Unesp inova em cirurgia de crânio

Peça de acrílico desenvolvida em impressora 3D foi utilizada com sucesso em procedimento cirúrgico; pesquisadores solucionam caso complexo de menino de 6 anos com fratura na cabeça

Pesquisa inédita da Universidade Estadual Paulista (Unesp) possibilitou a realização com sucesso, na segunda-feira, 1º, de cirurgia de implante de crânio (cranioplastia) em um menino de 6 anos de idade. Executada em duas horas, a operação foi realizada no Hospital das Clínicas (HC) da Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB-Unesp).

O procedimento cirúrgico de alta complexidade teve a coordenação dos cirurgiões Aristides Palhares (cirurgia plástica) e Pedro Hamamoto (neurocirurgia), ambos professores da instituição. Custeada pelo Sistema Único de Saúde (SUS), a cranioplastia foi realizada no HC de Botucatu, hospital universitário vinculado à Secretaria de Estado da Saúde, que oferece atendimento gratuito à população.

Tridimensional

A cirurgia consistiu em implantar uma peça de acrílico tridimensional no crânio do paciente. Desenvolvido sob medida, o biomaterial teve como origem imagens contidas em duas tomografias remetidas pelo professor Palhares para o Centro Avançado de Desenvolvimento de Produtos (Cadep). Especializada em impressão tridimensional (3D) e prototipagem rápida, a unidade especial da Unesp é vinculada à Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação de Bauru (Faac-Unesp).

Responsável pelo Cadep, o professor Osmar Rodrigues, do Departamento de Design da Faac, explica que a peça de acrílico é segura, resistente e compatível com os tecidos do organismo, sem risco de rejeição. Sua confecção exigiu oito dias de trabalho e foi projetada com uma folga proposital de dois milímetros – espaço considerado suficiente para a instalação do implante e possibilitar o crescimento da caixa craniana da criança.

Monitoramento

Responsável geral pelo projeto, o pesquisador Palhares explica que o garoto já recebeu alta hospitalar. Observa, contudo, que ele seguirá sob acompanhamento médico permanente até a adolescência, quando terá seu quadro clínico reavaliado por completo.

Especialista em cirurgia plástica, Palhares informa que a cranioplastia não é técnica médica inédita no País. Destaca, entretanto, o pioneirismo e o protagonismo da Unesp ao solucionar, internamente, uma demanda específica de alta complexidade. Sobre o paciente, explica o motivo do trauma: a queda de uma laje de três metros de altura, cujo impacto da batida provocou grave traumatismo e levou à perda de tecido ósseo, abrindo fenda de 10 cm por 13 cm de área na cabeça do menino.

Fila do implante

Há quatro anos aguardando a cirurgia, a criança encabeçava lista com mais de 50 pacientes com diferentes traumas à espera de um implante ósseo sob medida. A cirurgia possibilitou reconstituir o tecido ósseo perdido, recuperar a forma e aspecto originais do crânio e assegurar proteção mecânica e física ao cérebro e demais órgãos interligados.

“Esse caso abre nova ‘janela’ científica para a pesquisa nacional”, comenta o pesquisador da FMB-Unesp. “Exigiu abordagem multidisciplinar e inovadora, integrando áreas distintas da universidade, como neurologia, cirurgia plástica e o design tridimensional da peça. Demonstrou, na prática, a importância do investimento em recursos humanos, científico e tecnológico no Estado de São Paulo e no País”, destaca Palhares.


Inovação em design

Os profissionais do Centro Avançado de Desenvolvimento de Produtos (Cadep) mantêm diversos projetos nas mais variadas áreas do design. O centro foi inaugurado em 2012 e sua sede e maquinários especializados funcionam em instalações próprias da Faac, em Bauru, cujos laboratórios atendem a pesquisas conjuntas de graduação e pós-graduação da Unesp e de outras instituições científicas.

O Cadep atende também a empresas, preservando os segredos industriais. Os setores já contemplados são o automotivo, metalúrgico, moveleiro, eletroeletrônico, brinquedos, miniaturas e plásticos, entre outros. O professor Osmar Rodrigues, coordenador do Cadep, conta que a primeira incursão do centro na área da biologia foi em 2013.

