Técnica de restaurar imagens reduz exposição de paciente à radiação

Criado na USP São Carlos, sistema retira das imagens de mamografias granulações e ruídos prejudiciais ao diagnóstico; testes clínicos com a tecnologia começarão em 2018

Uma inovação do Laboratório de Visão Computacional (Lavi) da Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo (EESC-USP) pretende diminuir em até 30% a exposição das pacientes à radiação decorrente de exames periódicos de mamografia. Orientado pelo professor Marcelo Andrade da Costa Vieira, do Departamento de Engenharia Elétrica e de Computação, esse trabalho acadêmico é a tese de doutorado do pesquisador Lucas Rodrigues Borges.

Apresentado no mês de junho na EESC-USP, o estudo consiste de um sistema de informática projetado exclusivamente para fazer simulações em imagens digitais de mamografias. A tecnologia abre caminho para solucionar um problema antigo da físico-medicina.

“Quanto mais radiação é utilizada na mamografia, melhor é a qualidade das imagens obtidas e, consequentemente, mais preciso se torna o diagnóstico. Porém, quanto mais exposição da mulher à radiação nos exames, maior o risco de ela desenvolver, no futuro, câncer de mama”, esclarece o pesquisador Borges, que é também engenheiro eletricista.

Impacto

Para o pesquisador, o filtro desenvolvido possibilita usar dosagens menores de radiação, pois sua característica principal é restaurar as imagens, isto é, retirar delas imperfeições como granulações e ruídos prejudiciais ao diagnóstico. “O software calcula a quantidade necessária de ‘ruído’ em cada imagem para simular a exposição da paciente à baixa radiação”, explica.

Na avaliação do professor Vieira, essa redução na concentração das doses de radiação tem relevância para a saúde feminina, quando considerada sua aplicação futura em larga escala: “Para preservar a saúde, os médicos recomendam às mulheres fazerem mamografias periódicas após os 40 anos. Sob essa perspectiva, metade da população mundial tem essa necessidade, assim, a redução na exposição à radiação nas pacientes será bastante significativa”, conclui.

Parcerias

Aluno da EESC-USP desde a graduação, Borges conta ter iniciado em 2011 a parceria com o professor Vieira, especialista com diversos trabalhos em andamento na área de diagnóstico por imagem. Nessa época, o docente o orientou em projeto voluntário de iniciação científica, cuja proposta foi criar um filtro analógico para analisar imagens de mamografias digitalizadas, já com o intuito de otimizar o trabalho de médicos radiologistas.

O projeto inicial evoluiu, foi tema do mestrado de Borges e originou o sistema com o filtro restaurador de imagens. Ao longo da última e mais recente etapa, o estudo acadêmico teve apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado (Fapesp) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

Pioneiro no País na área de mamografias tridimensionais, o trabalho teve colaboração de dois físicos-médicos com pesquisas na área de câncer de mama: Andrew Maidment e Predrag Bakic, da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, e do cientista da Universidade de Tecnologia de Tampere (Finlândia), Alessandro Foi, especializado em matemática e restauração de imagens.

Metodologia

A estrutura principal do sistema é um banco de dados construído por Borges, contendo 1,8 mil imagens, volume de amostras suficiente para permitir ao software simular a realização de novos exames das pacientes usando quantidades menores de radiação. Essas imagens (mamografias realizadas em 72 pacientes voluntárias) integram protocolo de pesquisa do Hospital da Universidade da Pensilvânia, entidade parceira no estudo.

A parceria da EESC-USP com o hospital foi firmada em 2012. No sistema desenvolvido em São Carlos, as 72 imagens originais são simuladas em cinco diferentes doses de radiação, somando 360 exposições. No projeto, cada uma delas foi avaliada individualmente por cinco pesquisadores físicos-médicos, totalizando 1,8 mil leituras diferentes. “Nas mamografias, esses cinco especialistas não conseguiram identificar em quais delas o software simulou a dose reduzida de radiação, prova da eficiência do sistema desenvolvido”, afirma Borges.

Futuro

Segundo ele, existem disponíveis outras opções de exames não invasivos para detectar alguns tipos de tumores, como, por exemplo, a ressonância magnética, porém, o custo ainda é alto em comparação com raio X, método mais barato, rápido e amplamente disseminado na maioria dos centros de saúde.

Os próximos passos são os testes clínicos, previstos para o ano que vem, com a nova tecnologia, e incluindo a participação de radiologistas. Nessa etapa experimental, os médicos irão considerar nos diagnósticos as imagens restauradas pelo software antes de fazerem novos exames com as pacientes. Participam dessa etapa quatro instituições de saúde: Hospital do Câncer de Barretos, Clínica Eco e Mama de São Carlos, Instituto de Radiologia (InRad) do Hospital das Clínicas da USP e Hospital da Universidade da Pensilvânia.

