Projeto Parcelas Permanentes constrói base de dados sobre a biodiversidade

Pesquisa financiada pela Fapesp estuda as quatro principais formações florestais do Estado e aponta caminhos para a preservação ambiental

O projeto Parcelas Permanentes é um dos estudos que compõem o Biota-Fapesp, iniciativa multidisciplinar de mapeamento e identificação de toda fauna e flora paulista realizada por diversas universidades e centros de pesquisa do Estado. Iniciado em 2001, o trabalho é pioneiro no País e consiste em conhecer e estudar os mecanismos de funcionamento das quatro principais formações florestais de São Paulo e apontar as diferenças básicas existentes entre esses ecossistemas.

São eles: a Restinga, presente na Ilha do Cardoso, no município de Cananeia, no litoral sul; a Floresta de Encosta, no Parque Estadual de Carlos Botelho, no município de Sete Barras, no sul do Estado; o Cerradão, existente na Estação Ecológica de Assis, no oeste e a Floresta Estacional Semidescidual, na Estação Ecológica dos Caetetus, na cidade de Gália, localizada na região central de São Paulo, proximidades de Bauru.

O estudo relaciona os fatores abióticos (solo, luz e clima) e bióticos (fauna, flora e micro-organismos) que influenciam a manutenção dessas formações. As informações coletadas no campo se transformaram em artigos científicos publicados, livros, teses e atualmente alimentam o sistema de dados existente na internet, que informa sobre a incidência e a distribuição de espécies vegetais nas formações florestais típicas do Estado.

A coleta de dados também oferece bases científicas para futuras pesquisas e contribui para a preservação da biodiversidade nativa e de áreas de reprodução, como matas ciliares e manguezais. Além disso, o conhecimento dessas dinâmicas permite a utilização das informações em projetos de reflorestamento e de exploração sustentável.

A pesquisa científica realizada pelo Projeto Parcelas Permanentes é de caráter básico e foi dividida em duas fases. A primeira tem término previsto para fevereiro de 2006 e recebeu investimento da Fapesp de R$ 1,2 milhão. A segunda etapa, será realizada com a renovação do projeto temático e começará no ano que vem.

Trabalho de campo

Em cada uma das quatro áreas de estudo, cerca de 90 pesquisadores de diversas instituições como USP, Instituto Florestal (IF), Unesp, Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), Unicamp, Embrapa e Instituto Agronômico de Campinas (IAC) demarcaram uma área quadrangular, de 10,2 hectares.

Na área selecionada, cada árvore com mais de 15 centímetros de diâmetro de tronco recebeu uma plaqueta de identificação, contendo o nome e número do indivíduo, e sua posição na parcela foi georreferenciada – mapeada por satélite, para indicar para os pesquisadores a sua coordenada correta (latitude e longitude) dentro da parcela. A medida tinha por objetivo estudar a incidência e a distribuição espacial de cada uma das espécies, acompanhar o seu desenvolvimento e estudar suas relações com as outras espécies e sua interação com o conjunto do ecossistema.

A abrangência do estudo também considerou aspectos como os tipos de solo, a topografia, a variação climática durante quatro anos, a presença de luz e de lençóis freáticos e da luz, e a fauna microbiana do solo. A proposta inicial da pesquisa é comparar os dados colhidos entre os quatro ecossistemas e o passo seguinte foi cruzar as informações com estudos semelhantes.

Ilha do Cardoso

Há dois anos e meio, a bióloga Cibele de Castro faz pós-doutorado na Esalq, e atua nas Parcelas Permanentes da Ilha do Cardoso e de Assis. Ela estuda a reprodução de espécies arbóreas – sua pesquisa consistiu em descobrir a proporção de diferentes sistemas sexuais presentes nas reservas florestais.

“Estudei as flores de todas as árvores e descobri como é, nas parcelas, a distribuição das plantas pelo sexo. Analisei também a dispersão de sementes no solo e na água, a polinização feita por beija-flores e encontrei variedades vegetais que são hermafroditas (possuem os dois sexos) e têm predominância masculina – situação bastante interessante na natureza”, explica Cibele.