Na época, o desafio proposto à sua equipe de cinco pesquisadores bolsistas foi projetar e construir, em resina biocompatível, a parte superior do bico de um tucano (foto). Bem-sucedida, a peça implantada repôs o pedaço original do bico da ave, que fora dilacerado por uma mordida de cachorro e prejudicava na alimentação e deglutição.

Novas frentes

A experiência na área veterinária abriu espaço para o desenvolvimento da peça para a cranioplastia realizada em Botucatu. Na avaliação de Rodrigues, a operação é promissora. Especialista em design, ele visualiza, agora, como desdobramento natural do trabalho, atender os demais pacientes que seguem na fila de espera de implantes do HC-FMB.

“Há também diversas possibilidades, como fornecer materiais odontológicos, pinos e implantes. Hoje, a modelagem 3D é mais precisa e mais barata do que a manual”, observa. “As tecnologias de prototipagem, modelagem e impressão tridimensional (3D) seguem disponíveis em diversos centros de pesquisa pelo mundo. Mas o grande diferencial do Cadep é mesclar a experiência adquirida na manipulação de diversos materiais e equipamentos com as técnicas mais recentes”, revela.

Serviço

Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB)
Hospital das Clínicas de Botucatu (HC-FMB)
Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação (Faac)
Centro Avançado de Desenvolvimento de Produtos (Cadep-Faac)

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente na página IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 05/09/2015. (PDF)

Hospital de Transplantes ensina a prevenir doenças de inverno

Com a chegada do inverno, pacientes transplantados e seus familiares devem redobrar os cuidados com a saúde. O alerta é da especialista Paula Tuma, do Hospital de Transplantes Euryclides de Jesus Zerbini, unidade vinculada à Secretaria de Estado da Saúde e gerenciada em parceria com a Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina.

A infectologista, que também é coordenadora do Centro de Controle de Infecção Hospitalar da instituição, explica que o uso de drogas para evitar a rejeição ao órgão do doador diminui as defesas do sistema imunológico da pessoa que realizou o procedimento. Como é medicação de uso contínuo (com a dosagem variando ao longo do tempo), as temperaturas mais baixas aumentam as possibilidades de doenças oportunistas, como gripes, resfriados e pneumonias.

De modo geral, a especialista recomenda procurar o médico e pedir informações sobre quais vacinas devem ser atualizadas, “pois as necessidades variam conforme cada caso”.

Dicas

  • Buscar orientação individual diretamente com o infectologista.
  • Sempre lavar as mãos com água e sabão.
  • Manter ambientes domésticos limpos, inclusive para os familiares da pessoa que fez o transplante.
  • Evitar espaços coletivos e fechados, com grandes aglomerações – metrô, ônibus, restaurantes e outros ambientes favoráveis ao contágio.
  • Alimentar-se de modo correto, adotando dieta rica em frutas, verduras e legumes.
  • Hidratar-se bem com água e sucos de frutas.
  • Ao sentir-se resfriado, procurar logo o médico, não esperando que o quadro piore, e evitar ambientes climatizados – com aquecedores ou ar-condicionado.

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente na página IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 03/07/2015. (PDF)

Molécula pode ser usada na luta contra o câncer

Pesquisa do Instituto Butantan obtém proteína capaz de eliminar células de tumores sem atacar tecidos sadios; trabalho gerou parceria com Fapesp, IPT, BNDES e União Química

Ao estudar moléculas anticoagulantes existentes no DNA de animais hematófagos (que se alimentam de sangue), o grupo multidisciplinar de 20 cientistas, coordenado pela farmacêutica-bioquímica Ana Marisa Chudzinski-Tavassi, do Instituto Butantan, identificou uma que se revelou promissora para o desenvolvimento de drogas anticâncer.

Testada com sucesso em roedores e não roedores, a proteína obtida a partir da molécula consegue eliminar células de tumores de modo eficaz e com ação localizada, sem atacar tecidos sadios.

