As supermulheres do Estado

Foi-se o tempo em que o serviço público era território dos homens. Aos poucos, as mulheres foram chegando e tomando conta do espaço – com competência

O Estado de São Paulo tem 372 mil servidoras públicas na ativa. Elas estão em todas as áreas e ocupam todos os cargos. No universo público, não há mais espaço exclusivo para homens.

Na Polícia Militar de São Paulo, por exemplo, elas ocupam altos cargos hierárquicos – coronéis e tenentes-coronéis. Neste ano, três mulheres passaram a comandar, pela primeira vez, três instituições consideradas território masculino: o DHPP, o Instituto de Criminalística e o Metrô de São Paulo. Na área acadêmica, a professora Marilza Vieira Cunha Rudge assumiu a vice-diretoria da Unesp, fato que ocorre pela primeira vez.

O tempo de permanência nos postos de trabalho, também, é outra característica do universo feminino. Algumas servidoras estão no cargo há 40 anos, como Ana Lúcia Negrão Fernandes, professora de Matemática, na Escola Estadual Horácio Soares, em Ourinhos.

No campo do entretenimento, Inezita Barroso esbanja vitalidade aos 88 anos e comanda há 33, o Viola, minha Viola, que vai ao ar pela TV Cultura.

“A parte mais difícil é conciliar todos os papéis femininos. Trabalhar fora e cuidar de todos os “cês” da nossa vida (casa, crianças, cônjuge, comentários) é tarefa para leoa. Mas existe o cê de consciência, que é maior”. O depoimento de Laura Molina Meletti, pesquisadora científica do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), revela ainda a preocupação das mulheres em conciliar carreira com família. Elas têm dado conta do recado.

Justiça

Quando se trata de Direitos Humanos, três mulheres (Elaine Cavalcante, Juliana Armede e Cristiane Pereira) arregaçam as mangas e não medem esforços para ajudar os mais necessitados. Principalmente quando o assunto é violência doméstica. Apesar da Lei Maria da Penha, a violência doméstica ainda é um dos graves problemas que atingem a mulher.

O Mapa da Violência 2012, do Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos, informa que entre 1980 e 2010 foram assassinadas no país cerca de 92 mil mulheres, mais de 43 mil só na última década.

Elaine Cavalcante é juíza de Direito e atua no combate à onda cíclica da violência. Ela está na Vara do Foro Central de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, na capital paulista. Muito atuante, ela coordena o projeto Dialogando para a Paz e integra a Coordenadoria da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário do Estado de São Paulo (Comesp) ao lado das desembargadoras Angélica Almeida e Maria Tereza do Amaral e da juíza Maria Domitila Prado Manssur Domingos.

Quando se transformou em primeira juíza titular na 2ª Vara Criminal de Jundiaí, Elaine foi manchete de jornais. “Naquela época, uma mulher assumir um cargo de juíza titular era um fato novo e daí a curiosidade dos leitores”. Ela garante que nunca sofreu discriminação. “Hoje as mulheres conquistaram seu espaço na magistratura paulista, e pela primeira vez têm uma desembargadora na Comissão de Concurso de Ingresso à Carreira da Magistratura. Então, temos que comemorar essas vitórias”.

Cristiane Pereira é coordenadora do Centro de Referência de Apoio às Vítimas (Cravi), programa da Secretaria de Justiça e da Defesa da Cidadania. O Cravi completa 15 anos de existência em julho e trabalha com vítimas diretas e indiretas da violência.

A advogada atua no Cravi desde 2011. Com mestrado em Filosofia do Direito pela PUC-SP, sempre atuou em projetos de inclusão social. “Atuar dentro de uma instituição como o Cravi é uma missão. Ajudamos as vítimas diretas e indiretas da violência. Infelizmente, 70% das pessoas que procuram o nosso atendimento são mulheres, no papel de mães ou esposas. Elas chegam aqui aos pedaços, clamando por Justiça.”

