Conjunto de medidas do Estado dinamiza a aquicultura paulista

Pequeno produtor pode registrar on-line seu empreendimento ou a movimentação de animais; ações integram o Agrofácil SP, da Secretaria da Agricultura e Abastecimento, e simplificam a criação de espécies aquáticas

Adotadas no âmbito do Programa de Desburocratização e Modernização da Agricultura (Agrofácil SP), duas medidas instituídas no final de fevereiro pelo Executivo paulista simplificaram a criação de animais aquáticos no território paulista: o preenchimento eletrônico, via formulário on-line, de dois documentos, a Guia de Trânsito Animal eletrônica (e-GTA) e a Declaração de Conformidade da Atividade de Aquicultura (DCAAq), exclusiva para produtor de pequeno porte.

As recentes decisões atribuem à fonte da informação a responsabilidade pela veracidade dos dados cadastrados pela internet e são complementares ao Decreto estadual nº 62.243/2016. Conhecida como Decreto da Aquicultura, essa lei reconhece o interesse social e o valor econômico da cadeia produtiva dos pescados, além de facilitar o licenciamento ambiental para produtores, de todos os portes, de peixes, crustáceos, rãs, moluscos, invertebrados e coral.

O texto legal também delega ao Instituto de Pesca (IP), órgão vinculado à Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento (SAA), a tarefa de definir quais espécies terão cultivo autorizado, assim como os locais destinados às criações, para prevenir impactos ambientais.

On-line

A primeira mudança diz respeito à Guia de Trânsito Animal eletrônica (e-GTA). Agora, o aquicultor não precisa mais se deslocar até uma unidade física da Coordenadoria de Defesa Agropecuária (CDA), também órgão ligado à SAA, para fazer essa declaração. Emite, diretamente de seu computador, esse atestado sanitário – autorização para a movimentação de animais aquáticos dentro do Estado e também uma forma de rastreio de processos e insumos na cadeia produtiva paulista.

A expedição da e-GTA requer somente cadastro no sistema informatizado de Gestão de Defesa Animal e Vegetal (Gedave), da CDA. Atualmente, o cadastro do Gedave identifica 874 propriedades orientadas à aquicultura, incluindo piscicultores, ranicultores e criadores de mariscos, ostras, algas, entre outros animais aquáticos. No ano passado, o sistema expediu 6.525 GTAs, relativas à movimentação de 22,2 milhões de animais e 12,8 milhões de quilos de espécies para abate.

Autodeclaração

A segunda medida adotada foi a criação da Declaração de Conformidade da Atividade Agropecuária (DCAA) exclusiva para a aquicultura de pequeno porte. Assim como ocorre nas culturas do milho e da soja, nesse sistema eletrônico o próprio produtor registra on-line seu empreendimento, por meio de formulário disponível no site da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati), também órgão vinculado à SAA.

Na autodeclaração, informa dados pessoais e da propriedade onde a atividade é desenvolvida; também lista as espécies cultivadas, os sistemas de produção utilizados e a bacia hidrográfica à qual o empreendimento está inserido. “A DCAAq estende o licenciamento ambiental para muitos piscicultores, previne multas e abre acesso a linhas de crédito públicas, com juros subsidiados e condições financeiras vantajosas”, informa o diretor técnico de Departamento do Instituto de Pesca, Luiz Marques Ayroza.

Segundo ele, o Decreto nº 62.243/2016 e a informatização dos procedimentos atendem a demandas antigas da cadeia produtiva do pescado, integrada por associações como Peixe SP, Peixe BR, Câmara Setorial de Pescado e Compesca. “O modelo paulista de simplificação de licenciamento ambiental é pioneiro no País e poderá até servir de modelo para outros Estados”, conclui Ayroza.

Regularização

Responsável na Cati pela expedição das DCAAs, o zootecnista Francisco Martins informa que esse modelo de declaração foi criado em 2009 e, desde então, 84 mil documentos foram expedidos. Sobre o novo modelo, a DCCAq, ele comenta terem sido preenchidas 88 delas e a previsão é receber de 4 mil a 5 mil declarações até 31 de outubro, prazo estabelecido pelo Decreto nº 62.243 para os criadores e os pesque-pague se regularizarem.