Miguel Cooper, professor do Departamento de Solos e Nutrição de Plantas da Esalq, comenta que parte dos relatórios científicos já está disponível na internet, no site do Programa Biota-Fapesp. Empresas, municípios ou órgãos públicos interessados podem utilizar os dados, basta pedir autorização. E podem utilizá-los para recuperar áreas degradadas, criar loteamentos imobiliários, construir portos, aeroportos e rodovias, ou mesmo instalar redes de água e esgoto com o mínimo de impacto ambiental.

Especialista em solos, o agrônomo Miguel explica que o monitoramento realizado nas parcelas trouxe conhecimento bastante útil para os pesquisadores, que será transformado em livro.


Extração ilegal, ameaça permanente

No texto, serão apresentadas as saídas encontradas para contornar dificuldades administrativas e específicas de campo, como a demarcação do território das parcelas, o sistema de trilhas abertas no meio das matas e uma nova disciplina que foi incluída nos currículos superiores, que orienta o pesquisador sobre a adoção de condutas conscientes nos locais de preservação.

Extração do palmito

A colocação de placas nas árvores da parcelas segue padrões internacionais de identificação. E já foi realizada na Amazônia, na Costa Rica e Panamá, em florestas tropicais e equatoriais. A equipe de pesquisadores aponta, também, que a educação ambiental dos moradores das regiões que vivem nas áreas de preservação não é o foco primordial do trabalho, porém é uma possibilidade para o futuro.

Os estudos realizados podem facilitar, no futuro, caminhos para o manejo sustentado, nas regiões próximas das parcelas, de diversas variedades de matérias-primas da floresta com apelo comercial e que poderiam ser produzidas com esta finalidade. Exemplos são o palmito-juçara, o bambu, espécies de bromélias, samambaias, orquídeas, plantas ornamentais e outras espécies nativas da Mata Atlântica.

A extração ilegal do palmito é uma das ameaças à preservação dos ecossistemas remanescentes da Mata Atlântica. Para obter um cilindro de 40 cm do alimento, situado na extremidade mais alta da árvore, é preciso sacrificar uma palmeira com oito metros de altura, em média. O prejuízo é ampliado com o sacrifício de outras árvores que são derrubadas na queda do palmiteiro.

O corte de uma palmeira impede também o desenvolvimento de outras espécies vegetais que se fixam ao longo de seu tronco, como as orquídeas. Também prejudica insetos, aves, roedores e cobras que vivem e se reproduzem dentro da mata. Uma possibilidade de preservação é a criação de fazendas exclusivas para a finalidade de cultivo do palmito e também de bromélias, que têm a capacidade de se regenerar na natureza quando seus “copos” que armazenam água são cortados e plantados em vasos.

O trabalho do biólogo Tiago Breier, aluno de doutorado da Unicamp, foi florístico. Ele fez um levantamento de todas as espécies de plantas das quatro Parcelas Permanentes que se desenvolvem sem contato com o caule no solo. Do estudo de cipós, árvores e ervas, encontrou uma nova espécie de orquídea e, em breve, dará início à sua descrição e catalogação científica.

Breier também observou o processo de polinização de diversos vegetais e as interações existentes entre insetos, particularmente moscas e plantas. “O estudo mostrou que quanto mais grosso o tronco da árvore, maior o número de espécies e vegetais que se desenvolvem aderidas a ela”, explicou.

A bióloga Daniela Sampaio, doutoranda da Unicamp, publicou um livro contendo a identificação das espécies de árvores existentes na Ilha do Cardoso, em Cananeia, uma das quatro Parcelas Permanentes. E comentou que a maioria das espécies identificadas são árvores de grande porte, em média 20 metros de altura. Muitas são bastante conhecidas da população por seus nomes populares, como o jacarandá, o palmito-juçara, a canela e a clúsia, espécie ornamental muito utilizada em projetos paisagísticos.


Nascido e criado na Ilha do Cardoso

O mateiro Roberto Barreto nasceu na divisa do Estado de São Paulo com o Paraná. Há 30 anos é funcionário do Instituto Florestal e trabalha no Parque Estadual da Ilha do Cardoso. Ele ajudou a construir as cinco casas da ilha e conhece, de modo autodidata, todas as ilhas vizinhas e também todas espécies de animais e vegetais que vivem no ecossistema.

