Tecnologia do Larex-USP recicla 100% da prata de circuitos eletrônicos

Rota hidrometalúrgica desenvolvida no Laboratório de Reciclagem, Tratamento de Resíduos e Extração abre caminho para reaproveitar o metal nobre; clientes potenciais são indústrias de cosméticos, fármacos, próteses dentárias, têxteis e tintas

Pioneira na América Latina, uma tecnologia desenvolvida no Laboratório de Reciclagem, Tratamento de Resíduos e Extração da Universidade de São Paulo (Larex-USP) possibilita recuperar 100% da prata utilizada em placas de circuitos impressos de computadores, eletroeletrônicos e eletrodomésticos. Com viés de reciclagem, sustentabilidade e preservação ambiental, essa inovação é o tema da tese de doutoramento do engenheiro eletricista Marcos Paulo Kohler Caldas, defendida em abril e orientada pela professora livre-docente Denise Crocce Romano Espinosa, coordenadora do Larex-USP.

De acordo com Denise, o estudo acadêmico de Marcos Paulo dá continuidade a uma linha de pesquisas do Laboratório iniciada na década de 1990, voltada à reaproveitar metais presentes em placas de circuitos impressos descartados. Desde então, o trabalho multidisciplinar baseado no desenvolvimento de rotas hidrometalúrgicas avançou e resultou em duas patentes obtidas junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi), uma em 2012 e outra em 2014. Em ambas, foram aprimorados processos para recuperar o cobre, elemento responsável por cerca de 30% de todo o conjunto de materiais presentes em uma placa-mãe.

Processos

No mais recente trabalho apresentado no Larex-USP, centro vinculado ao Departamento de Engenharia Química da Escola Politécnica (Poli) e sediado na Cidade Universitária, zona oeste da capital, o resultado obtido são nanopartículas de prata, metal nobre com ação bactericida bastante conhecido e com uso difundido pela ciência e pela indústria. “A matéria-prima obtida tem valor agregado superior às outras já recicladas no Laboratório e tem diversas possibilidades de reutilização”, informa Marcos Paulo.

Segundo ele, cada ponto de solda aplicado em uma placa-mãe de computador contém cerca de 3% de prata e os segmentos econômicos com interesse potencial direto nessa matéria-prima são as áreas de cosméticos, fármacos, próteses dentárias, têxteis e tintas, entre outros.

A rota hidrometalúrgica desenvolvida envolve uma primeira lixiviação – a dissolução dos constituintes solúveis de uma matéria – em meio ácido sulfúrico e uma segunda, nessa mesma substância, em meio oxidante. Após o processo, a matéria-prima obtida é isolada dos demais metais, sendo usado citrato de sódio como agente estabilizante para a síntese das nanopartículas.

Extensão

Apoiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado (Fapesp), a tese de Marcos Paulo baseou-se na recuperação da prata de placas-mãe e de memórias de computadores obsoletos. Atualmente docente do curso de Automação Industrial do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes), ele destaca o fato da tecnologia aprimorada também servir para outros circuitos eletrônicos descartados, como os de geladeira, forno de micro-ondas, televisor, notebook e tablet, entre outros.

“Entre os aparelhos potenciais, o celular é um dos com maior apelo para esta tecnologia, devido à sua substituição pelos consumidores ser cada vez mais rápida e em maior volume”, observa. Para a pesquisa avançar, Marcos Paulo e Denise convidam empresas a se tornarem parceiras do Larex-USP no projeto (ver serviço). Motivos, segundo eles, não faltam.

A logística reversa é um deles. Trata-se, para os cientistas, de uma tendência universal, irreversível e medida prevista na Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS – Lei nº 12.305, de 2010) (ver serviço). Esse instrumento legal determina as responsabilidades de industriais, revendedores, importadores, distribuidores e consumidores com relação ao ciclo de vida de um produto – desde a sua fabricação até o descarte ambiental de todos os seus componentes.

Oportunidade

“Hoje no Brasil se separam e vendem as placas, mas não ocorre a reciclagem delas”, explica Marcos Paulo. Segundo ele, fora do País, os minérios extraídos dos circuitos são recuperados em escala industrial por nações como China e Bélgica, dois dos maiores compradores desse tipo de material. “Com o avanço da logística reversa, reciclar a prata será uma fonte de novos negócios, empregos e renda, além de prover mais sustentabilidade para a indústria e preservação ambiental”, prevê.

No Larex-USP, os desafios futuros com a rota hidrometalúrgica incluem achar um método para extrair o cobre e a prata no mesmo processo e também como tornar o formato das nanopartículas de prata mais uniformes, para atender à própria indústria, sua futura ‘compradora’. Desse modo, estima Marcos Paulo, será possível multiplicar em até 400 vezes o valor agregado da matéria-prima quando este ciclo científico estiver consolidado.