Serviço

Laboratório de Visão Computacional (Lavi – EESC-USP)
E-mail mvieira@sc.usp.br
Telefone (16) 3373-9362

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente na página IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 05/10/2017. (PDF)

Secretaria de Energia e Mineração apoia pesquisas com o biogás

Estudo conjunto avalia impactos da conversão do motor a diesel de caminhão para também funcionar com gás; meta é reduzir emissões de dióxido de carbono e ampliar o uso do GNV e do biometano

Com a proposta de estimular no território paulista o desenvolvimento de tecnologias limpas e sustentáveis, como o biogás proveniente da vinhaça, a Secretaria Estadual de Energia e Mineração tomou parte em um protocolo de intenções firmado na 25ª Feira Internacional de Tecnologia Sucroenergética (Fenasucro & Agrocana), realizada em Sertãozinho, de 21 a 24 agosto. Experimental, o projeto reúne agentes públicos e privados e consiste em converter um motor a diesel de caminhão para o sistema bicombustível (flex) e também para funcionar a gás.

Participam desse protocolo a secretaria e a Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado (Arsesp) e as empresas GasBrasiliano Distribuidora S.A., Grupo São Martinho, Mercedes-Benz do Brasil, Convergas Fuel Systems e Mahle-Metal Leve. Os testes com o abastecimento do motor estão sendo realizados com Gás Natural Veicular (GNV) e biometano (biogás), produzido a partir do reaproveitamento e transformação da vinhaça, resíduo orgânico da produção de açúcar e etanol, por meio de reatores anaeróbios (biodigestores).

Ação conjunta

“A proposta é avaliar e promover o uso da tecnologia Dual–Fuel (Diesel-Gás) em caminhões pesados utilizados pelas usinas paulistas durante a época da safra da cana, período anual que vai de março a novembro”, explica Francisco Emilio Baccaro Nigro, assessor técnico da Secretaria Estadual de Energia e Mineração e professor de engenharia mecânica da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP).

Especialista em motores de combustão interna a combustíveis alternativos, Nigro vê o protocolo como um esforço conjunto dos setores público e privado em prol da diminuição do impacto ambiental e o classifica como medida capaz de gerar economia e renda. “Além de ser uma ação alinhada ao Programa Paulista de Biogás (Decreto estadual nº 58.659/2012)”, ressalta (ver serviço).

Segundo ele, essa legislação propõe ampliar o papel das fontes renováveis na matriz energética paulista, destaca a biomassa como opção renovável, sustentável e de baixa emissão de carbono e sublinha a oportunidade de desenvolvimento regional a partir da geração de biogás proveniente do setor sucroenergético.

Atualmente, a secretaria estima em 2.250 megawatts o potencial paulista de produção de biometano a partir da utilização da vinhaça, volume suficiente para ser transformado em biogás – se for queimado e transformado em eletricidade, é volume suficiente para manter em operação uma cidade com 450 mil habitantes.

Laboratório

Os testes com a tecnologia Diesel-Gás prosseguirão até o final do primeiro trimestre do ano que vem, quando os primeiros resultados serão apresentados à Arsesp e à secretaria. Além da análise do motor marca Mercedes-Benz de 440 cavalos de potência, estão sendo realizadas medições comparativas de emissões atmosféricas e de consumo específico de combustível no laboratório da Mahle-Metal Leve, em Jundiaí.

A avaliação prevista no protocolo de ações vai aferir a eficiência e a eficácia do motor e o sistema de pós-tratamento de emissão de gases poluentes, de acordo com os requisitos da NBR 15.634, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), para homologação de motores Euro 5 e Euro 6.

Campo

O projeto piloto com o caminhão pesado está sendo realizado pelo Grupo São Martinho na Usina Santa Cruz, planta industrial da companhia sucroalcooleira instalada no município Américo Brasiliense, região de Araraquara. Com quatro unidades produtoras e capacidade de moagem anual de 24 milhões de toneladas de cana, a empresa é uma das maiores produtoras de açúcar e etanol do País.

Segundo estimativas de mercado, o processamento de uma tonelada de cana necessita de quatro litros de diesel – e a previsão de colheita no Brasil para a safra 2017/2018 é de 647 milhões de toneladas de cana. Se já fosse adotado um modelo como o do projeto piloto em todas as usinas sucroalcooleiras do País usando metade do combustível a gás natural ou biometano e o restante a diesel, as empresas poderiam economizar cerca de 1,3 bilhão de litros de diesel por safra, reduzindo significativamente as emissões de carbono.

