Agricultura é destaque nas discussões da Conferência Nacional de Bioenergia

Debates incluem avanço das fronteiras tecnológicas e agrícolas e ampliação da matriz energética do País

Dois painéis ampliaram as discussões da Conferência Nacional de Bioenergia, evento promovido pela Universidade São Paulo na capital, entre os dias 26 e 28 de setembro. Os principais temas dos debates foram O avanço do desenvolvimento tecnológico no País e A ênfase da agricultura brasileira em produzir matérias-primas para os biocombustíveis (etanol e biodiesel).

A professora Beatriz Kilikian, da Escola Politécnica da USP, iniciou os trabalhos lembrando os presentes que no início de sua formação acadêmica já eram comuns debates sobre a diversificação de matérias-primas em relação à cana para a produção de álcool.

“Na época, havia na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) a preocupação de se impedir a transformação das terras agriculturáveis do País em imensos canaviais. Considerávamos o sorgo como opção de cultivo no cerrado brasileiro, em razão de grande parte do solo brasileiro ser inadequado para a cultura da cana. Agora, essa discussão foi retomada”, observou.

Sobre a produção acadêmica atual, Beatriz mencionou sua pesquisa mais recente. Ela estuda técnicas de reaproveitamento do bagaço e da palha da cana para produzir etanol, meta já presente no Brasil em 1975, com o advento do Proálcool.

Segundo Beatriz, um ponto positivo foi a formação no País, ao longo dos últimos 30 anos, de recursos humanos capazes de assegurar a liderança brasileira nos estudos com bioetanol. “Cabe aqui um reconhecimento da sociedade pelo serviço prestado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado (Fapesp) ao patrocinar muitos destes estudos”, destacou.

Parque tecnológico

Na sequência, Weber Amaral, pesquisador da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) e coordenador do Pólo Nacional de Biocombustíveis, indicou quatro pontos que julga estratégicos para a manutenção da competitividade do etanol brasileiro.

O primeiro é a ampliação do mercado global para o álcool brasileiro. O passo seguinte será expandir, de modo sustentável, a atual capacidade produtiva. O terceiro é reduzir barreiras técnicas e gargalos na infraestrutura do País, como o transporte, a armazenagem e a distribuição, áreas carentes, em sua opinião. E a última proposta é investir continuamente em inovação.

Com relação ao biodiesel, e para fazer frente à liderança européia nas pesquisas sobre esse combustível de origem vegetal, Weber anunciou o projeto de construção do Parque Tecnológico de Piracicaba.

“A região é berço de novas tecnologias para o setor sucroalcooleiro. Fornece 65% dos bens de capital para manutenção e expansão da capacidade de produção. Além disso, há suporte da prefeitura e de âncoras públicas de pesquisa, como a Esalq, e privadas, como o Centro de Tecnologia Canavieira (CTC)”, lembrou.


Fronteira tecnológica

A pesquisadora Elba Bom, do Instituto de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), sugeriu coordenação nacional para as pesquisas com os biocombustíveis – uma opção para o País ganhar mais competitividade. Na oportunidade, apresentou projeto do Ministério da Ciência e Tecnologia para a produção de biomassa.

Segundo a pesquisadora, biomassa é a denominação genérica para toda matéria-prima orgânica de origem animal ou vegetal que pode ser aproveitada como matriz energética. Trata-se de uma fonte renovável, que tem origem possível na cana, gordura bovina, soja, milho, mamona, dendê, girassol, canola, pinhão-manso, madeiras e resíduos orgânicos e de indústrias agrícola e alimentícia.

Expansão agrícola

A pesquisadora descartou o risco de a agricultura brasileira privilegiar culturas direcionadas para os biocombustíveis (cana e a soja) em detrimento da atividade para a alimentação. Minimizou também a questão do avanço das fronteiras agrícolas sobre áreas de preservação ambiental, como o Pantanal, a Amazônia e trechos remanescentes de Mata Atlântica.