Larex-USP é Embrapii

Em julho, o Larex-USP passou a sediar a mais nova unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), organização social de pesquisa, inovação e apoio às empresas do governo federal (ver serviço). Especializado em serviços da chamada Química Verde (Tecnogreen), o grupo multidisciplinar com equipes da Poli-USP atua com Engenharia Química, Minas, Petróleo, Metalurgia, Materiais e Civil. Desde 1992, mantém projetos de reciclagem, tratamento de resíduos, tratamento de efluentes, biossorção, biorremediação, biolixiviação e processos químicos extrativos de alta temperatura ou em meio aquoso.

No modelo de fomento tecnológico da Embrapii, o empreendedor tem acesso a financiamento a fundo perdido, isto é, não necessita devolver os valores investidos, e, igualmente, pode realizar ações sem esperar abertura de edital e negociar o serviço direto com a Unidade escolhida, assim como aprová-lo. O núcleo recém-criado na USP atende empresas de sete áreas de competências da Química Verde: Engenharia de Bioprocessos; Engenharia Verde; Mineração Urbana; Processos de Reciclagem; Processos Sustentáveis; Tratamento de Efluentes; Tratamento de Resíduos e Rejeitos Industriais.

Serviço

Laboratório de Reciclagem, Tratamento de Resíduos e Extração (Larex-USP)
E-mail mpkcaldas@gmail.com
Telefone (11) 3091-9120

Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS – Lei nº 12.305/2010)
Logística Reversa – Ministério do Meio Ambiente
Embrapii

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente na página III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 29/11/2017. (PDF)

Técnica de restaurar imagens reduz exposição de paciente à radiação

Criado na USP São Carlos, sistema retira das imagens de mamografias granulações e ruídos prejudiciais ao diagnóstico; testes clínicos com a tecnologia começarão em 2018

Uma inovação do Laboratório de Visão Computacional (Lavi) da Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo (EESC-USP) pretende diminuir em até 30% a exposição das pacientes à radiação decorrente de exames periódicos de mamografia. Orientado pelo professor Marcelo Andrade da Costa Vieira, do Departamento de Engenharia Elétrica e de Computação, esse trabalho acadêmico é a tese de doutorado do pesquisador Lucas Rodrigues Borges.

Apresentado no mês de junho na EESC-USP, o estudo consiste de um sistema de informática projetado exclusivamente para fazer simulações em imagens digitais de mamografias. A tecnologia abre caminho para solucionar um problema antigo da físico-medicina.

“Quanto mais radiação é utilizada na mamografia, melhor é a qualidade das imagens obtidas e, consequentemente, mais preciso se torna o diagnóstico. Porém, quanto mais exposição da mulher à radiação nos exames, maior o risco de ela desenvolver, no futuro, câncer de mama”, esclarece o pesquisador Borges, que é também engenheiro eletricista.

Impacto

Para o pesquisador, o filtro desenvolvido possibilita usar dosagens menores de radiação, pois sua característica principal é restaurar as imagens, isto é, retirar delas imperfeições como granulações e ruídos prejudiciais ao diagnóstico. “O software calcula a quantidade necessária de ‘ruído’ em cada imagem para simular a exposição da paciente à baixa radiação”, explica.

Na avaliação do professor Vieira, essa redução na concentração das doses de radiação tem relevância para a saúde feminina, quando considerada sua aplicação futura em larga escala: “Para preservar a saúde, os médicos recomendam às mulheres fazerem mamografias periódicas após os 40 anos. Sob essa perspectiva, metade da população mundial tem essa necessidade, assim, a redução na exposição à radiação nas pacientes será bastante significativa”, conclui.

Parcerias

Aluno da EESC-USP desde a graduação, Borges conta ter iniciado em 2011 a parceria com o professor Vieira, especialista com diversos trabalhos em andamento na área de diagnóstico por imagem. Nessa época, o docente o orientou em projeto voluntário de iniciação científica, cuja proposta foi criar um filtro analógico para analisar imagens de mamografias digitalizadas, já com o intuito de otimizar o trabalho de médicos radiologistas.

O projeto inicial evoluiu, foi tema do mestrado de Borges e originou o sistema com o filtro restaurador de imagens. Ao longo da última e mais recente etapa, o estudo acadêmico teve apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado (Fapesp) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

Pioneiro no País na área de mamografias tridimensionais, o trabalho teve colaboração de dois físicos-médicos com pesquisas na área de câncer de mama: Andrew Maidment e Predrag Bakic, da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, e do cientista da Universidade de Tecnologia de Tampere (Finlândia), Alessandro Foi, especializado em matemática e restauração de imagens.

Metodologia

A estrutura principal do sistema é um banco de dados construído por Borges, contendo 1,8 mil imagens, volume de amostras suficiente para permitir ao software simular a realização de novos exames das pacientes usando quantidades menores de radiação. Essas imagens (mamografias realizadas em 72 pacientes voluntárias) integram protocolo de pesquisa do Hospital da Universidade da Pensilvânia, entidade parceira no estudo.