Juliana Felicidade Armede é coordenadora dos programas estaduais de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e Combate ao Trabalho Escravo. “O Estado de São Paulo tem uma legislação pioneira no combate ao trabalho escravo e no enfrentamento ao tráfico de pessoas, mas existe um Brasil desconhecido, onde falta infraestrutura social e de Direitos Humanos. É nesse contexto que a sociedade deve atuar”. Juliana questiona também o papel da mulher na perpetuação da opressão.

Quebrando paradigmas

Cláudia Virgília conquistou uma vaga sonhada por muitos homens. Aos 41 anos, ela é subcomandante do 50º Batalhão de Polícia do Interior, sediado em Itu. Nascida em uma família de militares, a major Cláudia pertence à primeira turma de mulheres que ingressaram na Academia do Barro Branco. “Entramos em 1989. Éramos 12 garotas num universo de 160 homens”. A jornada árdua de estudos e treinamento não intimidou a oficial e as colegas. “Hoje, temos o orgulho de sermos chamadas de pioneiras”, recorda.

A oficial foi a primeira mulher a trabalhar na 2ª Companhia de Choque, na zona norte, e na Companhia de Força Tática. Formada em psicologia, é casada, tem um filho e ainda encontra tempo para atuar numa ONG que luta em defesa dos animais.

A voz tranquila e a figura aparentemente frágil escondem o verdadeiro perfil de Débora Santos de Oliveira. Quem a vê dificilmente imagina que ali está uma oficial do Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Estado de São Paulo.

Aos 31 anos, a primeiro-tenente PM comanda o 3º Grupamento de Bombeiros – Posto de Itaquera. Com histórico semelhante ao da major Cláudia (é filha do sargento PM Delcídio, bombeiro aposentado), Débora tem 60 profissionais sob suas ordens. “A sensibilidade da mulher é um dos fatores de sucesso em todas as profissões. Não é diferente no Corpo de Bombeiros”.


Histórias de mulheres de valor

Dividindo seu tempo entre as atividades profissionais e as responsabilidades de casa, elas buscam a realização (que muitos homens não conseguem)

A trajetória profissional da psicóloga Cândida Rocha Schwenck confunde-se com a evolução dos serviços prestados pelo Poupatempo. Em abril de abril de 1998, ingressou no serviço público estadual e passou por treinamento no posto Sé, o posto pioneiro do programa, inaugurado em outubro de 1997. E foi trabalhar, como assistente de atendimento, na agência Luz, desde a sua abertura.

Em 15 anos dedicados ao Poupatempo, a hoje executiva passou por várias funções: coordenadora geral (Agência Luz) e coordenadora de atendimento (Sé). Depois, gerenciou os postos de São Bernardo do Campo e de Itaquera. Atualmente comanda as unidades Sé (750 funcionários) e Luz (200 servidores), curiosamente, onde iniciou a carreira.

Cândida diz gostar de treinar e de comandar equipes, em especial, de trabalhar com pessoas de perfis diversificados – característica presente no trabalho do Poupatempo. Hoje, com 42 anos, casada, mãe de gêmeas, com duas especializações no currículo, ela tem uma vida dedicada à família, à formação acadêmica e, em especial, a aperfeiçoar o atendimento ao cidadão. Uma tarefa desafiadora e bem-sucedida, visto que, em 2012, pesquisas revelaram 95% de satisfação com o serviço do Poupatempo.


Quando Luciana Quintanilha entrou para os quadros da Polícia Civil, há 28 anos, o universo da instituição também era dominado por homens. “Eu cursava biologia na PUC Campinas e prestei concurso para a Polícia Civil para ajudar meu pai nas despesas com a universidade”. Há quase três décadas atua na área, hoje como perita criminal e especialista em documentoscopia. “É um universo fascinante no qual não existe rotina”. Entre macroscópios, ela é especialista em detectar documentos e dinheiro falsos. Fluente em inglês, já visitou diversos países e participou de inúmeros congressos (inclusive conheceu o Federal Reserve nos Estados Unidos). E trata de dividir suas conquistas: ensina documentoscopia e inglês na Acadepol.


