santista.

Um dos objetivos é desafogar o trânsito de caminhões nas rodovias Anchieta e Cônego Domênico Rangoni (SP-55 – Piaçaguera-Guarujá). Atualmente, os transportadores precisam percorrer distância maior, pela SP-55, para o desembarque de cargas no Porto de Santos. E o túnel seria opção para diminuir tempo, trajetos e custos.

Complemento às balsas

A proposta do túnel será a de complementar o transporte feito pelas balsas, serviço operado pela Dersa. E assim absorver parte do tráfego na região, que abriga o porto de cargas e passageiros com maior movimento da América Latina.

O projeto da ligação Santos-Guarujá inclui escadas rolantes para pedestres. Além da cobrança de pedágio nos dois sentidos, está prevista a construção de estacionamentos pagos para veículos nos dois acessos do túnel. Uma das ideias propostas é usar esta receita acessória para diminuir o custo de construção e de manutenção da obra.

Quando estiver em operação, a expectativa com o túnel será a de reduzir em até 60% a procura pelo transporte na balsa, em especial nos horários de pico da população residente. Os períodos com mais congestionamentos são no início da manhã e no final da tarde dos dias de semana.

Túnel imerso

Segundo Laurence Casagrande Lourenço, diretor-presidente da Dersa, a opção de construir uma ponte acabou sendo descartada. Os motivos foram a legislação vigente que orienta as operações com navios no porto e o tráfego aéreo de aeronaves na Base Aérea de Santos, localizada no Guarujá.

A Autoridade Aeroportuária, responsável pela Base Aérea, define em 75 metros o limite de altura para edificações no entorno. Já a Autoridade Portuária especifica em 85 metros a distância mínima do espelho d’água para garantir a passagem de navio pelo canal. “Assim, a legislação inviabilizou qualquer projeto de ponte”, concluiu Lourenço.

Os passos seguintes da Dersa foram realizar mais estudos técnicos para decidir qual tipo de túnel seria adotado – escavado ou imerso. E depois da opção pelo segundo, pesquisaram então sete locais possíveis para a instalação do túnel. Até concluírem que o escolhido era o mais indicado.

Opção inédita

Lourenço observa que a técnica de construir túnel escavado é conhecida e adotada em larga escala no Brasil. Entretanto, foi preterida. “Por estar em terreno arenoso e ser submarino, seria preciso gastar muito para perfurar o solo e edificar estruturas de apoio e contenção nas entradas e saídas, para evitar que ele ruísse”, observou.

Embora nunca tenha sido usada no Brasil, a opção pelo túnel imerso foi a escolhida. Esta tecnologia é 60% mais barata que a do escavado. Foi usada pela primeira vez em 1910, no Rio Detroit, nos Estados Unidos, para interligar Estados Unidos e Canadá. Neste sistema, o túnel é construído na superfície, em pequenas unidades (perfis). Depois, cada uma delas é transportada em barcaças e afundada. A vedação, encaixe e posicionamento dos perfis são feitos no fundo do mar.

Outra vantagem do túnel imerso é poder ser instalado em menor profundidade e trazer risco geológico menor do que o escavado. Sua construção é mais rápida e, por ter inclinação menos acentuada que o escavado, é possível diminuir o comprimento total. As rampas de acesso e de saída são mais curtas, o que facilita o tráfego e a exaustão dos gases emitidos pelos escapamentos dos veículos no seu interior.

Como desvantagem, tem impacto maior para os moradores, por exigir mais desapropriações. E durante a execução da obra, o canteiro tem extensão maior que o escavado.


Tecnologia holandesa

Um dos destaques do seminário realizado no IPT foi a presença dos engenheiros holandeses Anton Driesse e Martijn Smitt. Eles participaram do evento como consultores e representantes de empresas europeias especializadas em construir túneis submersos.

A primeira delas é o grupo TEC, interessado em participar da concorrência pública internacional que definirá o projeto executivo do túnel. A outra é a Mergor/Strukton, que pretende se associar a uma empreiteira brasileira para disputar a licitação.

Atualmente, o grupo TEC está construindo uma conexão submersa (doca seca) de 19 quilômetros ligando Dinamarca e Alemanha. Anton Driesse disse que o primeiro projeto da TEC foi um túnel construído em 1988 no Porto de Roterdã, na Holanda. E mesmo com o passar dos anos, o principal desafio neste tipo de projeto é trabalhar com diferentes tipos de rocha e de solo no local da construção, além de encontrar meios para prover a segurança contra desabamentos e incêndios.

Na obra da Baixada Santista, segundo Anton, a principal dificuldade será a grande área urbanizada existente no local. Segundo ele, foi o mesmo desafio encontrado na construção de muitos túneis submersos de Amsterdã, na Holanda.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente na página IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 18/11/2011. (PDF)