As supermulheres do Estado

Foi-se o tempo em que o serviço público era território dos homens. Aos poucos, as mulheres foram chegando e tomando conta do espaço – com competência

O Estado de São Paulo tem 372 mil servidoras públicas na ativa. Elas estão em todas as áreas e ocupam todos os cargos. No universo público, não há mais espaço exclusivo para homens.

Na Polícia Militar de São Paulo, por exemplo, elas ocupam altos cargos hierárquicos – coronéis e tenentes-coronéis. Neste ano, três mulheres passaram a comandar, pela primeira vez, três instituições consideradas território masculino: o DHPP, o Instituto de Criminalística e o Metrô de São Paulo. Na área acadêmica, a professora Marilza Vieira Cunha Rudge assumiu a vice-diretoria da Unesp, fato que ocorre pela primeira vez.

O tempo de permanência nos postos de trabalho, também, é outra característica do universo feminino. Algumas servidoras estão no cargo há 40 anos, como Ana Lúcia Negrão Fernandes, professora de Matemática, na Escola Estadual Horácio Soares, em Ourinhos.

No campo do entretenimento, Inezita Barroso esbanja vitalidade aos 88 anos e comanda há 33, o Viola, minha Viola, que vai ao ar pela TV Cultura.

“A parte mais difícil é conciliar todos os papéis femininos. Trabalhar fora e cuidar de todos os “cês” da nossa vida (casa, crianças, cônjuge, comentários) é tarefa para leoa. Mas existe o cê de consciência, que é maior”. O depoimento de Laura Molina Meletti, pesquisadora científica do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), revela ainda a preocupação das mulheres em conciliar carreira com família. Elas têm dado conta do recado.

Justiça

Quando se trata de Direitos Humanos, três mulheres (Elaine Cavalcante, Juliana Armede e Cristiane Pereira) arregaçam as mangas e não medem esforços para ajudar os mais necessitados. Principalmente quando o assunto é violência doméstica. Apesar da Lei Maria da Penha, a violência doméstica ainda é um dos graves problemas que atingem a mulher.

O Mapa da Violência 2012, do Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos, informa que entre 1980 e 2010 foram assassinadas no país cerca de 92 mil mulheres, mais de 43 mil só na última década.

Elaine Cavalcante é juíza de Direito e atua no combate à onda cíclica da violência. Ela está na Vara do Foro Central de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, na capital paulista. Muito atuante, ela coordena o projeto Dialogando para a Paz e integra a Coordenadoria da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário do Estado de São Paulo (Comesp) ao lado das desembargadoras Angélica Almeida e Maria Tereza do Amaral e da juíza Maria Domitila Prado Manssur Domingos.

Quando se transformou em primeira juíza titular na 2ª Vara Criminal de Jundiaí, Elaine foi manchete de jornais. “Naquela época, uma mulher assumir um cargo de juíza titular era um fato novo e daí a curiosidade dos leitores”. Ela garante que nunca sofreu discriminação. “Hoje as mulheres conquistaram seu espaço na magistratura paulista, e pela primeira vez têm uma desembargadora na Comissão de Concurso de Ingresso à Carreira da Magistratura. Então, temos que comemorar essas vitórias”.

Cristiane Pereira é coordenadora do Centro de Referência de Apoio às Vítimas (Cravi), programa da Secretaria de Justiça e da Defesa da Cidadania. O Cravi completa 15 anos de existência em julho e trabalha com vítimas diretas e indiretas da violência.

A advogada atua no Cravi desde 2011. Com mestrado em Filosofia do Direito pela PUC-SP, sempre atuou em projetos de inclusão social. “Atuar dentro de uma instituição como o Cravi é uma missão. Ajudamos as vítimas diretas e indiretas da violência. Infelizmente, 70% das pessoas que procuram o nosso atendimento são mulheres, no papel de mães ou esposas. Elas chegam aqui aos pedaços, clamando por Justiça.”