Tudo nos trilhos

Em maio de 2012, Alexandra Leonello Granado assumiu a diretoria de assuntos corporativos do Metrô paulistano. Em 45 anos de existência da companhia, a administradora, antes advogada da empresa, foi a primeira mulher a assumir um cargo de diretoria no Metrô.

A executiva comenta que as áreas de transportes e de engenharia, trabalhos típicos do Metrô, tradicionalmente despertam maior interesse do maior público masculino – 70% do corpo funcional do Metrô ainda é formado por homens. Entretanto, o perfil do quadro vem se modificando. Ela própria é um exemplo: comanda 604 funcionários, divididos entre os setores jurídico, compras e contratações, infraestrutura, serviço interno e recursos humanos.

Com 41 anos, casada e mãe de dois meninos, Alexandra diz que sempre foi bem recebida pelos colegas homens e que essa junção – homens e mulheres –traz muitos benefícios para as empresas.

É grata ao marido, “que divide a educação das crianças comigo”, e como dica para quem ingressa no mercado de trabalho, sugere desprendimento.“Independente mente do sexo, concluir uma faculdade já não é suficiente. A preparação tem de ser constante, pois os espaços se abrem para quem se dedica com afinco”.


Café e simpatia

Ivanete da Silva Melo esbanja alegria pelas salas da Secretaria Estadual do Trabalho e Relações do Emprego (Sert). Copeira há dez anos, a sergipana de Estância cuida dos colegas com o mesmo carinho que dedica à família, principalmente aos dois netos. Bem falante, conta com orgulho sua nova conquista: “Vou utilizar a linha de crédito do Banco do Povo Paulista para reformar minha casa no Itaim Paulista”.

Para Ivanete não há mau tempo. “As mulheres não devem temer nada, a não ser a falta de vontade. Com fé em Deus, consegui criar meus quatro filhos, construí uma casa, trabalho onde gosto. Até dou entrevistas para TVs e jornais, pareço uma celebridade,” brinca.


Aposentadoria é uma palavra que não existe no dicionário de Maria Rosa Baraldi nem de Etelvina Moreira de Souza, ambas de 65 anos. Maria Rosa, há 18 anos, é analista sociocultural da Secretaria Estadual de Esportes e coordena o Espaço Salutaris, uma academia para os funcionários da pasta. “Viajamos pelo interior para dar cursos e conhecemos pessoas maravilhosas que mudaram suas vidas, a partir daí.”


Já a história de Etelvina Moreira de Souza confunde-se com a história da Universidade de São Paulo. “Meus pais eram portugueses e tinham uma pequena chácara, onde está localizado hoje o Hospital Universitário no campus da USP”.

Aos 16 anos, ela deixou o lugar e foi morar na zona leste. Depois, o destino se encarregou de levá-la de volta à USP. E, há 27 anos, é conhecida como a Dona Etelvinha, a zelosa funcionária da Faculdade de Saúde Pública, onde cuida do laboratório, serviço de zeladoria e ainda tem tempo para estudar. “Meu conselho para as mais jovens? Estudem. A vida é um aprendizado e cada segundo deve ser aproveitado”.


Mudando rumos

Elaine de Carvalho é testemunha da história. Funcionária do TJSP, ela atua como agente de fiscalização judiciária há 27 anos. “Além de prestarmos serviços de atendimento ao cidadão que procura o TJ, nós damos assistência no controle das salas durante os julgamentos”. Ela assistiu aos principais casos que tiveram grande clamor público como os julgamentos de Suzanne Von Richtofen, o de Lindenberg e dos Nardoni.