A parceria da EESC-USP com o hospital foi firmada em 2012. No sistema desenvolvido em São Carlos, as 72 imagens originais são simuladas em cinco diferentes doses de radiação, somando 360 exposições. No projeto, cada uma delas foi avaliada individualmente por cinco pesquisadores físicos-médicos, totalizando 1,8 mil leituras diferentes. “Nas mamografias, esses cinco especialistas não conseguiram identificar em quais delas o software simulou a dose reduzida de radiação, prova da eficiência do sistema desenvolvido”, afirma Borges.

Futuro

Segundo ele, existem disponíveis outras opções de exames não invasivos para detectar alguns tipos de tumores, como, por exemplo, a ressonância magnética, porém, o custo ainda é alto em comparação com raio X, método mais barato, rápido e amplamente disseminado na maioria dos centros de saúde.

Os próximos passos são os testes clínicos, previstos para o ano que vem, com a nova tecnologia, e incluindo a participação de radiologistas. Nessa etapa experimental, os médicos irão considerar nos diagnósticos as imagens restauradas pelo software antes de fazerem novos exames com as pacientes. Participam dessa etapa quatro instituições de saúde: Hospital do Câncer de Barretos, Clínica Eco e Mama de São Carlos, Instituto de Radiologia (InRad) do Hospital das Clínicas da USP e Hospital da Universidade da Pensilvânia.

Serviço

Laboratório de Visão Computacional (Lavi – EESC-USP)
E-mail mvieira@sc.usp.br
Telefone (16) 3373-9362

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente na página IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 05/10/2017. (PDF)

Plásticos reforçados com fibras de celulose são novidade da USP

Patenteada, tecnologia amplia resistência, sustentabilidade e possibilidades de uso de materiais na indústria

Pesquisa do Departamento de Engenharia de Materiais da Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo (EESC-USP) desenvolveu novo método para produzir compósitos de poliestireno (resina do grupo dos termoplásticos) e polimetacrilato de metila (acrílico), utilizando como matéria-prima fibras e nanofibras de celulose de eucalipto.

Iniciada em 2013 e coordenada pelo professor Antonio José Felix de Carvalho, a tecnologia material com biomassa na composição foi patenteada pela Agência USP de Inovação no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) em 2015. Empresas interessadas no compósito devem procurar o Departamento de Engenharia de Materiais no câmpus de São Carlos.

De acordo com Carvalho, livre-docente em engenharia de materiais, uma das premissas iniciais era substituir uma parte do plástico utilizado pela indústria em seus processos fabris, considerando o fato de ele ter como origem o petróleo, fonte de energia finita, poluente e não renovável. “Conseguimos produzir um compósito cujos diferenciais, em comparação com os plásticos e acrílicos convencionais, são a leveza, a elevada resistência mecânica, o baixo custo e o apelo ambiental, isto é, a sustentabilidade, por se basear na celulose”, explica.

Processos fabris

O Brasil é um dos maiores produtores mundiais de celulose, a partir de plantações de eucalipto, sendo esse uma commodity agrícola abundante no mercado nacional. “Essa matéria-prima é usada pela indústria papeleira para produzir papel sulfite e higiênico, embalagens e outros produtos”, explica. Segundo ele, o principal desafio acadêmico da EESC-USP era desenvolver um processo para permitir dispersar na matriz do polímero, de modo homogêneo, as nanofibras de celulose, mais as fibras de celulose nos plásticos e acrílicos, isto é, conseguir manter iguais as propriedades do material em todo o volume.

A patente obtida pela EESC-USP protege a propriedade intelectual tanto do processo de obtenção do compósito quanto do próprio compósito. Segundo Carvalho, o produto criado em São Carlos pode ser direcionado a diversos segmentos industriais com materiais injetados e extrudados em seus processos. A lista inclui fabricantes de automóveis, eletrodomésticos, materiais esportivos e de embalagens e a construção civil, entre outros.

Carvalho informa que alguns empreendedores demonstraram interesse pela tecnologia. “Queremos, agora, empresas para serem parceiras do projeto e podermos avaliar o desempenho obtido em laboratório com quantidades maiores e em aplicações específicas. Outro viés do trabalho é buscar produzir o compósito a partir de outras biomassas, também renováveis”, observa.

Colaborações

A pesquisa com o compósito teve a participação de Cayque Alvares Casale, aluno de graduação e bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Atualmente, ele está no último ano do curso de engenharia de materiais e manufatura da USP São Carlos. Outra colaboradora é a farmacêutica Eliane Trovatti, pós-doutoranda da EESC-USP na área de materiais. Para participar do projeto, ela recebeu bolsa de estudos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e atualmente leciona nos cursos de pós-graduação da Universidade de Araraquara (Uniara).

Serviço

Depto. de Engenharia de Materiais da Escola de Engenharia de São Carlos da USP
E-mail toni@sc.usp.br
Telefone (16) 3373-8679

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente na página III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 03/10/2017. (PDF)