Usuário carente tem prioridade e serviço inclui triagem, emergência e atendimentos; atividade clínica é fundamental para a formação do aluno
Há 85 anos a população carente de 75 municípios da região de Araraquara recebe atendimento gratuito na Faculdade de Odontologia (FO) da Universidade Estadual Paulista (Unesp). A atividade clínica integra a grade curricular dos alunos de graduação, a partir do segundo ano, e atende, em média, no período letivo, 600 pacientes por dia em tratamentos odontológicos, das 9 às 12 horas e das 14 às 18 horas.
O serviço odontológico gratuito assiste pacientes paulistas e de outros Estados, como Paraná, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás. No total, contempla dez especialidades: odontopediatria, ortodontia, cirurgia, radiologia, diagnóstico bucal, periodontia, dentística, endodontia, oclusão e prótese.
Criada em 1923, a FO é a mais antiga do Brasil. Já formou 4,8 mil dentistas e todos os seus docentes têm titulação mínima de doutor. O prédio original da faculdade foi projetado em formato de U e, há quatro anos, reformado. Com o término das obras, passou a abrigar 130 consultórios distribuídos em seis clínicas e quatro miniclínicas de especialidades.
A escola oferece, também, serviços odontológicos complementares ao tratamento, como radiologia e análise laboratorial de amostras – retiradas de pacientes em tratamento na instituição.
Triagem informatizada
Para solicitar o serviço, o interessado deve se dirigir à Faculdade de Odontologia e passar pela triagem. É então cadastrado no sistema e encaminhado para atendimento de emergência ou para agendar consulta. Ninguém sai sem ser atendido e o processo é impessoal, informatizado e obedece à ordem de chegada. Em média, uma consulta com diagnóstico de pouca complexidade demora até dois meses para ser agendada, de acordo com a especialidade.
Experiência prática
“Muito além do assistencialismo, o atendimento clínico é uma atividade de extensão universitária fundamental. Além de habilitar o aluno para o trabalho, favorece pessoas sem condições de pagar”, explica o professor José Cláudio Segalla, vice-diretor da faculdade.
Conhecido como Caco, Segalla venceu eleição realizada em novembro de 2007 e será empossado diretor da FO no dia 28 de março. Sobre o serviço gratuito, destaca o caráter curativo dos procedimentos: começa com tarefas simples, como a remoção de cáries e tártaro, e chega, nos anos finais, em técnicas complexas, como cirurgias e implantes.
“O problema odontológico interfere na autoestima do indivíduo, pode provocar mau hálito, dores nas costas, dificuldade para engolir, falar, conseguir emprego e até de namorar. O essencial é mostrar, na prática, para estudantes e pacientes, a importância da prevenção para a saúde bucal. Procedimentos simples, como visita periódica ao dentista, escovação correta e uso de fio dental, poupam gastos e sofrimento”, ensina.
Mobilização
Os 75 calouros que ingressaram no curso de Odontologia a partir de 2006 já estão com a nova grade curricular da carreira, que é integral. O período de formação foi ampliado de quatro para cinco anos e privilegiou-se a prática clínica. Atualmente, o atendimento gratuito envolve 480 alunos de graduação e de pós e tem acompanhamento de 75 dos 97 professores da FO. A atividade recebe repasse mensal em torno de R$ 22 mil do Sistema Único de Saúde (SUS).
O professor Segalla afirma haver espaço para ampliar o número de atendimento, porém condiciona a expansão ao aporte de recursos adicionais. “Não abrimos mão da qualidade em todos os aspectos ligados ao serviço, como infraestrutura, consultórios, equipamentos, materiais, pessoal de apoio e demais necessidades,” avisa.
Trabalho em dupla
Nas clínicas, o atendimento é prestado por duplas de alunos que se revezam na tarefa. Desta maneira, o treinamento fica mais versátil e o estudante tem chance de acompanhar um colega durante a consulta. Depois de encerrado o procedimento, o relatório é redigido a quatro mãos.
Em cada disciplina do currículo, mudam os pares de alunos e os equipamentos e consultórios utilizados. O objetivo é estender a experiência clínica ao máximo e ampliar a troca de conhecimentos entre os universitários.
Há 27 anos o professor Ivan Faria supervisiona o trabalho dos alunos de graduação e pós nas clínicas. Segundo ele, a parte prática da formação é mais difícil para o estudante que a teórica. No entanto, é fundamental para fixar conteúdos das aulas e aproximar o futuro dentista da realidade brasileira, muitas vezes carente.
Serviço aprovado
Na manhã do dia 10 de março, na clínica da disciplina de Prótese, os quartanistas Rafael Lamas e Mariana Freitas prescreveram uma prótese para Ivonete Sandretti. Motivo: repor um dente perdido. Foi a quinta vez que ela recorreu aos serviços gratuitos da Faculdade de Odontologia. Em todas as ocasiões, Ivonete aprovou os diagnósticos e os tratamentos. Também elogiou a dedicação de alunos e professores.
“Em dupla, o serviço fica mais versátil”, asseguram Lamas e Mariana. Amigos desde o ingresso na universidade, dizem aproveitar bastante o período de aprendizado. Eles explicam que o primeiro desafio é conquistar a confiança do paciente, que vem com dores e traz na memória lembranças ruins de tratamentos anteriores.
“Depois de algumas consultas, o vínculo de confiança se consolida e avançamos no tratamento. Em muitos casos, a gratidão é grande e recebemos agradecimentos singelos. Porém, a sensação do dever cumprido só aparece quando vemos restabelecido o sorriso no rosto do paciente”, afirmam os futuros dentistas.
Serviço
Faculdade de Odontologia (FO) – Unesp
Rua Humaitá, 1.680 – Araraquara
Telefone (16) 3301-6300
Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial
Reportagem publicada originalmente na página III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 18/03/2008. (PDF)