“As regras do licenciamento ambiental para aquicultor de médio e de grande porte também foram facilitadas e os custos, reduzidos, porém, essa autorização segue vinculada à Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb)”, informa Martins. “Agora, criador de porte médio faz o chamado procedimento simplificado e o de grande porte, o ordinário, também ações favoráveis para tornar a atividade econômica mais atrativa e rentável”, conclui.


Tudo em ordem

Criador de tilápias em Paraibuna, no Vale do Paraíba, Luiz Costa foi um dos primeiros aquicultores do Estado a registrar uma Declaração de Conformidade da Atividade de Aquicultura (DCAAq). Desde agosto de 2012, quando iniciou o negócio, ele e o sócio Júlio Santos aguardavam resposta federal para o pedido de licenciamento ambiental da criação. Agora, regularizada, a dupla pretende ampliar a produção anual de 80 toneladas.

Na propriedade sediada nas imediações da Usina Hidrelétrica de Paraibuna da Companhia Energética de São Paulo (Cesp), o ciclo de desenvolvimento dos peixes é de sete meses. Começa com a introdução de 5 mil alevinos de 7 gramas cada um em cada tanque. Os animais são alimentados somente com ração mais de uma vez por dia e, quando atingem 800 gramas, são comercializados por R$ 6 o quilo. O crescimento deles se dá em tanques-rede, instalados na água corrente e limpa de uma área delimitada de uma represa formada por trechos alagados pelos rios Paraitinga e Paraibuna.

A produção de tilápias é feita em cem gaiolas aquáticas, cuja área total é de 900 metros cúbicos de água, volume 10% inferior ao limite estabelecido pelo Decreto nº 62.243 para caracterizar essa piscicultura como sendo negócio de pequeno porte. Atualmente, o cultivo gera duas safras anuais e os peixes são repassados vivos para os pesque-pague. “Felizmente, nunca sobrou nada nos tanques, a procura segue maior do que a nossa capacidade produtiva. Hoje, porém, somente temos essa opção de comercialização, pelo fato de não termos frigorífico e abatedouro na região. Gostaríamos, no futuro, de fornecer o peixe para a merenda escolar da rede pública”, revela Costa.

Serviço

Decreto estadual da Aquicultura (nº 62.243/2016)
Instituto de Pesca (IP)
Emissão de e-GTA no sistema Gedave/CDA
Declaração de Conformidade da Atividade de Aquicultura (DCAAq)

Rogério Mascia Silveira
Imprensa Oficial – Conteúdo Editorial

Reportagem publicada originalmente na página II do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 29/03/2017. (PDF)

Nova técnica do Instituto de Pesca aumenta sustentabilidade do mexilhão

Praia da Cocanha em Caraguatatuba lidera produção do marisco no Estado; cultivo amplia renda e fixação da comunidade caiçara

Técnica desenvolvida pelo Instituto de Pesca aumentou a produtividade e a sustentabilidade do cultivo de mexilhão em Caraguatatuba, no litoral norte paulista. Iniciada como pesquisa em maio de 2007, a técnica usa coletores artificiais para retirar do mar as sementes do molusco em suspensão na água.

Sem custos para o produtor, a nova metodologia substituiu na Praia da Cocanha a prática predatória de retirar o marisco de locais como costões e pedras. As vantagens incluem favorecer a recuperação dos estoques do animal na natureza, ampliar a sustentabilidade da atividade econômica e reduzir custos da criação.

O estudo para criar e aperfeiçoar o sistema de coletores foi pedido pela Associação dos Pescadores e Maricultores da Praia da Cocanha (Mapec). Foi realizado com o mexilhão de nome científico Perna perna, comum em Caraguatatuba e encontrado em toda a costa sudeste brasileira.

No Instituto de Pesca, vinculado à Secretaria de Agricultura e Abastecimento, a experiência prática transformou-se no tema da dissertação de mestrado da aluna Isabella Bordon. A defesa da tese foi realizada no final de junho sob orientação do pesquisador Hélcio Marques.