Roberto virou guia turístico e também referência para os pesquisadores, porque subia em árvores, indicava o caminho correto em todas as trilhas e ajudava na extração e coleta dos vegetais. Além disso, indicava os nomes populares das plantas, auxílio fundamental para a identificação das espécies. “Meu maior prazer ainda é poder estar presente todos os dias na Ilha do Cardoso”, afirma.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas I e IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 21/10/2005. (PDF)

Livro de experiências torna-se novidade na escola e está disponível na internet

Publicação aborda conceitos básicos de física e traz 32 experiências para serem reproduzidas na sala de aula e em casa

Com o objetivo de reforçar o aprendizado dos alunos do ensino fundamental e médio e enriquecer o conteúdo das aulas de física e ciências, o professor Luiz Antônio de Oliveira Nunes, da USP São Carlos, em parceria com a mestranda Alessandra Riposati, lançou o livro Física em Casa. A obra é distribuída gratuitamente online, e traz 32 experiências para serem reproduzidas pelas crianças em casa e na escola.

A publicação tem 68 páginas e é recomendada para ser utilizada como material de apoio aos livros didáticos tradicionais. O texto estimula o debate e a compreensão de tópicos fundamentais no estudo da física, em especial da eletricidade. É dividida em três capítulos, com 13 experiências de eletrostática na primeira parte; 11 de corrente elétrica na segunda; e, na última, oito estudos sobre magnetismo.

Luiz Antônio sugere que a realização das experiências siga a sequência proposta no texto, dessa maneira, o aproveitamento da obra é maior. Com exemplos do cotidiano, a criança começa a compreender o princípio de funcionamento do pára-raios, da bússola, da máquina fotocopiadora e do motor elétrico. O trabalho facilita o entendimento dos fenômenos naturais, e a absorção de conteúdos que antes eram ensinados somente de modo teórico, distante da realidade do aluno.

“Os experimentos utilizam materiais de baixo custo, e que não apresentam riscos à saúde – canudinhos, papel higiênico, vidro de maionese vazio, palitos de fósforo, pedaços de cartolina e garrafas PET. Todos esses itens podem ser encontrados em qualquer supermercado e, reunidos, não passam de R$ 50″, explica o professor.

A narrativa começa quando o líder de um grupo de garotos, chamado Tales, pesquisa na rede virtual a origem de seu nome e descobre, num site, a história do matemático grego Tales de Mileto, um dos precursores do estudo da eletricidade. Pelo computador, aprende uma das primeiras experiências realizadas sobre o assunto na antiguidade. Curioso para saber o desfecho da experiência realizada e seus desdobramentos, Tales começa a se corresponder com o responsável pelo site. Em vez de respostas prontas, recebe novas perguntas, que o induzem a prosseguir nas experiências, compreender os fenômenos e avançar na pesquisa.

Primeira edição

Luiz Antônio é pesquisador do Instituto de Física (IFSC) da USP São Carlos, financiador da primeira edição do livro. A tiragem inicial é de mil exemplares e os volumes estão sendo distribuídos em eventos de capacitação organizados pela Secretaria da Educação. Esses encontros tiveram início no segundo semestre de 2005 e já foram realizados em Araraquara, São Carlos, Pirassununga e Taquaritinga. A capacitação tem duração de um dia e 500 professores de física e de ciências já receberam o livro.

Luiz Antônio está à procura de patrocínio para as próximas edições. Explica que se a obra for bem aceita, a intenção é criar uma coleção de livros de apoio (paradidáticos). “Cada exemplar abordará um tópico específico da física”.


Capacitação em Araraquara

O Sesc de Araraquara foi palco de capacitação ministrada pelo professor Luiz Antônio. Na oportunidade, os professores aprenderam e receberam dicas para as experiências funcionarem e não frustrarem as jovens plateias. “O segredo é treinar bastante antes da concretização em sala de aula”, explica.

A plateia ficou empolgada com a terceira experiência do livro que ensina como a força do atrito mantém um canudo preso à parede depois de eletrizado com um chumaço de papel higiênico. A brincadeira funciona com a maioria dos canudinhos à venda nos supermercados. A sugestão é experimentar vários tipos do produto até obter bom resultado. O interior do canudo deve estar seco e não ter sido utilizado ou assoprado.