Juliana Felicidade Armede é coordenadora dos programas estaduais de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e Combate ao Trabalho Escravo. “O Estado de São Paulo tem uma legislação pioneira no combate ao trabalho escravo e no enfrentamento ao tráfico de pessoas, mas existe um Brasil desconhecido, onde falta infraestrutura social e de Direitos Humanos. É nesse contexto que a sociedade deve atuar”. Juliana questiona também o papel da mulher na perpetuação da opressão.

Quebrando paradigmas

Cláudia Virgília conquistou uma vaga sonhada por muitos homens. Aos 41 anos, ela é subcomandante do 50º Batalhão de Polícia do Interior, sediado em Itu. Nascida em uma família de militares, a major Cláudia pertence à primeira turma de mulheres que ingressaram na Academia do Barro Branco. “Entramos em 1989. Éramos 12 garotas num universo de 160 homens”. A jornada árdua de estudos e treinamento não intimidou a oficial e as colegas. “Hoje, temos o orgulho de sermos chamadas de pioneiras”, recorda.

A oficial foi a primeira mulher a trabalhar na 2ª Companhia de Choque, na zona norte, e na Companhia de Força Tática. Formada em psicologia, é casada, tem um filho e ainda encontra tempo para atuar numa ONG que luta em defesa dos animais.

A voz tranquila e a figura aparentemente frágil escondem o verdadeiro perfil de Débora Santos de Oliveira. Quem a vê dificilmente imagina que ali está uma oficial do Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Estado de São Paulo.

Aos 31 anos, a primeiro-tenente PM comanda o 3º Grupamento de Bombeiros – Posto de Itaquera. Com histórico semelhante ao da major Cláudia (é filha do sargento PM Delcídio, bombeiro aposentado), Débora tem 60 profissionais sob suas ordens. “A sensibilidade da mulher é um dos fatores de sucesso em todas as profissões. Não é diferente no Corpo de Bombeiros”.


Histórias de mulheres de valor

Dividindo seu tempo entre as atividades profissionais e as responsabilidades de casa, elas buscam a realização (que muitos homens não conseguem)

A trajetória profissional da psicóloga Cândida Rocha Schwenck confunde-se com a evolução dos serviços prestados pelo Poupatempo. Em abril de abril de 1998, ingressou no serviço público estadual e passou por treinamento no posto Sé, o posto pioneiro do programa, inaugurado em outubro de 1997. E foi trabalhar, como assistente de atendimento, na agência Luz, desde a sua abertura.

Em 15 anos dedicados ao Poupatempo, a hoje executiva passou por várias funções: coordenadora geral (Agência Luz) e coordenadora de atendimento (Sé). Depois, gerenciou os postos de São Bernardo do Campo e de Itaquera. Atualmente comanda as unidades Sé (750 funcionários) e Luz (200 servidores), curiosamente, onde iniciou a carreira.

Cândida diz gostar de treinar e de comandar equipes, em especial, de trabalhar com pessoas de perfis diversificados – característica presente no trabalho do Poupatempo. Hoje, com 42 anos, casada, mãe de gêmeas, com duas especializações no currículo, ela tem uma vida dedicada à família, à formação acadêmica e, em especial, a aperfeiçoar o atendimento ao cidadão. Uma tarefa desafiadora e bem-sucedida, visto que, em 2012, pesquisas revelaram 95% de satisfação com o serviço do Poupatempo.


Quando Luciana Quintanilha entrou para os quadros da Polícia Civil, há 28 anos, o universo da instituição também era dominado por homens. “Eu cursava biologia na PUC Campinas e prestei concurso para a Polícia Civil para ajudar meu pai nas despesas com a universidade”. Há quase três décadas atua na área, hoje como perita criminal e especialista em documentoscopia. “É um universo fascinante no qual não existe rotina”. Entre macroscópios, ela é especialista em detectar documentos e dinheiro falsos. Fluente em inglês, já visitou diversos países e participou de inúmeros congressos (inclusive conheceu o Federal Reserve nos Estados Unidos). E trata de dividir suas conquistas: ensina documentoscopia e inglês na Acadepol.