Tecnóloga em contabilidade, Elaine mudou radicalmente de profissão ao ver a oportunidade da estabilidade de um emprego numa carreira pública. “Para as mulheres, a área de segurança ainda representa alguns obstáculos, principalmente das pessoas que não pertencem ao setor. Geralmente, eles associam segurança com homens sarados em ternos escuros”. Elaine chefiou durante cinco anos o departamento de fiscalização judiciária do Fórum Criminal da Barra Funda. “Era como matar um leão por dia, mas valeu cada segundo”.


Aos 33 anos, Marinalva Cruz, supervisora do Programa de Apoio à Pessoa com Deficiência (Padef), acredita na capacidade do ser humano em mudar sua própria história. “Independentemente das limitações, todos têm direito à educação e ao trabalho. Não é diferente aqui, quando lidamos com pessoas com deficiência”. Os resultados comprovam. De 1995 a 2012, 65 mil pessoas com deficiência procuraram o Padef. Mais de 12,7 mil conseguiram a tão almejada vaga de trabalho.

A supervisora do Padef, formada em Recursos Humanos, acredita que a real inserção das pessoas com deficiência, só ocorrerá com a mudança cultural e empresarial. “Temos pessoas deficientes com excelente qualificação acadêmica e profissional. Eles só precisam de oportunidade”.

Maria Lúcia Zanelli e Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas I e IV do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 07/03/2013. (PDF)

Novos rumos na inclusão digital

Encontro Regional do Acessa SP premia experiências bem-sucedidas do programa, presente em 535 municípios paulistas

Os monitores Elizângela de Souza, Junior Eduardo e Muriel Brefori venceram o II Prêmio Acessa SP, realizado ontem no Memorial da América Latina, na capital. O trio apresentou os projetos de inclusão digital mais bem sucedidos e inovadores do ano de 2011. Foram 53 trabalhos inscritos e os 12 finalistas receberam como prêmio uma câmera fotográfica digital. Os três primeiros também levaram notebooks.

Além disso, Elizângela também conquistou o prêmio Grande Destaque. A conquista valeu um datashow para o posto do Acessa SP de Marabá Paulista, por ensinar aos professores como usar em classe o recurso tecnológico. “Um professor, antes leigo em informática, agora adota o recurso na alfabetização no ensino fundamental”, conta orgulhosa.

Junior Eduardo, de São Lourenço da Serra, é bicampeão. Desta vez, disseminou o Google Docs e ensinou ao usuário a usar o pacote de programas gratuitos e guardar os arquivos criados no ambiente virtual. “Percebi a dificuldade das pessoas em trabalhar com arquivos incompatíveis. E a solução também dispensa pen-drive e mídias de armazenamento”.

Monitor de Pirangi, Muriel Brefori conquistou o prêmio na categoria Projetistas. Seu projeto, Conhecendo Minha História, alfabetiza e ensina informática para idosos. A experiência foi narrada em postagens do blog que leva o mesmo nome e revela cenas das vida dos participantes. “Dedico a vitória aos alunos, eles é que venceram”.

Aprendizado colaborativo

A seleção dos projetos ficou a cargo de júri de especialistas em políticas públicas, internet e projetos comunitários. Os critérios foram inovação, criatividade, relevância e parcerias. “Nesta edição, sobressaíram a diversidade de temas e a valorização da cidadania de todos os envolvidos”, conta Gilmar Gimenes, da Prodesp.

Drica Guzzi, da Escola do Futuro da USP, destacou a oportunidade do monitor explorar a potencialidade da internet para construir uma sociedade diferente. A instituição dá suporte técnico, capacita monitores e os ajuda a elaborar projetos.

Cada posto foi pensado a partir da realidade da cidade e das necessidades da população. A ideia é cada vez mais oferecer, com rapidez e qualidade, o que as pessoas precisam. Segundo Daniela Matielo, da Escola do Futuro da USP, a meta é aproveitar novas tecnologias. E incentivar o monitor a elaborar projeto de acordo com a necessidade da comunidade, compartilhando os conteúdos em outros postos.