Iniciado em 2005, o trabalho, pioneiro no País, teve apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado (Fapesp) e da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação de São Paulo.

Com término previsto para o fim de 2017, o estudo tem custo total estimado de R$ 20 milhões e já apresenta como resultados uma patente no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) e a montagem de uma plataforma (laboratório) de pesquisa no Butantan para purificação de moléculas.

Parceiros

Apostando na viabilidade da molécula, três novas instituições foram incorporadas ao trabalho e passaram a atuar ativamente no projeto. A primeira da lista é o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), ligado ao governo federal, cujo repasse de verbas foi feito por meio do financiamento de Fundo Tecnológico (Funtec).

O segundo parceiro é o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), que estuda a estruturação da produção da molécula em escala industrial. O último é a União Química, empresa farmacêutica que adquiriu o direito de reaproveitar a tecnologia desenvolvida para fabricar medicamentos com base na descoberta do Butantan, instituto vinculado à Secretaria de Estado da Saúde.

A empresa aguarda autorização e orientações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para iniciar testes com seres humanos. A expectativa é que essa definição ocorra em breve e a avaliação com voluntários tenha início no segundo semestre.

Inspiração

A glândula salivar do carrapato-estrela, transmissor da febre maculosa, foi o ponto de partida do trabalho. A cientista Ana Marisa, diretora do Laboratório de Bioquímica e Biofísica do Butantan, explica que a proposta era descobrir quais moléculas estavam presentes no impedimento da coagulação do sangue do animal picado (hospedeiro), ou seja, no momento em que o aracnídeo se alimenta.

O passo seguinte foi identificar qual dessas moléculas teria maior potencial para originar anticoagulantes (capazes de impedir tromboses) e anti-hemostáticos (para prevenir hemorragias). “Muitos pesquisadores buscam novos agentes biológicos com essas características, pelo fato de terem diversas aplicações nas áreas médica, farmacêutica e veterinária”, explica Ana Marisa.

Identificado o gene, os pesquisadores do instituto obtiveram, em laboratório, uma proteína recombinante com as características da molécula. A técnica usa micro-organismos (bactérias) na produção do material, que também é purificado (esterilizado) e submetido a análises para comprovar sua ação anticoagulante e anti-hemostática.

Novos rumos

Ana Marisa explica que vários tipos de tumores têm atividade pró-coagulante. Nos testes de eficácia, a molécula se mostrou também capaz de identificar e eliminar células de câncer de pele, de pâncreas e de rim. “A descoberta deu novo direcionamento à pesquisa. O desafio foi, então, descobrir como funcionam exatamente esses mecanismos e definir meios para repetir em escala industrial a produção da molécula obtida em laboratório”, ressalta.

Em 2011, o Butantan firmou convênio com o IPT, órgão também vinculado à Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação, para orientar o método de escalonamento da produção e repassá-lo à União Química. No instituto vizinho do Butantan, e também sediado na Cidade Universitária, na capital, o trabalho é coordenado pela pesquisadora Maria Filomena Rodrigues, do Laboratório de Biotecnologia Industrial.

Farmacêutica-bioquímica, Maria Filomena comanda no IPT equipe multidisciplinar de 20 pesquisadores dedicados à preparação da molécula para sua produção em biorreatores (fermentadores). Um dos desafios do grupo foi encontrar o meio ideal para o crescimento da bactéria que produz a proteína recombinante derivada da molécula, além de buscar opções para reduzir custos e aumentar a produtividade.

“Em 2006, troquei impressões com a Ana Marisa sobre o estudo dela, que ainda estava na fase de extração da saliva do carrapato. Hoje, com o trabalho encaminhado, ele é visto como resultado do empenho coletivo (Butantan, IPT, BNDES, Fapesp e União Química) em definir um modelo interessante de financiamento de pesquisa e, ao mesmo tempo, de prestação de serviços à sociedade”, revela, orgulhosa.

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente na página II do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 24/06/2015. (PDF)