Tudo nos trilhos

Em maio de 2012, Alexandra Leonello Granado assumiu a diretoria de assuntos corporativos do Metrô paulistano. Em 45 anos de existência da companhia, a administradora, antes advogada da empresa, foi a primeira mulher a assumir um cargo de diretoria no Metrô.

A executiva comenta que as áreas de transportes e de engenharia, trabalhos típicos do Metrô, tradicionalmente despertam maior interesse do maior público masculino – 70% do corpo funcional do Metrô ainda é formado por homens. Entretanto, o perfil do quadro vem se modificando. Ela própria é um exemplo: comanda 604 funcionários, divididos entre os setores jurídico, compras e contratações, infraestrutura, serviço interno e recursos humanos.

Com 41 anos, casada e mãe de dois meninos, Alexandra diz que sempre foi bem recebida pelos colegas homens e que essa junção – homens e mulheres –traz muitos benefícios para as empresas.

É grata ao marido, “que divide a educação das crianças comigo”, e como dica para quem ingressa no mercado de trabalho, sugere desprendimento.“Independente mente do sexo, concluir uma faculdade já não é suficiente. A preparação tem de ser constante, pois os espaços se abrem para quem se dedica com afinco”.


Café e simpatia

Ivanete da Silva Melo esbanja alegria pelas salas da Secretaria Estadual do Trabalho e Relações do Emprego (Sert). Copeira há dez anos, a sergipana de Estância cuida dos colegas com o mesmo carinho que dedica à família, principalmente aos dois netos. Bem falante, conta com orgulho sua nova conquista: “Vou utilizar a linha de crédito do Banco do Povo Paulista para reformar minha casa no Itaim Paulista”.

Para Ivanete não há mau tempo. “As mulheres não devem temer nada, a não ser a falta de vontade. Com fé em Deus, consegui criar meus quatro filhos, construí uma casa, trabalho onde gosto. Até dou entrevistas para TVs e jornais, pareço uma celebridade,” brinca.


Aposentadoria é uma palavra que não existe no dicionário de Maria Rosa Baraldi nem de Etelvina Moreira de Souza, ambas de 65 anos. Maria Rosa, há 18 anos, é analista sociocultural da Secretaria Estadual de Esportes e coordena o Espaço Salutaris, uma academia para os funcionários da pasta. “Viajamos pelo interior para dar cursos e conhecemos pessoas maravilhosas que mudaram suas vidas, a partir daí.”


Já a história de Etelvina Moreira de Souza confunde-se com a história da Universidade de São Paulo. “Meus pais eram portugueses e tinham uma pequena chácara, onde está localizado hoje o Hospital Universitário no campus da USP”.

Aos 16 anos, ela deixou o lugar e foi morar na zona leste. Depois, o destino se encarregou de levá-la de volta à USP. E, há 27 anos, é conhecida como a Dona Etelvinha, a zelosa funcionária da Faculdade de Saúde Pública, onde cuida do laboratório, serviço de zeladoria e ainda tem tempo para estudar. “Meu conselho para as mais jovens? Estudem. A vida é um aprendizado e cada segundo deve ser aproveitado”.


Mudando rumos

Elaine de Carvalho é testemunha da história. Funcionária do TJSP, ela atua como agente de fiscalização judiciária há 27 anos. “Além de prestarmos serviços de atendimento ao cidadão que procura o TJ, nós damos assistência no controle das salas durante os julgamentos”. Ela assistiu aos principais casos que tiveram grande clamor público como os julgamentos de Suzanne Von Richtofen, o de Lindenberg e dos Nardoni.