André Sobreiro, jornalista da Escola do Futuro responsável pelo acompanhamento das redes sociais do Acessa SP, destaca que a receptividade às redes sociais aumentou em relação à primeira edição. Seu trabalho tem sido monitorar as postagens e auxiliar na produção de foto, vídeo e texto. “É uma cobertura colaborativa. Dou o suporte necessário, mas são eles que produzem o conteúdo”.​

Encontro Regional

A premiação integrou o 4º Encontro Regional, realizado nos dias 5 e 6 de julho. Teve a participação dos responsáveis pelo Acessa SP e de 80 monitores vindos de mais de 50 cidades. Os participantes trocaram ideias e experiências e debateram caminhos para melhorar a infraestrutura do programa e da rede de postos, ampliar a autonomia do usuário e capacitar monitores.

Akira Shigemori, gestor do Acessa SP, anunciou que até o fim do ano 300 novas máquinas substituirão PCs do programa com mais de quatro anos de uso. Comentou também a proposta de desenvolvimento de novos projetos sugeridos por monitores, usuários e trabalhos voluntários. “A meta é oferecer o que o usuário precisa, aprimorar o atendimento e manter a ocupação de 60% nos telecentros”, salientou.

Como fazer projeto viável nos postos? Possíveis respostas foram mostradas em oficinas de mapeamento social, parcerias e registros dos projetos. Na identificação, o monitor foi orientado a explorar o potencial do entorno do posto e a realidade da região.

Em São João da Boa Vista, a monitora do Acessa SP estreitou laços com o Projeto Girassol, iniciativa local de apoio à criança deficiente. Antes a maioria dos atendidos não distinguia televisor de computador. Ela contou que agora sabem a diferença e aprenderam a escrever o nome utilizando o teclado.

Em Jacupiranga, em projeto parecido, a ação conjunta é com a Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae). Os dois casos ilustram possibilidades de parceria, que servem para divulgar o Acessa SP e contribuir com apoio voluntário e financeiro.

A orientação do gestor do Acessa SP é divulgar cada trabalho no Portal da Rede, para que os demais o conheçam. Para pôr em prática técnicas de comunicação, os monitores fotografaram as instalações do Memorial da América Latina. Depois, analisaram as imagens para perceber se elas eram o melhor retrato do local. Na oportunidade, foi ensinado como postar imagem, texto, vídeo.

Os monitores ouviram o depoimento do colega de São Luis do Paraitinga sobre a atuação do posto após a trágica enchente em janeiro de 2010. Destacaram que o posto teve papel fundamental no contato com parentes e na emissão de segunda via de documentos. Foram informados pelo parceiro comunidade LibreOffice sobre os diferenciais do software livre em contraponto com que os requer pagamento de licença de uso e pelo Sebrae a respeito das vantagens de se tornar empreendedor individual.

Claudeci Martins e Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente na página III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 07/07/2011. (PDF)

Virada Cultural leva diversidade artística a 30 municípios do interior paulista

Organizadores calculam que 1,6 milhão de pessoas participaram dos eventos culturais que pela quarta vez chegaram ao interior

Depois da capital, foi a vez do interior, neste último fim de semana, ter a sua Virada Cultural. O evento promovido pela Secretaria de Estado da Cultura, em sua quarta edição, atraiu público estimado de cerca de 1,6 milhão de pessoas e teve a participação de 30 municípios, incluindo a Baixada Santista.

A festa levou para os palcos dessas cidades mais de 1.070 atrações gratuitas, algumas internacionais como Manu Chao, Cat Power e Mudhoney. Entre os artistas nacionais, destaques para Lenine, Mônica Salmaso, Paralamas do Sucesso, Toquinho e Zeca Baleiro.

Em São João da Boa Vista, por exemplo, a ópera Carmen de Bizet (em versão compacta) abriu a programação oficial. Cleber Papa, diretor do espetáculo, explicou que o objetivo era iniciar o público em ópera. Apesar do formato mais enxuto, disse que se tratava de uma apresentação com artistas de qualidade. “É a primeira vez que se tem um espetáculo desse tipo na Virada. A ópera é uma conquista futura”, salientou.