Rebateu, ainda, críticas recentes à expansão dos biocombustíveis, proferidas pelos presidentes Evo Morales, da Bolívia, e Hugo Chavez, da Venezuela. “De soja, o País tem área plantada equivalente ao Estado do Paraná; de milho, o espaço corresponde ao Ceará; e de cana, ao da Paraíba. Na verdade, preservar a natureza é uma necessidade fundamental para obtermos sucesso em qualquer cultura agrícola”, ensinou.

Hidrólise

Segundo Elba Bom, a hidrólise enzimática é um tema atual e objeto de grande interesse da comunidade científica internacional. “Vencer esse desafio permitirá ampliar e talvez até dobrar a atual eficiência dos biocombustíveis, sem aumentar áreas de plantio. Há, porém, estratégia de pesquisa exclusiva a ser desenvolvida com cada cultura agrícola e um dos problemas é o alto custo para usar as enzimas, que são importadas”, observou.

No Brasil, a cana é a opção mais promissora, com o reaproveitamento do bagaço e da palha. “A moagem do vegetal na usina para ser fermentado já é um pré-tratamento para a hidrólise. Esta é uma vantagem competitiva a ser considerada, pois o custo desse processo industrial é computado na fixação de preço do açúcar e do álcool pelo mercado”, observa.


Investimento em bioenergia

O ex-presidente da Petrobras, Henri Philippe Reichstul, encerrou os debates analisando perspectivas de investimento em bioenergia no País. Ele comanda a Companhia Brasileira de Energia Renovável (Brenco), empresa disposta a investir US$ 2 bilhões no etanol, com capital nacional e estrangeiro. O objetivo é instalar dez destilarias de álcool, processar por ano 44 milhões de toneladas de cana e produzir 3,7 bilhões de litros de álcool.

Segundo Reichstul, em comparação com outras culturas, a cana é a matéria-prima com maior eficiência energética. “É uma matriz limpa e sustentável e tem preço competitivo com a gasolina. Além disso, o Brasil tem o menor custo de produção de etanol”, analisa.

Na sua opinião, há oferta suficiente de álcool nas bombas dos postos de todo o País, inclusive na época da entressafra da cana. Destaca que no primeiro semestre do ano, 88% dos veículos vendidos no País eram equipados com motor flex. “Há maturidade no setor e abre-se uma oportunidade de expansão internacional, aliada a uma necessidade premente de aprofundar a co-geração de eletricidade nas usinas, uma saída para conter um apagão elétrico nos próximos anos”, finalizou.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente na página II do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 04/10/2007. (PDF)

Agricultura paulista diminui a área plantada mas aumenta produtividade

Um dos exemplos é o milho safrinha: com uma área de cultivo 7% menor, a produção terá aumento de quase 40%

O Instituto de Economia Agrícola (IEA) e a Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati), órgãos da Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento, finalizaram os números da safra 2006/2007. Foram analisadas as culturas do algodão, amendoim da seca, amendoim das águas, arroz, cana-de-açúcar, feijão da seca, feijão das águas, feijão de inverno, laranja, milho (de verão), milho safrinha e soja.

Considerando-se todos os grãos (inclusive sorgo e trigo), na comparação com a safra 2005/2006, a área plantada em 2006/07 sofreu redução de 18%. A produtividade média aumentou 11,6% e o resultado foi a queda menos acentuada da produção (8,5%).

A cultura do algodão sofreu a maior redução de produtividade (16,1%), causada por questões climáticas. O destaque foi o milho safrinha. Embora a área plantada tenha sido 7% menor, há aumento previsto de 39,9% na produção.

Entre os motivos, o pesquisador do IEA Alfredo Tsunechiro aponta as condições climáticas favoráveis e a maior produtividade com o uso da tecnologia. “Houve recuperação de 50,5% dessa cultura em relação à safra 2005/2006, que foi afetada por problemas climáticos”, analisa.

Mais cana plantada

A cana-de-açúcar foi uma das poucas culturas a ter a área de plantio ampliada. Cresceu 13,5% e saltou de 4,25 milhões de hectares para 4,83 milhões de hectares. A safra deve crescer 12,2% comparada à safra passada (284 milhões de toneladas), ficando em 319,6 milhões de toneladas.