Tecnóloga em contabilidade, Elaine mudou radicalmente de profissão ao ver a oportunidade da estabilidade de um emprego numa carreira pública. “Para as mulheres, a área de segurança ainda representa alguns obstáculos, principalmente das pessoas que não pertencem ao setor. Geralmente, eles associam segurança com homens sarados em ternos escuros”. Elaine chefiou durante cinco anos o departamento de fiscalização judiciária do Fórum Criminal da Barra Funda. “Era como matar um leão por dia, mas valeu cada segundo”.


Aos 33 anos, Marinalva Cruz, supervisora do Programa de Apoio à Pessoa com Deficiência (Padef), acredita na capacidade do ser humano em mudar sua própria história. “Independentemente das limitações, todos têm direito à educação e ao trabalho. Não é diferente aqui, quando lidamos com pessoas com deficiência”. Os resultados comprovam. De 1995 a 2012, 65 mil pessoas com deficiência procuraram o Padef. Mais de 12,7 mil conseguiram a tão almejada vaga de trabalho.

A supervisora do Padef, formada em Recursos Humanos, acredita que a real inserção das pessoas com deficiência, só ocorrerá com a mudança cultural e empresarial. “Temos pessoas deficientes com excelente qualificação acadêmica e profissional. Eles só precisam de oportunidade”.

Maria Lúcia Zanelli e Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas I e IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 07/03/2013. (PDF)

Banco do povo: R$ 1 bilhão de empréstimo

Banco do Povo atinge R$ 1 bilhão em empréstimos. Com taxa de juros menor e aumento no limite do valor financiado, instituição pretende aumentar volume de operações

Conhecido como Banco do Povo Paulista (BPP), o Fundo de Investimento de Crédito Produtivo Popular do Estado alcançou neste mês volume de R$ 1 bilhão emprestado. Na manhã de segunda, 20 de agosto, o Palácio dos Bandeirantes, sede do Governo paulista na capital, foi palco de evento comemorativo ao valor inédito de dinheiro financiado com juros subsidiados.

Instituído pela Lei nº 9.533, de 30 de abril de 1997, o programa paulista de microcrédito é uma iniciativa pioneira no Brasil, realizada pela Secretaria Estadual do Emprego e Relações do Trabalho (Sert). Funciona em parceria com as prefeituras e entidades de apoio e fomento ao empreendedorismo, como o Sebrae. A primeira agência do Banco do Povo foi aberta em setembro de 1998, em Presidente Prudente.

O BPP cobra juros de 0,5% ao mês, a menor taxa do País. O valor financiado varia de R$ 200 a R$ 15 mil. No primeiro semestre de 2012, o volume de dinheiro emprestado dobrou em comparação com o mesmo período de 2011 e atingiu R$ 107,6 milhões.

“Neste período, atendemos mais de 20 mil microempreendedores paulistas. A expectativa é crescer ainda mais nos próximos anos”, afirma Antonio Mendonça, diretor-executivo da instituição financeira.

Desde a fundação, já atendeu 252 mil microempreendedores em mais de 289 mil operações. Hoje está em 496 municípios e tem como meta alcançar um posto disponível em cada uma das 645 cidades paulistas até o final de 2014.

Para efeito comparativo, o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) anunciou acúmulo de R$ 300 milhões em operações de microcrédito no período de sete anos (entre 2005 e 2012). Já o BPP no mesmo período atingiu quase 203 mil pessoas, com um volume de investimento superior a R$ 774 milhões.

Emprego e renda

A proposta primordial do Banco do Povo é gerar emprego e renda, por meio da concessão de crédito para o desenvolvimento de pequenos negócios urbanos ou rurais, formais ou informais. E oferecer para empreendedor individual, empresa ou cooperativa alternativa de empréstimo, e com parcelas fixas e juro prefixado em 0,5% ao mês, para todas as linhas de crédito, taxa menor que a cobrada pelos bancos comerciais.

Não há cobrança de taxa para abertura de crédito, cadastro e elaboração de contrato. Em fase de expansão, o BPP pretende ampliar o volume de operações financeiras. E atuará em setores rurais realizando empréstimos nas áreas de quilombo e para assentados.

