Unesp mantém em Araraquara maior museu e acervo odontológico do País

Exposição apresenta a evolução do instrumental odontológico e a história da faculdade local, a segunda mais antiga do Brasil

As 3 mil peças do Museu Odontológico Prof. Dr. Welingtom Dinelli da Universidade Estadual Paulista (Unesp) preservam, em Araraquara, a história da odontologia, a evolução do instrumental odontológico e a história da faculdade, a segunda escola de odontologia mais antiga do Brasil, que completou 80 anos no ano passado. O acervo é o maior e mais variado do País, e tem o maior número de itens em exposição permanente que se conhece.

O museu ocupa cem metros quadrados de uma sala no andar térreo da Faculdade de Odontologia (FO), anexo à biblioteca. Nele, o público tem a oportunidade de conhecer consultórios antigos, modelos dentários, material didático, catálogos, aparelhos de alta rotação e sua evolução ao longo do tempo, sugadores de saliva, medicamentos, estufas esterilizadoras e antigos anúncios de material odontológico restaurados.

História da odontologia

Desde outubro de 2003, abre todos os dias úteis para visitação. Mostra a cronologia da história da Odontologia e o público descobre que o ofício do dentista foi exercido na Idade Média por barbeiros, por volta do ano 1100. As informações são oferecidas por meio de retratos e fotos de época, alguns assustadores, que mostram como era feito o atendimento aos pacientes.

Na sequência, a exposição apresenta um consultório itinerante, do século 19, que era transportado no lombo de burros para atender à população brasileira dispersa em pontos longínquos, principalmente no interior da Bahia e de Minas Gerais. O destaque seguinte é um consultório retrátil utilizado na Segunda Guerra Mundial, que era lançado de para-quedas para atender aos soldados no campo de batalha. Do mesmo período, há um aparelho alemão de Raios X, da Siemens, dos anos 40, que, segundo os expositores, deixou de ser fabricado por ser eficiente demais. “Nunca quebrou e, se for preciso, pode ser usado até hoje”, conta Carolina Carvalho Bortoletto, monitora do museu.

Parcerias de sucesso

Roberto Esberard, vice-diretor da FO, conta que o Museu Odontológico recebeu, há algum tempo, importante apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado (Fapesp), e conta, até hoje, com o auxílio da Fundação para o Desenvolvimento da Unesp (Fundunesp), mas o seu principal aliado para colocá-lo em atividade permanente foi a Pró-Reitoria de Extensão Universitária (Proex) da Unesp.

“O pró-reitor de Extensão Benedito Barraviera ofereceu auxílio financeiro e patrocinou uma bolsa de estudos, que foi repassada para um dos alunos monitores de visitação. E a Dabi Atlante, fabricante de material odontológico, também concedeu uma bolsa de estudos por meio do Projeto Adote um Aluno da Unesp. As duas bolsas mantêm os dois monitores, que se dividem nos períodos da manhã e da tarde. A Dabi Atlante prometeu recursos significativos para o início de março para dar prosseguimento às atividades do museu”, conta Esberard.

Agendamento

O Museu foi incluído pela Secretaria de Turismo de Araraquara como atração turística permanente da cidade. Desde sua inauguração, mais de mil pessoas assinaram a lista de visitas. Ele foi incluído no Guia Brasileiro de Museus e fica aberto de segunda a sexta-feira, das 9 às 11 horas e das 15 às 17 horas, com entrada franca. As escolas ou grupos interessados em conhecê-lo devem entrar em contato com a diretoria da FO pelo telefone (16) 3301-6300.

Permutas e doações

“Tenho a ferrugem no sangue, sou colecionador de lambretas, vespas e automóveis antigos. Há dois anos, fui convidado pelo professor Dinelli e dei prosseguimento à sua iniciativa”, lembra o vice-diretor Esberard. “Desde o início, recebi o apoio do professor Ricardo Abi-Rached, diretor da FO e de todos os departamentos, que não mediram esforços no sentido de consolidar as atividades”, recorda.