Biometano

Por possuir elevado teor de metano em sua composição, o biometano também pode ser misturado ao gás natural e comercializado por meio de conexão à rede de distribuição de gás canalizado ou, então, aproveitado na forma de gás comprimido.

Para também aproveitar esse biocombustível dessa maneira, a Secretaria de Energia e Mineração instalou, em março, o Comitê Gestor do Programa Paulista de Biogás, que, atualmente, estuda qual porcentual de biometano pode ser acrescentado ao gás natural canalizado, assim como quais seriam os impactos dessa mudança para os consumidores e o mercado. Os resultados desse estudo técnico serão apresentados na reunião do Conselho Estadual de Política Energética (Cepe), prevista para ser realizada até o final do ano.

Em julho, a Arsesp publicou a Deliberação nº 744/2017. Inédita no País, essa legislação regulamenta as condições de distribuição de biometano na rede de gás canalizado do Estado e estabelece como esse biocombustível fornecido pelos produtores rurais pode ser inserido e distribuído pela rede de gás canalizado (ver serviço).

Serviço

Secretaria Estadual de Energia e Mineração
Arsesp
Programa Paulista de Biogás, Decreto nº 58.659/2012
Deliberação Arsesp nº 744/2017

Convergas Fuel Systems
Grupo São Martinho
GasBrasiliano
Mahle-Metal Leve
Mercedes-Benz

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente na página II do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 03/10/2017. (PDF)

Plásticos reforçados com fibras de celulose são novidade da USP

Patenteada, tecnologia amplia resistência, sustentabilidade e possibilidades de uso de materiais na indústria

Pesquisa do Departamento de Engenharia de Materiais da Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo (EESC-USP) desenvolveu novo método para produzir compósitos de poliestireno (resina do grupo dos termoplásticos) e polimetacrilato de metila (acrílico), utilizando como matéria-prima fibras e nanofibras de celulose de eucalipto.

Iniciada em 2013 e coordenada pelo professor Antonio José Felix de Carvalho, a tecnologia material com biomassa na composição foi patenteada pela Agência USP de Inovação no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) em 2015. Empresas interessadas no compósito devem procurar o Departamento de Engenharia de Materiais no câmpus de São Carlos.

De acordo com Carvalho, livre-docente em engenharia de materiais, uma das premissas iniciais era substituir uma parte do plástico utilizado pela indústria em seus processos fabris, considerando o fato de ele ter como origem o petróleo, fonte de energia finita, poluente e não renovável. “Conseguimos produzir um compósito cujos diferenciais, em comparação com os plásticos e acrílicos convencionais, são a leveza, a elevada resistência mecânica, o baixo custo e o apelo ambiental, isto é, a sustentabilidade, por se basear na celulose”, explica.

Processos fabris

O Brasil é um dos maiores produtores mundiais de celulose, a partir de plantações de eucalipto, sendo esse uma commodity agrícola abundante no mercado nacional. “Essa matéria-prima é usada pela indústria papeleira para produzir papel sulfite e higiênico, embalagens e outros produtos”, explica. Segundo ele, o principal desafio acadêmico da EESC-USP era desenvolver um processo para permitir dispersar na matriz do polímero, de modo homogêneo, as nanofibras de celulose, mais as fibras de celulose nos plásticos e acrílicos, isto é, conseguir manter iguais as propriedades do material em todo o volume.

A patente obtida pela EESC-USP protege a propriedade intelectual tanto do processo de obtenção do compósito quanto do próprio compósito. Segundo Carvalho, o produto criado em São Carlos pode ser direcionado a diversos segmentos industriais com materiais injetados e extrudados em seus processos. A lista inclui fabricantes de automóveis, eletrodomésticos, materiais esportivos e de embalagens e a construção civil, entre outros.

Carvalho informa que alguns empreendedores demonstraram interesse pela tecnologia. “Queremos, agora, empresas para serem parceiras do projeto e podermos avaliar o desempenho obtido em laboratório com quantidades maiores e em aplicações específicas. Outro viés do trabalho é buscar produzir o compósito a partir de outras biomassas, também renováveis”, observa.

Colaborações

A pesquisa com o compósito teve a participação de Cayque Alvares Casale, aluno de graduação e bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Atualmente, ele está no último ano do curso de engenharia de materiais e manufatura da USP São Carlos. Outra colaboradora é a farmacêutica Eliane Trovatti, pós-doutoranda da EESC-USP na área de materiais. Para participar do projeto, ela recebeu bolsa de estudos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e atualmente leciona nos cursos de pós-graduação da Universidade de Araraquara (Uniara).

Serviço

Depto. de Engenharia de Materiais da Escola de Engenharia de São Carlos da USP
E-mail toni@sc.usp.br
Telefone (16) 3373-8679

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente na página III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 03/10/2017. (PDF)