Para conseguir financiamento, o interessado deve conferir se possui os requisitos exigidos pelo programa e verificar se há posto do Banco do Povo na cidade em que reside e em que mantém o negócio.

Dá para pedir o financiamento na agência local ou pela internet, no site do BPP. O site também informa a relação completa de endereços em todo o território paulista e permite simular o valor das parcelas a serem pagas pelo empréstimo.

Pelas regras do Banco do Povo, cada solicitante tem direito a pedir apenas um empréstimo por vez. Quando quita a última parcela do primeiro, fica liberado para pedir o segundo. O dinheiro a ser cedido pode ser usado como capital de giro ou investimento fixo ou, ainda, agregar as duas possibilidades.

O negócio também precisa ter faturamento bruto de até R$ 360 mil nos últimos 12 meses e não ter “nome sujo” na Serasa ou no Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC) ou Cadastro Informativo de Créditos não quitados do setor público Estadual (Cadin).

Solicitante pessoa física pode parcelar o pagamento em até 24 meses. Precisa morar na mesma cidade há mais de dois anos ou ter seu negócio aberto há mais de dois anos no município. Já pessoa jurídica pode dividir em até 36 meses. Não há restrição de tempo de residência.

Como garantia, é necessário um avalista sem restrição cadastral, podendo ser parente de primeiro grau. Há, ainda, a alienação fiduciária, para empréstimo na modalidade investimento fixo com transferência da posse de um bem móvel ou imóvel do devedor ao credor para garantir o pagamento.

Alma do negócio

O agente de crédito é o principal elo entre o empreendedor e o BPP. Seu trabalho inclui atender ao empreendedor e encaminhar seu pedido de empréstimo para o Comitê de Crédito Operacional, grupo responsável por deferi-lo ou não, a partir de critérios técnicos. E depois acompanhá-los, ao longo do processo.

Quando o pedido de crédito é aprovado, são feitos orçamentos com três fornecedores, que têm o produto ou serviço desejado pelo tomador de empréstimo. O de menor valor cobrado vence a concorrência. Em média, o dinheiro demora uma semana para ser liberado. Dez dias depois, o agente de crédito retorna ao local do empreendimento para conferir se o recurso teve a destinação correta.

O agente de crédito orienta o cliente com relação ao prazo ideal do empréstimo e do valor das parcelas. Também é feita sempre uma avaliação da sua capacidade de pagamento, assim como o avalista é analisado. Se ao longo do primeiro financiamento não houver nenhum atraso de pagamento superior a 30 dias, o segundo não exige avalista.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente na página II do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 22/08/2012. (PDF)

Banco do Povo Paulista cresce fazendo empreendedores

Com 11 mil operações financeiras e R$ 58 milhões repassados, montante financiado para microempreendedores no primeiro trimestre é recorde

Conhecido como Banco do Povo Paulista, o Fundo de Investimento de Crédito Produtivo Popular do Estado alcançou volume recorde de empréstimos nos três primeiros meses de 2012. Com 11 mil financiamentos, a instituição ampliou em 66% a quantidade de transações realizadas no mesmo período de 2011. E repassou R$ 58 milhões, montante 135% superior ao cedido no ano anterior.

Instituído pela Lei nº 9.533, de 30 de abril de 1997, o programa paulista de microcrédito é uma iniciativa pioneira no Brasil, realizada pela Secretaria Estadual do Emprego e Relações do Trabalho (Sert). Funciona em parceria com as prefeituras e entidades de apoio e fomento ao empreendedorismo, como o Sebrae.

A proposta primordial do Banco do Povo é gerar emprego e renda, por meio da concessão de crédito para o desenvolvimento de pequenos negócios urbanos ou rurais, formais ou informais. E oferecer para empreendedor individual, empresa ou cooperativa uma alternativa de empréstimo, e com parcelas fixas e juro prefixado em 0,5% ao mês, para todas as linhas de crédito, taxa menor que a praticada pelos bancos comerciais. Não há cobrança de taxa para abertura de crédito, cadastro e elaboração de contrato.