“Minha preocupação foi criar ambientes propícios para a visitação do público com conforto. Adaptei as instalações disponíveis, reuni e dispus as peças de modo didático-funcional, com o objetivo de tornar a exposição auto-explicativa para os leigos”, conta, acrescentando: “Para isso, visitei os principais museus odontológicos do País: da Associação Paulista de Cirurgiões Dentistas (APCD), na capital, de Piracicaba e um no Rio de Janeiro”, diz Esberard. “Mantenho contato permanente com essas instituições e sempre consigo, por meio de permutas e doações, novos itens”, relata.

Ideia do Museu nasceu há mais de 30 anos

A idéia de um museu odontológico teve início no final da década de 1970 quando o ex-diretor da FO, Rafael Lia Rolfsen, solicitou aos ex-alunos e fornecedores da universidade que doassem peças em desuso. Inicialmente, elas foram estocadas numa pequena sala do 6º andar do prédio da faculdade e, assim, o museu começou a tomar forma no início dos anos 80, quando o professor Welingtom Dinelli, também ex-diretor da FO, abraçou a causa.

Os anos de luta pela efetivação renderam ao professor Dinelli uma homenagem: o conjunto foi batizado com seu nome. “A maior dificuldade foi conseguir local definitivo para receber o acervo, que até hoje cresce sem parar”, explica Dinelli. A disposição em preservar a história da instituição acabou por contagiar outros profissionais da faculdade, como a professora Ângela Cristina Zuanon, do Departamento de Odontopediatria, a bibliotecária Maria Helena Matsumoto Komasti Leves, o supervisor de seção Róbson Ostan, o auxiliar acadêmico aposentado Cláudio Titã e o pintor Wagner Adalberto Correa dos Santos”, finaliza. Esberard, assumiu a coordenação do museu em 2002.

Rogério Mascia Silveira (texto e fotos)
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente na página IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 12/02/2004. (PDF)

Berço de Macunaíma, em Araraquara, é preservado como Centro Cultural

Entregue à Unesp, a antiga Chácara Sapucaia abriga acervo que registra evolução da ciência na região desde a década de 20

Situado no bairro do Carmo, em Araraquara, numa área verde de 13 mil metros quadrados, repleta de árvores centenárias com mais de setenta espécies frutíferas e ornamentais, o Centro Cultural Professor Waldemar Saffioti (CCPWS) da Universidade Estadual Paulista (Unesp) é muito mais do que o local onde Mário de Andrade se acomodou para, em seis dias, escrever Macunaíma, obra-prima do modernismo brasileiro.

A Chácara Sapucaia, antiga morada do casal Waldemar e Heleieth Saffioti, ex-docentes da Unesp, foi doada à universidade em 2001. Depois do falecimento do marido, Heleieth cedeu a propriedade com a condição de que a área fosse transformada em centro cultural e passasse a oferecer serviços de extensão universitária para jovens de 14 a 25 anos.

Na doação, Heleieth incluiu também o arquivo pessoal do marido, que dá nome ao centro. Dele constam documentos acadêmicos, científicos e políticos, fotos, revistas, teses, artigos e recortes de jornais a partir dos anos 20, que ilustram a evolução da ciência na região de Araraquara.

Organização

Orlene Capaldo, docente aposentada da Unesp e membro do Conselho Provisório designado pela reitoria para gerir o CCPWS, conta que está sendo preparado o processo de institucionalização do centro. A iniciativa tem o apoio da Pró-Reitoria de Extensão Universitária (Proex) e está sendo organizado em três núcleos, para permitir, no futuro, a expansão dos serviços prestados. Foram definidos o Núcleo de Ensino Pré-Universitário, o de Cultura Plural e o de Documentação e Memória, que abrigará as coleções do professor Saffioti e o acervo histórico da Unesp em Araraquara.