Há 20 anos, a professora Maria Isabel Orso leciona para crianças de sete a dez anos e participa do Programa Oficinas Pedagógicas. Comentou que é sempre enriquecedor para o aprendizado quando o professor não fica restrito aos livros didáticos. “Os alunos se motivam quando levo ímãs nas aulas e explico os conceitos de atração de corpos. O objetivo das aulas de ciências é investigar, tentar compreender os fenômenos naturais”, observa.

O professor Antônio Carlos de Paiva Lima, da EE Letice B. Godoy, diz que pretende montar em casa os experimentos para colocá-los em prática em 2006. “Vou incentivar a turma a trazer materiais para a escola e vamos organizar uma feira de ciências”. Suas colegas, Giselda Telarolli, Terezinha Cita de Lima e Cecília Araci Prada planejam trocar informações conforme forem fazendo em suas escolas as experiências, para aprimorar ainda mais a iniciativa.

Serviço

A cópia do livro pode ser feita diretamente neste link, do Laboratório de Lasers e Aplicações da USP São Carlos (LLA/IFSC-USP).

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente na página II do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 15/10/2005. (PDF)

Prolar Autoconstrução da CDHU comemora dez anos com 55 mil moradias

Programa utiliza sistema de mutirão que reduz o custo de cada residência de R$ 35 mil para R$ 14 mil e está presente em 536 cidades paulistas

O Programa Prolar Autoconstrução, da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), festeja dez anos de atuação. Nesse período, financiou a construção de 29 mil casas e apartamentos populares; e mais 26 mil estão em fase de obras. A iniciativa é parceria entre o Estado (que financia os imóveis), prefeituras (que supervisionam as obras) e os futuros moradores (que erguem as novas casas em regime de mutirão). O custo da edificação por esse sistema cai de R$ 35 mil – valor cobrado pelas empreiteiras por unidade habitacional – para R$ 14 mil.

O programa está presente em 83% dos 645 municípios paulistas, com conjuntos habitacionais em 536 cidades. Consulta sobre as moradias, realizada pela Secretaria da Fazenda com os moradores, no final de 2004, obteve 94% de conceitos ótimo e bom na avaliação dos mutuários.

O objetivo principal dessas iniciativas da CDHU é atender a população de baixa renda, cuja soma de rendimentos familiares não ultrapassa dez salários mínimos. Além disso, para concorrer aos sorteios, é preciso ser morador da cidade há pelo menos três anos e não possuir outro imóvel nem participar de qualquer outra modalidade de financiamento habitacional.

Cada casa tem 43 metros quadrados de área construída, com dois dormitórios, sala, cozinha, banheiro e área de serviço. O projeto das residências reserva espaço para a ampliação de mais dois quartos, a critério do morador. Para receber a escritura definitiva da habitação, o mutuário paga prestações mensais de R$ 45. O prazo do financiamento é de 25 anos.

Em média, cada conjunto habitacional dispõe de 150 moradias e demora dois anos para ser finalizado – desde a proposta inicial da prefeitura até a entrega e o sorteio das casas prontas. Cerca de 5% das unidades são reservadas para pessoas idosas e outros 7% são destinados a portadores de deficiência ou seus familiares.

União e entrosamento

O superintendente de gestão do Prolar Autoconstrução, Arnaldo Negri, ressalta que a ação é estruturada com base no tripé qualidade, prazo e custo. Tem como proposta propiciar moradias dignas, erradicar favelas, áreas contaminadas e de risco e reduzir o déficit habitacional no Estado.

De 1995 até 2001, a CDHU entregou, somando-se todos os programas habitacionais, 136 mil unidades. Em apenas 11% delas foi adotado o sistema de autoconstrução. De março de 2001 até hoje, o mutirão foi utilizado em 17 mil das 73 mil novas casas. Assim, a opção por essa modalidade cresceu 23%. Nos 50 mil novos lares em construção pela companhia, 26 mil também são em mutirão – mais da metade.

Negri comenta que o empenho das prefeituras é fundamental para o sucesso dos loteamentos. Para auxiliá-las, a CDHU fornece, após a assinatura do convênio, a tipologia do empreendimento e a planilha de custos com a quantidade do material de construção: pregos, cimento, ferro e outros itens. “Os prefeitos recebem toda a orientação e suporte para que a obra transcorra sem interrupção”, explica.

