Documento idealizado pela Comissão Multidisciplinar de Acompanhamento Permanente destina-se a agentes públicos e cidadãos; atividades do grupo serão centralizadas na Secretaria da Segurança Pública
Para marcar o Dia Estadual da Criança Desaparecida, 25 de maio, o programa São Paulo em Busca das Crianças e dos Adolescentes Desaparecidos lança protocolo de ações para agentes públicos e cidadãos com orientações sobre como proceder quando uma pessoa desaparece ou é localizada, independentemente da idade.
Disponível on-line e apresentado na forma de check-list, ou lista de tarefas, o documento é um dos resultados do trabalho realizado pela Comissão Multidisciplinar de Acompanhamento Permanente do Programa, iniciativa pioneira no País instituída pelo Executivo paulista a partir do Decreto estadual nº 58.074/2012.
Levantamento do Ministério da Justiça revela que, em 2015, a cada 15 minutos uma criança desapareceu no Brasil e cerca de 250 mil continuam desaparecidas, sendo maus-tratos a causa principal da maioria das fugas.
De acordo com o presidente da comissão paulista, Marco Antônio Castello Branco, prevenir o problema é a medida mais importante para evitá-lo; e, hoje, aliados tecnológicos ajudam nessa luta, como os sistemas de informação e de identificação empregados pela 4ª Delegacia de Investigações sobre Pessoas Desaparecidas do Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP), da capital, um dos integrantes da comissão.
O público-alvo primordial do protocolo são os servidores públicos. A lista inclui policiais, bombeiros, agentes do Metrô e da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), motoristas da Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo (EMTU/SP), atendentes de hospitais e postos de saúde, delegacias, Instituto Médico-Legal (IML), entre outros.
“A proposta é oferecer um roteiro sem deixar dúvida sobre o que fazer, por exemplo, quando alguém desaparece ou reaparece, ou, ainda, como proceder se um bebê for encontrado vivo ou resgatado morto em uma praça ou estação de transporte público”, observa o coordenador.
Registro
Em caso de desaparecimento, a recomendação é registrar boletim de ocorrência (B.O.) o mais rapidamente possível. Esse procedimento pode ser realizado presencialmente nas delegacias ou on-line, na Delegacia Eletrônica. A pessoa que faz o B.O. deve apresentar o máximo possível de dados do desaparecido, como, por exemplo, se usa óculos ou aparelhos nos dentes, se tem tatuagens ou usa piercing, se sofre de deficiência mental, além de uma foto recente.
“Informação precisa e atualizada facilita e acelera o trabalho. Quando alguém é localizado, também é preciso informar a polícia”, ressalta o presidente da comissão. No intuito de integrar ainda mais a comunicação, ele anuncia o próximo passo da comissão: a centralização de suas atividades na Secretaria da Segurança Pública (SSP), medida prevista pela Lei estadual nº 15.292/2014.
A Comissão Multidisciplinar de Acompanhamento Permanente é formada por representantes das secretarias estaduais da Segurança Pública, Justiça e Defesa da Cidadania, Direitos da Pessoa com Deficiência, Educação, Desenvolvimento Social, Saúde e Transportes Metropolitanos, além da colaboração de parceiros como a Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social da prefeitura de São Paulo, a ONG Mães em Luta! e o projeto Caminho de Volta, realizado pelo Departamento de Medicina-Legal, Ética Médica e Medicina Social e do Trabalho da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
Repercussão
Em 1992, Fabiana, filha de 13 anos da microempresária Vera Lúcia Ranu, foi para a escola e nunca mais voltou. A tragédia familiar vivenciada pela hoje moradora do Jaraguá, zona noroeste da capital, foi tema de depoimento na novela Explode Coração (1995/1996), exibida pela TV Globo. A dor vivida deu forças a Vera Lúcia para criar, em 2005, a ONG Mães em Luta!. A instituição congrega familiares em busca de parentes desaparecidos e luta para prevenir o problema.
Em 2012, o rosto de Fabiana foi o primeiro a ser manipulado em 3D pela equipe do Laboratório de Arte Forense do DHPP, tendo sido ‘envelhecido’ 30 anos no computador. A imagem impressa circulou em cartazes distribuídos em locais públicos, foi veiculada na TV Minuto do Metrô e também impressa em cupom de recibo de pedágio – porém, sem sucesso. Entretanto, a repercussão obtida com seu trabalho garantiu a Vera Lúcia convite para integrar e participar das reuniões mensais da comissão, cujo aniversário também é celebrado hoje.
DNA
Desenvolvido em 2004 por um grupo de professores e técnicos da FMUSP, o Caminho de Volta surgiu com a proposta de permitir a comparação gratuita dos perfis genéticos das famílias dos desaparecidos com os encontrados.
Coordenado pela geneticista e livre-docente Gilka Gattás, o projeto é realizado em convênio com a 4ª Delegacia do DHPP e desenvolve pesquisas para conhecer melhor o problema dos desaparecimentos, além de dispor de equipe de psicólogos para dar apoio aos familiares no processo de busca e aos desaparecidos, quando encontrados. Tem armazenadas, atualmente, amostras de 1,2 mil famílias.
Final feliz
No dia 18 de março, Gabriela, de 12 anos, regressou da escola na perua escolar para a casa da avó, porém, em vez de entrar, como fazia habitualmente, pegou um ônibus para ir à casa de um amigo, em um bairro vizinho. Três horas depois, temendo punição pela travessura e mantendo sempre o celular desligado, embarcou em outro coletivo. O destino agora era a casa de uma amiga, em outro local. Por volta das 22 horas, quase cinco horas após seu sumiço, além da mãe da garota, Denise Araújo, pai, padrasto, tias e avós estavam desesperados à sua procura.
Denise demorou 24 horas para fazer o B.O. Na delegacia, foi orientada a buscar informações em hospitais próximos e no IML. Felizmente, diz, não a encontrou ferida. “Depois de dois dias e muita angústia, ela reapareceu. Apresentou como justificativa para o sumiço estar cansada com as negativas que recebia. No fundo, ela só queria mais atenção”, relata a mãe, que preencheu cadastro da menina nos sistemas de informática da ONG Mães em Luta! e cedeu amostras de sangue e saliva para o banco de DNA do projeto Caminho de Volta.
Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial
Reportagem publicada originalmente na página IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 25/05/2017. (PDF)