Consuelo Barbosa Aliende, de 68 anos, nunca tinha assistido a uma ópera ou algo similar. “Ao vivo nunca vi. Minha avó italiana gostava muito e passou isso para a gente. A Virada está me dando essa possibilidade”, disse. A empregada doméstica Marilídia Inácio, de 50 anos, apesar de ter pisado o palco do Teatro Municipal, onde faz teatro afro, também nunca tinha visto. “A primeira oportunidade que estou tendo é essa”, garantiu. Americano de passagem pela cidade, Chris Teague viu e achou a montagem bem planejada: “Gostei”.

Várias atrações

Além da obra Carmen, a Virada levou para São João atrações musicais como os grupos Canastra, Os Opalas e Westboys, entre outros. O público teve acesso também a espetáculos teatrais (como Marias de Deus), de dança (como a performance Kamaleoas, do Núcleo Brasílica) e circo (com a dupla do Circo Delírio). Integraram ainda a programação aula aberta de teatro e feira de artes e artesanato.

As apresentações se concentraram, principalmente, no Teatro Municipal, palco externo da Estação Ferroviária e Fonteatro. Fora da área central, a Concha Acústica do bairro Jardim Nova República foi a única a receber o evento.

Em sua terceira edição na localidade, a Virada Cultural Paulista alcançou público estimado de 85 mil pessoas. A estudante Mariana Ponce, de Poços de Caldas, considerou o evento um incentivo cultural para a região inteira. A babá Rose Helena da Silva, de 36 anos, achou a iniciativa o máximo. “Aqui quase não tem nada e, quando tem, é caro. Então, se é gratuito, é muito bacana”, disse, lembrando que costuma ir algumas vezes ao teatro e raramente ao cinema.

Um dos destaques do primeiro dia, além da ópera, foi a Banda de Pífanos de Caruaru. Outro ponto alto foi o grupo Blitz que, com Evandro Mesquita à frente, apresentou sucessos como Você não Soube me Amar. A faxineira Josinete Freitas, de 46 anos, que estava na plateia, comentou que São João precisava de uma iniciativa como a Virada. Sugeriu apenas a realização do show num lugar mais amplo.

Paulo Henrique Andrade
Da Agência Imprensa Oficial


Evento vai à periferia

Pela primeira vez, um bairro de São João da Boa Vista foi incluído na programação. O público do Jardim Nova República e imediações pôde conferir shows musicais e apresentações circenses, de dança e teatro.

Moradora da região, a manicure Márcia Cristina Rodrigues da Silva comemorou a iniciativa porque as pessoas da localidade não dispõem de opções de lazer. Além disso, “muita gente tem vergonha de ir a um cinema, teatro no centro, porque acha que esses lugares são para os ricos”.

Nem por isso a dona de casa Crislaine Gomes Félix Silva, que assistia às apresentações no bairro, deixou de fazer sua crítica: “Deveria ter mais música. Achei que está muito parado. Esse negócio de circo não vira”, comentou.


Músico atrai fãs até do Acre

A manhã do segundo dia teve, por exemplo, performances circenses e a Orquestra Brasileira de Música Jamaicana na Fonteatro. Luís Antônio Carneiro de Carvalho e a esposa compareceram ao primeiro espetáculo, por causa do filho mais velho, que adora circo. As atenções do dia se dividiram, porém, entre os shows de Yann Tiersen e Elba Ramalho.

O músico e compositor arrastou uma legião de fãs de outros Estados, como Vanderlei Cidral Júnior, do Acre. A funcionária pública Clarinda Doria Roqueto, de São João da Boa Vista, decidiu-se pelo show por conhecer as trilhas sonoras dos filmes Adeus, Lênin! e O Fabuloso Destino de Amélie Poulain, compostas pelo músico francês.

O show de Elba, como o da Blitz, atraiu grande público. “Não imaginava que fosse tão bom”, comentou a estudante Márcia Massoni, de 24 anos. Para a cantora paraibana a iniciativa é interessante “porque mobiliza a cidade e incentiva a cultura”.