A primeira agência do Banco do Povo foi aberta em setembro de 1998, em Presidente Prudente. Ao longo de 14 anos, a instituição realizou 276 mil operações e concedeu empréstimos de R$ 930 milhões. Hoje, está presente em 472 municípios e tem como meta alcançar um posto disponível em cada uma das 645 cidades paulistas até o final de 2014.

Regras

Para conseguir financiamento, o interessado não pode ter ‘nome sujo’ no Serasa, no Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC) ou no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Estadual (Cadin). Pelas regras do Banco do Povo, cada solicitante tem direito a pedir apenas um empréstimo por vez. Só quando quitar a última parcela do primeiro fica liberado para pedir o segundo. O dinheiro pode ser usado como capital de giro ou investimento fixo ou, ainda, agregar as duas possibilidades. O faturamento bruto da empresa não pode exceder a R$ 360 mil nos últimos 12 meses.

O solicitante (pessoa física) pode parcelar o pagamento em até 24 meses. Além disso, precisa morar na mesma cidade há mais de dois anos ou ter seu negócio aberto há mais de 24 meses no município. Já a pessoa jurídica pode dividir a dívida em até três anos. Não há restrição de tempo de residência.

Como garantia, é necessário um avalista sem restrição cadastral, podendo ser parente de primeiro grau. Há ainda a alienação fiduciária, para empréstimo na modalidade investimento fixo com transferência da posse de um bem móvel ou imóvel do devedor ao credor para garantir o pagamento.

É possível pedir o financiamento na agência local ou pela internet. O site do programa também informa a relação de endereços em todo o território paulista e permite simular o valor das parcelas a serem pagas.

Decorando o mundo

O artesão Paulo César Santana tem 32 anos e se mudou de Ilhéus (BA) para São Paulo aos 15. Autodidata e criador de peças para decoração e utilidades domésticas, ao longo dos anos aprimorou sua técnica de pintura de revestimentos em gesso, vidros e materiais plásticos. No apartamento que divide com dois amigos, no bairro de Campos Elíseos, capital, ele produz e vende gatos, elefantes, namoradeiras, cães e imagens de diversas denominações religiosas. No Facebook, também expõe e comercializa seus trabalhos, neste link.

“Conheci o serviço de microcrédito paulista por intermédio de uma amiga. Na agência Centro, fui muito bem atendido e pedi R$ 1,2 mil para financiar matérias-primas, como tintas e pincéis. No encontro, ela sugeriu e eu aceitei formalizar o meu negócio, no programa de Empreendedor Individual (EI) do Governo federal. E me informou sobre as condições de pagamento das dez parcelas mensais de R$ 120. Depois ele foi conhecer meu ateliê improvisado no apartamento”, conta Paulo.

“Os passos seguintes foram conseguir um avalista e apresentar no Banco do Povo a nota fiscal de compra dos produtos. Nem vi o dinheiro, que foi depositado, por meio de cheque administrativo, na conta do fornecedor. Uma semana depois recebi o material e comecei a trabalhar. Hoje, já vendi todas as peças”, comemora.

“Este incentivo do Governo para quem quer trabalhar por conta própria é fundamental. Agora, só faltam duas parcelas. Depois, pretendo financiar um carro para usar como loja ambulante. A ideia é descer para o litoral nos finais de semana e comercializar as peças”, finaliza.

Embelezando a vida

Para fazer seu negócio progredir, a esteticista e cabeleireira Aldaíra de Oliveira deixou de atender clientes de depilação em domicílio e montou seu novo salão de beleza e perfumaria no primeiro andar de uma galeria comercial, no bairro do Bom Retiro, na capital. Para comprar móveis, lavatório, cadeira de manicure, autoclave e esterilizador, retirou financiamento de R$ 5 mil, a serem pagos em 36 parcelas.