Outro apoio é das 13 regionais da CDHU – duas na capital e 11 no interior. Depois do sorteio e da efetivação da inscrição, o cidadão recebe a denominação de “mutirante” e passa a ser mutuário. Quando convocado para o trabalho no canteiro de obras, forma-se a noção de comunidade. “A união e o entrosamento entre os futuros vizinhos, que tocam as obras juntos, reforçam os vínculos, estimulam o sentimento de união para o bem-estar coletivo”, observa o superintendente.

Ricardo Costa, gerente de controle de informações da CDHU, explica que o Prolar deu continuidade ao antigo Programa Sonho Meu, que ganhou novas diretrizes, como modalidades específicas de conjuntos habitacionais, sem sorteio, direcionados para habitantes de favelas e de áreas de risco notificadas pela Defesa Civil – moradores de encostas, torres de transmissão de eletricidade e vítimas de enchentes.

Outra inovação foi o Qualihab, exigência de certificação dos materiais de construção, fios, cabos e produtos utilizados nas obras. O fornecedor interessado em participar das licitações e vender suas mercadorias encontra no site da CDHU informações de como proceder para obter o credenciamento, feito pela Fundação Vanzolini e por entidades reconhecidas pelo Estado. Além de garantir a qualidade e a segurança dos materiais empregados, o Qualihab assegura o fornecimento e a entrega dos pedidos. Se um fornecedor não honrar seus compromissos, a própria rede de fornecedores indica outro. Dessa maneira, a obra nunca é paralisada por falta de material.

Selo do mérito

Em 2003, a CDHU criou o Programa Lotes Próprios, que oferece financiamento individual, no valor de R$ 14 mil, para o cidadão de baixa renda que possua um terreno quitado e regularizado e não tem recursos para fazer sua moradia. São destinados R$ 9,4 mil para o material de construção; R$ 3,4 mil para a contratação de profissionais especializados (engenheiros); R$ 520 para despesas com cartório; R$ 350 para o gerenciamento da obra e, o restante, para despesas gerais. O solicitante tem 20 anos para quitar as prestações.

Outras linhas de atuação da CDHU são os financiamentos para boias-frias, no interior, e o convênio assinado com a Fundação Instituto de Terras do Estado (Itesp), que atende famílias assentadas na região do Pontal do Paranapanema. Tania Wakisaka, gerente de planejamento estratégico da companhia, afirma que os programas oferecem moradias e contribuem para minimizar problemas urbanísticos, como a utilização irregular do solo e de áreas de mananciais.

Nessas situações, não há sorteio para distribuição das casas, e todos os moradores são transferidos para o conjunto habitacional, que segue padrões técnicos de edificação, recebe assistência técnica e obedece às regras de ocupação dos lotes. Dessa maneira, são evitados erros de autoconstrução comuns na periferia.

O engenheiro Márcio Gaban, do Prolar Autoconstrução, informa que os conjuntos residenciais também preenchem vazios urbanos e aproveitam a infraestrutura disponível para os moradores. Segundo Gaban, o Prolar concorreu com programas habitacionais de outros Estados e conquistou, em 2004, o Selo do Mérito da Associação Brasileira de Cohabs (ABC).


Bons resultados do programa se devem à soma de esforços

A CDHU, órgão da Secretaria da Habitação, estuda a viabilidade de cada empreendimento, o cadastramento e a seleção, por sorteio, do nome dos interessados. Posteriormente, repassa aos municípios verbas para a aquisição de materiais de construção, ferramentas, administração de obras, treinamento de pessoal e recursos incidentes no financiamento a ser concedido aos beneficiários.

Além disso, a Secretaria também fiscaliza a execução das obras de edificação e de infraestrutura, orienta as equipes técnicas das prefeituras e habilita as famílias a elaborar o plano de comercialização das unidades habitacionais. Por fim, verifica e aprova as contas apresentadas pelos municípios e é também responsável por cobrar as prestações dos financiamentos.

À prefeitura cabe ceder o terreno, orientar os candidatos sobre a documentação necessária para participar, definir o cronograma dos trabalhos e, com recursos próprios, realizar as obras de terraplenagem e de infraestrutura básica: redes de água, esgoto e elétrica, postes de iluminação, sarjetas e asfaltamento. Responde também pelas tarefas de administrar e assessorar as obras feitas pelas famílias e zelar pela segurança da obra e dos envolvidos na construção.