Os serviços a serem prestados pelo CCPWS são coordenados por professores do câmpus da Unesp. Os destaques são o projeto “História da Ciência e da Universidade no Interior Paulista”, da docente Rosa Souza; a construção da sede do cursinho pré-vestibular gratuito do câmpus de Araraquara (Cuca); a oficina de vidros, coordenada pelo professor Miguel Jafelicci Júnior; o Centro de Estudos Indígenas (Ceimam), comandado pela professora Sílvia Carvalho; o Projeto de Cidadania Ambiental, dirigido pelo professor Luís Sacramento, que trabalha atualmente com cultivo de horta de plantas medicinais e aromáticas; o Projeto Viver Bem, que promove a melhoria da qualidade de vida como estratégia de redução de danos, das professoras Sílvia Fernandes e Mírian Onofre, e o projeto “Ensinando com arte e aprendendo com o trabalho”, desenvolvido por Neusa Barcelos.

Desafio

Orlene conta que o maior desafio encontrado para a efetivação das propostas do centro tem sido encontrar parceiros privados para financiar as obras e projetos. “Muitas das iniciativas propostas pelo centro, têm apelo social. Aqui os jovens carentes poderão se especializar de modo interdisciplinar, nas oficinas artísticas, de vidro e se encaminhar para uma profissão, longe das drogas e da delinquência”. E lembra que o trabalho dos professores e funcionários no centro é voluntário.

Revitalização e visitas

A revitalização do conjunto arquitetônico é um serviço também voluntário do arquiteto araraquarense Paulo Pires Lima. “A antiga Chácara Sapucaia tem arquitetura notável e edifícios de grande valor histórico, literário, educacional e científico para o município. Procurei, de forma harmoniosa, adaptar a área às necessidades do centro cultural e manter o desenho paisagístico original, traçando um diálogo entre o antigo e o novo”, relata.

As visitas ao centro são monitoradas e podem ser agendadas no horário comercial para escolas da rede pública. Embora em fase inicial de organização, o acervo já pode ser utilizado para consultas. A pesquisadora Nívia de Paulli utiliza atualmente os documentos como fonte para sua tese de doutorado.

Mário de Andrade e Araraquara

Macunaíma, o herói sem nenhum caráter foi escrito na chácara de Pio Lourenço, benfeitor de Araraquara, em uma semana de rede e muito cigarro, de 16 a 23 de dezembro de 1926. Nascido em 1893, Mário na infância juntava-se periodicamente na capital aos seus primos araraquarenses, da família de Cândido Lourenço Corrêa da Rocha, marido de sua tia Isabel.

O escritor esteve várias vezes na Chácara Sapucaia que hoje abriga o centro cultural. Em algumas, para se recuperar de crises emocionais, como a perda de seu irmão Renato em 1913, e em outras, para passar férias, como em 1926, quando redigiu a rapsódia transformada no livro Macunaíma. Ao completar 40 anos, Mário sofreu séria crise de depressão. Com fases mais brandas ou profundas, a doença acompanhou-o até o fim de sua vida. Enfermo, sempre recorreu às temporadas em Sapucaia.

Foi membro ativo de uma renovação estética e ideológica, buscava na mudança e na transição argumentos destacáveis para sua eterna luta: a da recuperação do sentido de “ser brasileiro”. Sua figura representa, até hoje, o grande questionador da cultura e da arte que estavam alimentando o Brasil do início do século 20. Com Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral, Mário foi um dos mais fortes defensores da cultura do povo brasileiro e de seu resgate, enfatizando o retorno às origens, sem perder de vista as influências estrangeiras.

Serviço

Centro Cultural Professor Waldemar Saffioti
Correio eletrônico: ccpws@iq.unesp.br
Rua dos Libaneses, 1111 – Carmo
CEP 14800-165 – Araraquara (SP)
Tel. (16) 3332-1505

Rogério Mascia Silveira (texto e fotos)
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente na página IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 21/01/2004. (PDF)