“Uma propaganda na televisão já tinha me chamado a atenção para o Banco do Povo. Quando fiz o curso gratuito de empreendedorismo no Sebrae, aprendi a gerenciar o negócio e fui novamente informada sobre essa possibilidade de conseguir o dinheiro”, recorda. “Antes de fazer o financiamento, o negócio já era formalizado há três anos, mas lá aprendi a separar a conta do salão do meu dinheiro pessoal. Aqui tenho salário, como se fosse funcionária”, explica.

“No salão, minha colega cabeleireira não é funcionária. Trabalha como autônoma e recebe porcentagem pelo serviço prestado. Para não me apertar com o financiamento, fui orientada no Banco do Povo a fazer prestações de menor valor e estender a dívida por um prazo mais extenso. Assim, nos meses de verão, em que o movimento cresce, antecipo o pagamento de algumas parcelas e consigo diminuir o valor total da dívida. Pretendo quitar o empréstimo antes do prazo previsto”, avisa.

O salão de Aldaíra funciona de segunda-feira a sábado, das 8 às 22 horas. “Não faltam clientes e 90% delas são coreanas, funcionárias e donas de lojas da região. Elas não priorizam luxo, mas exigem qualidade”, revela.

“Gostei muito do atendimento do Banco do Povo e o recomendei para duas amigas. Aliás, hoje sou fiadora dos empréstimos que elas fizeram”, conta a empreendedora de 42 anos e que há 27 mora na capital. “O controle do dinheiro que consigo no salão me permite visitar meus pais todos os anos na minha cidade natal, Ibiquera (BA), na região da Chapada Diamantina”.

Alimentando o futuro

A família de Aparecido Igino de Souza deixou de fazer marmitas em casa. Com os R$ 5 mil obtidos no Banco do Povo, a serem pagos em mensalidades de R$ 180 até o final de 2013, montou um restaurante na região da Estação da Luz, na capital. O filho de Aparecido foi avalista do financiamento.

O dinheiro ajudou a bancar a reforma e adaptação do ponto comercial para funcionar como bar e lanchonete. Na sequência, também formalizaram o negócio no programa de Empreendedor Individual (EI).

Em média, são produzidas 200 refeições por dia. O serviço emprega também a esposa e a filha de Aparecido, e mais uma auxiliar na cozinha. “A maior parte da receita vem das entregas de marmitex, uma clientela boa, que eu já tinha antes de abrir o restaurante. Mas quando passei a atender o público da redondeza, as vendas aumentaram. E, em alguns dias da semana, também sirvo jantar para caminhoneiros”, conta Aparecido.

Alma do negócio

Antônio Sebastião Teixeira Mendonça, diretor-executivo, comenta que desde a criação do Banco do Povo a inadimplência se mantém na média de 2% sobre o volume de operações. “A maioria dos tomadores de empréstimo paga em dia suas prestações. É um perfil de cliente que tem seu nome no mercado como sua principal referência. E faz de tudo para mantê-lo limpo”, avalia Antônio.

O diretor-executivo diz que em 14 anos o valor médio emprestado foi de R$ 3,3 mil. Nos três primeiros meses de 2012, este total saltou para R$ 5,3 mil. Além da maior procura pelo serviço, a elevação também foi motivada pela ampliação em 2011 do limite de crédito passível de ser emprestado. O valor dobrou: passou de R$ 7,5 mil para R$ 15 mil.

“O agente de crédito é o principal elo entre o empreendedor e a instituição”, observa. “Estes profissionais são a alma do negócio, quem realmente executa o programa”, afirma Antônio. O trabalho do agente de crédito inclui atender o empreendedor e encaminhar seu pedido de empréstimo para o Comitê de Crédito Operacional, grupo responsável por deferi-lo ou não, a partir de critérios técnicos. E depois acompanhá-los, ao longo do processo.