Os pesquisadores Hélcio e Isabella explicam que o coletor desenvolvido retém grande quantidade de larvas de mexilhão espalhadas no ambiente marinho. De tamanho microscópico e invisível a olho nu, elas se enroscam num emaranhado de fios da corda do equipamento. O passo seguinte do estudo inclui descobrir a época com maior abundância das sementes no ambiente marinho, propícia para lançar os coletores na água e, ainda, fixar a altura ideal para posicioná-los. Determinou-se que o melhor posicionamento é na superfície da água, o que se consegue com o auxílio de pequenas boias de isopor.

Na natureza, o ciclo de vida do animal bivalve (de duas conchas) começa no oceano, após a junção dos gametas masculino e feminino. Durante dois meses, a semente vagueia até encontrar um local para se fixar – rocha, rede coletora ou qualquer outro ambiente marinho. Para se alimentar, o mexilhão filtra a água do mar e dela retira plâncton e outros nutrientes.

Viveiro artificial

Na fazenda aquícola, o coletor é usado como viveiro. Quando a concha atinge dois centímetros de comprimento, o mexilhão passa a ser chamado de semente, sendo transferido para as redes de engorda envoltas numa malha fina.

A medida beneficia o ganho de peso e tamanho, amplia o espaço para cada molusco da colônia e reduz a competição por alimento com os outros indivíduos. Com o aumento do tamanho das conchas, o tecido biodegradável se rompe naturalmente. Em média, o animal atinge tamanho entre 7 e 9 centímetros após oito meses, quando está pronto para a colheita e consumo.

O equipamento é instalado a 500 metros da praia, na fazenda aquícola da Mapec, área demarcada exclusiva para a mitilicultura (criação do mexilhão). É fixado no chamado longline – corda com dezenas de coletores paralelos, identificados por boia. Cada um deles possui dois metros de extensão e é formado por cordas entrelaçadas.

A mitilicultura, ou criação de mexilhões, realizada de modo semi-artesanal em Caraguatatuba, é a criação de organismos marinhos mais difundida no litoral paulista. No Estado, a Mapec é a maior fazenda produtora e a atividade econômica ajuda a aumentar a renda e conter o êxodo urbano da população caiçara rumo aos grandes centros urbanos.

A denominação marisco diz respeito a todos os moluscos comestíveis. O mexilhão é um deles, e 90% da sua produção nacional vêm de Santa Catarina. São Paulo e Rio de Janeiro produzem apenas 5% cada. Na Praia da Cocanha, o quilo do produto in natura, na concha, custa em média R$ 6, e a pequena produção local abastece restaurantes e o comércio da região.

“Um dos reflexos da pesquisa foi elevar a produção para 30 toneladas anuais em 2008”, comemora José Luiz Alves, um dos 40 maricultores que integra a Mapec. Ele conta que a associação pesquisa em parceria com a prefeitura opções para aumentar o valor agregado do produto. Uma das novidades em estudo é vender mexilhão defumado em conserva. A Praia da Cocanha dispõe de aspectos naturais favoráveis ao cultivo, como a temperatura média anual da água, 25°C. E os valores ideais para o desenvolvimento do animal oscilam entre 25°C e 28°C.


Menos gordura e mais saúde

A Praia da Cocanha tem águas limpas e é margeada por duas ilhotas situadas a 500 metros do continente, que formam uma baía no local. Ambas atuam como barreiras naturais contra tempestades e correntes marítimas fortes e frias vindas do leste e do sul.

A criação funciona numa área marinha próxima entre a costa e as duas ilhas. No local, de acesso restrito aos maricultores, são espalhadas as longlines, com 50 a cem coletores e redes de engorda em cada uma. O animal produzido na fazenda aquícola apresenta a vantagem de ser livre de areia, poluição e impurezas, além de possuir maior proporção de carne em relação às conchas.

O mexilhão (de ambos os sexos) é um fruto do mar de sabor delicado. O macho é branco e a fêmea, alaranjada, porém não há diferença de paladar na degustação. Do ponto de vista nutricional tem grande valor proteico, com pouca gordura e calorias. É rico em sais minerais, cálcio, fósforo e ferro. Todos os anos, a Mapec promove, em dezembro, na Praia da Cocanha, o Festival do Mexilhão. Na ocasião, são servidas nos quiosques e restaurantes receitas típicas caiçaras com o alimento, como a mariscada temperada, o mexilhão ao forno e o risoto lambe-lambe.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente na página II do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 05/08/2009. (PDF)