O estudo mostra que as áreas em produção totalizam 3,86 milhões de hectares e as áreas novas ocupadas pela cana alcançam 971,91 mil hectares, com destaque para região de São José do Rio Preto. Nesse município, foram registrados 97,11 mil hectares ocupados com cana.

O milho sofreu redução de 11,3% na área de plantio e ficou com 678 mil hectares e 3,4 milhões de toneladas produzidas – volume 10% menor que a safra anterior. A soja teve diminuída sua área em 28% e passou de 666 mil hectares, na safra 2005/2006, para 478 mil na finalizada agora. A produção caiu 17% e atingiu 1,2 milhão de toneladas.

As safras de feijão da seca e das águas apresentaram redução. O primeiro ficou em 45 mil hectares (13% menor) e produção em 65 mil toneladas (13% menor). Para o feijão das águas, a área totalizou 70 mil hectares, 4% menor, e a produção praticamente estável em 124 mil toneladas.

A área e a produção do amendoim, tanto da safra da seca quanto a das águas, apresentaram redução. Na primeira, a área ficou em 11 mil hectares (22% menor) e a produção em 20 mil toneladas (25% menor). Na das águas, são 60 mil hectares de área cultivada (redução de 8,5% em relação à safra anterior), com produção em 148 mil toneladas (18% menor).

O algodão teve sua área de plantio reduzida em 41%. Ocupou 32 mil hectares e gerou 67 mil toneladas (em caroço). O café teve área 2% menor em relação à safra passada, perfazendo 229,7 mil hectares. Na produção, devido à bianualidade da cultura, a queda deve ficar em 29%, com 201 mil toneladas a serem colhidas.

A quarta previsão para a safra 2006/2007 de laranja aponta crescimento de 2% na área, alcançando 672,8 mil hectares. A produção deve chegar a 352,1 milhões de caixas, praticamente o mesmo volume da safra anterior, diferença de 1%.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente na página II do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 13/09/2007. (PDF)

Cientistas do centro multidisciplinar investem na criação de novos negócios

Ex-alunos da Unesp, USP e UFSCar abrem empresas direcionadas à inovação com produtos e serviços de apelo tecnológico

Formar pessoal qualificado, de perfil multidisciplinar e capaz de gerar inovação, conhecimento e novos negócios para a sociedade brasileira. Esta é a proposta do Centro Multidisciplinar para o Desenvolvimento de Materiais Cerâmicos (CMDMC), mantido pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e composto por 120 cientistas de instituições públicas de pesquisa.

A sede, estrutura organizacional e administração estão alojadas no Laboratório Interdisciplinar de Eletroquímica e Cerâmica (Liec) do Instituto de Química (IQ) da Unesp, campus de Araraquara. Além do IQ, o Centro mantém equipes na USP São Carlos, Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen).

Investe no desenvolvimento de novos materiais inorgânicos e de novas tecnologias de síntese e processamento. E em spin off, modelo de criação de novas empresas de base tecnológica realizado por ex-alunos de mestrado e doutorado da universidade, com a supervisão e parceria dos antigos mestres. Isso é comum em países europeus e promove o desenvolvimento regional, gera empregos e renda e preserva o vínculo entre o ex-aluno e a universidade.

Perfil tecnológico

Um dos caminhos para inovar, explica o físico José Arana Varela, é atuar sempre nas fronteiras existentes entre as diversas áreas do conhecimento humano. “Esse terreno é bastante fértil para a criatividade. Nele, o cientista consegue ultrapassar as barreiras estabelecidas e anunciar os novos limites da corrida tecnológica”.

Sobre o spin off, destaca a importância da universidade pública repassar o conhecimento produzido para a sociedade brasileira.

“O Brasil deixa de importar tecnologias e passa a ter novo perfil, mais tecnológico e menos industrial. Começa a formar sua sociedade do conhecimento – revolução feita por países como Alemanha e EUA no início do século passado”, esclarece.