Para o torneiro mecânico Marcilio Tadeu Martins, de 54 anos, eventos como a Virada são positivos porque atraem um público com menor poder aquisitivo.


Araraquara atraiu 86 mil pessoas aos espetáculos

Araraquara foi uma das 30 sedes da quarta Virada Cultural Paulista 2010. E registrou público da ordem de 86 mil espectadores, de acordo com estimativa da Secretaria da Cultura.

A maratona de 24 horas de atrações, realizada nos dias 23 e 24, ofereceu mais de 70 opções nas áreas de música, teatro, circo, cinema, capoeira, artes plásticas, artes visuais, dança e folclore.

Quem abriu a festa foi a Cia. Contemporânea de Dança, com o espetáculo Baseado em Fatos Reais, no Teatro Municipal, às 18 horas do sábado. O encerramento e ápice da festa foi com o show do cantor franco-espanhol Mano Chao, no domingo, com público de 13 mil espectadores na Praça Pedro de Toledo, no centro da cidade, palco dos principais shows musicais.

Revelações da MPB

Os araraquarenses e visitantes curtiram nomes consagrados da MPB, como o cantor pernambucano Lenine. E também revelações como a poetisa e compositora paraibana Socorro Lira e o grupo Seu Chico, cujo repertório é baseado em versões cover de canções de Chico Buarque.

Os apreciadores da música clássica se deliciaram com os acordes do Coro da Osesp na Igreja Santa Cruz. Na Casa da Cultura, o público pôde conferir trabalhos de mais de 100 artistas de diversos Estados brasileiros na exposição VIII Território das Artes.

Barbatuques

No Teatro Municipal, a apresentação mais concorrida foi a dos Barbatuques. Em poucos minutos, os 460 ingressos já estavam na mãos dos felizardos que chegaram com mais de duas horas de antecedência. Quem entrou, não se arrependeu. Foram quase duas horas de ritmos e melodias a partir de sons feitos com o corpo humano.

O repertório incluiu palmas, estalos, assobios e sapateados. No final foram aplaudidos de pé e, na hora do bis, grande parte da plateia foi convidada a participar de uma performance com os artistas. O tema foi um batuque para conscientizar o público da importância da coleta seletiva e da reciclagem de materiais.

Lendas amazônicas

A Biblioteca Mário de Andrade recebeu diversas atrações para as crianças. O principal destaque para o público infantil foram os contadores de estórias da Cia. do Mapinguary, que encantam os pequeninos com lendas amazônicas e contos do folclores nacional.

O público do Teatro Wallace Leal pôde aprender na prática como são feitas muitas mágicas executadas por ilusionistas no picadeiro circense. Quem revelou estes segredos foi o Grupo Oculto do Aparente.

O palco do Sesc abrigou performistas de diversos estilos de danças urbanas, ao som de DJs nas picapes, com apresentações do Chemical Funk, Nossa Crew e Discípulos do Ritmo.


Festa no interior

As cidades que receberam eventos da Virada Cultural Paulista: Araçatuba, Araraquara, Assis, Bauru, Caraguatatuba, Franca, Indaiatuba, Jundiaí, Marília, Mogi das Cruzes, Mogi Guaçu, Piracicaba, Presidente Prudente, Ribeirão Preto, Santa Bárbara D’Oeste, São Bernardo do Campo, São Carlos, São João da Boa Vista, São José do Rio Preto, São José dos Campos, Sorocaba e a Região Metropolitana da Baixada Santista, Santos, Bertioga, Cubatão, Guarujá, Itanhaém, Mongaguá, Peruíbe, Praia Grande e São Vicente.

Rogério Mascia Silveira
Da Agência Imprensa Oficial

Reportagem publicada originalmente nas páginas II e III do Poder Executivo I e II do Diário Oficial do Estado de SP do dia 25/05/2010. (PDF)