Araraquara: Parque Residencial São Rafael está quase pronto

O nome do loteamento foi escolhido por meio de votação entre os moradores. Os coordenadores de mutirão e de serviços também. A perspectiva de futuros vizinhos construírem em parceria a casa própria e constituírem laços de amizade e de solidariedade motivou os mutirantes do Parque Residencial São Rafael, em Araraquara, a dar início às obras de suas residências. O conjunto residencial é dividido em dois grupos: o primeiro, com 92 casas, será inaugurado no final deste mês; o outro, com cem unidades, será entregue no mês de março.

A arquiteta Mara Gomes, coordenadora municipal de habitação, comanda o canteiro de obras. Explica que o mutirão começou em setembro de 2003 e a jornada de trabalho diário era das 8 às 17 horas. Cada mutirante, com idade mínima de 18 anos, pôde escolher o dia da semana e o horário para trabalhar. Na impossibilidade de comparecer, podia enviar algum familiar ou amigo no lugar.

“Foi comovente ver as demonstrações de afeto entre as pessoas, que se reencontravam todos os finais de semana. O grupo avaliava cada atitude individual e a classificava como positiva ou negativa. Os mais esforçados, solidários e disciplinados puderam escolher suas casas, e tiveram seu valor reconhecido pelos demais. No final, não foi preciso de sorteio, e todos ficaram satisfeitos com seu imóvel”, observa Mara.

Assembleia semanal

O andamento da obra era discutido coletivamente, na assembleia semanal, realizada aos sábados. Na véspera, Mara produzia um boletim informativo e distribuía a todos, dando conta do andamento das obras e estimulando as cerca de 300 pessoas comprometidas com a tarefa. Nesses encontros, surgiram soluções como a creche comunitária, para atender às mães que trabalharam nas obras.

Cuidar das crianças foi ocupação repassada para outras trabalhadoras participantes do mutirão. Foi bem-sucedida também a experiência da cozinha coletiva. Muitos não tinham tempo de preparar marmita e, pagando R$ 1,50, podiam encomendar no canteiro de obras seu almoço. Os gêneros alimentícios eram cedidos pelo Supermercado Patrezão, que doava em média dez caixas semanais de mantimentos. A renda revertia para a “caixinha” dos moradores.

Feijoada

Os sete coordenadores de serviço foram eleitos pelo grupo. Eram serventes, eletricistas e profissionais com experiência de construção, capazes de executar o trabalho e ensinar os demais.

O pedreiro Elvis Freitas mostrou aos outros mutirantes como lidar com alvenaria e assentar blocos. “Depois de um mês, a maioria já sabia fazer direito. Uma das colegas se saiu tão bem que passou a fazer bicos na construção civil”, conta Elvis.

A mutirante Teresa Regina Grande, 39 anos, foi eleita pelos demais para cuidar das fichas de horário de entrada e saída no trabalho. Viúva e mãe de uma filha, foi considerada pelo grupo modelo de persistência e dignidade. Apelidada de Tetê, organizou feijoada para conseguir recursos adicionais e deu início à coleta de latinhas de bebida, garrafas PET e sucatas. O dinheiro arrecadado ia para a “caixinha” e era utilizado em pequenos consertos, como troca de fechaduras, por exemplo.

A assistente social Daniela Legendre, da prefeitura, trabalhou na seleção das pessoas e identificou as habilidades que cada um poderia oferecer ao grupo. Esteve presente em todas as fases da construção, mediou conflitos e promoveu dinâmicas coletivas para reforçar a autoestima de todos. Além disso, estimulou a solidariedade e discutiu coletivamente questões como racismo, doenças sexualmente transmissíveis e problemas de relacionamento. “O sentimento de cidadania foi despertado e muitos passaram a ter consciência de seu potencial”, observa.

Rosimeire Maurício, 39 anos, apelidada de Formiga pela sua disposição, é auxiliar de cozinha e colaborou em várias tarefas. Abriu valas para receber o encanamento, ajudou na cozinha e na creche comunitária e pintou todos os rodapés do conjunto habitacional.

Edna Martins de Freitas, há 40 anos em Araraquara, vai morar com o filho na casa de número 291 do conjunto habitacional. Seu imóvel foi o primeiro a ficar pronto, e inspirou os demais.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas II e III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 11/10/2005. (PDF)