Materiais especiais

O Centro Multidisciplinar dispõe de laboratórios especiais para processamento e caracterização de materiais cerâmicos. Pesquisa áreas como catálise, cosméticos, filmes finos, matérias luminescentes, nanotecnologia, pigmentos cerâmicos, química teórica, sensores, varistores, cerâmica artística e refratários.

O químico Élson Longo da Silva, diretor do CMDMC, prevê novos usos para as cerâmicas, como produzir eletricidade, a partir do uso do hidrogênio, em células de alto desempenho. Essa tecnologia poderá suprir condomínios, hospitais, veículos, celulares, notebooks e máquinas fotográficas.

Outra novidade para breve é a cerâmica semicondutora – mercado potencial de U$ 1 milhão em sistemas de proteção e de transmissão de circuitos elétricos.

Desde a fundação, em 1998, o CMDMC possui mais de 70 contratos de prestação de serviço, 12 dos quais em operação. A lista de clientes inclui a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), White Martins, Indústria Brasileira de Artigos Refratários, Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração e o Sindicato de Cerâmica Artística de Porto Ferreira. Conseguiu US$ 97 milhões em recursos e obteve o registro de 13 patentes.

Ação localizada

Parceria entre o CMDMC e empresa EMS promete novidades na área farmacêutica. Pesquisa realizada por três cientistas visa a produzir medicamentos capazes de agir somente numa determinada estrutura de tecido como, por exemplo, em músculos estriados cardíacos. A inovação permitirá ao médico prescrever remédios com dosagem mais equilibrada e liberação mais lenta do princípio ativo no organismo.

“O estudo dessas partículas orgânicas terá uso garantido em remédios com diferentes finalidades. O paciente passará a receber menos medicação e doses sob medida, porque a droga encapsulada somente atua no local desejado”, explica Élson.


Novos talentos

No dia 16 de junho, o Centro Multidisciplinar aplicou as provas da 3ª Olimpíada de Matemática, Química e Física. Com abrangência nacional, a iniciativa é dirigida a alunos dos três anos do ensino médio de escolas da rede pública. O intuito é descobrir novos talentos e incentivar jovens a ingressar em carreiras científicas e tecnológicas. Na terceira edição do concurso, o número de inscritos superou os 10 mil, ante 400 na primeira e 1,1 mil na segunda edição.

Na avaliação, o estudante tem a oportunidade de aprender mais e revelar quais são as suas principais carências de aprendizado. O concurso objetiva, também, apresentar a tecnologia como algo presente no cotidiano da sociedade e derrubar estereótipos, como o do cientista maluco. “Em suma, mostrar a inovação e a aplicação da ciência com naturalidade, com conceitos próximos da realidade do estudante”, observa Élson.


Retorno do investimento

Sediada em São Carlos, a empresa Nanox é uma criação de Luiz Gustavo Simões em sociedade com mais dois ex-alunos do Centro Multidisciplinar para o desenvolvimento de Materiais Cerâmicos. Baseada no sistema spin off, é especializada em novos materiais, como um filme especial à base de aço, utilizado para revestir paredes de tubos na indústria petroquímica. A aplicação facilita a limpeza interna das tubulações e reduz de 100 para 40 dias o tempo de interrupção do serviço para manutenção.

Após dois anos de trabalho, período mais crítico para a consolidação de micro e pequenas empresas, o grupo de sócios recuperou o dinheiro investido no negócio. No terceiro ano, a Nanox captou recursos do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas da Fapesp. Hoje emprega 15 pessoas e vende três linhas de produtos. Porém, o vínculo com o CMDMC jamais foi rompido e um grupo de pesquisadores do Centro integra o comitê científico da empresa.

Uma das últimas novidades é um revestimento desenvolvido sob medida para secadores de cabelo. Com ação bactericida, purifica o ar aspirado e expelido pelo bocal do aparelho. “A experiência na universidade somada ao apoio dos pesquisadores explica muito nosso sucesso”, observa Luiz Gustavo.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente na página II do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 09/08/2007. (PDF)