Quando o pedido de crédito é aprovado, são feitos orçamentos com três fornecedores que dispõem do produto ou serviço desejado pelo tomador de empréstimo. O de menor valor cobrado vence a concorrência. Em média, o recurso demora uma semana para ser liberado. Dez dias depois, o agente de crédito retorna ao local do empreendimento para conferir se o recurso teve a destinação correta.

O agente de crédito também orienta o cliente com relação ao prazo ideal do empréstimo e do valor das parcelas. Também é feita sempre uma avaliação da sua capacidade de pagamento, assim como a do avalista. Se ao longo do primeiro financiamento não houver nenhum atraso de pagamento superior a 30 dias, o segundo pode ser concluído sem avalista.

Ouvir para orientar

Simoni Almeida Canella é agente de crédito da unidade Centro do Banco do Povo, na capital. Desde março de 2011 ela trabalha no posto instalado dentro da Associação Comercial do Estado, na Rua Galvão Bueno, bairro da Liberdade. Mesmo com pouco tempo na função, é profissional das mais destacadas. Seu trabalho foi elogiado e recomendado pelos três empreendedores entrevistados pela reportagem.

“Um dos segredos do atendimento é sempre ouvir bastante o cliente, para assim compreender quais são suas necessidades e possibilidades”, conta Simoni. “Gostar do trabalho e de lidar com o público também é fundamental. Muitos interessados chegam ao balcão sem saber ao certo como pedir um empréstimo. É gratificante orientá-los para expandir seu negócio e crescer com segurança e rentabilidade. E claro, também ajudá-los a realizar seus sonhos”, diz, orgulhosa.

Meio milhão de novos negócios

Um dos reflexos dos empréstimos feitos pelo Banco do Povo Paulista foi que, no primeiro trimestre de 2012, o Estado de São Paulo atingiu a marca de 500 mil microempreendedores individuais registrados. Os dados são da Junta Comercial do Estado (Jucesp).

Em 2011, foram abertas no Estado 444,6 mil empresas, sendo 54% microempreendedores individuais. A maioria deles, 82%, está nos setores de comércio, serviços e construção civil; 79% têm ensino médio completo e 61% atuavam na informalidade antes de ingressar no programa de Empreendedor Individual (EI). Os dados são de pesquisas de perfil destes empreendedores divulgadas pelo Sebrae no ano passado.

“Os registros da nova modalidade ainda deverão continuar crescendo durante um período, até se estabilizar a longo prazo, abrindo caminho para transformações em modelos que permitam a ampliação do porte empresarial”, afirma o presidente da Jucesp, José Constantino de Bastos Júnior. Segundo a Jucesp, o registro de EI cresceu 41% no ano passado em relação a 2010, enquanto o total de abertura de empresas aumentou 27% no período.

Os dez tipos de empreendimento que mais deixaram a informalidade no primeiro trimestre de 2012 foram, pela ordem, comércio varejista de artigos de vestuário; cabeleireiros; execução de trabalhos de pedreiro; estética corporal; alimentação e lanchonetes; bares e outros estabelecimentos especializados em bebidas; fornecimento de marmitex; eletricista residencial; costura e confecção sob medida; manutenção de computadores.


Evolução das operações

Ano Operações Valor emprestado (em R$)
1998 102 170.197,65
1999 1.409 2.870.966,60
2000 5.188 11.714.039,19
2001 9.038 20.830.859,87
2002 17.186 42.399.328,86
2003 27.523 74.317.759,05
2004 26.744 76.356.541,16
2005 24.059 72.688.128,73
2006 24.588 79.865.094,26
2007 21.338 72.963.500,16
2008 20.261 77.790.717,00
2009 25.530 92.217.814,96
2010 28.802 107.193.307,73
2011 31.953 132.326.289,79
2012* 12.511 67.513.578,20
Total 276.232 931.218.123,21

*= até 18/4/2012
(Fonte: Banco do Povo Paulista)

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas II e III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 10/05/2012. (PDF)